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Temas em Psicologia

versão impressa ISSN 1413-389X

Temas psicol. vol.19 no.1 Ribeirão Preto jun. 2011

 

TERCEIRA PARTE: 20 ANOS DO LABORATÓRIO DE PSICOLOGIA SOCIAL DA COMUNICAÇÃO E COGNIÇÃO SOCIAL - LACCOS - UFSC

 

Representações sociais, crenças e comportamentos de saúde: um estudo comparativo entre homens e mulheres

 

Social representations, health beliefs and behaviors: a comparative study between men and women

 

 

Annie Mehes Maldonado BritoI; Brigido Vizeu CamargoII

ILACCOS - Universidade Federal de Santa Catarina - SC, Brasil
IILACCOS - Universidade Federal de Santa Catarina - SC, Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo pretendeu relacionar as representações sociais de saúde, as crenças relativas aos cuidados com a saúde, com a adoção de comportamentos saudáveis para homens e mulheres. Estudo descritivo e comparativo utilizou o método de levantamentos de dados, por meio de questionário. O instrumento foi respondido por 638 participantes. Para análise dos dados foram utilizados procedimentos da estatística descritiva e relacional, classificação hierárquica descendente, e a análise fatorial de correspondência. Constatou-se que a média de idade dos adolescentes foi de 16 anos (DP = 1,04), dos adultos foi de 43 anos (DP = 9,6) e dos idosos foi de 66 anos (DP = 5,7). Os comportamentos de cuidados de saúde prevalentes para o sexo feminino foram a adoção de comportamentos saudáveis. As crenças normativas familiares expressaram o autocuidado através da prevenção. As crenças dos pares para os homens destacaram o autocuidado em casos de agravos à saúde; já para as mulheres, o cuidado preventivo. O núcleo da representação social da saúde destes participantes traz a noção preventiva em relação aos cuidados, sendo que, prevalece para o sexo feminino o aspecto subjetivo, com o elemento bem-estar; e para o sexo masculino o aspecto curativo, com os elementos hospital e doença.

Palavras-chave: Representação social, Crença, Comportamento de saúde.


ABSTRACT

The present paper intended to relate health social representations, beliefs related to health care with the adoption of healthy behaviors for men and women. A descriptive and comparative study used the data acquirement through questionnaire. The instrument was answered by 638 participants. For data analysis descriptive and relational statistics procedures were employed, also as descendent hierarchical classification and factorial correspondence analysis. An average age for teenagers was 16 years old (DP= 1,04), 43 years old for adults (DP= 9,6) and 66 years old for elderly people (DP= 5,7). The health care behaviors which prevailed for women were the adoption of healthy behaviors. Familiar health behaviors were expressed through prevention. Couples' beliefs for men showed self care in severe cases of health injury, and for women as preventive. The social representation health center for these participants brings a preventive notion related to precaution, meaning that, for females the subjective aspect prevails, with the well-being element, and for males the curative aspect, with elements such as hospital and disease.

Keywords: Social representation, Belief, Health behavior.


 

 

Introdução

Quando se volta a atenção para os dados epidemiológicos de saúde, constata-se que, durante esta última década, ocorreram mudanças significativas na expectativa de vida ao nascer. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2009), no período de 1998 a 2008, a população brasileira ganhou 3,3 anos de expectativa de vida média ao nascer. Apesar dos avanços das descobertas no campo da medicina, seria limitado atribuir estas mudanças a explicações puramente médicas. Outros fatores foram relevantes para estas estimativas, como as mudanças sanitárias, nutricionais e do estilo de vida.

Ao se falar em saúde, existem várias esferas que podem ser privilegiadas, como a individual ou de pequenos grupos, até a que se refere a um universo maior, como a saúde de populações de grandes cidades ou de um país. Na esfera individual ou de grupos menores, este último foco deste artigo, o estilo de vida e os comportamentos relacionados aos cuidados com a saúde podem ser determinantes para a saúde (Dahlgren & Whitehead, 2007). Além disso, vários fatores estão associados com a saúde e influenciam estes comportamentos, sendo que o sexo é um dos mais importantes (Bee, 1997). O IBGE (2009) divulga dados da média de vida por sexo, demonstrando as diferenciações entre homens e mulheres expressas em anos de vida, sendo que os indicadores sociais realizados em 2008 apontam que os homens viviam em torno de 69,3 anos e as mulheres 76,8 anos.

Práticas de cuidados de saúde, como alimentação adequada, peso ideal em função da altura, não fumar cigarros, uso moderado de bebidas alcoólicas e atividade física regular, são disseminadas de várias formas na sociedade, seja em programas televisivos, seja em revistas de saúde e demais meios de comunicação. Apesar do conhecimento sobre quais práticas de saúde adotar para se ter qualidade de vida, com o adiamento de doenças crônicas e o aumento do período de vida ativo (Stroebe & Stroebe, 1995), constata-se que os estilos de vida adotados nem sempre vêm ao encontro de comportamentos saudáveis. Isto ocorre, pois os estilos de vida podem ser determinados pelas crenças, atitudes e comportamentos relativos à saúde, que são gerados por meio de conhecimentos que podem ser produzidos através das representações sociais.

Alguns aspectos das crenças normativas ou normas subjetivas foram estudadas nessa pesquisa, quais sejam, crenças familiares e crenças dos pares. Normas subjetivas são definidas como crenças que podem originar das pressões exercidas por seu entorno social, como familiares, amigos e a sociedade, de forma que normatiza o que é importante para cada indivíduo (Rodrigues, Assmar, & Jablonski, 2002).

A partir de Moscovici (1978, 1981), a representação social é um fenômeno que traduz uma forma de conhecimento dos grupos, a qual nasce nas relações interpessoais e pode ser entendida como um conjunto de explicações que se originam na vida cotidiana. A teoria das representações sociais operacionaliza um conceito para trabalhar com o pensamento social em sua dinâmica e em sua diversidade. Parte da premissa de que existem formas diferentes de conhecer e de se comunicar, guiadas por objetivos diferentes. Com Moscovici (1981) é legitimada a importância do saber popular, o qual inspira pesquisas científicas na busca do entendimento destas produções geradas no e pelo social. Esta concepção remete a práticas sociais, sendo que as mesmas podem se expressar em comportamentos de cuidados de saúde. Os comportamentos de cuidados de saúde de cada indivíduo podem funcionar como determinantes do seu estado de saúde. Todavia, este determinante é afetado por um conjunto de processos, tanto pessoais, quanto sociais.

O modelo de Dahlgren e Whitehead (2007), sobre os determinantes de saúde, permite localizar a perspectiva deste artigo. A partir deste modelo, os determinantes sociais da saúde são organizados em diferentes camadas, sendo que estes podem influenciar de maneira positiva ou negativa a mesma e estão relacionados com os estilos de vida. Os indivíduos estão na base deste modelo, com suas características pessoais, como sexo, faixa etária e fatores hereditários, os quais influenciam as condições de saúde na esfera individual. Na camada subsequente, aparecem os estilos de vida dos indivíduos e seus comportamentos. A mesma está relacionada tanto com aspectos individuais, quanto com aspectos sociais, culturais e políticos, e é condicionada por determinantes sociais, como pressão dos pares, informações e o acesso a alimentos saudáveis entre outros. Estas duas primeiras camadas foram privilegiadas neste artigo. A camada seguinte destaca a relação entre a rede e o apoio social, nível fundamental para a saúde da sociedade por completo. No próximo nível estão fatores relacionados às condições de vida e de trabalho e a última camada se relaciona aos aspectos macro, tais como às condições culturais, econômicas e sociais; esta, por sua vez, influencia as demais camadas (Dahlgren & Whitehead, 2007; Buss & Filho, 2007).

