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Cadernos de psicanálise (Rio de Janeiro)

On-line version ISSN 1413-6295

Cad. psicanal. vol.39 no.37 Rio de Jeneiro July./Dec. 2017

 

ARTIGOS

 

O caso Maura: o uso de mediadores dialógicos no setting analítico

 

The Maura case: the use of dialogic mediators in the analytical setting

 

 

Larissa Garcia PonceI*; Diana Pancini de Sá Antunes RibeiroII**

IPontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP - Brasil
IIUniversidade Estadual Paulista - UNESP - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O texto discute, a partir de breve exposição da teoria da comunicação na obra de D. W. Winnicott e Clare B. Winnicott e da apresentação de um caso clínico, sobre outras possibilidades de comunicação psicanalítica no setting, por meio do uso de mediadores dialógicos. O uso destes recursos tem por objetivo viabilizar o estabelecimento de comunicação espontânea entre paciente e psicoterapeuta por via menos direta de conteúdos do que a comunicação verbal. A possibilidade do uso deste recurso no setting se dá pelo respeito às necessidades específicas do paciente, tal como ocorreu no caso apresentado.

Palavras-chave: Psicanálise, Winnicott, Setting, Mediadores dialógicos, Comunicação espontânea.


ABSTRACT

The text discusses, from a short exposition of the communication theory in the work of D. W. Winnicott and Clare B. Winnicott, and from the presentation of a clinical case, other possibilities of psychoanalytic communication in the setting, brought about by the employment of dialogic mediators. The use of this resource aims to enable the establishment of spontaneous communication between patient and psychotherapist, by a less direct approach of contents than verbal communication. The possibility of using this feature in the setting is due to the respect for the patient's specific needs, as occurred in the presented case.

Keywords: Psychoanalysis, Winnicott, Setting, Dialogical mediators, Spontaneous communication.


 

 

Introdução

Observa-se que um dos maiores desafios da prática psicoterapêutica, na atualidade, é vencer os obstáculos que se interpõem no desenrolar dos atendimentos clínicos. Nas situações em que experiências traumáticas marcam profundamente o psiquismo de quem as vivenciou, nem sempre é terapêutico falar diretamente sobre os conteúdos que provocaram tamanha dor. Este fato é ainda mais notório em pacientes considerados difíceis.

Franco (2005) define caso difícil como aquele que desafia o analista, pois tende a provocar atitudes contra transferenciais, tais como angústia, raiva, inquietação. A sensação que o analista tem é de que está caminhando em um solo escorregadio. O paciente não responde ao setting tradicional psicanalítico, requerendo uma elasticidade da técnica, tal como definiu Ferenczi (1928/1992), ou uma análise modificada, como recomendou Winnicott (1965/1990).

O trabalho psicanalítico winnicottiano, nos casos em que o manejo adaptado se faz necessário, inclui uma maneira especializada de cuidar, com intervenções específicas, entendidas como facilitadoras do desenvolvimento psíquico do paciente. Estas intervenções são pensadas a partir das necessidades singulares de cada indivíduo e de sua história pessoal e social.

Como principal recurso no tratamento de pacientes muito regredidos ou com grande fragilidade psíquica, a análise modificada visa proporcionar as condições indispensáveis para a constituição do verdadeiro self1 do paciente. Além disso, espera-se deste enquadre: que seja um setting protegido de invasões, que forneça ao paciente aquilo de que necessita e que não o invada pela interpretação. Deve-se propiciar, também, que o paciente encontre, no psicoterapeuta, uma presença corporal sensível facilitadora, que forneça um tipo de cuidado que o ambiente familiar e social não disponibilizou (AVELLAR, 2004).

Este artigo, portanto, propõe-se discorrer sobre a possibilidade de outros modos de comunicação psicanalítica com o paciente, no setting. Modos estes considerados diferenciados daqueles comumente utilizados, no sentido de possibilitar que o paciente se comunique por intermédio de diversas ferramentas, que não demandem a comunicação verbal direta de suas problemáticas, em um setting que leve em conta suas necessidades específicas. Destaca, portanto, os mediadores dialógicos, utilizados, nesta busca, por uma comunicação significativa, os quais possibilitaram que a expressão subjetiva da paciente, cujo caso é brevemente apresentado, viesse à tona.

O percurso metodológico para alcançar este objetivo se inicia por uma breve introdução à teoria da comunicação, na obra de D. W. Winnicott e Clare B. Winnicott; depois, por uma introdução ao conceito de mediador dialógico na clínica winnicottiana; e, a seguir, pela apresentação do caso clínico, com sua análise sobre o uso de mediadores dialógicos no setting; por fim, as considerações finais das autoras sobre o tema.

