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Temas em Psicologia

versão impressa ISSN 1413-389X

Temas psicol. vol.19 no.2 Ribeirão Preto dez. 2011

 

Transtorno dismórfico corporal: uma revisão da literatura

 

Body dysmorphic disorder: a review of literature

 

 

Alessandra Salina-BrandãoI; Bruna Miziara CassetariII; Roberta DarozII; Vanessa FernandesII; Alessandra Turini Bolsoni-SilvaII

IInstituto de Análise do Comportamento - Bauru, SP - Brasil
IIUnesp - Bauru, SP - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente trabalho teve o objetivo de revisar artigos sobre TDC publicados entre os anos de 1980 e 2008, indexados nas bases de dados Lilacs, Francis, Scielo, Psychinfo e Ovid. As principais categorias de análise do estudo foram bibliografia, método, resultado e suas especificações. Entre os resultados obtidos ressalta-se o aumento considerável de publicações a partir do ano de 1996 e a baixa frequência de publicações nacionais sobre o tema. Os artigos consultados eram em sua maioria de caracterização, tinham como delineamentos mais frequentes o não experimental e o experimental e usavam o relato verbal como principal fonte de coleta de dados. Os resultados dos estudos investigados focam principalmente os comportamentos e características típicas da população diagnosticada com TDC. O presente trabalho discute os artigos consultados, suas contribuições para a área e lacunas no conhecimento.

Palavras-chave: Transtorno dismórfico corporal, Estudo de revisão.


ABSTRACT

This study aimed to review articles about BDD published from 1980 to 2008, indexed in Lilacs, Francis, Scielo, Psychinfo and Ovid's databases. The main categories of analysis in the study were bibliography, method, results and their specifications. Among the results it is emphasized the considerable increase of publications from 1996 on and the low frequency of national publications on this topic. The articles consulted were mostly of characterization, their designs were more frequent as the non-experimental and experimental and used the verbal report as the main source of data collection. The results of the investigated studies focus mainly the typical behaviors and characteristics of the population diagnosed with BDD. This paper discusses the articles consulted, their contributions to the area and knowledge gaps.

Keywords: Body dysmorphic disorder, Review study.


 

 

O transtorno dismórfico corporal (TDC) é descrito pelo DSM-IV-TR (Manual Diagnóstico e Estatístico) como um transtorno que envolve sintomas de preocupação excessiva em relação a um defeito mínimo ou imaginário na aparência e que traz prejuízos na vida social, ocupacional ou em outras áreas importantes para o indivíduo (B. J. Sadock & V. A. Sadock, 2007).

Apesar de essa ser a definição oficial desse transtorno, vários autores (Amâncio et al., 2002; Phillips, McElory, Hudson & Pope,1995; Rauch et al., 2003; Torres, Ferrão & Miguel, 2005) discutem a possibilidade de categorizá-lo como uma forma de transtorno obsessivo compulsivo (TOC), já que ambos os transtornos compartilham algumas características, entre elas: curso crônico e flutuante, pensamentos desagradáveis e indesejados, comportamentos compulsivos e repetitivos, sentimentos de vergonha, baixa autoestima e, em casos mais graves, isolamento social e total incapacidade funcional. Segundo Torres et al. (2005), a vantagem em se agrupar o TDC como uma forma de TOC estaria na possibilidade de, a partir de uma categoria mais geral de transtorno psiquiátrico, descobrir quais são os genes envolvidos na sua etiologia e quais abordagens terapêuticas seriam mais adequadas.

Por outro lado, outros autores sinalizam que o avanço da forma de tratamento do TDC, como de outros transtornos psiquiátricos, não estaria exclusivamente na descrição de sua topografia (aqui exemplificada pelos critérios diagnósticos do TDC), mas na identificação das variáveis ambientais que manteriam os comportamentos característicos do transtorno (Abreu & Cardoso, 2008; Cavalcante & Tourinho, 1998).

Considerando as duas tendências na literatura (topografia e funcionalidade), acredita-se possível avaliar ambos os aspectos, pois os manuais diagnósticos trazem informações sobre características gerais do transtorno permitindo uniformizar e ter interlocução com outros profissionais, sobretudo com os da psiquiatria. Adicionalmente, entender as variáveis ambientais relacionadas ao TDC é útil para entender a sua funcionalidade, aumentando as chances de um tratamento eficaz.

A relação entre variáveis ambientais e respostas comportamentais é descrita pela análise do comportamento como análise de contingências. Segundo Meyer (2008), analisar as contingências implica em identificar e descrever condições ambientais antecedentes e consequentes ao comportamento de interesse. A autora aponta que os principais focos para a realização de uma análise de contingências são: identificar o comportamento alvo e suas propriedades, tais como frequência e duração, e identificar as relações entre as variáveis ambientais e o comportamento, ou seja, observar a ocasião em que a resposta ocorre e quais as consequências reforçadoras que mantêm essa resposta, ainda que os padrões comportamentais também tragam punições, para em seguida propor uma intervenção.