Existem inúmeros indicadores de saúde que revelam comportamentos saudáveis e/ou comportamentos inadequados que estão associados a fatores de impacto na saúde ou relacionados ao perfil de morbimortalidade descrito para uma determinada região ou país. Em pesquisas epidemiológicas (Monteiro, Moura, Jaime, Florindo, Figueiredo, Figueiredo et al., 2005; Moura, E. C., Neto, Malta, Moura, L., Silva, Bernal et al., 2008) podem ser denominados respectivamente de fatores de proteção, tais como padrão alimentar saudável, a ingestão de frutas e verduras, a prática de exercícios físicos, o uso de serviços de saúde na prevenção de doenças, entre outros; e fatores de risco, tais como, o consumo abusivo de bebidas alcoólicas, o tabagismo, o excesso de peso, o sedentarismo ou inatividade física.

O Centro para Controle e Prevenção de Doenças (CDC - Center for Disease Control and Prevention), em pesquisa realizada com alunos do Ensino Médio nos Estados Unidos, identificou seis tipos de comportamentos de risco que podem impactar o desenvolvimento da saúde (Eaton, Kann, Kinchen, Shanklin, Ross, Hawkins et al., 2008):

a) uso de tabaco;

b) uso de álcool e outras drogas;

c) comportamentos que contribuem para danos e violência sem intenção;

d) comportamentos sexuais que contribuem para gravidez precoce, involuntária e doenças sexualmente transmissíveis;

e) comportamentos alimentares pouco saudáveis;

f) inatividade física.

Neste artigo foram privilegiados os seguintes indicadores: o uso de álcool e tabaco, a inatividade física ou a prática de exercícios físicos e outros indicadores positivos como a busca por consulta médica e a realização de exames, que podem contribuir para prevenir agravos à saúde. A escolha dos indicadores relaciona-se ao escopo inicial da pesquisa, a partir dos estilos de vida dos indivíduos, com o modelo proposto por Dahlgren e Whitehead (2007). Os indicadores, que expressam comportamentos de cuidados de saúde, podem ser relevantes para expressar a vivência de anos de vida mais saudáveis (Moura et al., 2008).

Sabendo que o pensamento social expresso pelas representações sociais e pelas crenças pode nortear práticas de saúde, o presente estudo teve como objetivo relacionar as representações sociais de saúde, as crenças relativas aos cuidados com a saúde, com a adoção de comportamentos saudáveis para homens e mulheres.

 

Método

Delineamento da pesquisa

Esta pesquisa se enquadra como um estudo de natureza descritiva e comparativa, baseada em avaliações individuais, porém circunscrito a grupo específico. O delineamento do estudo é transversal e exploratório, do tipo levantamento de dados.

Participantes

Participaram deste estudo 638 pessoas e, conforme delineamento do estudo, estas foram emparelhadas por sexo e faixa etária, envolvendo aproximadamente 200 pessoas para cada grupo etário, todos residentes em Florianópolis. O critério de inclusão estabelecido foi a vinculação à instituição de ensino (professores, funcionários, estudantes ou usuários dos serviços oferecidos pela instituição) ou grupo de terceira idade, buscando a oportunidade do participante estabelecer interações sociais em contextos semelhantes. Quanto à faixa etária dos grupos, a média de idade dos adolescentes foi de 15 anos e 8 meses (DP = 1,04); dos adultos foi de 43 anos e 2 meses (DP = 9,6). Já entre os idosos, a média de idade foi de 66 anos (DP = 5,7).

Instrumentos

Foi aplicado um questionário autoadministrado em situação coletiva, composto por 19 questões divididas em quatro partes:

1. Características sociodemográficas (idade, escolaridade, condição socioeconômica, situação conjugal, renda familiar).

2. Diagnóstico das representações sociais da saúde: envolvendo um teste de evocação livre a partir do estímulo indutor "Saúde". Esta técnica consiste em solicitar ao participante que evoque (escreva ou fale) livremente 5 palavras relacionadas ao estímulo indutor.

3. Questões relativas aos comportamentos de saúde, comportamento preventivo e hábitos relativos à saúde, predominantemente questões fechadas e uma questão aberta.

4. Questões relacionadas às crenças normativas (familiar e amizades) apresentadas de forma aberta.

Análise de dados

Inicialmente, foram analisadas as principais variáveis clássicas, como idade, condição socioeconômica, situação conjugal e escolaridade. Para esta análise os participantes foram divididos segundo o sexo e a faixa etária, sendo o sexo a principal variável de comparação. Os dados coletados por meio das questões fechadas foram analisados por estatística descritiva (medidas de tendência central e dispersão) e estatística relacional (Qui-quadrado e t-Student), empregando-se o Programa Estatístico SPSS 17,0 (Statistical Package for the Social Sciences).

A análise dos dados obtidos a partir das evocações livres de cinco palavras a fim de diagnosticar as representações sociais sobre saúde foi lexicográfica, por meio do programa informático Evocation 2000, técnica desenvolvida por Vergès, (Scano, Junique, & Vergès, 2002) e Similitude 2000 (Junique, Barbry, Scano, Zeliger, & Vergès, 2002). Foram consideradas a frequência, a ordem de evocação das palavras e a conexidade entre os elementos da representação social (Sá, 1996). A análise a partir do Evocation 2000 possibilitou a identificação da estrutura base da representação social, identificando os elementos centrais e periféricos desta. A questão central da análise realizada pelo Evocation está na frequência e na ordem média de evocação, ou seja, a frequência é obtida pelo número de vezes em que a palavra foi evocada e a ordem média de evocação é obtida somando-se um quando uma evocação aparece em primeiro lugar e assim sucessivamente até a quinta posição. As palavras são indicadores de elementos de significação e sua frequência e ordens médias indicam o grau de compartilhamento e de importância destes elementos referente ao termo indutor.

O programa similitude busca descrever a conexão dos elementos que participam da composição prototípica do núcleo das representações sociais. Tal técnica se baseia na teoria dos grafos, indicada pela relação de pareamento entre as variáveis, cujos resultados são árvores máximas, que demonstram vértices nos quais se encontram as variáveis, e, nas arestas que as ligam, a conexidade ou coocorrência dentro de um grupo de evocações. Um determinado elemento será tanto mais conexo quanto mais aparecer em um conjunto de clique (filtro) mais elevado (Vergès, 2002).

Por fim, as análises dos materiais textuais advindos das questões "Quais foram as coisas mais importantes que sua família lhe ensinou sobre como cuidar da sua saúde" e "O que você acha que seus amigos pensariam de você se fosse a uma consulta sem estar se sentindo doente?" foram realizadas respectivamente pelos softwares ALCESTE (Analise Lexicale par Contextes de Segments de Textes) e SPAD 7.0 (Systhème Portable pour l'Analyse des Données Textuelles). (Lebart & Salem, 1988) O primeiro programa realiza uma classificação hierárquica descendente (CHD) e o segundo, análises fatoriais de correspondências com base nos vocabulários específicos considerando os grupos (adolescentes, adultos e idosos) e o sexo dos participantes.

