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Cadernos de psicanálise (Rio de Janeiro)

versão On-line ISSN 1413-6295

Cad. psicanal. vol.38 no.34 Rio de Jeneiro jun. 2016

 

ARTIGOS

 

«Vous les femmes...» A propósito da sexualidade feminina

 

«Vous les femmes...» Around female sexuality

 

 

Urias Arantes*

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este ensaio tem como objeto as discussões recentes entre alguns psicanalistas franceses a propósito do «declínio do pai» e das consequências clínicas, sociais e mesmo culturais dessa transformação no processo de subjetivação e de transmissão. Esse declínio seria acompanhado pelo «retorno do matriarcado.» Esses psicanalistas parecem esquecer a importância dos feminismos nas transformações sociais desde os meados do seculo XIX e, mais recentemente, a partir dos anos 60. Daí, a necessidade de retornar à compreensão freudiana da sexualidade feminina e ao que Lacan propôs no inicio dos anos 60: de um ideal de maternidade ao reconhecimento do desejo feminino.

Palavras-chave: Sexualidade feminina, Declínio do pai, Retorno ao matriarcado, Feminismos.


ABSTRACT

This paper focuses on the recent discussions among certain French psychoanalysts about the «decline of the father», and the clinical, social, and even cultural consequences of this transformation in the process of subjectivation and transmission. This decline might be followed by a «return to matriarchy». Those psychoanalysts seem to forget the importance of feminisms and their impact on social transformations since the middle of the 19th century, and more recently, those starting in the 1960s. Hence the necessity to return to Freud's understanding of female sexuality, and to Lacan's ideas at the beginning of the 1960s: From an ideal of maternity to the recognition of female desire.

Keywords: Female sexuality, Decline of the father, Return to matriarchy, Feminisms.


 

 

Of course, they had male patients, but women were the focus (...). So there is a real sense in which psychoanalysis was a science -- or an artifact -- born of the love between men. It began that is to say, as a conversation between men about women's bodies (and what will change psychoanalysis is the arrival of women psychoanalysts interested in children as well as sexuality (PHILLIPS, A. Becoming Freud. The making of a psychoanalyst. Yale Un. Press, 2014, p. 108).
En thèse générale: Les projets sociaux et changements de période s'opèrent en raison des progrès des femmes vers la liberté; et les décadences d'ordre social s'opèrent en raison du décroissement de la liberté des femmes (Fourier, Ch. Théorie des quatre mouvements et des destinées générales, 1808, Paris: J.-J. Pauvert, 1967).
Vous les femmes, vous mon drame Vous si douces, la source de nos larmes Pauvres diables, que nous sommes vulnérables, misérables, nous les hommes (IGLESIAS, Julio, Pauvres diables, 1979).

 

Posição do problema

Os textos de Charles Melman e de J.-P. Lebrun - de L'homme sans gravité (2002) até Les couleurs de l'inceste (2013) - chamam a atenção dos psicanalistas sobre os efeitos clínicos, sociais, políticos e mesmo culturais das transformações contemporâneas da configuração da familia patriarcal tradicional. No desaparecimento progressivo e irreversível da autoridade paternal - do Nom-du-père como fundamento de toda autoridade e como eixo da transmissão e do acesso à linguagem - no retorno ou na expansão (de natureza compensatória?) do maternal - lugar da confusão e do gozo imediato e gratuito - os dois analistas detectam a tendência ao desaparecimento, no sujeito «postmoderno,» das nevroses e psicoses em proveito das perversões e dos estados borderline. Em consequência, eles afirmam a necessidade de procurar os instrumentos de un novo enfoque clínico, melhor adaptado às manifestações de uma « nova economia psíquica

Além disso, os fundamentos da vida em comum são ameaçados pela generalização de um consumo sem limite, que não deixa mais nenhum lugar para o objeto do desejo, mais nenhum lugar para o vazio, para a palavra ou o juízo fundado: tudo isso estimulado pelo liberalisme econômico radical e pelo egalitarismo que apaga as diferenças e destrói as hierarquias. Politicamente, na ausência de uma autoridade, o saber técnico, anônimo e cientificamente objetivo substituti as escolhas, os conflitos e os efeitos implicados, necessariamente, em toda escolha.

É possível tornar o quadro proposto da contemporaneidade ainda mais sombrio. Por exemplo: «Penso que a democracia, com seu ideal de livre escolha, não conduz obrigatoriamente, do ponto de vista psíquico, ao estado mais satisfatório, mais feliz. A aspiração ao rebanho de nossos contemporâneos est aí para demonstrar (...) (MELMAN, 2002, p. 217s). Ou então, «(...) porque não se torna legivel a necessidade irredutível de produzir um espaço, o 'buraco', só é possivel avançar progressivamente, mas sem falta, para o apagamento de qualquer limite, portanto para a hubris e, assim, para a Coisa, ou seja, para o risco do inumano» (LEBRUN, 2013, p. 316).

Os psicanalistas não devem mostrar-se insensíveis nem desencorajados diante das novas tarefas. O que pode ajudá-los no trabalho clínico e na compreensão dos efeitos sociais, culturais e políticos é a consideração dos novos modos de transmissão, isto é as novas práticas educativas nas novas configurações, onde a criança se humaniza submetendo-se às leis da linguagem. Essas novas práticas estão sendo justificadas e validadas por modificações no estatuto jurídico, social e político da família. Ora, o acesso à linguagem e a submissão da pequeno humano à distancia entre o Significante e o Significado que é a própria possibilidade da castração, sem a qual a criança não sera nunca adulta - é uma função paternal, mesmo se ela deve ser introduzida e sustentada pela mãe. Os psicanalistas devem, então, estar atentos aos efeitos produzidos pelo apagamento da função paternal, pela destituição do Nom-du-père que transforma o campo simbólico em ruínas, os quais são alimentados pelo ideal da igualdade suposta entre o pai e a mãe, pelo ideal de achatamento das hierarquias tradicionais do patriarcado, tudo isso implicando o esquecimento progressivo da palavra fundadora e do lugar (paterno) de exceção.

Não se dirá de Melman ou de Lebrun que se trata de misoginia, de falocracia ou de antidemocratismo reacionários, quando explicam como o patriarcado assegurava o processo de humanização e do laço social. Eles não parecem nostálgicos do regime patriarcal na sua versão familiar ou coletiva e nem propõem um impossível retorno ao passado. Houve e há progresso, afirmam. O que os preocupa são os efeitos desses progressos sobre a transmissão de nossa humanidade e o pouco de atenção dada pelos psicanalistas às novas interrogações. Tudo se passa como se a procura de uma igualdade sem limites - o que Lebrun chama de «democratismo» - estivesse produzindo o apagamento da alteridade, a expansão da homogeneidade e, assim, a corrupção de uma das invariantes da condição humana.