Moriyama e Amaral (2007) realizaram uma pesquisa com sete participantes diagnosticados com TDC e tiveram o objetivo de investigar comportamentos envolvidos nesse transtorno e suas contingências de desenvolvimento e manutenção. Nos resultados, as autoras encontraram comportamentos depressivos, obsessivos, compulsivos e delirantes; de esquiva social; checagem no espelho e rituais de camuflagem. Em relação às histórias de vida dos participantes, identificou-se: educação coercitiva, grande valorização da beleza, reduzidas interações sociais, acidentes ocorridos, comentários sobre parte do corpo e cirurgias. Segundo as autoras, os comportamentos dos sujeitos eram reforçados negativamente, porque evitavam a exposição aos outros e críticas. Alguns comportamentos foram descritos por meio da esquiva experiencial, pois tinham a função de evitar o contato com experiências privadas aversivas, trazendo grandes prejuízos nas áreas social, ocupacional e familiar. Cabe ressaltar que entre as discussões levantadas pelas autoras, encontra-se a escassez de bibliografia que procura analisar as contingências envolvidas no transtorno em questão.

Além do número reduzido de publicações sobre TDC e análise de contingências, diversos outros aspectos desse transtorno demandam pesquisas futuras, como: critérios diagnósticos (Amâncio et al., 2002; Phillips et al., 1995; Torres et al., 2005), a dismorfia muscular como um subtipo de TDC (Sardinha, Oliveira & Araújo, 2008), procedimentos de diagnóstico (Battini, Soares & Zakir, 2008) e formas de tratamento (Neziroglu & Yaryura-Tobias, 1997).

Considerando a necessidade de pesquisas futuras sobre TDC, um primeiro passo necessário para a ampliação dessa área de conhecimento é a realização de estudos de revisão. Um levantamento bibliográfico nas bases de dados "Ovid" e "Francis", em publicações ocorridas entre os anos de 1980 e 2006, indicaram dois artigos de revisão sobre TDC, o de Neziroglu e Yaryura-Tobias (1997) e o de Castle e Russel (2006).

Neziroglu e Yaryura-Tobias (1997) investigaram os tratamentos empregados para casos de TDC, especificamente os farmacológicos e cognitivo-comportamentais. Os autores não especificaram as bases de dados consultadas e o período da pesquisa, no entanto, descreveram artigos entre as datas de 1945 e 1997 (data de publicação do artigo em questão). Após a realização da pesquisa, os autores encontraram sete estudos sobre terapia cognitivo-comportamental, sendo que todos demonstraram a melhora dos clientes diagnosticados com TDC. Dois desses trabalhos se referiram a pesquisas com sujeito único: em um dos artigos, utilizou-se relaxamento e dessensibilização sistemática e no outro treino em habilidades sociais. Outros três artigos relataram o uso da técnica de exposição com prevenção de respostas: um desses trabalhos não mencionou o número de sujeitos, e os outros dois descreveram o comportamento de cinco participantes. Outros dois estudos se referiram à aplicação da terapia cognitiva: o primeiro, com 17 participantes que foram expostos exclusivamente à terapia cognitiva e o segundo, no qual 13 participantes foram expostos concomitantemente à terapia psicológica e farmacológica.

Quanto aos tratamentos farmacológicos, os autores descreveram quatro estudos com sujeitos diagnosticados com TDC: a) trabalho que avaliou a resposta de 30 sujeitos após exposição à psicoterapia e tratamento medicamentoso, em que os resultados indicaram, no geral, uma resposta pobre a neurolépticos e uma boa resposta a fluoxetina e clomipramina, porém, sendo difícil atribuir se os resultados se deviam à terapia medicamentosa, psicológica ou combinação de ambas, já que todos os sujeitos foram expostos às duas modalidades concomitantemente; b) estudo que não isolou a variável "famacoterapia", ou seja, os pesquisadores avaliaram o padrão de TDC de 13 pacientes que foram expostos à clomipramina, pimozide, fluoxetina e litium e, apesar de observarem melhora, não puderam atribuí-la exclusivamente às medicações mencionadas, pois os sujeitos também receberam terapia comportamental; c) pesquisa comparou o uso de fluoxetina e clomipramina (isoladamente e em conjunto) por cinco sujeitos e os resultados demonstraram melhora nas duas condições; d) estudo de caso no qual um cliente demonstrou melhora no quadro de TDC após uso de tranylcypromine.

Além destes resultados mencionados, os autores ressaltaram as seguintes conclusões: 1) o TDC é uma condição mental que deve ser reconhecida e tratada por psicólogos e psiquiatras, 2) Clínicos precisam se familiarizar com os sintomas do transtorno a fim de identificarem pessoas que apresentam TDC e encaminhá-las para os especialistas, 3) Importância de se perguntar para os clientes nas consultas sobre a sua percepção a respeito do seu corpo, 4) Os efeitos das intervenções dermatológicas e cirúrgicas são incertos, mas os tratamentos psiquiátricos e cognitivo-comportamentais são promissores.

Castle e Russel (2006) fizeram um estudo referente às pesquisas publicadas sobre TDC nos 12 meses anteriores à publicação e os autores também não especificaram as bases de dados consultadas. Segundo os autores, os artigos identificados centravam-se principalmente em quatro categorias sobre TDC: 1) Diagnóstico e classificação, 2) Transtorno Dismórfico Corporal e Psicose, 3) Transtorno Dismórfico Corporal e Cognição e 4) Tratamento.