 

Resultados

Caracterização

No que se refere à escolaridade de toda a amostra, verificou-se que 14% tinham o ensino fundamental incompleto ou completo, 50% ensino médio incompleto ou completo e 36% ensino superior completo ou incompleto. Em relação ao sexo e ao grupo etário observa-se na Tabela 1 que metade dos homens tinha o ensino fundamental ou menos, para as mulheres, verifica-se o predomínio dos ensinos médio e superior (69,2%). Por meio do qui-quadrado, constatou-se uma associação estatisticamente significativa entre escolaridade e sexo, e com força moderada [χ2(2)=131,32; V = 0,45; p<0,001], pelo fato de que as mulheres demonstram ter escolaridade mais elevada se comparadas com os homens.

Em relação à situação conjugal dos participantes e o sexo, verifica-se que para os homens existe uma predominância de casados e com relacionamento estável (45,9%), já para as mulheres a predominância são de solteiras, por serem ou separadas ou viúvas (78%). Pela associação entre ambas as variáveis, houve associação significativa entre ser homem e ser casado ou manter relação estável; ser mulher, e ser separada ou viúva; com uma associação de força regular [χ2(4)=26,40; V= 0,20; p<0,001].

Cuidados com a saúde

Quanto aos cuidados com a saúde, os participantes de ambos os sexos relatam principalmente uma preocupação com a manutenção dos "exercícios regulares" (71,8%) e do "check-up de forma periódica" (61%). Ademais, metade dos participantes relata "ir ao médico quando doente" e somente 1,6% afirmam "não realizar nenhum tipo de cuidado com a saúde".

A maioria dos participantes relata que fazer exercícios regulares é importante para se cuidar da saúde (71,8%), e, quando questionados sobre o quanto os mesmos efetivamente praticam exercícios, sobressaem os praticantes aos não praticantes. Com aproximadamente 1/3 deles afirmando realizar atividade física diariamente (35%), sendo que os homens relatam com maior frequência esta prática (28%). A partir do teste qui-quadrado, houve diferença significativa entre os sexos e com força forte de associação entre as variáveis [χ2(3)= 194,43; V=0,55; p < 0,001].

Ainda caracterizando a prática regular de atividade física, 16% das mulheres relatam praticá-la três vezes por semana e aproximadamente 1/3 dos participantes realizam menos de três vezes por semana (35,3%), o que descaracteriza a prática frequente. Apenas 13,4% relatam sedentarismo, não havendo diferenciação entre os sexos. Como se pode observar na figura 1, há uma tendência de os homens praticarem exercícios de forma mais regular que as mulheres.

 

 

Fonte de informação

Em relação à questão "Com quem obteve a maior parte das informações sobre como cuidar da sua saúde", observa-se a família com um papel primordial na comunicação de informações desse tipo de cuidado.

Evidencia-se que aproximadamente metade dos participantes refere como fonte de informação à família (46,4%), dentre os demais participantes, quase ¼ declarou receber informações principalmente dos profissionais de saúde. Importante salientar que o papel familiar é representado principalmente pelas mães, e em segundo lugar, a figura paterna (35,7% e 8,5%, respectivamente).

Serviços de saúde e vulnerabilidades

No que se refere às dificuldades encontradas para realizar consultas e exames médicos, os participantes relataram, em primeiro lugar, o medo de descobrir doenças (48%) e, em segundo lugar, a demora no atendimento (46,7%), e, em terceiro, a falta de tempo (43,4%).

Dos participantes que realizaram tratamento prolongado (50%), metade refere a busca por consulta médica quando doente. O fato de ter realizado tratamento prolongado não evidenciou aumento na adesão à alimentação saudável ou a prática de exercícios físicos. Sendo que a não associação foi evidenciada pelo teste do qui-quadrado.

Ainda em relação aos cuidados de saúde, porém, através da variável "fazer check-up" e "realizar tratamento prolongado", dos participantes que realizaram este tipo de tratamento, mais da metade deles realiza check-up regularmente. Sendo a associação entre estas variáveis significativa e com força regular a partir do coeficiente de contingência de Pearson [χ2(1)= 35,97; C=0,23; p<0,001]. Evidenciando que possivelmente os participantes que fazem ou já fizeram algum tipo de tratamento prolongado realizam com maior frequência os check-up de saúde.

Em relação ao "consumo de bebidas alcoólicas", aproximadamente metade dos participantes afirma que não costumam ingerir bebidas alcoólicas (46,2%), já parte dos participantes afirmam consumir bebidas alcoólicas com a periodicidade semanal e a outra parte quinzenal (37,1% e 14,4%, respectivamente). Observou-se associação significativa entre o "sexo" dos participantes e o "consumo de álcool" [χ2(2)=105,30; V=0,41; p<0,001], sendo que entre os participantes que ingerem bebidas alcoólicas, os homens o fazem com maior frequência. Pela verificação da análise de Cramer (V), houve força de associação moderada entre as variáveis.

Em relação à variável "tabagismo", 8% dos participantes afirmaram ser usuários de tabaco (cigarro), sendo que a grande maioria não era fumante no momento da pesquisa. Ao verificar a relação do "consumo de cigarros" considerando o "sexo", observa-se que a maioria dos homens e das mulheres não fumava ou havia parado de fumar no momento da pesquisa (91,3% e 92,7%, respectivamente).

Conforme a tabela 2, os participantes que referem praticar regularmente exercícios físicos são maiores entre os não fumantes do que entre fumantes (respectivamente, 53,2% e 32%). Entre os entrevistados fumantes, a realização de exercícios físicos ocorre predominamente menos de três vezes por semana (38%), já para os não fumantes o predomínio é da prática diária de atividade física (36,7%). A associação entre tabagismo e prática de exercício físico é significativa, com força fraca entre elas [χ2(3)= 15,88; V=0,15; p<0,001].

 

 

Ensinamentos familiares sobre cuidados com a saúde

A questão "Quais foram as coisas mais importantes que sua família lhe ensinou sobre como cuidar da sua saúde?" contou com 638 respostas. Estas compuseram um corpus que foi submetido à análise de classificação hierárquica descendente, através do programa ALCESTE.

O corpus foi dividido em 569 unidades de contexto elementar (UCEs), das quais 91,9% foram consideradas na classificação hierárquica descendente (CHD); 6.474 palavras foram analisadas e tiveram, em média, seis ocorrências, sendo que as palavras com frequência inferior a doze foram excluídas da apresentação dos dados. Das palavras encontradas 1.089 são de formas distintas. Os resultados da Análise Hierárquica Descendente deste corpus podem ser observados no dendograma (Figura 2).

Observa-se que o corpus original foi inicialmente dividido em dois subcorpora (1ª partição); de um lado temos as classes 1, 3 e 6; e do outro as classes 2, 7, 5 e 4. Uma 2ª partição, sobre o primeiro subcorpora separou a classe 6 das classes 1 e 3; e uma 3ª partição separou estas duas últimas classes. Uma 4ª partição, sobre o segundo subcorpora contrapoz a classe 4 as classes 2, 7 e 5. Uma 5ª partição separou a classe 5 das classes 2 e 7; e uma 6ª partição separou estas duas últimas classes entre si. O resultado foi a obtenção de 7 classes.

A classe 6 é formada por 36 UCEs, o que representa 6,33% das unidades de contexto elementar (UCE) ou segmentos de texto do corpus analisado. Nessa classe, os ensinamentos mais consistentes realizados pela família envolvem evitar indicadores de risco para a saúde, como as drogas lícitas e ilícitas. As palavras que mais representam esta classe são: "não, fumar, bebidas, drogas, usar e álcool." Contribuíram significativamente para essa classe pessoas casadas e pessoas do sexo masculino. Apresenta-se a seguir uma das UCEs que compõem essa classe:

"[...] não fumar, não beber e se preocupar com a saúde do dia a dia." (homem adulto). Conforme o trecho apresentado, dois elementos são recorrentes: o fumo e o álcool.