M. Zafiropoulos afirma que a tese do declínio da familia tradicional e de seu chefe, sustentada, atualmente, por alguns lacanianos, encontra-se já no próprio Lacan, em Les complexes familiaux, de 1938. Lacan a encontrou em Durkheim e na sua lei da contração familiar: a grande família se reduz com o tempo para chegar «à forma conjugal portadora de anomia» (ZAFIROPOULOS, 2006, p. 296)1. O encontro de Lacan com Lévi-Strauss permite a elaboração da noção de Nom-du-père em 1953, no Rapport de Rome: o pai se inscreve no registro simbólico, o que implica que não se trata de um objeto real: «É bem o que demonstra que a atribuição da procriação ao pai só pode ser o efeito de um puro significante, de um reconhecimento não do pai real, mas do que a religião nos ensinou a invocar como o Nom-du-père» (LACAN, 1966, p. 556). Ora, argumenta Zafiropoulos, se seguimos Lacan, é preciso estar atento, não ao apagamento do Nom-du-père, mas à sua pluralização, uma possibilidade que não depende do fato histórico «mas de uma possibilidade originária de um léxico etnologicamente apoiado na sincronia como na diacronia e que se funda sobre uma suplência à incompletude da função semântica que permite ao pensamento simbólico de se exercer justamente porque ele não é completo» (ZAFIROPOULOS, 2006, p. 289). Em outros termos, aqueles que falam do declínio da neurose, em razão do declínio do pai, tomam a multiplicação do Nom-du-père como um declínio da função, confundindo assim o simbólico e o real, a cultura e natureza (e acrescento: a democracia com as figuras que ela pode assumir). Eles parecem saudosos da «unidade divina do sintoma» que pode aparecer como encarnação do fundamento de uma configuração familiar, social, política e cultural - e ainda é preciso se perguntar se não era uma ilusão, um simples efeito de superfície. Em outros termos ainda: se a figura do Deus-pai se apaga e o mundo se desencanta, isso não implica de modo algum que a dimensão de uma transcendência, de um além-do-homem ou de um aquém-do-homem desapareça ao mesmo tempo.

No seu percurso de compreensão da história do pensamento lacaniano, após ter estudado «o momento durkheimiano» (1938-1950), Zafiropoulos chega ao «retorno a Freud» de Lacan, o qual passa pela questão do pai e por Lévi-Strauss. Nesse movimento, visando lançar as bases de uma antropolgia psicanalítica, Zafiropoulos encontra a questão feminina elaborada por Lacan, a partir de 1951, com a releitura do caso Dora, releitura incomprensível «se não se leva em conta o que chamamos de transferência de Lacan a Levi-Strauss» (ZAFIROPOULOS, 2010, p. 12). À luz dos textos estimulantes de Zafiropoulos, é difícil não perceber uma outra dificuldade, na verdade duas dificuldades nas elaborações de Melman, Lebrun e outros, em relação provável com uma apreensão problemática do Nom-du-père e das vantagens de um enfoque estrutural. Trata-se - primeira dificuldade - da ausência da questão feminina que passa também pelo reconhecimento do papel e da importância das mulheres e dos feminismos nas transformações contemporâneas da familia e do laço social, assim como - segunda dificuldade - das relações entre tais transformações e a democracia.

Melman e Lebrun falam, frequentemente, da função materna, de matriarcado, de maternal e do incestuoso, mas sempre do ponto de vista da função paterna, do patriarcado, do paternal ou da autoridade, como se os primeiros só fossem o negativo, talvez mesmo a negação, dos segundos. Quer dizer, como se justamente a alteridade do feminino não devesse ser considerada como Outro absoluto. E quando é questão da análise das transformações sociais, os feminismos ou o lugar das mulheres não parecem merecer uma atenção particular. No primeiro caso, como esquecer os protestos das psicanalistas mulheres (e daqueles que as sustentaram) que, desde os meados dos anos 20 do último século, tentaram jogar novas luzes sobre a sexualidade feminina, diferentes da concepção fundada sobe a inveja do pênis e a ignorância da vagina? No segundo caso, tudo parece acontecer como se os feminismos apenas fossem um efeito secundário das transformações na estrutura da familia patriarcal, ou então como se os ideais feministas - a começar pelo ideal de igualdade de direitos entre os sexos - se reduzisse à destruição da dominação masculina. E é aqui que a questão da democracia, de sua natureza e de seus efeitos - sem esquecer suas relações íntimas com a psicanalise - é escamoteada, colocada no melhor dos casos como um elemento no processo de mutação das sociedades modernas ocidentais (ver, por exemplo, LEBRUN, 1997, p. 105) que dá lugar à possibilidade do totalitarismo, ou vagamente confundido com neoliberalismo, totalitarismo e neoliberalismo sob a empresa maléfica do feminino.2

Tais questões merecem ser retomadas em detalhe e em profondidade. Pode-se começar pela teoria da sexualidade feminina em Freud, sem esquecer a elaboração lacaniana, assim como o debate aberto em particular pelas psicanalistas mulheres nos anos 20 e mais ou menos resumido por E. Jones em 1935. A partir daí, o debate parece ter perdido seu vigor até os anos 60, com a «segunda vaga» do feminismo europeu e americano. Abre-se, então, un novo capítulo no encontro entre os feminismos e a psicanálise, atravessado por conflitos e convergências - um capítulo que não parece importante aos olhos dos psicanalistas atuais, como atesta o embaraço no qual se encontram nos debates contemporâneos sobre as novas figuras das relações entre os sexos, da família e da transmissão. Duas transversais completam a ambição desse trabalho. A primeira tem a ver com o «declínio» da psicanálise, enquanto prática e enquanto teoria, um declínio em relação, não somente o pouco de atenção que ela recebe no debate cultural, mas também ao fato que teoria e prática psicanalíticas parecem ter perdido sua força.3 A segunda transversal diz respeito às transformações da democracia moderna.

O projeto pode parecer ambicioso, sua elaboração o dirá. Por enquanto, trata-se de avançar os primeiros elementos para afinar a interrogação.

 

Freud e a sexualidade feminina

Numa nota introduzida na edição de 1924 dos Trois essais sur la théorie sexuelle, Freud acrescenta (FREUD, 1905/1987, p. 130s)4 que reconheceu, em 1923, a existência de uma terceira fase no desenvolvimento sexual da criança, após a fase oral e a fase anal-sádica. Essa nova fase chama-se fálica e se caracteriza como genital pela convergência de moções sexuais sobre o orgão genital, mas não pertence à maturidade sexual porque a fase fálica conhece apenas o orgão sexual masculino. A fase fálica é então a fase do primado do falo e de seu correlato, para a menina, a inveja do pênis. O texto de 1923, indicado por Freud na nota, é Sur l'organisation génitale infantile, ele inaugura um primeiro conjunto de textos (1923/1925) sobre a sexualidade feminina, questão que será retomada alguns anos mais tarde (1931/1932). O debate sobre a fase fálica é conduzido, em grande parte, pelas psicanalistas mulheres e por E. Jones. Lacan o retoma no seu seminário e textos de 1957/1958 no quadro do «retorno a Freud

Percorrer os caminhos, os desvios e os horizontes do debate ao redor da fase fálica entre os contemporâneos de Freud será o objeto de um próximo estudo. Antes, gostaria de abordar algumas das articulações operadas por Freud, assim como as dificuldades que elas suscitam antes de chegar aos primeiros textos lacanianos sobre a sexualidade feminina. Isso deverá permitir uma melhor formulação das questões levantadas pelos psicanalistas de hoje, quando consideram a família contemporânea e seus modos de transmissão como resultando do declínio do pai e do retorno do matriarcado, da prevalência do maternal e do incestuoso. O futuro da psicanálise está em jogo, caso ela não leve em conta tais mudanças que comprometem nossa humana destinação.

