SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.40 issue38There are 788 steps: psychoanalysis up on the hillThe Unheimlich in the adoption of disabilities children author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Cadernos de psicanálise (Rio de Janeiro)

On-line version ISSN 1413-6295

Cad. psicanal. vol.40 no.38 Rio de Jeneiro Jan./June 2018

 

ARTIGOS

 

Considerações sobre as modificações de Ferenczi à técnica psicanalítica e os desenvolvimentos posteriores de Winnicott

 

Considerations about Ferenczi's modifications on the psychoanalytic technique and Winnicott's later developments

 

 

Bartholomeu de Aguiar Vieira*

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Devido à grande incidência de pacientes que não se adaptam ao método padrão da Psicanálise, este trabalho investiga formas de adaptação da escuta, tendo a noção de empatia proposta por Ferenczi como uma ferramenta clínica fundamental para o manejo terapêutico. O objetivo deste trabalho é oferecer um solo de embasamento para a técnica em questão. Para tanto, ele aproxima a conceituação ferencziana sobre o tema à ideia de preocupação materna primária em Winnicott. Tal escolha se justifica, pois as ideias formuladas pelo autor inglês funcionam como continuações do percurso inaugurado por Ferenczi. Para esclarecer esse argumento, o trabalho aborda Winnicott e sua compreensão da maternagem como capacitadora natural da regressão, o que me levou a concluir que o "sentir com" da empatia, nesse enquadre, opera como uma adaptação às necessidades primárias do paciente traumatizado.

Palavras-chave: Relação mãe-bebê, Preocupação materna primária, Trauma, Clínica psicanalítica.


ABSTRACT

Due to the high incidence of patients who do not adapt to the standard method of Psychoanalysis, this paper investigates ways of adapting the listening of the analyst, with the notion of empathy proposed by Ferenczi as a fundamental clinical tool for therapeutic management. The objective of this paper is to offer a keystone for the technique in question. To this end, the paper approaches the Ferenczian conceptualization on the subject to the idea of primary maternal preoccupation in Winnicott. Such a choice is justified, since the ideas formulated by the English author function as continuations of the course inaugurated by Ferenczi. To clarify this argument, the paper addresses Winnicott and his understanding of mothering as a natural enabler of regression, which led me to conclude that the "feeling with" empathy in this framework operates as an adaptation to the primary needs of the traumatized patient.

Keywords: Mother-child relationship, Primary maternal preoccupation, Trauma, Psychoanalytic clinic.


 

 

Introdução

Ferenczi foi um autor que montou sua clínica no contexto específico de criação da Psicanálise. Ao lado de Freud, cooperando com suas teorias e acrescentando pontos de vista e modificações metodológicas, Ferenczi era eminentemente preocupado com as implicações clínicas do fazer psicanalítico. O autor realizou um importante percurso lógico de adaptação do dispositivo às necessidades de uma clínica voltada aos casos que eram considerados difíceis. O leitor observará nas próximas páginas que a capacidade de empatia, entendida por Ferenczi como uma forma de compartilhar os afetos que circulam na clínica, deu ao seu método terapêutico contornos altamente úteis para a clínica contemporânea. Como, por exemplo, a postura de acolhimento afetivo capaz de acolher a experiência promovida pelo trauma.

Nas páginas que se seguem, espero proporcionar ao leitor um contato com o já mencionado percurso lógico feito por Ferenczi no desenvolvimento de suas ideias, tendo como eixos as modificações metodológicas propostas por ele em decorrência de sua compreensão sobre a transferência. Em um segundo momento do trabalho, cotejarei o pensamento de Ferenczi às contribuições de Winnicott relativas à relação da díade mãe-bebê, pois sugiro haver aí uma relação de aproximação e complementaridade entre os dois autores. Neste sentido, torna-se possível afirmar que o pediatra e psicanalista inglês é um continuador do projeto ferencziano de uma clínica debruçada sobre os laços emocionais e sobre suas possibilidades criativas.

 

Sobre a transferência e seus usos - as modificações técnicas de Ferenczi

A preocupação primordial de Ferenczi me parece ser relativa à situação de encontro entre o psicanalista e o paciente e se assim for, acredito que o autor coloca em evidência as exigências feitas à pessoa do analista. Tal afirmação encontra respaldo, fundamentalmente, no final de sua obra, no texto O problema do fim da análise (1927/2011). Nesse trabalho, nota-se a preocupação de Ferenczi em expor suas considerações sobre o papel basilar da análise do analista, único dispositivo capaz de tornar alguém apto à tarefa de conduzir o processo de uma psicanálise.