A classe 1 é composta por 97 UCEs e foi característica de pessoas com baixa escolaridade, representada pelo ensino fundamental incompleto, responsável por 17% das unidades de contexto elementar. O contexto da classe 1 está associado aos cuidados preventivos, especificamente a alimentação, conforme ilustram os recortes textuais.

"[...] saber e procurar se prevenir tomar os cuidados básicos com a saúde." (homem adulto)

"[...] não cometer excessos e se alimentar bem com produtos se possível naturais." (homem adulto)

A classe 3 conta com 84 UCEs, que corresponde a 14,76% das unidades de contexto elementar. Nesse contexto os ensinamentos familiares mais recorrentemente repassados foram caracterizados pelos cuidados corporais, expressos pela higiene. Assinala-se desde a higiene bucal, até a higiene corporal e os comportamentos de higiene, como lavar as mãos antes de se alimentar. Além disso, também apontam como importante evitar andar descalço. Estiveram mais significativamente associados a esta classe, os adolescentes e as pessoas com baixa escolaridade, especificamente do ensino fundamental. As palavras representativas foram: "sempre, comer, tomar, banho, lavar, dente, andar, saudável e escovar". O seguinte excerto da resposta dos participantes pode exemplificar a mesma: "não andar descalço, não tomar banho de chuva, não sair do banho e ir para o sereno, não andar sem camisa no frio, lavar os alimentos, não comer nada com as mãos sujas, não roer a unha [...]". (homem adolescente)

A classe 4 obteve 71 UCEs, representando 12,48% do corpus. O contexto apresentado por esta classe demonstra a necessidade de se procurar o médico quando necessário como um dos ensinamentos abordados pela família e foram agrupadas predominantemente em procurar o médico como uma forma de prevenção. Além da prevenção, foram apontados também aspectos relativos à atenção terciária à saúde, atrelados à presença de sintomas e, ou doenças. Algumas das palavras que mais se destacaram nesta classe foram: "fazer, médico, ir, atividade, regularmente, exame, física". Como se pode observar, na UCE associada ao contexto: "[...] ir ao médico quando não se sentir bem [...]". (Mulher adolescente)

A classe 5 complementa o sentido da classe 6, sendo 7,28% das unidades de contexto elementar geradas. As palavras representativas dessa classe foram: "Cuidar, bebida, evitar, álcool, doença, excesso". Os ensinamentos familiares, nessa classe, revelam os cuidados relativos aos excessos na ingestão de bebida alcoólica (droga lícita). Demarcando uma diferenciação da classe 6 que engloba as drogas ilícitas também.

A classe 2, que conta com 96 UCEs que correspondem a 16,87%, do total do corpus, as pessoas com ensino superior contribuíram de forma predominante. Esta classe evidenciou os comportamentos preventivos associados à saúde como cuidados repassados pela família. Para se ter uma vida saudável, considerou-se necessário cuidar da alimentação, praticar esporte e higiene. As práticas apontadas demonstram cuidados gerais e específicos relativos à prevenção. As palavras representativas da classe foram: "alimentação, higiene, cuidar, esporte, pessoa". A classe 2 pode ser ilustrada pela seguinte UCE: "[...] cuidar da higiene, alimentar-me de maneira saudável, praticar exercícios". (Mulher adolescente)

A classe 7, maior dentre o corpus, representa 25,31% das unidades de contexto elementar (UCEs) ou segmentos de texto do corpus analisado e envolve as práticas preventivas como, boa alimentação, prática de exercícios e a qualidade do sono, demonstrando uma variedade das mesmas em comparação a classe 1, que prioriza a alimentação. Esta classe foi característica do sexo feminino e de pessoas viúvas. As palavras que mais representam a classe são: "alimentação, exercício, boa, fazer, físico, praticar, saudável, dormir, atividade, sono, bom". Nos excertos que seguem os elementos recorrentes são os exercícios físicos e a alimentação saudável. "[...] sempre comer alimentos saudáveis e praticar exercícios físicos regularmente". (Mulher adolescente). "[...] alimentação balanceada, prato colorido, comer de três em três horas, em quantidade pequena, exercício físico, caminhada". (Mulher adolescente).

Representação social da saúde

A partir da questão "Escreva as cinco primeiras palavras que você pensa quando lê a palavra Saúde", de evocação livre, buscou-se investigar a estrutura da representação social de saúde para homens e mulheres dos três grupos etários. Na Tabela 3, apresenta-se o diagrama dos quadrantes referentes ao cruzamento dos critérios de frequência e ordem média de evocação de todos os participantes.

A análise realizada pelo programa Evocation gera um diagrama de quatro quadrantes organizados em dois eixos: o eixo vertical corresponde à frequência de evocação das palavras e o eixo horizontal, à ordem média de evocações. Foram evocadas 3.017 palavras, com 635 palavras distintas, sendo consideradas na análise aquelas com frequência superior a cinco. A frequência mínima aqui considerada foi de 10 para representação na tabela; a frequência média foi de 18, e a ordem média de evocação foi de 3.

O quadrante superior esquerdo da tabela indica os elementos da representação considerados como provavelmente centrais, são aqueles em que as frequências são maiores e que foram mais prontamente evocados. Quanto aos elementos intermediários, o quadrante superior direito, constitui a periferia próxima (1ª periferia), e há chances desses elementos serem periféricos com alto grau de ativação. Já o quadrante inferior esquerdo contém os elementos pouco evocados, mas mencionados com prontidão e se referem também a outra periferia próxima (2ª periferia). Ambos os quadrantes, superior direito e inferior esquerdo, são cognições relacionadas e que servem de suporte para o núcleo central da representação. Os elementos do quadrante inferior direito compõem a periferia longínqua, que se constitui pelas menores frequência e evocações com menos prontidão.

Conforme a tabela 3, no quadrante superior esquerdo, destacam-se os elementos "alimentação, bem-estar, exercício, médico, hospital, cuidado, vida, esporte, felicidade, doença, qualidade de vida, higiene, prevenção, importante, disposição, saudável e tranquilidade". Sendo estes os possíveis elementos centrais da representação. Os elementos "alimentação, bem-estar e exercício", com significativa frequência quando comparados com os demais elementos, assumem maior força para a centralidade. Enquanto o elemento "alimentação" possui maior frequência (234) que o elemento "bem-estar" (136), o segundo elemento possui maior prontidão ao ser evocado, com ordem média de evocação inferior (1,96). A partir dos elementos apontados acima, verifica-se que para os participantes a saúde está atrelada aos cuidados preventivos, sendo que estes podem ocasionar bem-estar. Todavia, além de aspectos relacionados à atenção primária, ou seja, relativos à prevenção, elementos como "médico e hospital" evidenciam o aspecto mais curativo, ligados à atenção terciária à saúde.

O quadrante superior direito indica elementos periféricos com alto grau de ativação, são eles: "lazer, remédio, trabalho, longevidade, família, amor, paz, amizade, exame e plano de saúde". Estes confirmam os indicativos da relação entre saúde e aspectos curativos, a partir dos elementos "remédio e exame", já enunciados no primeiro quadrante. O tipo de serviço também afeta a representação de saúde, enunciado pelos "planos de saúde", como também a rede social, apontada por meio do elemento "família". Outro destaque para este quadrante são os elementos de ordem da subjetividade como "amor e paz".