Os editores da Standard Edition assinalam que Some psychical consequences of the anatomical distinction between the sexes (1925) é « a first re-assessment of Freud's view of psychological development of women » (SE, 19, p. 243). Trata-se menos de novas descobertas - praticamente todos os elementos estão já presentes no pensamento de Freud - mas de um esforço no sentido de articulá-los mais claramente. O texto, lido por Anna Freud durante o Congresso de Hambourg em setembro de 1925, é assim «the synthesis of these various pieces of knowledge.» A célebre metáfora de Freud sobre «o continente negro» da sexualidade feminina (FREUD, 1926, p. 75) significa menos o caráter enigmático do objeto e mais o pouco de progresso obtido pela psicanálise no conhecimento da vida sexual da menina e da mulher adulta. No texto de 1925, o desenvolvimento da sexualidade feminina está longe de ser descrito (como tampouco o do menino; no entanto, melhor explorado, segundo Freud), mas os avanços são significativos. O que tomamos, frequentemente, como confissão de ignorância da parte de Freud a propósito das mulheres - a começar pelo que ele teria escrito ou dito, segundo Jones, a Marie Bonaparte: «a grande questão permanece sem resposta à qual eu mesmo não pude responder, apesar de meus trinta anos de estudo da alma feminina, é a seguinte: o que quer a mulher?» (JONES, 1961, p. 445) e que não é datado - não permite a suposição de uma ausência de avanços considerados importantes por Freud. A prudência freudiana - e que falta, frequentemente, aos analistas - conduz a afirmar que o que se ignora é maior, talvez mesmo mais importante, do que o que se sabe. Já nos Trois essais, Freud assinalava a dificuldade do estudo da vida erótica das mulheres em razão «de um lado, do empobrecimento que lhe impõe a civilização, de outro lado por causa da discreção e da insinceridade convencional das mulheres» (FREUD, 1905/1987, p. 59). E em 1908, a propósito das Théories sexuelles infantiles, Freud afirma que as observações realizadas concernem sobretudo os meninos em razão de «circunstâncias externas e internas desfavoráveis » (FREUD, 1908/1969, p. 16) que impedem ou reduzem as observações de meninas.

Se comparamos os textos de 1924 (La disparition du complexe d'œdipe) e de 1925 (Quelques conséquences psychiques de la différence anatomique entre les sexes) não encontramos teses fundamentalmente diferentes relativas aos elementos em jogo na pré-história do édipo e no seu desaparecimento. A ênfase é dada à articulação desses elementos no jogo libidinal e na pré-historia edipiana, o que, como esperado, aprofunda a comprensão. Talvez seja também isso que leva Freud a afirmar, em 1924, que o conhecimento do édipo da menina é ainda obscuro e lacunar, e, no ano seguinte, que a pré-historia do édipo da menina é melhor conhecida que a do menino. Não é difícil perceber que, em 1925, Freud coloca em primeiro plano a inveja do pênis no édipo da menina e entrevê a importância crucial da relação à mãe, importância que será ainda mais sublinhada nos textos de 1931/1932.

A prevalência do masculino não é uma novidade no pensamento de Freud. Já na Lettre 75 a Fliess, Freud indica uma diferença entre o menino e a menina no que diz respeito à «repressão normal» (quer dizer, a desafectação das zonas erógenas, boca e ânus). Na puberdade, «um desgosto da sexualidade sem caráter neurótico se apropria das moças, enquanto que a libido se apropria dos rapazes» (FREUD, 1950/1956, carta de 14.01.1897), desgosto associado ao abandono da região do clítoris, zona genital masculina. Permanece aberta a questão da significação da prevalência da sexualidade masculina até a puberdade da menina. Os Trois Essais insistem sobre a ideia que só a puberdade institue claramente uma separação entre os caráteres masculino e feminino. Mesmo se há diferenças no nivel das predisposições - as inibições são mais precoces na menina, assim como a preferência pelas manifestações passivas das pulsões sexuais - «a atividade autoerótica das zonas erógenas é a mesma para os dois sexos» (FREUD, 1905/1987, p. 161). Donde se segue a tese freudiana a propósito do caráter masculino da sexualidade infantil (até a adolescência), assim como sobre a natureza da libido: «de maneira regular e conforme às leis, de natureza masculina» (FREUD, 1905/1987, p. 161). E pouco importa o objeto. No entanto, uma nota acrescentada à edição de 1915 dos Trois essais esclarece os três sentidos das noções de masculino e feminino: atividade/passividade, sentido biológico e sentido sociológico. Ao que Freud acrescenta que só o primeiro sentido é importante para a psicanálise. O clítoris é do lado do masculino no que diz respeito à atividade autoerótica.

Quanto à inveja do pênis, Freud a reconhece em 1908, nas Théories sexuelles infantiles, em relação à atividade autoerótica da menina, pois ela se interessa, como o menino, ao pênis e se sente prejudicada na comparação: «eu gostaria de ser um menino» (FREUD, 1908/1969, p. 21). Ou como dizia uma outra menina observando um grupo de meninos simulando uma briga no páteo da escola: «os meninos são mais divertidos !» Em 1916, em Quelques types de caractère dégagés par la psychanalyse, a propósito do célebre monólogo inicial de Richard III - «Now is the winter of our discontent ...» - Freud explica a empatia com o terrível personagem em razão do fato que «reclamamos todos compensações por mortificações precoces de nosso narcisismo, de nosso amor próprio » (FREUD, 1919/1933), p. 111). E ele lembra que é também a base da pretensão das mulheres a serem dispensadas de muitas das exigências da vida: «as mulheres se consideram como tendo sofrido um grande prejuízo na infância sem que sejam culpadas, com tendo sido parcialmente mutiladas e desavantajadas». É também a razão pela qual detestam as mães que «as fizeram nascer mulheres e não homens» (FREUD, 1919/1933, p. 111).

O mesmo motivo se encontra em Tabou de la virginité (1917/1924/1969) para explicar o costume primitivo que consiste em confiar a defloração a um substituto do pai, evitando, dessa forma, ao marido as moções que o primeiro coito desperta na mulher. Freud sublinha a fase em que as meninas invejam o irmão «que possui um signo de masculinidade cuja falta nela (ou melhor, sua redução) faz com que se sintam lesadas ou desprezadas» (FREUD, 1917/1924/1969, p. 76). E em Pour introduire le narcissisme (1914/1969), Freud situa entre as perturbações às quais se expõe o narcisismo originário da criança o complexo de castração, quer dizer a angustia pela perda do pênis para o menino, a inveja do pênis para a menina. Em 1917, em Sur les transpositions de pulsions plus particulièrement dans l'érotisme anal, Freud sustenta que, no fundo de uma neurose feminina, há a inveja do pênis, uma tese que não mudará mais. Quando não há neurose, continua Freud, o desejo infantil de possuir um pênis se transforma então em desejo de homem. Em outros termos, a mulher aceita o homem como «apêndice do pênis» (FREUD, 1917/1969, p. 108). Durante esse processo, uma parte do complexo de masculinidade da menina passa do lado do feminidade e um elemento erótico pré-genital é utilizado na fase genital: a mulher uma criança. O desejo de maternidade é assim um composto de uma moção erótica anal (o excremento é o primeiro presente) e de uma moção genital.