Em relação à classificação do TDC, a pesquisa de Castle e Russel (2006) identificou que alguns autores (Mayou, Kirmayer & Simon, 2005; Phillips & Castle, 2002) sugerem que o TDC deva ser agrupado com transtornos obsessivos compulsivos. No entanto, tais autores sugerem que poucos estudos compararam pacientes com TOC e TDC e citam um artigo (Frare, Perugi, Ruffulo & Toni, 2005) que sinaliza diferenças importantes entre pacientes dos dois grupos, por exemplo: pessoas com TOC tem menores níveis de comorbidade ao serem comparadas a pessoas com TDC.

Quanto à relação entre TDC e psicose, Castle e Russel (2006) descreveram um estudo (Phillips, 2005) que comparou como pacientes com TDC com e sem aspectos psicóticos respondiam ao tratamento com antipsicóticos e ansiolíticos e observaram que os sujeitos demonstraram uma melhora considerável com o uso de ansiolítico, resultado que foi interpretado pelos pesquisadores como uma evidência de que o TDC não precisa ser separado entre as categorias com e sem aspectos psicóticos, mas deve ser visto dentro de um contínuo (ou seja, a distorção da imagem corporal varia de um nível mais leve e mais sensível ao teste de realidade até um nível mais grave e insensível às evidencias ambientais).

Quanto à terceira questão discutida, a relação entre TDC e aspectos cognitivos, Castle e Russel (2006) sinalizaram que existem poucos estudos sobre essa temática. Segundo os autores, as publicações existentes indicam que os portadores de TDC apresentam vários déficits cognitivos, entre eles: funções executivas, memória e cognição social.

Quanto ao tratamento de TDC, os autores mencionaram que existe uma escassez de ensaios clínicos sobre as diferenças entre intervenções medicamentosas e psicoterápicas, mas que parece razoável concluir que a terapia comportamental ou cognitivo-comportamental são as abordagens de preferência e que os ansiolíticos são a primeira linha na intervenção farmacológica e o uso de antipsicóticos ainda permanece incerto.

A partir das descrições das pesquisas acima, constata-se que foram abordados temas importantes como formas de tratamento e relação entre TDC e psicose, mas não especificaram algumas informações, como: quais bases de dados foram consultadas ao realizar o estudo de revisão, os critérios de inclusão e exclusão dos artigos, se os mesmos foram usados em sua totalidade ou apenas os seus resumos, o procedimento de coleta e tratamento dos dados e no caso de um dos artigos, qual foi o período pesquisado. A ausência dessas informações coloca em questionamento a extensão dos resultados obtidos, ou seja: as conclusões dos autores se pautam em pesquisas de um grupo específico ou toda a produção sobre TDC?

A lacuna mencionada acima sinaliza a necessidade de pesquisas de revisão sobre essa temática. Moreira (2004) define tais pesquisas como

estudos que analisam a produção bibliográfica em determinada área temática, dentro de um recorte de tempo, fornecendo uma visão geral ou relatório do estado da arte sobre um tópico específico, evidenciando novas idéias, métodos, subtemas que têm recebido maior ou menor ênfase na literatura selecionada. (p. 191)

Moreira (2004) aponta diversas questões de importância para se realizar um estudo de revisão, dentre elas estão as funções histórica (faz parte integral do desenvolvimento da ciência) e de atualização (fornece aos profissionais informações sobre o desenvolvimento corrente da ciência e sua literatura).

A necessidade de estudos de revisão sobre TDC também pode ser justificada pelos argumentos de diferentes autores sobre a escassez de pesquisas sobre essa temática. Amâncio et al. (2002) e Torres et al. (2005) ressaltam que, apesar de bem descrito há mais de uma centena de anos e de causar muito sofrimento, o TDC ainda recebe pouca atenção na rede assistencial e na literatura.

Os artigos descritos até o momento sinalizaram algumas lacunas do conhecimento em relação ao TDC, as quais podem ser sintetizadas da seguinte forma:

• Ausência de uma caracterização mais ampla da produção nacional e estrangeira sobre o tema, ou seja, quais são as bases de dados consultadas, número de autores dos artigos, os tipos de delineamentos das pesquisas (se experimentais, quase experimentais ou não experimentais), as estratégias de coleta e análise de dados, dentre outras informações, das pesquisas sobre o tema;

• Informação insuficiente sobre a ênfase explicativa dada ao fenômeno: o TDC é explicado apenas por meio da sua topografia e/ou também pela sua funcionalidade;

• Os artigos exploraram pouco quais são as formas de tratamento mencionadas na literatura como mais efetivas.

Devido à ausência de algumas informações importantes nos artigos mencionados acima, a escassez de estudos de revisão identificados na literatura e a sugestão de vários autores sobre a necessidade em se ampliar o número de estudos sobre TDC, a presente pesquisa teve o objetivo de revisar artigos publicados entre os anos de 1980 e 2008 por meio de consulta às bases de dados Lilacs, Francis, Scielo, Psychinfo e Ovid e discutir sobre as lacunas do conhecimento acima mencionadas.

 

Método

Procedimento de coleta de dados

Com base em consultas às bases de dados Lilacs, Francis, Scielo, Psychinfo e Ovid, foram selecionados 226 artigos que abordavam a temática da presente pesquisa, dos quais 90 foram incluídos neste trabalho considerando os critérios descritos abaixo. As publicações selecionadas datam entre 1980 e setembro de 2008, quando se encerrou a coleta de dados.