O quadrante inferior esquerdo contém os elementos pouco evocados, representados pelas seguintes palavras: "posto de saúde, necessidade, atividade, preocupação, qualidade, mau atendimento, precariedade, corpo". Estes elementos remetem à qualidade da prestação de serviço e a falta de eficiência do sistema de saúde. Denota-se que a compreensão de saúde está ligada também à estrutura de seu sistema. Ressalta-se que os elementos dos quadrantes superior direito e inferior esquerdo possibilitam uma interpretação menos direta no sentido de sua proximidade em relação ao núcleo.

No quadrante inferior direito, constituído pela periferia mais distante, constam as seguintes palavras: "segurança, atendimento, harmonia, morte, prazer, qualidade do sono, responsabilidade, sexo, caminhada, força, conforto, SUS, autoestima, custo, educação, relacionamento". Estes elementos não são organizadores e definidores da representação social, mas constituem contextos condicionais e as particularidades dela.

Constatam-se, nesse quadrante, indicações relativas aos demais, demonstrando as práticas sociais que por vezes são contraditórias e as possíveis especificidades dos vários contextos dos grupos. Nas palavras apontadas, pode-se verificar tanto questões relativas à prevenção, por meio da "caminhada e qualidade do sono," quanto questões relacionadas ao sistema de saúde, a partir das palavras "atendimento e custo", como também, menção a estrutura do sistema de saúde, com a palavra "SUS".

Foi possível verificar indicativos de quatro aspectos diferentes da representação social da saúde:

Preventiva: relacionada com comportamento de cuidados de saúde, apontando práticas do que fazer para se ter saúde.

Curativa: relacionada aos aspectos relativos ao tratamento de doenças.

Subjetiva: relacionada ao bem-estar e atrelada ao estado emocional, o que interfere diretamente na representação preventiva.

Programática: relacionada à constituição do sistema de saúde e a sua operacionalização na garantia do direito à saúde.

Na intenção de realizar uma comparação dos elementos da representação social da saúde considerando as características dos sexos, foram realizadas análises para verificar a relação entre as variáveis de acordo com a palavra evocada, classificando assim as palavras características do sexo masculino e do sexo feminino (tabela 4).

 

 

Verifica-se que as mulheres evocaram com mais frequência elementos relacionados aos cuidados preventivos como "alimentação", "exercício" e "qualidade de vida", como também, questões relacionadas ao "bem-estar" como a "alegria e vida". Já para os homens, os elementos mais evocados foram "hospital e doença". Em relação a estas palavras, observa-se que houve diferença estatisticamente significativa entre as respostas de homens e de mulheres em relação ao "hospital" (χ2 = 8,62; p < 0,05 ) e a "alegria" (χ2 = 6,78; p < 0,05). Ou seja, enquanto a primeira palavra foi mais evocada pelos homens, a segunda palavra foi mais evocada pelas mulheres.

Ainda em relação ao sexo, as mulheres evocaram mais frequentemente as palavras "bem-estar" (χ2 = 3,86; p < 0,05) e "prevenção" (χ2 = 5,34; p < 0,05), indicando associação significativa. As diferenciações apontam para uma representação da saúde voltada a aspecto mais curativo em relação ao homem, e mais preventivo em relação à mulher.

Para visualizar a organização da representação social de saúde foi realizada uma análise de Similitude, que contempla a conexidade dos elementos desta. Esta análise mostra as relações, a partir do filtro de um número mínimo de coocorrências entre os elementos. A representação gráfica do resultado dos estudos de conexidade é denominada de grafo, em cujos vértices se encontram as variáveis e, nas arestas que as ligam, a conexidade, ou coocorrência dentro um grupo de evocações. As categorias que aparecem conexas ao final da aplicação de um critério (filtro) são aquelas que apresentam um grau de conexão mais forte, o que está diretamente relacionado ao número de indivíduos que trata aqueles elementos de forma similar, indicativos estruturais da representação social (Junique et al., 2002).

Assim, um determinado elemento será tanto mais conexo quanto mais aparecer em um conjunto de clique (filtro) mais elevado (Moliner, 1994). O clique é um critério utilizado para determinar no gráfico as coocorrências a partir de 20 ou mais. Conforme demonstrado na Figura 3, o grafo representa as conexões obtidas pela aplicação do primeiro filtro, cujo critério foi de 30 coocorrências. Nesta, apresenta-se a conexão entre elementos da representação social da saúde e sua centralidade.

Inicialmente constata-se a formação de dois subconjuntos formados em função dos agrupamentos das categorias. O primeiro deles verifica-se através de uma forte conexidade entre as categorias "alimentação e atividade física", o que evidencia o papel organizador desses dois elementos para o significado acerca do objeto de representação tratado aqui. A categoria "alimentação" guardava relação com aspectos relativos aos "cuidados" com a saúde, por meio da "prevenção e da higiene", e por outras categorias que denotam o aspecto mais curativo, como "tratamento, médicos e demais profissionais e hospital". Estas últimas conexidades possuem força menos intensa, demonstrado pelo menor número de coocorrências. Além disso, os conteúdos da categoria "atividade física" relacionam-se ao lazer, com força média, expressando possivelmente uma forma com que os participantes compreendem as práticas esportivas.

Por sua vez, "alimentação" estabelece conexão com força moderada com os conteúdos da categoria "bem-estar", e retoma uma forte conexão com a categoria "estado emocional". Apontando o segundo subconjunto de categorias agrupadas, a partir da força da conexão e frequência de coocorrências. Sendo que nessa última conexão, entre as categorias "bem-estar e estado emocional", evidencia-se possivelmente outros elementos organizadores da representação social de saúde, demarcando que os sentidos construídos sobre saúde perpassam aspectos subjetivos que se ligam às características pessoais.

Outra noção central relacionada à representação da saúde é "bem-estar" relacionado à "vida". Esta conexão, com intensidade média, demarca a ideia inerente a aspectos de subjetividade, mais especificamente a forma de perceber e desfrutar a vida. Outras categorias associadas à representação de saúde, com fraca intensidade de conexão, são "rede de apoio e desenvolvimento humano", indicando a relação entre saúde e forma de envelhecimento, relacionada ao apoio recebido.

Foi realizada uma tentativa de testar a conexidade das categorias centrais (alimentação - atividade física; bem-estar - estado emocional), empregando um filtro mais exigente, de 45 coocorrências, que indica no gráfico apenas as coocorrências iguais ou acima de 45. O aumento do nível de exigência de coocorrência manteve a ligação anterior entre estes elementos. Pode-se verificar no grafo representado pela figura 4 que os elementos centrais considerados na análise anterior, não se separam pelo aumento do rigor de exigência do filtro.

Ressalta-se que houve uma redução de elementos da representação pelo aumento do rigor do critério do filtro, sendo que ficaram apenas 9 categorias das 16 anteriores, com a utilização de filtro cujo número de coocorrências era igual ou maior que 30. Por outro lado, as categorias centrais mantiveram sua conexidade, evidenciando a importância destas na constituição estrutural da representação da saúde para o grupo estudado.

Nessa representação gráfica (figura 4), manteve-se a conexidade forte e moderada respectivamente entre as categorias "alimentação e atividade física", e "bem-estar e estado emocional". Evidencia-se o papel organizador principalmente das categorias "alimentação e atividade física", sendo que o primeiro organiza aspectos referentes ao bem-estar, à prevenção e ao cuidado; e, o segundo, organiza aspectos relacionados ao lazer.