 

A teoria da comunicação na obra de D. W. Winnicott e Clare B. Winnicott

O tema comunicação tem lugar privilegiado no corpo teórico apresentado pelo casal Winnicott - Donald e Clare - psicanalistas britânicos. Ambos se voltaram para a compreensão dos fenômenos de comunicação e não-comunicação na análise, com o intuito de ampliar as possibilidades de uma comunicação espontânea e não invasiva2 no setting analítico, a fim de promover benefícios terapêuticos para o paciente.

Comunicar-se na teoria winnicottiana diz respeito, em sua essência, à forma como se processa o relacionamento objetal, no qual os sentidos de realidade evoluem, gradualmente, conforme avança o amadurecimento. A vivência infantil parte do mundo subjetivo, atravessa o espaço intermediário, por meio dos fenômenos transicionais , até alcançar a percepção mais avançada, a do mundo objetivamente percebido.

Os fenômenos transicionais são destacados por Winnicott como um processo importante na conquista maturacional humana. Abram (2000) assinala que estes fenômenos se referem a uma dimensão do viver que não pertence nem à realidade interna, nem à externa, está situada no espaço entre ambas, em uma terceira área, espaço potencial ou intermediário. Estes fenômenos estão associados ao brincar, à criatividade e à localização da experiência cultural.

Para Winnicott (1958/1990, 1963/ 1990), a comunicação se origina na relação primitiva entre mãe e bebê, logo no início da constituição egóica do indivíduo. Ocorre, a partir das experiências, que esta dupla alcança em termos de mutualidade, uma interação pré-verbal, aquela que precede o uso de palavras.

Pode-se descrever, muito sinteticamente, todo o processo até que o ser humano alcance o mundo objetivamente percebido, da seguinte forma: graças a um ambiente suficientemente bom, o bebê pode explorar o mundo por meio de seu gesto espontâneo, experimentar a onipotência e estabelecer uma relação com objetos subjetivos de maneira criativa. A onipotência surge devido à ilusão da criança de que criou o mundo. Há um paradoxo aqui, na medida em que, nessa fase inicial, o bebê cria o objeto; no entanto, o objeto já está lá. É preciso, então, que o ambiente permita a manifestação desta criatividade, possibilitando o que irá ser "descoberto".

Após vivenciar algumas experiências satisfatórias, inevitavelmente, o bebê se depara com o princípio da realidade. Há, nesse processo, uma transformação que incita o indivíduo a progredir do relacionamento com objetos subjetivos para o relacionamento com objetos objetivos. Este avanço perceptivo se dá quando a criança tem que abandonar a onipotência, o que é fundamental para que se constitua com um self (si-mesmo) integrado e, portanto, separado da mãe. Este movimento de conquista da realidade externa, sem perder o contato com a realidade subjetiva é um sinal de saúde psíquica (WINNICOTT, 1963/1990).

Segundo Coelho Jr. & Barone (2007), há uma alteração importante na finalidade e nos meios de comunicação com o aparecimento desta evolução maturacional.

Quando o bebê está circunscrito ao relacionamento com objetos subjetivos, não há necessidade de comunicação explícita com objetos. Mas, quando ocorre a transição de relacionar-se com objetos subjetivos para relacionar-se com objetos objetivos, surgem novos modos de comunicação. De acordo com Winnicott: "aqui aparecem duas coisas novas, o uso e o prazer individual de modos de comunicação, e o self individual que não se comunica, ou o núcleo pessoal do self que é um verdadeiro isolado" (WINNICOTT, 1963/1990, p. 182, apud COELHO JR.; BARONE, 2007, p. 89).

De acordo com os preceitos de Winnicott, existem, portanto, duas necessidades opostas do self: a necessidade paradoxal de se comunicar e a de conservar isolada uma parte do self, permanentemente não comunicada. Coelho Jr. e Barone (2007) ressaltam a importância da postura do psicoterapeuta nesta abordagem: é preciso possibilitar que o paciente se comunique e permitir, ao mesmo tempo, que o indivíduo se retire para o isolamento, a fim de preservar sua privacidade. Tal como no famoso paradoxo winnicottiano, que coloca a comunicação com a mãe como "[...] u m sofisticado jogo de esconder em que é uma alegria estar escondido, mas um desastre não ser achado" (Winnicott, 1963/1990, p. 169), o processo psicoterapêutico deve possibilitar esse jogo de mostra e esconde, no qual é preciso ser sensível às necessidades, tanto de comunicar, quanto de silenciar de seu paciente.