Para a busca nas bases citadas acima, foram utilizadas as seguintes palavras-chaves: transtorno dismórfico corporal, dismorfofobia e body disorder dismorfic.

O critério de inclusão/exclusão deu-se conforme o acesso ao artigo completo; dessa forma, todo resumo de artigo encontrado referente ao TDC, ao qual não era permitido o acesso ao texto completo, foi excluído da coleta de dados.

Procedimento de tratamento de dados

Os artigos foram organizados em categorias iniciais referentes aos objetivos. Sendo que cada categoria-objetivo apresentou categorias gerais e estas subcategorias.

As categorias-objetivo foram: avaliar efeito de intervenção, estudo epidemiológico, estudo teórico, estudo de caracterização, estudo de revisão, construção e validação de instrumento e estudo de correlação.

As categorias gerais foram: bibliografia (base de dados, ano de publicação, nome do periódico, número de autores), temática (população alvo, tamanho da amostra, sexo, faixa etária, delineamento); metodologia (procedimento de coleta de dados, procedimento de análise de dados, procedimento de intervenção); abordagem teórica e resultados.

Todos os artigos foram analisados tendo por base as categorias gerais explicitadas acima, exceto os artigos de revisão e de estudos teóricos. Esses trabalhos foram analisados separadamente, porque não compartilhavam algumas categorias presentes nos demais estudos (por exemplo: população alvo, tamanho da amostra, sexo, faixa etária, delineamento, entre outras) e, dessa forma, não poderiam ser comparados com os mesmos.

Nos estudos de construção e validação de instrumentos, foram encontradas especificidades na categoria resultados, utilizando-se apenas os resultados: validado e não validado.

As subcategorias estão apresentadas na figura a seguir, de acordo com os números das categorias gerais já mencionadas.

 


Figura 1 - Clique para ampliar

 

É importante mencionar que a categoria "observação", citada no procedimento de coleta de dados deste trabalho, não se refere à observação sistemática como defina por Cozby (2003): "Observação sistemática refere-se à observação cuidadosa de um ou mais comportamentos específicos num ambiente particular" (p.130). Este termo foi utilizado para definir situações em que os pesquisadores observaram se os participantes apresentavam ou não o defeito que era indicado, seja através da obtenção de medidas corporais e/ou classificação médica do grau do defeito (por exemplo, nos casos de acne) ou a partir avaliação subjetiva de cada pesquisador.

Após a organização dos artigos nas categorias mencionadas - categorias iniciais, gerais e subcategorias - os dados foram organizados em planilhas em um pacote estatístico (SSPS 14.0), cujos resultados são apresentados por meio de Figuras. O delineamento de coleta, tratamento e análise de dados foi o mesmo utilizado por Bolsoni-Silva, Villas-Boas, Romera e Silveira (2010), o qual se mostrou efetivo para responder às perguntas de estudo.

 

Resultados

Essa seção está organizada de acordo com as categorias previamente indicadas no método. A Figura 2 mostra o ano de publicação dos artigos de acordo com o número de autores e base de dados consultada; a Figura 3 apresenta o sexo e idade dos participantes dos estudos de acordo com o tamanho das amostras consultadas; a Figura 4 apresenta a relação entre delineamentos empregados e objetivos dos estudos; a Figura 5 mostra por meio de três gráficos a relação entre procedimento de coleta de dados e três conjuntos de variáveis: ano de publicação, procedimento de análise empregado e delineamento utilizado.

 

 

 

 

Observando o primeiro gráfico da Figura 2 (relação entre número de autores pelo ano de publicação), nota-se um aumento progressivo no número de autores nos artigos da área entre o período de 1980 e 2008, sendo que de 2006 a 2008 não se encontra nenhum artigo escrito por um único autor. De 1991 a 1995, apenas encontram-se artigos escritos por dois autores. Entre 1996 e 2000, surgem artigos escritos por mais autores, mas a maioria ainda é escrita por dois autores (seis artigos). A partir de 2001, observa-se um aumento considerável no número de artigos escritos por três, quatro, cinco ou mais autores (oito, oito e dez artigos respectivamente) e uma diminuição no número de publicações com dois autores (três artigos). A partir de 2006, os números se mantiveram estáveis, com exceção do número de publicações com um autor, pois não houve nenhuma publicação com essa característica após esse período.

O segundo gráfico da Figura 2 mostra a quantidade de publicações sobre TDC em diferentes bases de dados no decorrer dos anos. Observa-se que, de 1991 a 1995, consta apenas um artigo sobre o tema, publicado na base de dados Francis, que apenas contém publicações internacionais. Entre 1996 e 2000, o número de publicações aumentou consideravelmente (passando de um artigo para dezenove), mas ainda encontram-se apenas publicações internacionais. A partir de 2001, as publicações continuaram em crescimento e já se pôde observar publicações nacionais, porém, com um número bastante baixo.

Como se observa na Figura 3, considerando o gráfico que ilustra a relação entre o sexo do participante de acordo com o tamanho da amostra, observa-se que 10% dos artigos tiveram como sujeitos apenas homens, 7,5% apenas mulheres. E, a maioria apresentou homens e mulheres como participante das pesquisas, totalizando 50% dos artigos. Considerando que 32,5% das pesquisas não apresentaram esse dado.