A forte conexão entre as categorias centrais "alimentação e atividade física", é indicativa de que a noção de saúde e a sua manutenção se associam aos cuidados preventivos. A partir do aumento do filtro, considerando um número mais elevado de coocorrência, constata-se que os aspectos curativos associados à saúde, como "tratamento, médico e outro profissionais e hospital, não se mantêm neste gráfico, prevalecendo as noções que remetem à atenção primária.

Norma subjetiva em relação à consulta médica

Para análise das respostas dadas pelos participantes à questão 14: "O que você acha que seus amigos pensariam de você sobre procurar um médico sem estar se sentindo doente?" foi utilizado o software SPAD 7, o qual, a partir do conteúdo textual, realiza uma análise fatorial de correspondência binária (AFC), com intuito de reconhecer as crenças relacionadas a amizades, ou seja, crenças dos pares. As variáveis ativas consideradas foram o sexo, feminino e masculino; e, a faixa etária, adolescente, adultos e idosos. Para verificar a contribuição das variáveis em cada fator dividiu-se 100 pelo número de modalidades de variáveis (5), obtendo vinte, como ponto de corte, o mesmo procedimento foi seguido para estabelecer o ponto de corte das palavras, dividindo 100 pelos números de palavras evocadas, sendo consideradas integrantes do fator as palavras que apresentassem uma contribuição acima de 1,40. A análise fatorial de correspondência foi realizada utilizando uma tabela lexical onde as respostas dadas pelos participantes à pergunta descrita acima se situavam nas linhas e as modalidades (sexo e faixa etária) se situavam nas colunas (638 x 5).

O Phi2 total da análise foi de 0,096, a partir da extração de três fatores, sendo que os dois primeiros fatores explicam 86,94% da variância. O fator um explica 58,28% da variância, o fator 2, 28,66% e, o fator 3, 13,06%. Sendo assim, optou-se por reter os dois primeiros fatores, uma vez que estes explicam acima de 80% da porção de variância. A tabela 5 apresenta os dois fatores retidos considerando as modalidades das variáveis.

O primeiro fator foi o mais representativo na AFC, pois explica sozinho 58,28% da proporção de variância, com autovalor de 0,056. Em relação à faixa etária, verifica-se que apenas os adolescentes contribuíram para o fator 1. Já quando foi priorizado o sexo, observa-se que tantos homens quanto mulheres contribuíram para o fator 2, no entanto, estes se localizam em coordenadas opostas, e relacionados a elementos distintos no que tange à representação da saúde.

A figura 5 mostra a representação gráfica dos dois primeiros fatores no plano cartesiano. As palavras que contribuíram para o fator 1 estão sublinhadas, já as palavras que contribuíram para o fator 2 estão em itálico, as palavras em itálico e sublinhadas contribuíram para os dois fatores; e as palavras com fonte maior são as modalidades de variáveis. As modalidades que apresentaram valores abaixo do ponto de corte estabelecido (5), não foram incluídas no plano fatorial.

Verifica-se na figura 5 que, no lado direito, no plano inferior, encontram-se os elementos que retratam, tanto cuidados preventivos, quanto cuidados curativos em relação à saúde. Estes se localizam próximos no plano fatorial e, são: "importar, necessário, amigos, remédio, sobre, prevenção". Ainda nesse plano, localizado mais abaixo, aparecem os elementos: "pensar, outros, exame, preocupação, opinião, hipocondríaco, rotina". Indicando que a saúde é motivo de preocupação e reafirmando os cuidados relacionados à atenção primária. Além disso, destaca-se também a rede social, representada por amigos e os pedidos de opinião. Em relação à modalidade, destaca-se nesse plano o sexo feminino.

Em oposição ao sexo feminino, o sexo masculino se encontra na parte superior, juntamente com os seguintes elementos: "vão, doença, ficar, problema, nada, falar, ver, louco". Indicando que a saúde é problema quando se está doente, além do elemento louco, que reafirma a busca desnecessária ao médico no caso de não haver doença. Como colocado anteriormente, os sexos se opuseram entre si no que tange aos cuidados de saúde, enquanto para o sexo masculino existe um problema apenas quando se fica doente, para o sexo feminino, denota-se uma posição mais favorável em relação aos hábitos preventivos, indicados pela preocupação com a saúde, desde a rotina estabelecida e a prevenção, como também no uso de medicação quando necessário.

 

Discussão

Indicadores de comportamento de saúde versus indicadores de comportamentos de risco entre os sexos

Para os participantes dessa pesquisa, a manutenção dos exercícios físicos e o check-up periódico relacionam-se aos principais cuidados necessários à saúde; além disso, apontam a necessidade de consultas médicas quando necessário. Todavia, mesmo demonstrando a importância da prevenção no quesito saúde, o sexo feminino se destaca na realização regular de check-up, sendo que o contrário ocorre para a prática frequente de exercícios físicos, com o predomínio do sexo masculino.

No que tange às diferenças entre os sexos quanto à prática de atividade física, resultados semelhantes foram encontrados por diversas pesquisas (Camões & Lopes, 2008; RIPSA, 2008; Sávio, Costa, Schmitz, & Silva, 2008; Augusto Silva, Lima, Santos Silva, & Prado, 2009), afirmando o predomínio de sedentarismo no sexo feminino e indicando também que ser homem se relaciona aos fatores que se associam a prática de atividades físicas. Especula-se, nesse sentido, a diferenciação entre as formas com que cada sexo concebe a prática de exercícios. Provavelmente, para os homens, esta pode ser significada a partir de uma partida de futebol com os amigos, o que não ocorre com o sexo feminino, o que pode ter interferido nas declarações de atividade física entre os homens.

WHO (2003) e Sávio et al. (2008) discutem a prática regular de atividade física afirmando seu auxílio na prevenção do ganho de peso, como também na redução das mortalidades e morbidades.

O maior número de relatos por parte das mulheres referente a tratamento prolongado de saúde evidencia a possibilidade de serem portadores de doença crônica. Demais pesquisas obtiveram resultados semelhantes ao considerarem que o autorrelato de morbidade é maior para as mulheres (Barros, Zanchetta, Moura, & Malta, 2009; Dachs & Santos, 2006; Fonseca, Blank, Barros, & Nahas, 2008; Mendoza-Sassi, Béria, & Bortolotto, 2006; Pinheiro, Viacava, Travassos, & Brito, 2002; Souza, Otero, Almeida, Turci, Figueireido, & Lozana, 2008). Uma hipótese para esta diferenciação entre os sexos pode encontrar-se na forma de perceber e relatar os sintomas. (Mendoza-Sassi et al., 2006; Pinheiro et al., 2002).

Como em outras pesquisas, o consumo de bebidas alcoólicas foi prevalente para o sexo masculino (Bastos, Bertoni, & Hacker, 2008; Courtenay, 2000; Moura et al., 2008; Rodrigues, Cheik, & Mayer, 2008). Esse resultado reafirma a assertiva de que as mulheres adotam mais frequentemente comportamentos saudáveis (Matos & Souza-Albuquerque, 2006).

Poucos participantes referiram o comportamento tabágico no momento da pesquisa. Sendo este valor inferior a média nacional dos adultos, como constatado a partir de inquérito telefônico (VIGITEL). (Brasil, 2008, 2009). Demais resultados de pesquisas de base populacional também obtiveram números mais elevados de fumantes se comparados com esta pesquisa (Kuhnen, Boing, Oliveira, Longo, & Kathie, 2009; Machado, Nicolau, & Dias, 2009). Além disso, não houve prevalência entre os sexos, para este tipo de comportamento, contrariando resultados de pesquisas anteriores (de Torrenté de la Jara, Willi, Cornuz, & Closuit, 2006; Field, 2008; Machado et al., 2009; RIPSA, 2008).