A Organisation génitale infantile foi escrito para integrar a edição dos Trois essais, de 1924, o que não ocorreu de fato. Freud acrescentou a essa edição apenas uma nota relativamente rápida. No texto, Freud retoma a afirmação da ausência de genitalidade, na primeira infância e reafirma a existência de um só orgão genital para os dois sexos no momento da primeira organização genital: pênis para o menino, clítoris para a filha. Ora, essa primeira organização genital é regida não por um primado do genital, mas por um «primado do falo,» uma distinção que terá um grande futuro em Lacan. O falo, explica Freud, não é o pênis ou o clítoris e se manifesta na criança como necessidade de investigação, como «curiosidade sexual» que conduz a criança a comparar seu orgão a outros, guiado vagamente pela ideia que «esse membro poderia e deveria ser maior» (FREUD, 1923/1969, p. 115). O processo é descrito para o menino e Freud afirma ignorar o que corresponderia para a menina. No entanto, a tese do primado do falo para os dois sexos terá um efeito significativo quando for articulada à inveja do pênis.

O primado do falo é consequênca da afirmação freudiana do caráter masculino da libido, mesmo quando ela se dá um objetivo passivo. Freud avança assim a tese dita do monismo sexual5. Enquanto energia, a libido é sempre ativa, o que significa igualmente que a passividade, os fins passivos da libido, se inscrevem num desenvolvimento e não são originários. A distinção aparece com a escolha de objeto, isto é, na fase sádica-anal. Na fase seguinte, fase fálica ou da organização genital infantil, há o masculino, mas não o feminino e a distinção se faz em termos de presença ou ausência (melhor, redução) do orgão genital masculino: «o masculino reune o sujeito, a atividade e a posse do pênis, o feminino perpetua o objeto e a passividade. A vagina ganha agora valor como casa do pênis, recolhendo a herança do corpo materno» (FREUD, 1923/1969, p. 116).

No ano seguinte, em La disparition du complexe d'Œdipe (1924), Freud retira as primeiras consequências dos avanços sobre o primado do falo e seu correlato na menina, a inveja do pênis. Nesse texto importante, Freud se concentra sobre a fase fálica do desenvolvimento sexual que coincide com a instalação e desenvolvimento do complexo de édipo. Essa fase, regida pelo falo, pela curiosidade sexual, terceira e última encruzilhada do desenvolvineto sexual infantil, implica que o orgão genital masculino exerce o papel de guia, enquanto presente ou ausente (reduzido), assim como a ignorância da vagina, antes do estado de latência: os dois fatores que marcarão, em profundidade, a organização genital adulta. Ora, o despertar da genitalidade para o menino e para a menina é associado à percepção da diferença anatômica. Sob o primado do falo, a resposta de cada um à descoberta é diferente: para o menino, a ameaça de castração, para a menina, uma indepassável inveja do pênis.

O menino desenvolve uma atitude edipiana em relação aos pais com duas possibilidades: passiva - ele toma o lugar da mãe para ser amado pelo pai; ativa - ele toma o lugar do pai para amar a mãe. Nos dois casos há perigo para seu pênis e abre-se, dessa forma, o conflito entre o investimento libidinal e o interesse narcisista. Este acaba se impondo e dá lugar a uma identificação com o pai, a uma dessexualização e sublimação de seus investimentos libidinais. O resultado é que a organização genital é protegida e salvaguardada ao preço da supressão de seu funcionamento (entrada no estado de latência). E Freud se interroga sobre a natureza desse processo, reconhecendo que há mais do que uma repressão para o menino, que há destruição e supressão do édipo, pelo menos idealmente. De qualquer modo, é por aí que passa a fronteira entre o normal (o ideal) e o patológico. Pois se houvesse apenas repressão, haveria retorno do reprimido com seus efeitos patogênicos. Sublinhemos, ainda, que a identificação à autoridade dos pais ou do pai «forma o núcleo do superego» (FREUD, 1924/1969, p. 120), marcado pelo rigor do pai, que proibe o incesto e protege assim o ego, oferecendo os caminhos posteriores da repressão e da sublimação.

A menina não conhece a angústia de castração e a percepção visual da diferença anatômica desperta nela a inveja do pênis, acompanhada pelo sentimento de ter sofrido um prejuízo e ser inferior. É assim que a menina entra no complexo de masculinidade, com dois efeitos fundamentais: o primeiro sobre a organização genital infantil, o segundo sobre o superego. Se a ameça de castração faz sair o menino do édipo, a menina entra no édipo pela inveja do pênis. Ela despreza a mãe e quer receber uma criança do pai a título de compensação. Esse desejo será reprimido, quer dizer que ele permanecerá no inconsciente e preparará o papel sexual da mulher: receber uma criança de um homem substituto do pai. Idealmente, a mulher não abandona jamais, de verdade, o édipo e, no melhor dos casos, encontra uma (in)satisfação sexual na maternidade. Lembrando a frase de Napoleão para quem a anatomia é destino, Freud critica a busca de igualdade das feministas. A diferença anatômica implicando a inveja do pênis faz com que as mulheres, no melhor dos casos, não conseguem dissolver seu édipo, elas o reprimem -com os efeitos patogênicos previsíveis do retorno do reprimido - chegam a aceitar um substituto do pai e a receber dele o pênis-criança invejado, conservando a identificação à mãe (após tê-la detestado). Os efeitos se observam igualmente na formação de um superego menos rigoroso, marcado por uma menor capacidade de repressão e de sublimação.

Insistamos sobre a observação de Freud quanto ao pouco de material disponível a respeito do édipo da menina, donde se segue que «nossa inteligência dos processos de desenvolvimento para a menina é pouco satisfatória, cheia de sombras e lacunas» (FREUD, 1924/1969, p. 122). Ora, no ano seguinte, Freud redige um texto decisivo de vários pontos de vista: Quelques conséquences psychiques de la différence anatomique entre les sexes (1925/1969). Se não há nele elementos novos, a articulação é aprofundada e reforçada ao redor da diferença sexual e da inveja do pênis. O onanismo que se manifesta na fase fálica da menina, sob o primado do falo, não está no início relacionado ao pai, mas à inveja do pênis. Em outros termos, o desejo de ter uma criança do pai não é uma realidade primeira e inanalisável. Quando a menina chega a esse ponto - portanto, quando ela entra no édipo - ela já tem atrás dela uma longa história em relação com a descoberta da diferença anatômica e as consequências psiquicas dessa descoberta. Diferentemente do menino, o édipo da menina é uma «formação de algum modo secundária» (FREUD, 1625/1969, p. 126). A inveja do pênis, ao contrário, é originária.

Como acontece com o menino, a menina recusa, inicialmente, a percepção da ausência de pênis; já o menino imagina que pênis da menina ainda vai crescer e só mais tarde associa a ausência de pênis à ameaça de castração, o que o conduz a renunciar à mãe, se identificar ao pai e sair, assim, do Édipo. A menina, desde o início, sente-se dividida entre a denegação - ela tem um pênis! - e a esperança de obtê-lo mais tarde. Nos dois casos, a inveja do pênis persiste e conduz ao complexo de masculinidade. Se este acaba por ceder, seus efeitos não desaparecem jamais: sentimento de inferioridade ligado à ferida narcisista, desprezo de seu sexo (partilhado pelo menino), desenvolvimento dos ciúmes e de uma relação terna com a mãe (com ou sem sobrecompensação, pois é culpa da mãe se a filha não tem um pênis). Mas, a consequência mais importante da inveja do pênis é a revolta da menina contra o onanismo, atividade masculina, revolta que se confirmará na puberdade para reprimir uma boa parte da sexualidade masculina e deixar o lugar para a feminidade (a qual aparece assim como uma sexualidade troncada).