Com relação ao tamanho da amostra, a faixa mais frequente encontrada nos artigos foi de 101 a 200 participantes (30%), seguido por 15% de artigos com amostras maiores que 200 e também 15% de artigos na faixa entre 11 a 30 participantes. A menor frequência encontrada, com relação ao tamanho da amostra, encontra-se na faixa de 31 a 60 participantes (5%). Já os estudos com sujeito único representam 8,75% dos artigos. Sendo que apenas 6,25% dos artigos não informaram o tamanho da amostra.

Observa-se que nas pesquisas realizadas com sujeito único, participantes do sexo masculino predominaram em comparação aos do sexo feminino. Novamente, uma quantidade notável de artigos (32,5%) não caracterizou a amostra com relação ao sexo.

Em relação à idade dos participantes pelo tamanho da amostra, observa-se que, 50% dos artigos se referem a pessoas adultas, 11,25% a adolescentes e 31,5% dos estudos não definiram a idade da amostra.

Como descrito anteriormente, houve predomínio de participantes adultos no número total de estudos identificados. Observando-se especificamente a faixa etária que estava mais presente em cada categoria de amostra, observou-se predominância de participantes na idade adulta (18 a 55 anos) em todas as amostras, principalmente na amostra que variou entre 101 a 200 participantes.

A porcentagem de crianças participantes desses estudos foi de 2,5%. Estando presente em artigos cujo tamanho da amostra variou entre 61 a 100, nos quais havia crianças e participantes da idade adulta. No tamanho de amostra que compreendeu entre 101 a 200 pessoas também foram encontradas crianças, juntamente com adolescentes e adultos. Estudos que continham apenas crianças como participantes não foram encontrados, assim como amostras que continham todos os estágios do desenvolvimento: criança, adolescente, adulto e idoso.

A população adolescente não foi encontrada em amostras com 11 a 60 participantes; porém, esteve presente em todos os demais tamanhos de amostras, que foram definidos. Totalizando em 16,25% dos artigos, tanto em estudos com população apenas adolescente ou juntamente com as demais faixas etárias: crianças, adultos e idosos. A amostra que continha tanto pessoas adultas, quanto pessoas idosas foi estudada em apenas 1,25% dos artigos, na faixa que compreendeu entre 11 a 30 pessoas.

No que se refere à relação entre tipo de delineamento empregado e objetivo do artigo, observa-se que o delineamento não experimental foi o mais frequente nos estudos epidemiológicos, de caracterização e correlação e em metade dos estudos de construção e validação de instrumento. Já nos estudos de intervenção, o delineamento predominante foi o experimental. Os delineamentos quase experimentais apareceram apenas nos estudos de caracterização (cinco artigos) e de correlação (dois artigos).

O primeiro gráfico da Figura 5 relaciona o procedimento de coleta de dados de acordo com o ano de publicação do mesmo. Observa-se que, em todo período de pesquisa, houve predomínio do relato verbal como procedimento de coleta de dados, seguido por estudos que utilizaram observação e relato e artigos que utilizaram apenas o procedimento de observação.

O segundo gráfico da Figura 5 ilustra a relação entre procedimentos de coleta e análise utilizados. Pode-se observar que a frequência de artigos que utilizaram o relato como procedimento de coleta de dados é consideravelmente maior (quarenta e sete artigos), como apresentado anteriormente, em relação aos outros procedimentos: relato e observação (vinte artigos); e, somente observação (nove artigos).

A coleta de dados com base na observação e no relato esteve presente em vinte artigos e o procedimento de coleta com base na observação apenas em nove artigos. Em todos os procedimentos de coleta de dados, que foram definidos pelos artigos, o procedimento de análise de dados que apresentou maior frequência foi o estatístico inferencial (presente em cinquenta e cinco artigos).

O terceiro gráfico mostra a relação entre procedimento de coleta de dados e delineamento utilizado. A maioria dos artigos, como descrito acima, utilizou como delineamento o não experimental (46 artigos), predominando o relato como procedimento de coleta de dados (presente em 29 artigos). Posteriormente, apresentou maior frequência o delineamento experimental, que esteve presente em 21 artigos, sendo que nesse delineamento continuou predominando o relato como procedimento de coleta de dados (em 14 artigos). A frequência de artigos com delineamento quase experimental foi menor que 10% (apenas seis artigos), seguida por artigos que não descreveram o delineamento utilizado (três artigos).

Pode-se observar que em todas as formas de delineamento houve o relato juntamente com a observação como procedimento de coleta de dados; sendo que predominou somente o relato nos delineamentos não experimental e experimental. A menor frequência de procedimento de coleta de dados foi o de artigos que utilizaram somente a observação, considerando somente os artigos que definiram esse procedimento.

Além das informações descritas acima de acordo com as Figuras apresentadas, seguem alguns dados complementares.

Um destes dados refere-se à população alvo. Observa-se que em 53,75% dos estudos realizados apenas participam indivíduos clínicos, ou seja, com TDC, e que 45% dos estudos utilizam população clínica e não clínica, seja para compará-las posteriormente, seja para classificar estas populações conforme a metodologia do estudo e excluir a população não clínica em um segundo momento. Apenas 1,25% dos estudos, que caso se refere a um artigo, são realizados com o indivíduo com TDC e sua família.