Winnicott (1963/1990) diferencia dois modos de não-comunicação. O primeiro deles, a não-comunicação simples, reflete um comportamento sadio de repouso. Neste sentido, este de tipo de não-comunicação se conecta com o núcleo de self verdadeiro, que permanece isolado e propicia a sensação de sentir-se real, por valer-se de uma comunicação significativa silenciosa. Na segunda forma, a não-comunicação ativa ou reativa, houve falha ambiental, que ocasionou uma cisão nas relações objetais infantis, tendo como consequência a comunicação por meio do falso self e um sentido de irrealidade próprio desta condição. Ambas as formas são compreendidas por Winnicott (1958/1990) como etapas fundamentais para o desenrolar maturacional , tanto do bebê, quanto da relação transferencial entre paciente e analista.

Winnicott (1963 /1990) reconhece que existem aspectos benéficos no isolamento pessoal. Para ele, o fundamento da saúde tem origem nas etapas iniciais da vida, quando o bebê se retira para sua interioridade na presença de outro, a mãe. Esta figura confiável sustenta o ambiente, protegendo-o de intrusões, para que o filho possa ter 'tranquilidade' em estar sozinho por um período limitado, o que leva, gradativamente e com experiências semelhantes repetidas, a uma futura capacidade de estar só. Esta capacidade pode ser evidenciada em sessão terapêutica, de acordo com este psicanalista, quando o paciente está se entregando, debatendo-se, associando livremente, absorto em seus próprios pensamentos (ABRAM, 2000).

Clare B. Winnicott, esposa de Winnicott, assistente social com formação em psicanálise e sua grande colaboradora, percebeu, por meio da experiência com crianças e adolescentes evacuadas durante a Segunda Guerra Mundial, a importância de se buscar estratégias de comunicação com os indivíduos desta faixa etária (SAFRA, 2011) . Em seus escritos, esta psicanalista situa o ato de se comunicar como constitutivo do ser humano, cuja finalidade consiste em se conectar com o verdadeiro self. Pela via da comunicação, estabelece-se uma reciprocidade entre pessoas, em que é preciso dar um pouco de si para receber algo do outro.

De acordo com Clare (1964/2004, 1977/2004), a comunicação se dá em níveis de experiência, do superficial ao mais profundo. Uma contribuição bastante valiosa desta autora e que se aplica à realidade da psicoterapia, diz respeito à comunicação que ocorre em um nível mais superficial. Os acontecimentos triviais do cotidiano são os mais facilmente comunicados. O relato destes fatos rotineiros permite ao indivíduo se apropriar das vivências, no momento em que elas acontecem, além de abrir um espaço para futuras comunicações significativas (KANTER, 2004; SAFRA, 2011; FARAH, 2012).

Tal como preconizado na teoria de Donald W. Winnicott, Clare (1964/2004, 1977/2004) entende que a aptidão para se comunicar depende do ambiente que é oferecido ao indivíduo. Para ela, o sucesso na capacidade comunicacional está relacionado ao equilíbrio entre a suspeita e a confiança e ao tipo de experiência de comunicação que ficou registrado no mundo interno, nas memórias inconscientes e não somente à capacidade simbólica da pessoa. Nem sempre as palavras ou símbolos têm por meta a transmissão clara de um conteúdo, podendo ser usados, de maneira defensiva, para encobrir os sentimentos, colocando-se como obstáculo para a compreensão. Se este impedimento, em se comunicar, for manejado apropriadamente, pode possibilitar ao indivíduo que venha, futuramente, fazê-lo. Outra contribuição importante da autora diz respeito à necessidade de considerar o todo para apreender os significados e interpretar os conteúdos daquilo que é expresso. Às vezes, o que está sendo falado não é, exatamente, o que precisa ser comunicado, pode haver um significado ou conteúdo oculto subjacente, revelando o que realmente precisa ser transmitido (KANTER, 2004; SAFRA, 2011; FARAH, 2012).

Tanto Donald quanto Clare concordam que a criança pode sofrer prejuízo na capacidade de amar, diante de um ambiente insuficientemente bom, sobretudo quando se defronta com perdas e luto. Na perspectiva de Clare (1964/2004, 1977/2004), comunicar estas vivências de maneira indireta tem o poder de auxiliar na recuperação desta capacidade, devido ao fato de a comunicação humana ser, por si só, um ato de amor, que reconstitui a confiabilidade e segurança perdidas (KANTER, 2004; WINNICOTT, 1950/2002).