É apenas com o enigma da inveja do pênis (que acompanha a ignorância da vagina da parte do menino e da menina) e a revolta contra o onanismo que a menina entra no édipo. A inveja do pênis é um enigma porque não tem um desenvolvimento prévio, ela não é derivada: «De início ela julgou e decidiu. Ela viu aquilo, sabe que ela não tem e quer tê-lo» (FREUD, 1925/1969, p. 127). A ameaça de castração para o menino tem uma história. Quando a menina «renuncia» à inveja do pênis e a substituti pelo desejo de criança, ela muda de sexo e de objeto de amor, passando da mãe ao pai. Essa relação acabará fracassando igualmente, para ser substituida pelo desejo de um substituto do pai e identificação com a mãe: agora ela quer uma criança que compensará a ausência de pênis. A inveja do pênis não é nunca ultrapassada de verdade, mas dá lugar a um jogo de substituições compensatórias, as quais implicam mudança de sexo e de objeto de amor.

É o caso ideal: a menina acede à maternidade. No caso em que o complexo de masculinidade não seja abandonado e que ele dirija os destinos da sexualidade, a menina tenderá a se identificar ao pai (ou ao irmão), escolhendo mulheres como objetos de amor. E, de qualquer modo, as mulheres não parecem poder escapar a um certo grau de frigidez.

A diferença do Édipo do menino salta aos olhos. Nele, o édipo desaparece com a ameaça de castração, enquanto que a menina entra no édipo graças à ação do complexo de castração ou de masculinidade acionado pela inveja do pênis. Do ponto de vista anatômico e da situação psíquica correlata, a diferença é entre uma ameaça de castração e uma castração efetiva. O efeito mais importante dessa diferença se verifica na dissolução do édipo: com o menino, idealmente, não apenas ele é reprimido, mas desaparece. Os investimentos libidinais são abandonados e em parte sublimados. Os objetos são introjetados e formam o núcleo do superego. «Nos casos normais - digamos melhor - nos casos ideais não subsiste então nada do complexo, mesmo no inconsciente, o superego tornou-se o herdeiro do complexo» (FREUD, 1925/1969, p. 131). Quanto à menina, no melhor dos casos, o édipo é reprimido, permanece no inconsciente e produz efeitos. Se ele não desaparece é porque, para a menina, a castração já ocorreu, é um fato natural, assim como a revolta exprimida pela inveja do pênis.

Não parece exagerado dizer que o texto de 1925 é um longo comentário à frase de Napoleão: l'anatomia é o destino. Não se trata de um determinismo cego porque não há continuidade entre o orgânico e o psíquico, mas não há tampouco liberdade de indeterminação, posto que a diferença anatômica é incontornável, com suas questões e possibilidades de resposta, face às quais cada indivíduo, homem ou mulher, desenvolve sua história singular.

É necessário retornar num outro ensaio sobre os efeitos sociais e culturais tais que Freud os formula a partir da diferença entre o édipo da menina e o do menino. Mas já sabemos que o pouco de aptidão das mulheres para a cultura, segundo Freud, está ligado à menor capacidade delas para a sublimação, pois permanecem implicadas no édipo. Sublinhemos, no entanto, que, em consequência da tese da bissexualidade, «os dois sexos são compostos ao mesmo tempo de traços masculinos e de traços femininos» (FREUD, 1925/1969, p. 129). Em outras palavras, não há tipo masculino ou feminino puros, ideais ou normais. Tais tipos são construções teóricas, incertas e dependentes da prova clínica. Mas, Freud insiste que o ideal da feminidade está na maternidade e que a mulher defende os interesses sexuais e familiares da humanidade. Como na Bíblia, seu ser é derivado do ser do homem: ela não nasce mulher, mas se torna mulher a partir de matéria masculina. Contra seu desejo mais profundo.

 

N.

Eis aqui uma história afetiva bastante próxima, de certos pontos de vista, da história da jovem homossexual analisada por Freud (1920/1973). Ela ilustra as possibilidades de desenvolvimento do édipo e de seus efeitos sobre as relações entre os sexos, quando as vias normais ou ideais não se concretizam, o que é o caso mais frequente. A normalidade, aos olhos da psicanálise, não é a regra, mas, caso seja mais do que uma simples hipótese, a exceção.

Lembremos que a jovem homossexual experimenta uma forte rivalidade com a mãe pelo amor do pai, quando a mãe engravida. Para se vingar de seu pai, a jovem faz, ostensivamente, a corte a uma bela mulher, mais velha e levando uma vida libertina. Ela reconhece o caráter leviano de sua amada, mas a venera e se mostra em público com ela. Um dia, o pai as encontra na rua e as olha furiosamente. A mulher aprende nessa ocasião que se trata do pai da jovem e exige que esta a deixe. A jovem faz uma tentiva de suicídio se jogando de uma ponte urbana. Freud compreende que a decepção provocada pelo pai leva a jovem a se identificar com a mãe, substituindo-a pela mulher leviana, escolhendo assim um objeto de amor feminino face ao qual ela toma uma atitude masculina de amor cortesão. No mesmo movimento, a mãe não é mais a rival, mas o objeto de amor a partir do lugar do pai, lugar que ela passou a ocupar. Quando o olhar furioso do pai desmonta essa montagem libidinal, a jovem se vinga, ao mesmo tempo que realiza seu desejo de ter um filho do pai (niederkommen=cair=dar a luz).

A história de N. começa nos anos que se seguem à puberdade. Durante uma consulta de rotina, seu médico, bem mais idoso do que ela e viuvo, a beija e a acaricia. «Fiquei como uma pedra » Para ele não era mais do que uma aventura sem futuro, mas N. se impõe, o obriga a aceitar em sua casa sob a ameça de denunciá-lo à polícia por abuso sexual de menor. Ela abandona a casa dos pais. Depois de muita insistência e de muitos conflitos, ela engravida e o homem se sente obrigado a lhe propor casamento, o que ela aceita sem saber exatamente a razão. Depois do nascimento da criança, o casal não tem mais nenhuma vida sexual e N. vive uma serie de aventuras passageiras, sobretudo com homens casados. Seu marido se comporta como se ele tivesse duas crianças em casa. Ela se apaixona por uma outra mulher algum tempo mais tarde e começa uma relação homossexual durável, mas pouco satisfatória. A história parece se repetir: ele encontra um outro homem, casado e bem mais velho que ela e que só deseja, em princípio, uma aventura passageira. Mas ela se impõe, rompe sua relação homossexual e começa a insistir junto ao novo companheiro para ter um outro filho. Este não o deseja e a relação torna-se cada vez mais conflituosa, com uma grande carga de ciúmes e de agressividade da parte de N. O começo de uma análise vai, rapidamente, mostrar uma forte rivalidade com a irmã mais velha, com quem ela tinha partilhado a cama até uma idade avançada, uma irmã que era a preferida da mãe, que se casara e se tornara mãe bastante jovem, assim como uma relação incestuosa com um irmão mais velho, que abandonara a casa dos pais quando N. tinha 15 anos, um ano antes do encontro com o velho médico. O pai era um homem fraco, ausente de casa par razões profissionais, dominado pela esposa - «ele a chamava sempre de 'mamãe'» - em todos os negócios da família e que adoeceu, gravemente, logo em seguida à aposentadoria. Dos quatro filhos do casal, tudo conduz a pensar que os dois mais velhos, um menino e uma menina, prolongavam o casal parental, enquanto que os dois mais jovens - N. era a caçula - se revoltaram contra o modelo familiar. N. hesitava entre renunciar à feminidade assumindo uma posição masculina, ou assumir uma posição feminina maternal. No primeiro caso, ela se identificava ao irmão e à sua revolta contra o modelo familiar dominado pela mãe, destituindo o pai, mas o acusava de tê-la abandonado no momento de maior necessidade; no segundo, ela se identificava à mãe e procurava assegurar que os substitutos do pai lhe seriam, definitivamente, submissos, como o pai face à mãe. Sua recusa do modelo familiar não permitia entrever outras alternativas senão aquelas oferecidas pelo próprio modelo familiar e ela não saia do círculo vicioso das questões aparecidas durante a puberdade, sem poder encontrar seu lugar. Ela se debateu vários anos com a questão de sua identidade sexual, passando de um objeto de amor homossexual (a mãe, a irmã) a um objeto de amor substituto do pai e do irmão.