Os usos de álcool e tabaco têm sido tolhidos nos últimos anos, o primeiro devido à implantação da Lei Seca (Lei 11.705/2008), a qual se relaciona à mudança no código de trânsito brasileiro; e, o segundo, parcialmente em função da Lei do tabaco (Lei 9.294/2008), que assevera a proibição do uso de cigarros, derivados deste e similares, em recintos coletivo, privado ou público. Essas duas modificações recentes, constantemente divulgadas pela mídia, podem ter interferido no que foi referido pelos participantes. Neste campo, verifica-se a adoção de práticas mais saudáveis, o que para Stroebe e Stroebe (1995) ocorre ou por meio da persuasão, focando o comportamento individual; ou através de medidas legais, como as leis que foram citadas.

Robalo (2009) considera que quando se constata: o aumento da prevalência de obesidade nas populações; o surgimento de diabetes do tipo 2 em jovens; a promoção, por parte da publicidade, de alimentos calóricos; a promoção de vida sedentária e em frente de computadores e televisão; o estímulo do consumo de bebidas e cigarro; as leis que inibam esse consumo são essenciais por parte das políticas públicas.

Foi possível observar uma relação inversa entre o tabagismo e a prática regular de atividade física, sendo que os fumantes referiram menos a prática de atividade física, enquanto que os não fumantes são mais ativos fisicamente e apresentam maior regularidade nesta atividade. A relação destas variáveis indica que além do tabagismo atuar como risco a saúde, também interfere na adoção de outros comportamentos saudáveis, como a prática regular de exercícios físicos. Em concordância com os resultados desta pesquisa, Almeida e Mussi (2006) apontam que existe correlação negativa entre a prática de exercícios físicos e tabagismo, já que em longo prazo, os fumantes vão desenvolvendo dificuldade de tolerância aos exercícios devido a uma queda na capacidade pulmonar. Por outro lado, Rodrigues et al. (2008) acrescentam que os praticantes de esportes também podem se beneficiar, já que esta prática auxilia na diminuição do comportamento tabagístico.

Crenças normativas e representação social da saúde

Os dados desta pesquisa que se referem às crenças normativas familiares indicam que a alimentação saudável aliada à prática de atividade física regular foram os resultados referidos pela a maioria dos participantes. Em segundo lugar, citaram também a realização anual de check-up e pequena parcela alegando que os familiares acreditam que se deve ir ao médico independente de estar doente. Quando se consideram os cuidados de saúde, a família assumiu papel central, sendo a mãe a figura representante deste repasse. Esse resultado é um indicativo de que o entorno social pode ser um interveniente nos comportamentos de cuidados de saúde, tanto mais auxiliando do que impedindo a adoção de práticas saudáveis. Xavier, Bittar e Ataíde (2009) confirmam a relevância familiar no estímulo aos comportamentos de cuidados de saúde, tanto preventivos quanto curativos.

Segundo Siqueira, Barbosa, Brasil, Oliveira e Andraus (2006), as crenças familiares são socializadas por todo o entorno social, vivenciadas em âmbito familiar e repassadas pelas gerações. Esses conhecimentos, vivenciados na esfera familiar, podem se tornar crenças, e por sua vez, estas podem influenciar nos comportamentos adotados pelos indivíduos no que se relaciona à saúde. Além do mais, os ideais tanto de masculinidade, quanto de feminilidade, que apregoam crenças disfuncionais, podem ser barreiras para a adoção de comportamentos salutares (Korin, 2001). Os ideais de feminilidade incentivam que a mulher busque a atenção à saúde, entretanto, o contrário ocorre com sexo masculino, podendo exercer impeditivos nesses tipos de cuidados.

Ao relacionar as crenças dos pares sobre a realização de consultas preventivas por ambos os sexos com o grupo etário ao qual o mesmo pertence, verifica-se uma oposição entre homens e mulheres. Os homens pensam que a busca por cuidados ocorre mediante a necessidade; no caso das mulheres, verifica-se uma maior favorabilidade relativa aos cuidados com a saúde. Em concordância com este achado, Schraiber, Gomes e Couto (2005) explicam que geralmente não está presente na socialização do homem aspectos que valorizem o corpo a partir do cuidado de saúde, todavia, a tentativa de distanciamento de características atreladas ao feminino podem ser frequentes. De maneira semelhante, Courtenay (2000) pondera que existem comportamentos e crenças que são utilizados para a manutenção do ideal masculino, firmando sua dominância e hegemonia. Estes ideais por sua vez, reafirmam a invulnerabilidade e a superioridade dos corpos masculinos, o que exige menos cuidados.

Nas respostas que se referem aos ensinamentos familiares, os cuidados de saúde frequentemente alegados foram os relativos aos excessos com as drogas lícitas e as ilícitas, cuidados de higiene corporal, cuidados preventivos e curativos; e de outro lado, a adoção de práticas saudáveis tais como: uma alimentação balanceada, prática de exercícios físicos regulares e dormir bem. Apesar de todos os participantes citarem esses ensinamentos, observa-se que para o sexo masculino se evidencia a preocupação com os indicadores de risco, fumo, álcool e demais drogas, demonstrando aspectos mais funcionais da representação da saúde. Em relação ao sexo feminino, destacam-se as práticas preventivas envolvendo aspectos desde a higiene, a alimentação, os exercícios físicos e o sono. Os ensinamentos repassados pela família podem vir a constituir representações, e estas podem se tornar norteadoras de práticas e comportamentos dentre de um determinado contexto social (Abric, 1998).

Núcleo central da representação social da saúde

Em relação ao sexo, a representação feminina da saúde se caracterizou com elementos mais subjetivos e afetivos, além de remeter aos cuidados primários, ou seja, a prevenção, a partir de elementos funcionais. Nesse sentido, Campos e Rouquette (2003) reiteram que a representação é dotada de um componente afetivo, o qual é composto por elementos atitudinais. Além do que, toda a representação é um tipo de conhecimento estruturado que tem um papel determinante na forma como os indivíduos reagem face à realidade, evidenciando nesse aspecto, que ter saúde é ter alegria e viver a vida com bem-estar.

Por sua vez, os homens evocaram elementos relacionados à atenção terciária à saúde, ou o que Meireles (2006) denomina de prevenção terciária. Estas diferenças entre os sexos indicam também formas diversificadas de se relacionar com o objeto representado.

Os dados dessa pesquisa referentes à representação social da saúde demonstram a menção de diferentes aspectos desta, tais como, preventivos e curativos, subjetivos e sistemáticos, ou seja, aspectos que são discutidos sobre o próprio conceito de saúde e a forma de operacionalização da mesma.

Sobre a concepção de saúde, Robalo (2009) e Straub (2005) afirmam que deve ser compreendida como um estado multidimensional, o qual envolve vários domínios. Para Robalo (2009), os domínios individuais, genéticos, biológicos e os estilos de vida. E para Straub (2005), os domínios físico, psicológico e social. Sendo que, estes domínios surgem fragmentados nos relatos dos participantes, referindo que ora ter saúde é ter bem-estar, é praticar comportamentos saudáveis, ou ainda evitar riscos. Assim, por vezes os conhecimentos sobre saúde são depositados em pólos dicotômicos, sendo este insuficiente para explicar os vários fenômenos que ocorrem com os organismos, como pontua Stédile (1996). Czeresnia (2003) considera que a manifestação da vida ocorre tanto por meio da saúde, quanto através da doença e está atrelada às experiências subjetivas. Soares Neto (2006) relaciona o funcionamento saudável do organismo à felicidade, ao equilíbrio e à autorrealização física e psíquica.