O papel do processo analítico, na perspectiva do casal Winnicott, é o de auxiliar o paciente a retomar seu amadurecimento emocional, estacionado por meio da comunicação de si. Para que este objetivo seja alcançado, é preciso encontrar, no psicoterapeuta, uma figura de cuidado sensível, compreensivo e não invasivo, em quem possa confiar para, então, compartilhar seus sentimentos e sofrimentos mais profundos e, quem sabe, vir a elaborá-los, futuramente.

 

Os mediadores dialógicos como facilitadores da comunicação na sessão analítica

Em muitas situações, ainda que o paciente queira estabelecer uma comunicação espontânea com seu psicoterapeuta, encontra dificuldades para realizá-la de fato. A fim de buscar alternativas, que promovam a manifestação ou restauração desta gestualidade espontânea, o analista pode recorrer aos mediadores dialógicos, como um convite à comunicação emocional, por via menos direta do que a efetivada por uma comunicação verbal.

Medeiros (2003) define os mediadores dialógicos como fenômenos que acontecem no contexto psicoterapêutico, que têm por meta facilitar a comunicação entre paciente e terapeuta, propiciando outra materialidade no encontro, como alternativa à intervenção verbal. Aiello-Vaisberg (2007) ressalta que qualquer atividade expressiva guarda a possibilidade de servir como mediação, desde que contemple um encontro inter-humano ocorrido por meio de fenômenos transicionais. Nestes, a dimensão lúdica é o canal para a expressão subjetiva do paciente e tem, por contrapartida, o acolhimento do analista e/ou pesquisador. Pautados no Jogo do Rabisco de D. W. Winnicott, os mediadores dialógicos proporcionam a possibilidade de expressão, configurando um campo de experiência menos defendido, no qual se permite uma comunicação emocional genuína, despontando, nos envolvidos, a espontaneidade e a criatividade (RIBEIRO et al., 2008).

Para que esta estratégia promova o desenvolvimento de aspectos saudáveis da personalidade e sirva na elaboração de ansiedades geradoras de sintomas, o analista deve ser sensível e permitir que seu paciente crie/encontre atividades que confluam com as características criativas que possui (VITALI, 2004).

A seguir, apresenta-se um breve relato de um caso clínico, em que mediadores dialógicos foram fundamentais para que a psicoterapia fosse possível.

 

O fim de uma vida interrompe outra existência: a psicoterapia de Maura3

Maura chegou ao consultório quando estava com 13 anos e ficou em terapia por aproximadamente dois anos e meio. É a filha mais velha de uma família de quatro filhos (tem três irmãos mais novos que estavam com oito, cinco e três anos na época)4. A demanda inicial trazida por sua mãe, Zenaide, foi a preocupação dela com o retraimento da filha, após a morte do pai, Renan, que ocorrera três meses antes.

Maura foi concebida quando Zenaide estava com 17 anos, gravidez que resultou em casamento pouco tempo depois e em uma mudança para uma cidade distante, em outro estado. O casal permaneceu junto até dois anos após o nascimento do quarto e último filho. Com a separação, Zenaide voltou com os filhos para a cidade de seus pais, dificultando o contato deles com Renan, que permaneceu morando longe. Três anos antes de sua morte, o pai das crianças fez algumas tentativas de reaproximação com seus filhos, ao se mudar para uma cidade próxima a deles. Maura foi quem se abriu mais para este contato, enquanto os irmãos menores não denotavam ter tanto interesse em estar com o pai.

Logo na primeira sessão, deparei-me com uma adolescente muito fragilizada, triste e retraída. Desde os primeiros encontros, expôs sua necessidade de se cortar nos momentos de tristeza profunda. Nas palavras da paciente, este ato tinha o poder de fazê-la "[...] se desconectar por alguns momentos da dor interior que a perseguia constantemente". Afirmava que esta sensação de tristeza profunda sempre a acompanhou, mas percebeu piorar com a morte do pai. Reclamava de sua mãe, que desmerecia sua dor, ressaltando o quanto ele foi ausente e de seus irmãos, que pareciam não sofrer.

Diante da impossibilidade de expressar seu pesar para sua família, a adolescente passou a manifestar a dor interna em dor física, situação recorrente em pessoas que praticam autoagressão e precisam sofrer em silêncio. De acordo com Favazza (1987/1996), busca-se a vida e a comunicação dos conflitos psíquicos por meio da expressão concreta de uma linguagem inscrita no corpo. Na leitura de Winnicott (1963/1994), diante do sofrimento máximo provocado pelas agonias impensáveis5, o indivíduo tem que erigir defesas para não as viver. O mecanismo defensivo que transparece em sua atuação, no caso de Maura, é a perda da união psicossomática e, como estratégia de autoproteção, inicia-se a despersonalização. Para sentir que habita o próprio corpo, ela se corta a fim de recuperar a consciência corporal, temporariamente inacessível.