A análise dos periódicos que publicaram artigos referentes ao tema nos mostra que a maioria deles publicou apenas um artigo, às vezes dois, sobre TDC. De 36 periódicos identificados, destacam-se: Comprehensive Psychiatric, publicando 13% dos artigos, The American Journal of Psychiatric, responsável por 10% do total de publicações, Behavior-research-and-therapy, com 7,50% das publicações, e Journal-of-affective-disorders e Psycossomatics, com 6,25% de artigos publicados cada. Foram identificados dois periódicos nacionais, São Paulo med. J. e Revista Brasileira de Psiquiatria, ambos com 1,25% do total de publicações, ou seja, um artigo publicado em cada periódico.

Outra análise que apresentou proporções bastante parecidas de distribuição ao longo dos itens foi a dos resultados. A maioria dos resultados teve taxas de incidência de 1,25% ou 2,50%. Os resultados mais frequentes nos artigos foram: comportamentos/características diferenciadas do paciente com TDC com uma taxa de 27,50% (quanto aos estudos de caracterização), resultados semelhantes entre tratamento psiquiátrico e não tratamento com 18,75% de incidência (referente aos estudos de intervenção), redução de sintomas representando 13,75% dos resultados apresentados e não consta com 6,25% (também referente aos estudos de intervenção). A categoria não consta foi utilizada nos casos em que ou o artigo não descrevia os resultados ou eles não eram claros o suficiente para que fossem organizados em alguma das categorias.

Até o momento, foram apresentados os resultados dos estudos empíricos, mas também foram encontrados estudos teóricos. Dos 90 artigos encontrados, somente cinco são teóricos: Neziroglu, Stevens, Mckay e Yaryura-Tobias (2001); Cunningham, Bryant, Manisali, Hunt e Feinmann (1996); Torres et al. (2005); Fontenelle (2001) e Torres (2001).

Os artigos foram publicados entre os anos de 1996 a 2005, três dos quais encontrados na base Lilacs (Torres et al., 2005; Fontenelle, 2001; Torres 2001), dois na base Francis (Neziroglu et al., 2001; Cunningham et al., 1996).

Com exceção do artigo de Neziroglu et al. (2001), que teve o procedimento estatístico inferencial para a análise dos dados, os demais artigos não descreveram tal procedimento, tampouco o procedimento de coleta de dados.

Para os autores Cunningham et al. (1996), o enfoque utilizado é na característica geral do transtorno de acordo com a descrição de casos na literatura; tal preocupação engloba sintomas, farmacologia utilizada, dificuldades no tratamento e possibilidades cirúrgicas. O autor Fontenelle (2001) descreve sintomas com base em aspectos neuropsicológicos, descrevendo não apenas o TDC, mas outros transtornos, com ênfase no TOC.

No artigo, cuja autoria é de Torres et al. (2005) observa-se apenas uma caracterização sucinta de ambos os transtornos, TDC e TOC, bem como a descrição presente nos manuais psiquiátricos, enquanto no artigo de Neziroglu et al. (2001), além de tal descrição, nota-se uma comparação estatística quanto aos sintomas e resultados.

 

Discussão

O presente artigo teve o objetivo de investigar algumas lacunas do conhecimento a respeito do TDC. A primeira questão levantada se referiu às características da produção nacional e estrangeira sobre o tema, ou seja, quais eram as bases de dados consultadas, número de autores dos artigos, os tipos de delineamentos das pesquisas (se experimentais, quase experimentais ou não experimentais), as estratégias de coleta e análise de dados, dentre outras informações das pesquisas sobre o tema.

Em relação a essa primeira questão, observou-se um aumento no número de pesquisas realizadas e de pesquisadores envolvidos com o tema, o que denotou uma maior preocupação em relação à produção de conhecimento na área. No entanto, entre os periódicos que publicaram sobre TDC, observou-se que a maioria deles publicou apenas um artigo, às vezes dois; notou-se também, uma baixa frequência de pesquisas nacionais: dentre os artigos consultados encontrou-se apenas cinco trabalhos completos nacionais sobre TDC e essas publicações iniciaram-se recentemente, apenas na última década. Esses dados vão ao encontro das discussões de Amâncio et al. (2002) e Torres et al. (2005) os quais ressaltaram que, apesar de bem descrito há mais de uma centena de anos e de causar muito sofrimento aos seus portadores, o TDC ainda recebe pouca atenção na literatura.

Outro dado interessante é referente ao número das amostras pesquisadas. Conforme descrito na sessão de resultados, cerca de 30% dos textos se referiam a pesquisas com amostras entre 101 e 200 participantes humanos. Esse dado pode indicar dois aspectos: uma maior preocupação de pesquisadores sobre essa temática demonstrada no interesse de descrever o comportamento de um número representativo da população e/ou um maior interesse por estudos epidemiológicos e de caracterização, conforme será descrito posteriormente.

Em relação ao sexo dos participantes das pesquisas, os dados mostraram que 10% dos artigos tiveram como sujeitos apenas homens, 7,5% apenas mulheres. E, a maioria apresentou homens e mulheres como participante das pesquisas, totalizando 50% dos artigos. Considerando que 32,5% das pesquisas não apresentaram esse dado. Como nota-se nessa distribuição, a proporção de artigos que avaliam os comportamentos de homens e mulheres está muito próxima, dado que corrobora a discussão de Assunção (2002), o qual sinaliza que as preocupações mórbidas com a imagem corporal eram tidas até recentemente como problemas eminentemente femininos, mas que atualmente também existem pesquisas sobre essa temática com homens.