Para N. e para a jovem homossexual de Freud, há uma decepção relativa ao pai ou ao irmão, como se tivessem traído uma promessa, mas também uma forte rivalidade com a mãe que conduz as jovens a uma identificação ao pai e a amar objetos tais que o pai deveria ter amado. No caso de N., a identificação é flutuante e conflitual - talvez seja menos visível no caso de Freud - pois N. não renunciou, inteiramente, aos homens, mas desenvolveu uma estratégia consistindo em obrigá-los a pagar pelo filho dado, assegurando assim um submissão definitiva: «eu te dei um filho, você é obrigado a ficar comigo! » Como a mãe fizera com o pai. Para a jovem homossexual, a escolha de objeto é uma escolha de objeto narcisista e o fato de se fixar sobre uma mulher leviana sugere a imagem que ela se fazia da mulher e de sua mãe, enquanto objeto de amor de um homem, assim como do dever desse último de ignorar a verdadeira natureza da mulher. Com elas estamos no centro do drama edipiano. A história é sempre uma história a três, o que parece tornar a homossexualidade feminina mais complexa e, provavelmente, mais diversa - talvez ela seja apenas uma variação da heterossexualiade do ponto de vista feminino - que a homossexualidade masculina.

Pode-se dizer aqui que a história afetiva de N. reativou na puberdade o dilema que apareceu na infância, provavelmente bastante cedo, dada a configuração familiar (uma irmã e dois irmãos mais velhos) e que só a análise traria à luz: sou um menino ou uma menina? Cada um desses polos tinha vantagens e desvantagens, mas sobretudo cada um deles enviava ao outro e exigia sacrifícios dolorosos. Do lado das meninas, a ausência de pênis, mas a satisfação de um objeto de amor fantasmático especular. Do lado dos meninos, presença fantasmática de um pênis, mas um objeto de amor outro. De um lado e de outro, a integridade em perigo. Na adolescência, o dilema retornou como impossibilidade de escolher entre as duas formas de amor incestuoso: a irmã e o irmão. No primeiro caso, como receber (ou dar) um filho? No segundo, como anular a alteridade?

 

Lacan: 19586

A fase fálica, com o primado do falo e a inveja do pênis para a menina, é objeto de um debate - «that bone of psycho-analytical contention» (GLOVER, 1950) - iniciado em grande parte pelas analistas mulheres contemporâneas de Freud, em particular K. Horney e M. Klein. Segundo Lacan, o melhor resumo dos pontos essenciais foi apresentado por E. Jones em sua conferência em Viena, em 1935, sob o titulo de Sexualité féminine primitive. Jones compara os acordos e desacordos entre Londres e Viena no que diz respeito ao desenvolvimento da sexualidade feminina. Será preciso examinar num outro lugar se a conferência de Jones faz justiça às questões colocadas e ao que está em jogo no debate. O fato é que Lacan analisa e discute as proposições de Jones e de Klein em relação às teses de Freud resumidas a partir de Sur la sexualité féminine (1931) como segue: «A menina se apresenta primeiramente no complexo de Edipo na relação com a mãe, e é o fracasso dessa relação à mãe que abre a relação ao pai, com o que em seguida sera normativado (normativé) pela equivalência do pênis, que ela não possuirá jamais, com a criança que ela pode, efetivamente, ter e que ela poderá dar em seu lugar» (LACAN, 1958). Ora, a entrada na dialética edipiana se dá com a inveja do pênis que corresponde à ameça de castração para o menino. Mas, nos dois casos, sublinha Lacan, o fundamental é a renúncia, um traço de estrutura comum aos dois: a inveja do pênis não é uma história de anomalia pulsional, mas antes uma história de relação fantasmática da menina com o pênis que ganha valor significante. Em outros termos, o primado do falo para o menino e para a menina intervém enquanto Significante. Em Freud, a percepção da diferença anatômica desperta a «curiosidade sexual» e a necessidade de investigação, quer dizer, a necessidade de encontrar significados. Se o falo pode, então, ser tomado como um Significante central na teoria psicanalítica é porque ele inaugura e ordena a aceitação da diferença sexual para o menino e para a menina.

Esse ponto da estrutura sublinhado, Lacan mostra que há em Freud uma espécie de preconceito que o conduz a considerar como natural a inveja do pênis, pois é a percepção que a desperta. Como Lacan já afirmara a propósito do édipo: Freud considera «como natural e não como normativa a prevalência do personagem paternal» (LACAN,1951/1966, p.223). No emprego que faz Freud da inveja do pênis, Lacan distingue três sentidos diferentes: (a) o fantasma que o clítoris seja um pênis, fantasma que pode durar a vida inteira (mesmo se a mulher é privada de pênis); (b) o desejo do pênis do pai na realidade (frustrado pela proibição do incesto e pela incapacidade fisiológica); (c) o pênis simbólico sob a forma de um filho do pai (que supõe a castração, a amputação simbólica de um fantasma). É nesse ultimo sentido que se encontra a correspondência estrutural com o édipo do menino. Em outros termos, a simetria entre o menino e a menina encontra-se na relação fantasmática na medida em que tal relação ganha um valor significante para além das alterações de uma pulsão natural. E assim que a noção de falo permite a Lacan de ultrapassar as críticas de Jones a Freud, valorizando um dos sentidos da noção freudiana de falo.

Como K. Horney já afirmara, ao contrário do que pensa Freud, a inveja do pênis não é originária, mas uma formação de defesa, secundária portanto, contra as pulsões primitivas que se manifestam na relação com a mãe, deixando entrever, segundo Jones, uma «posição feminina primitiva» (LACAN, 1958). Essa posição é uma atitude visando «receber e conservar.» A menina não considera a mãe da mesma maneira que um homem considera uma mulher, isto é como um ser cujos desejos de receber ele tem o prazer de satisfazer. A menina considera a mãe mais como uma pessoa que conseguiu preenchê-la justamente com as coisas que ela deseja: «um alimento ao mesmo tempo sólido e líquido» (JONES, 1935/1969, p. 444). Essas análises são feitas por M. Klein e aceitas por Jones. O falo está, portanto, presente na experiência da criança precocemente, bem antes da suposta fase fálica: o pênis seria um seio mais cômodo, desejado porque melhor adequado à boca, provocando assim uma certa insatisfação com o seio, a qual anuncia «o descontentamento a respeito do clítoris e a inveja do pênis» (JONES, 1935/1969, p. 444). Ora, uma tal aprensão primitiva de seu próprio órgão feminino é reprimida pela menina porque o órgão é interno e mais difuso e a menina projeta suas angústias sobre o clítoris, mais visível e manipulável.