Maura não encontrou suporte ambiental para sustentar e legitimar sua dor e nem pôde ter suas dores e lutos reconhecidos na presença de alguém para, então, poder recuperar o que foi perdido, tal como explicitam Clare Winnicott (1964/2004, 1977/2004).

Após comunicar suas questões principais na primeira sessão, apresentou grande dificuldade de se expressar verbalmente, nas sessões subsequentes. Ela pouco falava e, quando o fazia, proferia frases curtas, assentia ou discordava com um meneio de cabeça. Tentei estabelecer algum canal de comunicação, ora ficando em silêncio, ora perguntando sobre seu estado emocional e suas atividades diárias. Mesmo diante deste meu "tatear no escuro", a adolescente parecia desfrutar do interesse e de minhas tentativas em compreender seu mundo interno.

Procurei constituir com ela uma dinâmica pautada, essencialmente, na escuta, postura que, na perspectiva de Clare Winnicott (1964/2004, 1977/2004), é fundamental nos casos em que a comunicação é difícil. Ao demonstrar respeito ao tempo e à hesitação do paciente, adquire-se, gradualmente, a confiança, o componente fundamental para que, posteriormente, ocorra uma comunicação significativa (KANTER, 2004).

Em uma conversa, desvelou-se a paixão da garota pelo cinema, livros e por desenhar e escrever histórias. Foi por meio destes elementos que iniciamos um diálogo, que se mostrou "terapêutico" com o passar do tempo. Seus gêneros favoritos eram suspense, terror e os romances policiais, que a inspiravam para compor seus próprios contos. Por conhecer muitos dos filmes e livros comentados por ela, foi possível construir, com a paciente, uma experiência compartilhada sem expectativas ou demandas, facilitando a formação e o fortalecimento de nosso vínculo terapêutico. Clare Winnicott (1964/2004, 1977/2004) ensina que, por meio desta experiência compartilhada, há um terceiro elemento que é capaz de unir e preservar ao mesmo tempo, uma vez que não há menção direta sobre uma questão crítica. Este tipo de experiência compartilhada, segundo a autora, seja talvez o único meio comunicacional não atemorizante.

Por muitas sessões, a adolescente relatou sua fascinação pelo mangá "Death Note"6. Em uma destas conversas, comentou que, além de gostar deste gênero artístico, gostava de produzir "desenhos e histórias escabrosas deste tipo" durante a aula. Os conteúdos mais presentes de sua arte retratavam cenas de morte, em sua faceta mais horripilante: cabeças decapitadas, pessoas ensanguentadas, etc. Professores e colegas de classe, ao se depararem com estas produções, exclamavam: "Isso é coisa de psicopata!". Nos períodos mais depressivos, a menina se trancava no quarto e, ao som da banda Nirvana7, imaginava diferentes mortes, fato que lhe provocava prazer (ao tentar se aproximar, segundo ela, do que o pai havia sentido ao morrer) e medo (por este pensamento ser mais um indício de que ela fosse, de fato, uma "psicopata"). Acalmava-se quando eu apontava que autores de obras similares não, necessariamente, "passavam ao ato" e nem concretizavam, na vida real, estas tramas de horror. Outra consideração que a tranquilizava era a de que este interesse pelo mórbido parecia ser sua maneira de se aproximar, por meio da arte, do assunto "morte" e, quem sabe, um modo de vir a elaborar o luto pela perda de Renan.

Tudo indica que Maura, ao se deparar com seus impulsos agressivos/destrutivos, assustava-se, talvez por ainda não ter se apropriado deles. Para Winnicott (1948/2002), este processo de apropriação necessita, como pano de fundo, de um ambiente facilitador e indestrutível para que o indivíduo possa se sentir seguro em descobrir e exercitar sua agressividade. O ambiente de setting passa a ser tomado como facilitador, por meio das experiências repetidas de holding. Assim, com apoio terapêutico e um maior holding materno é possível integrar estes impulsos e se tornar capaz de se responsabilizar pela destrutividade, fazendo as devidas reparações, completando o que Winnicott (1954/1990) denomina de ciclo benigno.