No que se refere à idade dos participantes, observou-se que 50% dos artigos se referem a pessoas adultas, 11,25% a adolescentes, 2,5% a crianças e 31,5% dos estudos não definiram a idade da amostra. Observou-se entre esses dados uma baixa frequência de estudos com adolescentes e crianças, no entanto, várias discussões de diferentes autores sugerem a necessidade de investigações sobre a incidência e desenvolvimento do TDC nessas faixas etárias. Amâncio et al. (2002) e Battini et al. (2008) indicam que normalmente esse transtorno se inicia na adolescência e Battini et al. (2008) e Moriyama e Amaral (2007) discutem a relação entre práticas educativas aversivas de pais e desenvolvimento de TDC, aspecto que pode indicar a necessidade de estudos sobre TDC em crianças. Tais estudos seriam interessantes também para propor estratégias de prevenção do transtorno.

Em relação ao objetivo dos estudos, observou-se uma notável superioridade de pesquisas de caracterização (cerca de 37%) em detrimento dos demais tipos de pesquisa. Cabe ressaltar que muitos desses trabalhos reproduzem as descrições sobre TDC presentes nos manuais diagnósticos CID-10 e DSM - IV - TR. Entre os objetivos do estudo ressalta-se também que apenas cerca de 15% deles descrevem procedimentos de intervenção, corroborando a indicação de vários autores (Battini et al., 2008; Castle & Russel, 2006; Neziroglu & Yaryura-Tobias, 1997; Torres et al., 2005) sobre a necessidade de tais pesquisas.

Quanto ao delineamento das pesquisas, houve uma notável superioridade de métodos não experimentais em relação aos experimentais e quase experimentais. Esse dado denota mais uma vez a maior incidência de estudos descritivos sobre TDC em detrimento de pesquisas que avaliam, por meio de teste de variáveis, as possíveis causas desse transtorno ou estratégias mais efetivas de intervenção. O número reduzido de pesquisas que observam esses aspectos também é indicado por Moriyama e Amaral (2007) e Battini et al. (2008).

Em relação ao procedimento de coleta de dados, observou-se um predomínio do relato verbal, seguido por estudos que utilizaram "observação + relato" e artigos que utilizaram apenas o procedimento de observação. O uso de relato verbal em pesquisas é cercado por muitas discussões, alguns autores sinalizam que nem sempre os participantes apresentam correspondência entre comportamento verbal e não verbal Amorim (2001) e Cozby (2003) sinalizam que o uso de relato verbal como recurso para coleta de dados pode facilitar a obtenção de informações sobre as atitudes e as crenças dos participantes.

Em todos os procedimentos de coleta de dados, que foram definidos pelos artigos, o procedimento de análise de dados que apresentou maior frequência foi o estatístico inferencial, o que é coerente com o uso de grandes amostras.

A segunda questão proposta por esse estudo foi: na produção científica atual, o TDC é explicado por meio da sua topografia e/ou também pela sua funcionalidade? Com base na extensão dos dados obtidos, para responder a essa questão o presente trabalho atentou-se aos estudos teóricos, considerando que essas publicações objetivam discutir aspectos conceituais do fenômeno. Com base nos dados coletados sobre os artigos teóricos, pode-se concluir que o TDC foi exclusivamente explicado por meio de sua topografia, sendo textos informativos para médicos/clínicos, que indicam diferenças entre transtornos semelhantes, em especial o TOC; as especificidades do transtorno, o papel do cirurgião, assim como as dificuldades e possíveis tratamentos. Nenhum desses artigos foi referente à funcionalidade do transtorno, dado que vai ao encontro das discussões feitas por Moriyama e Amaral (2007) e Battini et al. (2008).

A última questão proposta por esse estudo foi o estudo das intervenções sugeridas na literatura para os casos de TDC.

Quatro dos artigos pesquisados objetivaram avaliar o efeito de medicações no tratamento do Transtorno Dismórfico Corporal (Amâncio et al., 2002; O'Sullivan, Philips, Keuthen & Wilhelm, 1999; Phillips, Grant, Siniscalchi, & Albertini, 2001; Phillips, Menard, Fay, & Pagano, 2005). Um desses artigos não especificou a medicação administrada (Phillips et al., 2001), dois avaliaram o uso de ISSR (inibidores seletivos de recaptação de serotonina) (Phillips et al., 2005; O'Sullivan et al., 1999) e um investigou a utilização da venlafaxina (Amâncio et al., 2002). Em dois artigos houve descrição de melhora dos sintomas com a administração de medicação, o artigo dobre venlafaxina e o trabalho de O'Sullivan et al., (1999) sobre o uso de ISSR, mas cabe ressaltar que os dois estudos que sinalizaram a melhora do TDC são descrições de caso único e os demais trabalhos se referem a um número maior de participantes. Outro aspecto importante é que o estudo sobre ISSR que não comprovou sua efetividade foi o trabalho com maior cuidado metodológico, por exemplo, com análise comparativa entre um grupo de pacientes que eram medicados com ISSR e outro grupo de pacientes que usavam placebo. Esses dados denotaram que, apesar dos manuais de tratamento psiquiátrico sugerirem o uso de medicação como tratamento eficaz para o TDC, especificamente os ISSR, as pesquisas identificadas nesse trabalho parecem ser insuficientes para embasarem esse uso. No estudo de Neziroglu e Yaryura-Tobias (1997) e Castle e Russel (2006) os ISSRs também são indicados como os psicofármacos mais adequados e, ao analisarem-se os estudos que embasaram essas conclusões também se observa a necessidade de pesquisas futuras, que isolem as variáveis psicoterapia e terapia medicamentosa.