É o que Lacan chama de «dialética» de Jones: a mulher se orienta sempre para o exterior, para a aparência, para o que assegura, donde resulta o desconhecimeno da origem (o que Horney designa como «fuga da feminidade»). Não há, propriamente falando, fase fálica, mas uma posição fálica (JONES, 1935/1969, p. 449) que é «um simples desvio num ciclo essencialmente instintivo, e a mulher entra em seguida de pleno direito na sua posição que é vaginal» (LACAN, 1958).

O que Lacan critica em Jones e Klein - e que ele entrevê em Freud como não articulado - é que a relação da criança com a mãe implica três, talvez quatro termos: a criança, a mãe, o pai e o falo enquanto significante da falta. Não há posição feminina primitiva - a qual, se existisse, só poderia ser natural - mas uma dialética de troca na qual «a mulher deve se propor ou, mais exatamente, se aceitar a si mesma como um elemento num ciclo de trocas» (LACAN, 12.03.1958). A referência a Lévi-Strauss é evidente. Ora, a criança depende desse desejo da mãe que a significa como aquilo que lhe falta, isto é, o falo. A relação da criança com a mãe é mediada pelo falo, o que implica que a criança deve renunciar ao pai e à mãe para entrar no circuito das trocas. Caso ela os conserve como objetos de seu desejo, esse só pode se inverter ou se pervertir, e não há «normativação» possível.

Mas o quer dizer, para a menina aceitar-se como objeto de troca senão desejar ser desejada? O desejo excelente da mulher não é, portanto, ser mãe, numa impossível compensação de uma falta originária, como afirma Freud, mas ser o objeto do desejo do Outro numa rede de relações significantes7.

É assim que Lacan pode afirmar o primado do falo para além da diferença anatômica: o falo é o Significante da falta para um ser de linguagem que significa sua demanda e encontra seu desejo. O desejo da criança de ser o falo de sua mãe é uma prova crucial para a criança na medida em que ela se dá conta que a mãe não tem o falo. É aí que o menino é tomado pela ameaça de castração e a menina pela inveja do pênis.

Retornando ao caso de N., parece evidente que a adolescente tornou-se prisioneira de uma polaridade do Significado fálico que a impede de ultrapassar o quadro familiar: ele se debate durante anos com a questão de sua identidade (de sua identificação?) passando de um objeto homossexual, que coloca em perigo a feminidade à qual ela não pode renunciar, a um objeto heterossexual que ameaça sua imagem de integridade física, uma imagem onde nada falta. A análise, em principio, vai confrontá-la ao seu não-saber de que significados são possiveis com o significante Mulher. Mas, também, inseparavelmente, com o significante Homem.

Zafiropoulois tem razão de sublinhar que a disjunção entre a mãe e a mulher operada por Lacan implica uma revisão do lugar da mãe no édipo: «à diferença de Freud, [Lacan] interroga menos o desejo da criança edipiana pela mãe do que o desejo da mãe do qual a criança deve se desfazer (...) » (ZAFIROPOULOS, 2010, p. 133). Isto é, para sua maturação subjetiva, a criança deve renunciar a ser o falo de sua mãe. A solução freudiana desembocava numa aporia, pois a rejeição da mãe e a entrada no édipo da parte da filha tornam difícil aceitar a ideia de uma identificação com a mãe na dissolução do édipo das meninas: «Com efeito, se a menina entra no édipo cruelmente decepcionada pela mãe, ela só pode sair - se chegar a sair - com essa decepção e esse ódio, mas, em todo caso, não com uma idealização da mãe» (ZAFIROPOULOS, 2010, p. 84). Como mostra a análise lacaniana do impasse de Dora, de um lado há identificação com o pai e, de outro, identificaçao com a Virgem. Em termos de ser e ter: (a) ser como o pai e escolher seu objeto de amor (impasse homossexual); (b) ser o objeto do amor do pai, o falo da pureza (impasse virginal). Para sair desses impasses, Lacan articula à dialética do ser e ter a distinção entre satisfação (gozo de ter) e desejo (registro do ser). O dilema feminino torna-se, então, ter o pênis e, por substituição, um filho, ou ser o falo desejado, significante do desejo do Outro. «Do ponto de vista da excelência do desejo feminino, podemos agora afirmar com certeza que a posição de Lacan é estritamente o oposto da posição de Freud que, lembremos, indicava, em 1932, que deveriamos 'reconhecer' o desejo do pênis como um desejo feminino por excelência. Entre Freud e Lacan é preciso, portanto, escolher» (ZAFIROPOULOS, 2010, p. 86).

Do lado do homem, o dilema é o seguinte: na linha da satisfação, o perigo que ameaça o que ele tem de verdade passa pela identificação ao pai, mas na linha do desejo, onde ele procura igualmente o falo, ele não o encontra onde procura e continua a procurá-lo alhures.

Diante desses dilemas, a escolha parece impossível e as relações entre os sexos vão de um lado para outro, hesitando sempre entre a satisfação e o desejo, segundo as histórias e a inventividade de cada um. As articulações lacanianas parecem fornecer uma apreensão mais esclarecedora, menos marcada pelos preconceitos - mais próxima das evoluções nas relações contemporâneas entre os sexos - do que Freud, no entanto, parecia indicar nessas mesmas relações já como radicalmente insolúvel e indepassável no texto sobre o casamento e as doenças nervosas de 1908.

 

Extroduções

É possivel colocar aqui um termo provisório a nossa trajetória. Não porque uma resposta satisfatória veio à luz, mas porque o caminho já permite um afinamento e uma multiplicação das questões que o dirigem. Será preciso abordar a discussão sobre a sexualidade feminina iniciada pelas analistas contemporâneas de Freud e retomada por Jones em 1935. Será igualmente preciso analisar as consequências sociais e culturais que Freud retira de algumas de suas teses sobre a diferença entre o édipo do menino e da menina e que são praticamente ignoradas pelas analistas satisfeitas ou insatisfeitas com as teses freudianas. É provável que à luz desses novos desenvovimentos a inegável misoginia de Freud apareça ainda mais matizada, talvez mesmo contraditória. A análise dos textos lacanianos, posteriores a 1958, se imporá então, assim como a espinhosa questão do que os feminismos da «segunda vaga», em particular, encontraram na psicanálise para aprofundar teorias e práticas de liberação. Por enquanto, algumas questoes podem ser elaboradas:

(1) A afirmação de Zafiropoulos segundo a qual a mulher se opõe à mãe e que é preciso escolher entre as duas - escolher entre Lacan que salva a mulher da armadilha da maternidade e Freud que a coloca - parece pouco convincente à luz dos dilemas entre satisfação e desejo. Pouco convincente é igualmente o argumento segundo o qual, depois do fracasso da relação com a mãe e a resposta de ódio com que a menina rejeita a mãe, culpada de sua falta de pênis, não poderia ocorrer uma idealização da mãe na saída do édipo da menina.