Na primeira fase do processo psicoterápico, no período mais crítico, qualquer tentativa de interpretação era recusada, e, por esta razão, parei de fazê-las. Ao longo de cinco meses, comunicamo-nos, essencialmente, pelos mediadores dialógicos, apenas trocando informações sobre os livros e filmes do interesse de Maura, sem correlacioná-los com seus conteúdos internos. Nesta situação e em tantas outras, precisei ser, tal como Winnicott (1962/1990) propôs, uma analista fazendo outra coisa, ou seja, realizando uma prática psicoterapêutica distinta da análise, mas que tem, na psicanálise, o embasamento para sua compreensão. Esta atitude é uma das previstas, quando se oferece um manejo de setting especial ao paciente. Winnicott (1965/1990) prediz que se promova este conjunto de atitudes em algumas situações específicas nas quais o enquadre tradicional não parece funcionar. O manejo é concedido por meio das três funções da mãe suficientemente boa: o holding, o handling e a apresentação dos objetos8 (AVELLAR, 2004).

O oferecimento deste enquadre à Maura possibilitou que se instalasse com ela um canal comunicacional aberto, tal como Clare Winnicott (1964/2004, 1977/2004) postula para que a paciente pudesse, no futuro, falar diretamente sobre sua dor, com um discurso mais organizado, recebendo interpretações e fazendo associações do material trazido e seus significados inconscientes.

Com a possibilidade de comunicação mediada, estabelece-se a confiança e Maura passa, então, a produzir mais e mais desenhos e contos. Após longos meses, sem qualquer interpretação do material, certo dia, sugeri que o filme/história que ela escolhia me relatar parecia ter relação com seus conteúdos inconscientes e acontecimentos, que foram significativos para ela naquela semana. Depois desta fala, a adolescente passou a pedir minha interlocução nas sessões que se seguiram: "Quero que você interprete! Estou achando muito legal entender o que eles significam! Você sempre fala algo que faz sentido!", dizia ela, usufruindo de cada palavra, como se estivesse, tal como na metáfora winnicottiana, desfrutando do prazer de estar escondida e ser descoberta. Maura pôde partilhar a experiência com uma figura, que lhe permitiu transitar pelo espaço transicional, ora lhe apresentando os objetos da realidade, ora retomando o contato com seus objetos subjetivos. O uso transicional que a garota fez dos mediadores dialógicos, no período mais difícil, permitiu a ela se "refugiar neste mundo de fantasia" para esquecer a dor emocional que a afligia por quase todo o tempo e se ajustar a uma vida sem a presença do pai.

Passado algum tempo de atendimento, a paciente foi revelando lembranças de sua infância, sobretudo das cenas de brigas dos pais, que antecederam a separação do casal e a depressão da mãe, ora dirigindo sua raiva e ódio à mãe, jogando nela a responsabilidade pelo casamento dos pais ter fracassado, ora ao pai, dizendo que ele não fez tudo o que estava ao seu alcance para recuperar o amor da esposa. As ideias de que sua vida não valia a pena persistiram por algum tempo e, na maior parte das sessões, eu apenas a escutava falar e chorar. Depois de quase dois meses nesta situação, fiz uma pontuação despretensiosa, que acabou se revelando crucial para mudar a dinâmica da paciente:

- Você ainda não conheceu todas as coisas da vida, como pode saber se são todas ruins e não valem a pena?

A garota parou para pensar alguns segundos e disse:

- É verdade. Eu só tenho 13 anos, nunca viajei para fora do país, nem aprendi a dirigir ou fui para a faculdade. Não posso morrer sem conhecer o que não conheço!

A partir daquele momento, algo diferente despertou dentro da garota. No encontro seguinte, afirmou, logo que entrou na sala, que tinha feito um acordo consigo mesma: "experimentar as coisas boas da vida". Começou a sair com os amigos, rir das pequenas coisas e estar aberta ao "novo" que estava por vir. Para o próprio espanto de Maura, ela passou a se divertir, sensação "rara" para ela até então.

Ao que tudo indica, a pontuação/interpretação, na sessão relatada acima, funcionou como um momento de mutação, no qual, segundo Safra (1995), há uma sobreposição da realidade psíquica do paciente com a do analista, favorecendo a instauração de um campo, que libera a simbolização de conteúdos psíquicos do paciente. Por meio da transferência e contratransferência, cria-se o espaço potencial, no qual ocorre a comunicação significativa e transformadora. Em decorrência deste fenômeno, foram viabilizadas transformações decisivas, que liberaram aspectos vitais esmagados, alterando, radicalmente, os significados e a direção da própria história de vida de Maura e dos rumos da psicoterapia.