Apesar das controvérsias que envolvem o conceito de saúde, e de se constatar diferentes conceituações, este deve ser ampliado para uma concepção que inclua as diversas dimensões da vida humana, sendo a saúde considerada um fenômeno que pode ser determinado não só por comportamentos individuais, mas beneficiado por estes, além do que, envolvendo questões sociais, econômicas e culturais.

Quanto à estruturação da representação social da saúde, tal qual assinalam Campos e Rouquette (2000, 2003), que as representações são perspassadas por aspectos tanto cognitivos, quanto afetivos, assumindo uma característica atributiva, à medida que influencia, organiza ou determina cognições ou comportamentos avaliativos.

Ao ser aplicado um filtro mais exigente para testar a conexidade das categorias centrais, mantêm-se a conexão entre "alimentação e atividade física", bem como a força de conexão entre elas. Isso denota com maior precisão o papel organizador dessas duas categorias para o significado acerca do objeto saúde. Todavia, através dessa nova análise, houve uma redução de conteúdos considerados como centrais na representação social da saúde, demonstrando a centralidade destes elementos e, asseverando a perenidade da representação (Abric, 2003). Sendo assim, confirma-se a importância principal dos conteúdos que compõem as categorias centrais e a articulação existente em seus entornos, com prevenção, cuidados e lazer.

 

Considerações finais

A problemática saúde por si só demarca sua complexidade e abordá-la exigiu realizar recortes de pesquisa para entender sua multiplicidade, sendo que neste estudo foi priorizada a esfera das características individuais dentro de pequenos grupos.

Sobre o conjunto de indicadores apresentados, ainda se constata primazia de indicadores de comportamentos saudáveis por parte do sexo feminino, principalmente no que se relaciona a questões preventivas. Todavia, de forma tímida, verificou-se modificação entre os sexos.

Se, por um lado, o sexo feminino demonstrou realizar check-up regulares, aderir a uma alimentação saudável e realizar consulta independente do estado de doença, por outro, referiram ser inativas fisicamente. Para os homens, houve destaque da prática regular de atividade física, todavia referem mais frequentemente o hábito de beber e não demonstram aderir a práticas preventivas tais como as mulheres. Do que se conclui que, para as mulheres, há nítida ênfase em práticas expressas pela busca de atendimento, com as práticas preventivas. Relacionado aos homens foram encontradas as maiores dificuldades na busca de atendimento médico preventivo, já que concebem esta necessidade na presença da doença ou algum tipo de sintoma.

Sobre o comportamento tabágico, o número de participantes que referiu fumar foi inexpressivo e inconsistente com os resultados de outras pesquisas. A partir das aferições destes indicadores, especula-se a possibilidade de mudanças sutis nos ideários masculinos no que tange à temática cuidados em saúde. Em geral, os ideários preconizados inserem o homem num universo em que aceitar os cuidados preventivos é comungar com o que é típico do sexo feminino. Entretanto, mesmo que sutilmente, estes homens demonstram que aderem a alguns indicadores de comportamentos saudáveis, como a prática de atividades físicas.

Outro aspecto relevante de diferenças entre os sexos consiste no fato de que, ainda que as mulheres demonstrem mais frequentemente aderirem a comportamentos preventivos, as mesmas referem ter realizado com maior frequência tratamentos prolongados de saúde. Infere-se que a recorrência de autorrelatos de morbidades é maior para o sexo feminino, além de que, a elevada possibilidade de terem sido vítimas de doenças crônicas aponta uma diferença negativa se comparada aos homens. Permanece o questionamento do que diferencia a maior númerode autorrelatos de morbidade para os sexos, se a real condição de saúde, ou se a diversidade ao relatar sua condição, desta forma, produzindo diretrizes para novos estudos.

As crenças normativas familiares identificadas confirmam que o autocuidado é traduzido primordialmente por cuidados preventivos, relacionado principalmente pela alimentação saudável e a prática regular de atividade física. Assim, constata-se a relação destas nos indicadores de comportamentos saudáveis, auxiliando funcionalmente nesta prática. Referente às crenças dos pares, constata-se outro diferenciador entre os sexos, enquanto para as mulheres o autocuidado de seus pares é percebido como necessário para se prevenir de acometimentos de doenças; para os homens este autocuidado é importante apenas quando ocorrem os agravos à saúde, ou seja, a doença. De forma geral, estas crenças, que podem ter sido compartilhadas pela família, amigos, pares, dentre outros, além de serem importantes fontes de informação podem nutrir os vários comportamentos.

A pressuposição básica deste estudo foi que as representações da saúde influenciam os comportamentos de cuidados de saúde, o que pode ser visto por meio dos indicadores associados e citados anteriormente. Em relação à representação social da saúde compartilhada pelo grupo, observam-se quatro aspectos distintos que constituem o saber social sobre este objeto, expressos por aspectos preventivos, curativos, subjetivos e sistemáticos.

Na hierarquia entre os elementos centrais da representação social, os principais sentidos contidos são de bem-estar e prevenção, com destaque para a funcionalidade, através da alimentação saudável e dos exercícios físicos. Além do que a complementaridade evidenciada pelo sistema periférico garante a segurança do cerne da representação social e admite as especificidades desta, o que pode ser evidenciado entre os sexos. Enquanto para as mulheres, os elementos "bem-estar, alegria e vida" foram evocados mais frequentemente, os elementos "hospital e médico" estiveram mais associados ao sexo masculino, o que caracteriza diferenças entre os sexos nos elementos que constituem a periferia das representações sociais da saúde. Do que se conclui que, para as mulheres, há nítida ênfase nos aspectos subjetivos, e para os homens, dos aspectos curativos.

O presente trabalho demonstra, em parte, a relação entre as representações sociais, as crenças e os indicadores de comportamentos de saúde; além disso, indica que as diferenças em relação aos cuidados com a saúde entre os sexos ainda estão presentes, mas com possibilidade de mudança. Provavelmente o ideário de masculinidade no que tange aos comportamentos de cuidados de saúde para o sexo masculino parece ainda guardar certa hegemonia e estar sendo apregoados pelo entorno social, naturalizando a construção de um homem forte e por isso invulnerável a doenças; o que levaria os participantes a priorizar o atendimento médico principalmente na presença da doença.

As políticas públicas voltadas para a saúde devem considerar as diversidades entre os sexos, relevando os ideais tanto de masculinidade quanto de feminilidade difundidos pelas crenças, como fatores que possuem relação na adoção de comportamentos saudáveis. Elas devem também considerar as especificidades entre os sexos; e ainda levar em conta a existência e a importância dos conhecimentos disseminados pelo pensamento social, envolvendo representações e crenças, nos espaços de ensino (educação para a saúde).

 

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Endereço para correspondência:
Brigido Vizeu Camargo
Departamento de Psicologia, Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC, Campus Universitário
Trindade, CEP 88.040-970, Florianópolis - SC, Brasil
Telefone: 55 48 3721 9067
Email: brigido.camargo@yahoo.com.br

Enviado em Dezembro de 2010
Aceite em Março de 2011
Publicado em Julho de 2011

 

 

Sobre os autores:

Annie Mehes Maldonado Brito - Professora Mestre do curso de Psicologia da Universidade do Alto Vale do Itajaí - UNIDAVI e doutorando do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC - Florianópolis, SC, Brasil.
Brigido Vizeu Camargo - Professor Doutor do Programa de Pós-graduação em Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina - UFSC - Florianópolis, SC, Brasil.