Como mostra o caso da jovem homosexual e o de N., a relação à mãe não desaparece após a decepção e que a filha se dirige ao pai na busca do pênis. Não se vê a razão pela qual a relação com a mãe permenceria a mesma. Lacan assinala a importância desse fracasso para a menina e para o menino, na medida em que ele implica o reconhecimento da mãe como não portadora do falo. Para a menina, é enquanto privada de falo que a mãe aparece igualmente, o que lhe permite de se desfazer do desejo materno, de se voltar para o pai (que o tem supostamente, mas proibido), abrindo assim para a menina as caminhos da feminidade fora do casal parental, marcada agora pelo dilema entre a satisfação e o desejo. Esse reconhecimento, que é também uma renúncia e uma superação, não parece impedir de modo algum uma identificação posterior à mãe, embora seja preciso examinar mais de perto o sentido dessa identificação.

No que diz respeito à dialética entre satisfação e desejo, retraduzida em termos de ter o falo ou de sê-lo, insistamos sobre a distância entre os dois que, justamente, impede de confundi-los, mas também de substitutir um pelo outro. Assim como um Significante não adere jamais integralmente a um Significado. Freud lembrava que a satisfação da maternidade é passageira, posto que o filho cresce e se separa. Pelo menos no desenvolvimento ideal do édipo da menina. Do lado do desejo, do desejo de ser desejada, além disso, um elemento importante pode justamente ser o dom de uma criança.

(2) Uma interrogação aparece com as primeiras elaborações de Lacan no seu «retorno a Freud». Quando ele desenha a estrutura do desejo como desejo de Outro e faz dela a estrutura fundamental do sujeito desejante, ser de linguagem, isso vale tanto para o homem como para a mulher, evidentemente. Quer dizer que não há diferença estrutural entre desejo feminino e desejo masculino senão ao nível dos efeitos ordenados pela estrutura sob a lei do primado do falo?

Será, certamente, necessário analisar retomar a questão do «monismo» ou do «dualismo» do desejo e melhor esclarecer as ambiguidades de Freud a propósito do sentido de masculino e feminino como atividade e passividade (único sentido, segundo ele, útil para a psicanálise). Tal sentido parece, às vezes, simplesmente convencional e, outras vezes, inscrito na providência natural. Para Lacan, a anatomia não é o destino e o psíquico se articula em plena autonomia. Mas, então, a estrutura não vem aqui ocupar o lugar da natureza?

(3) Diante dos defensores do declínio da função paterna e do desaparecimento das neuroses e psicoses, em proveito dos estados borderline e das perversões, convém lembrar que a ressurgência do matriarcado e do incestuoso não é um simples efeito de balança ameaçando os fundamentos da sociabilidade e da cultura. Se acompanhamos o movimento do pensamento de Freud entre 1923 e 1932, ao lado das teses misóginas inegáveis e de um esforço para atribuir às mulheres os interesses naturais da humanidade que se reproduz - pagando o preço do sacrifício do desejo e da exclusão do trabalho cultural, ou do trabalho tout court - parece evidente que, sob a pressão das psicanalistas mulheres, Freud descobre a complexidade do pré-genital e da relação à mãe estruturando a entrada em cena da lei do pai, para o menino e para a menina. Uma entrada em cena já marcada pelo primado do falo significante. Mas, então, não se anuncia já em Freud que o édipo é um capítulo das estruturas do desejo? E se é bem o caso - o que um exame mais detalhado dos últimos textos de Freud sobre a sexualidade feminina pode mostrar - o «declínio» do pai sociológico e cultural não pode apagar o Nom-du-père ou a função paternal, mas implica uma transformação da figura familiar que, longe de obstruir a dimensão da autoridade e do terceiro, ao contrário, a multiplica: esse declínio a revelaria, exatamente, como o que ela é, isto é, uma dimensão, melhor ainda, um Significante multiplicador de Significados. O Filho já anunciara que havia muitas moradas na casa do Pai. E o desencantamento de um mundo abandonado por Deus não anula a dimensão de uma transcendência, embora talvez a transforme.

E se compreendemos como Significante o signo que abre um espaço de Significados compossiveis e em conflito, pode-se considerar o declínio da família patriarcal como um efeito do desejo feminino e tentar reconhecer nesse movimento a força inventiva da ação feminina. Os psicanalistas não podem permanecer insensíveis à força inventiva dos feminismos e deveriam desconfiar do apoio que acabam dando, voluntariamente ou não, às forças mais reacionárias em ação nas sociedades contemporâneas, prova de um mal-estar permanente diante das exigências democráticas de repensar os fundamentos. Como é que a psicanálise pode articular seu trabalho de elaboração com a aventura democrática?

(4) E permanece aberta a interrogação, inaugurada pelo próprio Freud, sobre os destinos da psicanálise: as transformações, as invenções de significados, não afetam em retorno o campo dos possiveis ordenado pela estrutura? Em outros termos, o que está em jogo para a psicanalise é também a questão de saber se o estruturalismo ainda é a resposta face a uma clínica que, talvez, um dia será chamada de post-edipiana.

 

 

Referências

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Artigo recebido em: 24/04/2015
Aprovado para publicação em: 01/12/2015

Endereço para correspondência
Urias Arantes
E-mail: urias.arantes@gmail.com

 

 

*Psicanalista, filósofo/Pontifícia Universidade de São Paulo-PUC-SP (São Paulo-SP-Brasil), mestrado Filosofia/Universidade de São Paulo-USP, doutorado Filosofia/Sorbonne Paris I (Paris-França).
1A referência, aqui, é o curso dado em 1892 por E. Durkheim, sob o titulo de La famille conjugale, publicado, após a morte do autor, na Revue philosophique, 90, 1921.
2A relação entre democracia, declínio do pai e totalitarismo é estabelecida por Melman quando prediz «a vinda do totalitarismo com o aumento em potência das mulheres na vida política. » Um índice desse perigo encontra-se no gabinete da kanzlerin alemã que mostra na parede o retrato de Catarina da Russia. In Bulletin de l'A.L.I., 2007, p.20.
3Reich, nos anos 30, constatava já uma relação entre a popularização da psicanálise nos Estados-Unidos e seu declínio. Ver MITCHELL, 2000, p. 297.
4A primeira data corresponde à primeira publicação do texto, a segunda à edição francesa utilizada.Infelizmente não posso fornecer a referência das traduções em português.
5Roudinesco considera que o monismo sexual de Freud obedece à exigência de pensar o feminino «sob a categoria de um universalismo, capaz de dar um fundamento verdadeiro ao igualitarismo reclamado pelas feministas» (ROUDINESCO PLON, 1997, artigo: Féminité). Além disso, segundo o Dictionnaire, como não há diferença sexual no inconsciente, não há tampouco correspondência entre o psíquico e a anatomia, o que pode reforçar a tese de um universal psíquico em contradição com a diferença sexual. Pode-se perguntar então se, em lugar de atribuir à libido um caráter masculino, não seria melhor considerá-la como energia neutra, o que conduziria a pensar a diferença sexual como derivada e secundaria, isto é, em função do desenvolvimento da libido quando ela se separa entre sujeito e objeto. A diferença sexual seria então, nos termos de L. Irigaray, de ordem relacional, o que não exclui a relação à diferença anatômica.
6No que diz respeito a Lacan, a atenção se concentra sobre os textos de 1951 a 1958, correspondendo ao movimento do «retorno a Freud» e à aposta lacaniana de articular os fenômenos psíquicos em termos de Significante/Significado.
7Já na sua releitura do caso Dora, Lacan situa o problema para toda mulher como sendo «no fundo de se aceitar como objeto do desejo do homem» e isto «por razões qui estão na base mesmo das trocas sociais mais elementares» (LACAN, 1951, p. 222).

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