Mesmo se apresentando mais disposta e revitalizada, ainda sentia que uma "tristezinha nunca a abandonava por completo". Destaquei que, talvez, não fosse possível eliminar por completo esta sensação que a assaltava de tempos em tempos, e que, naquele momento de sua vida, ela fosse capaz de conviver com uma dose de tristeza sem se despedaçar, uma vez que havia atingido um progresso maturacional significativo. Maura sorriu, concordando e brincou afirmando que não precisava mais perder, literalmente, nenhum pedaço de si para retornar ao eixo.

A evolução da paciente se comprovou em determinadas épocas do ano, ante datas significativas, que remetiam ao pai. O mês de agosto seria triste: ela teria que suportar o Dia dos Pais, o aniversário de nascimento de Renan e também de sua morte. Na época que antecedeu este período, Maura se negou, por várias sessões, a discutir este assunto. Começava a falar e logo se interrompia dizendo: "Eu quero falar das coisas da escola, não quero falar mais destas coisas". O recurso de uso de mediadores dialógicos se fez, novamente, necessário. Com a dor beirando o insuportável, após quase nove meses sem se cortar, a garota o fez novamente. A ação, de acordo ela, adquiriu outro sentido: não promoveu a sensação boa de antes, muito pelo contrário, despertou um sentimento de culpa terrível. Foi, então, que se convenceu que não admitiria que isto se repetisse. Juntas, pensamos em outros modos de enfrentar a dor, que não colocassem sua integridade física em risco e, depois de algum tempo, Maura começou a se permitir chorar, refugiar-se em um sono de fuga "sem sono" e passou a visitar o túmulo do pai com mais frequência para se sentir um pouquinho mais perto dele. E, ainda, comunicou à mãe que respeitasse seus sentimentos em relação ao pai, que acabou por compreender as emoções da filha.

O atendimento foi interrompido pela mãe da paciente, que acreditava que a filha estava muito melhor e precisava começar a se desvincular de mim, já que a família estava de mudança marcada para outro país. Maura estava animada e cheia de planos com a mudança.

 

Considerações finais

A clínica das mediações terapêuticas tem sua importância reconhecida e sedimentada na atualidade, sobretudo nas situações de adversidade e tratamento de pacientes difíceis.

Pela experiência acima mencionada, é possível compreender que, não só a leitura, mas outros mediadores dialógicos, tais como o cinema, a música, as artes plásticas e a própria confecção de narrativas, podem desempenhar um papel que contribui para a atividade psíquica na reconstrução de si mesmo. Por meio de apropriações singulares do objeto, seja ele qual for, permite-se ao indivíduo que identifique suas questões, exercite o devaneio, conte ou reescreva sua história sob as mais diversas possibilidades. Este fenômeno se verificou em Maura, que encontrou, no ato de ler, escrever contos, assistir a filmes e desenhar, uma razão plausível para sua existência "tão idiota e sem importância" - segundo ela própria repetia.

Os textos e outras formas de expressão artística agem em diversos níveis, sejam eles lidos, produzidos, assistidos ou ouvidos na solidão por meio de seus conteúdos, das associações e discussões suscitadas, assim como de suas melodias ritmos e tempo da obra. A paciente pôde encontrar nestes mediadores o apoio para enfrentar a escuridão da dor que a separação pela morte do pai trouxe à vida dela. A expressão de Maura no setting, por meio de variadas formas de arte, possibilitou que encontrasse a expressão de si mesma, retomando sua saúde emocional. Sua espontaneidade desabrochou quando confiou no ambiente familiar e no setting.

A impossibilidade de ter sua dor ouvida e referendada pela mãe, a princípio, fez com que Maura encontrasse na autoagressão a voz estridente que a fez ser ouvida. Devido à desconfiança transferida à analista, a paciente encontrou grandes barreiras para expressar seus conteúdos verbalmente. A adaptação do setting às suas necessidades e a utilização dos mediadores dialógicos transmitiram à adolescente a segurança necessária para que realizasse comunicações mais profundas e retomasse o amadurecimento emocional estagnado.

O processo psicoterapêutico permitiu à Maura que comunicasse a dor de sua perda na presença sensível de alguém, como testemunha desta experiência vivida. Ao entrar em contato com seus sentimentos, por meio da criatividade, foi capaz de encontrar-se com sua interioridade e reaver o que perdeu no momento do sofrimento.