Em relação ao tipo de terapia mais efetiva, foram encontrados três estudos que avaliaram a efetividade da terapia cognitivo comportamental, sendo um trabalho referente à intervenção em grupo (Wilhelm, Otto, Lohr & Deckersbach, 1999) um referente à intervenção individual (Schmidt & Harrington, 1995) e um não especificou tal modalidade (Veale et al., 1996). Também foi encontrado um estudo que avaliou a terapia comportamental (Mckay, 1999) e um trabalho que analisou o uso da técnica de exposição com prevenção de respostas (Mckay et al., 1997). No estudo de revisão de Neziroglu e Yaryura-Tobias (1997), foram mencionados sete estudos que demonstraram a efetividade da terapia cognitivo-comportamental no tratamento do TDC e no estudo de revisão de Castle e Russel (2006) também é mencionada a superioridade da efetividade da terapia cognitivo-comportamental e comportamental no tratamento do TDC, apesar de não mencionarem os estudos que embasaram essa constatação.

Um primeiro dado que merece atenção, a despeito das indicações em Manuais Psicológicos e Psiquiátricos, são poucas as pesquisas que mostram a efetividade da terapia cognitivo-comportamental para o tratamento do TDC. Apesar de aparecem em maior frequência no presente levantamento de literatura, o número de artigos publicados ainda é pequeno, apenas três publicações.

Cabe ressaltar também a necessidade das pesquisas futuras incluírem alguns dados sobre cuidados metodológicos não descritos nos artigos pesquisados. Por exemplo, notou-se que os três artigos cognitivo-comportamentais descrevem intervenções sem fase de seguimento e apenas um dos artigos utilizou grupo controle. A ausência da descrição de cuidados metodológicos dos estudos de intervenção também foi encontrada no trabalhos de Neziroglu e Yaryura-Tobias (1997) e Castle e Russel (2006).

Os dados também denotaram a necessidade de pesquisas sobre a eficácia do tratamento de TDC por outras abordagens psicológicas, considerando que as pesquisas estão centradas em publicações sobre terapia cognitivo-comportamental e comportamental.

Além das relações mencionadas acima, cabem outras comparações entre os trabalhos de revisão de Neziroglu e Yaryura-Tobias (1997) e Castle e Russel (2006). No artigo de Neziroglu e Yaryura-Tobias (1997), há uma discussão sobre as semelhanças entre TDC e TOC, sobre os possíveis aspectos psicóticos do TDC e reflexões sobre aspectos cognitivos desse transtorno.

Em relação às semelhanças entre TDC e TOC, pode-se verificar que: a) tanto o trabalho de Neziroglu e Yaryura-Tobias (1997), quanto os artigos encontrados no presente trabalho indicam que, apesar das semelhanças entre os transtornos, poucos estudos compararam pacientes com TOC e TDC; b) existe uma concordância quanto aos aspectos psicóticos, sendo que não existe a necessidade em se dividir o TDC em duas categorias (TDC com e sem aspectos psicóticos), pois os comportamentos de inflexibilidade ao avaliar os sintomas devem ser analisados dentro de um contínuo e, no que se refere aos aspectos cognitivos; c) assim como Castle e Russel (2006) sinalizaram os poucos estudos sobre esta temática, a presente pesquisa sinalizou poucos trabalhos que investigaram esses aspectos, como o trabalho de Battini et al. (2008).

Cabe ressaltar que um avanço proporcionado por esse estudo em comparação aos estudos de revisão mencionados foi a sistematização das publicações nacionais referentes ao tema. Esse cuidado deu-se especificamente por meio da descrição dos procedimentos de coleta e análise utilizados, como também outras informações importantes, como as bases de dados consultadas. A partir desse cuidado metodológico, novas pesquisas poderão ser realizadas e constatações como a escassez de pesquisas sobre intervenções junto a clientes com TDC ficam mais evidentes e devidamente justificadas.

A partir das discussões apresentadas acima ressalta-se a necessidade de pesquisas futuras sobre o tema, entre elas: estratégias de avaliação e intervenção, incluindo nessa última categoria pesquisas sobre eficácia de medicações e de intervenções psicológicas em suas diferentes abordagens.

 

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Endereço para correspondência:
Alessandra Salina Brandão
Rua Paraná 3-39, Jardim Coralina
CEP: 17030-023, Bauru, São Paulo, Brasil
E-mail: alessandrasalina@gmail.com

Enviado em 22 de Setembro de 2010
Texto reformulado em 30 de Maio de 2011
Aceite em 8 de Junho de 2011
Publicado em 31 de Dezembro de 2011

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