 

 

Referências

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Artigo recebido em: 16/02/2017
Aprovado para publicação em: 17/04/2017

Endereço para correspondência
Larissa Garcia Ponce
E-mail: l.garcia.ponce@gmail.com
Diana Pancini de Sá Antunes Ribeiro
E-mail: diana@assis.unesp.br

 

 

*Mestre e doutoranda em Psicologia Clínica/Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
**Professora assistente doutora/Departamento de Psicologia Clínica da Faculdade de Ciências e Letras (FCL) da Universidade Estadual Paulista (UNESP), de Assis. Mestre em Psicologia Clínica/Universidade de São Paulo (USP), doutora em Psicologia como Ciência e Profissão/Pontifícia Universidade Católica de Campinas (PUC-Campinas), membro do grupo de pesquisa CNPq Figuras e Modos de Subjetivação no Contemporâneo.
1O verdadeiro self estabelece as fronteiras e faz a distinção de eu e não-eu, uma parte deste permanece oculto, outra parte é protegida pelo falso self. O verdadeiro self surge quando há uma organização mental suficiente para que haja potencial criativo propiciado pelo gesto espontâneo (WINNICOTT, 1960/1990).
2O termo invasivo é usado ao longo da obra de Winnicott para designar situações ambientais que prejudicam a continuidade de ser do indivíduo. Quando a pessoa ainda não completou a tarefa da integração da personalidade ou tem um self fragilmente constituído, segundo o autor (WINNICOTT, 1967/1994) deve-se primar por um cuidado ainda maior, adaptando o setting às necessidades do paciente a fim de evitar que este erija defesas ao se sentir ameaçado. Considerando a delicadeza da situação (necessidade de Maura em se cortar, a ideação suicida, bem como sua dificuldade em falar diretamente sobre suas questões) o uso dos mediadores dialógicos se apresentou como uma alternativa menos direta para abordar as questões da paciente, até que ela pudesse tratar seus conteúdos por meio de um discurso direto.
3A referida paciente foi atendida por uma das autoras e, por esta razão, será relatado em primeira pessoa.
4A fim de preservar a identidade dos envolvidos, todos os nomes foram trocados, assim como alguns detalhes que poderiam identificar a paciente e sua família.
5Tem origem nas fases iniciais, quando não há um self integrado para sustentar o mundo subjetivo. Segundo Winnicott (1963/1994), as agonias impensáveis levam o indivíduo ao "sofrimento máximo", porque tem que construir defesas para não as vivenciar novamente. A natureza destas agonias depende do estágio de amadurecimento emocional em que se situa a criança. As defesas que surgem podem ser: um retorno ao estado não integrado; ser necessário se autossustentar por sentir que pode "cair para sempre"; perda da união psicossomática (e como estratégia de autoproteção inicia a despersonalização); deformação do sentido de realidade e retorno ao narcisismo primário; por último, um déficit na capacidade de se relacionar com os objetos, culminando em estados autistas.
6Mangás são histórias em quadrinhos japonesas nas quais a leitura é feita de trás para frente. Especificamente a história de Death Note - em português "Caderno da Morte" é uma série escrita por Marsh e ilustrada por Takeshi Obata, cuja adaptação para anime foi dirigida por Tetsurō Araki. A trama centra-se em Light Yagami, um estudante do ensino médio que encontra um caderno sobrenatural chamado "Death Note", no qual pode matar pessoas se os nomes forem escritos nele, enquanto o portador visualiza mentalmente o rosto de alguém que quer assassinar. A partir daí, Light tenta eliminar todos os bandidos e criar um mundo onde não exista o mal, mas seus planos são contrariados por L, um famoso detetive particular.
7A banda Nirvana é mundialmente conhecida por suas músicas com letras e melodias depressivas, reflexo, especialmente, de seu vocalista Kurt Cobain, que foi diagnosticado com transtorno bipolar e fazia uso abusivo de drogas. Ele se suicidou em 1994.
8A sustentação física e emocional do bebê se dá pelo holding, que inclui a rotina completa de cuidados, e protege a criança das invasões fisiológicas e psicológicas. O handling diz respeito à manipulação do bebê durante o cuidado. Esta função visa promover o bem-estar físico do pequeno ser, e viabiliza a união da vida psíquica ao corpo. A apresentação de objetos se refere ao início da relação do bebê com os objetos do mundo externo. Cabe à mãe, como agente adaptativo, apresentar o mundo em doses pequenas, oferecendo ao filho a experiência de onipotência, estabelecendo o alicerce adequado para que, paulatinamente, o pequeno ser entre em acordo com o princípio da realidade (ABRAM, 2000).

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