Estando sempre atento aos elementos presentes na transferência, Ferenczi desenvolve, ao longo de sua obra, diversos instrumentos para circunscrever as formas de atuação do analista e suas funções. A especificidade de seu método reside no olhar atento ao encontro promovido pela análise. Além da busca pela representação recalcada (objetivo do tratamento clássico proposto por Freud), Ferenczi acrescenta que o contato humano que se dá no desenvolvimento da transferência é suscitador de afetos e promotor de mudanças. É justamente porque o autor desloca sua atenção para esse aspecto relacional que Ferenczi dará especial ênfase à necessidade de trazer para a consciência, no aqui e no agora da sessão, aspectos referentes à transferência negativa - fato que diferencia de forma sutil o seu método daquele proposto por Freud, que considerava o vetor negativo um empecilho ao processo.

A dimensão sensível da clínica, isto é, a atmosfera afetiva posta em jogo durante uma sessão de psicanálise, é o eixo condutor do pensamento teórico de Ferenczi. Ora, tendo em vista que a análise do material trazido pelo analisando fica submetida aos contornos afetivos nos quais se desdobra a relação analítica, sugiro que entendamos as modificações técnicas de Ferenczi dentro do quadro maior, referente a uma ética do cuidado (KUPERMANN, 2017; MAIA, 2009). Tal proposta visa realçar o aspecto da adaptabilidade da técnica às necessidades do analisando e superar uma possível compreensão de evolução direta entre as propostas de Ferenczi. Dito de outro modo, não entendo, no presente momento, a passagem de uma técnica a outra como a superação de um momento anterior que encontra no próximo uma resposta mais favorável ao encontro clínico. De outro ponto de vista, estou propondo que, diante da análise da transferência, um analista pode escolher a ferramenta técnica que supõe se adequar melhor à atmosfera afetiva da sessão.

Por motivo de sistematização e exposição de ideias, desenvolverei, a seguir, respeitando o percurso histórico, as modificações técnicas feitas por Ferenczi. Inicialmente, concebendo o analista como o catalisador de um processo (FERENCZI, 1909/2011), a transferência é entendida como um deslocamento de afetos particular dos neuróticos. Em sua concepção, o inconsciente faz seus próprios movimentos, e a figura do analista atua como um catalizador de afetos responsável pelos ditos movimentos de expansão. O analista ocupa o lugar de permanente oscilação entre as figuras materna e paterna; entre a indulgência do perdão relativo à benevolência materna e, no outro polo, a severidade paterna. Esse ponto de vista relativo ao uso da transferência, apesar de se harmonizar facilmente à concepção que Freud (1904/2017) possui sobre o tema no mesmo período, leva em consideração o fator materno que o vienense ignorava parcialmente. Porém, a visão de Ferenczi já confere, também, uma originalidade própria, fato que torna o psicanalista tanto um autor como um discípulo, desde o começo de sua carreira.

O fôlego inventivo e rigoroso de Ferenczi, no tocante à transferência, se destaca pela sua opinião a respeito da força introjetiva que está em ação no psiquismo desde o início da vida. Segundo o autor, o ego possui a tendência (Süchtigkeit) de se expandir por toda a vida, se espalhando pelo mundo externo em um movimento de interesse pelos objetos, como se estes fizessem parte de si mesmo - movimento autoerótico em sua essência, que se evidencia como "o homem só pode amar-se a si mesmo e a mais ninguém; amar a outrem equivale a integrar esse outrem no seu próprio ego" (Ferenczi, 1921/2011, p. 209). Essa concepção a respeito do ego é distinta à de Freud e impactante para a prática clínica1.

É somente quando o autor se debruça para observar as defesas - isto é, palavras vazias, sons e silêncios - praticadas contra a regra fundamental da associação livre, efetuadas por neuróticos obsessivos, que Ferenczi fará suas primeiras mudanças na técnica. Gostaria de ressaltar o que suponho ter sido necessário para que o autor tenha se sensibilizado a ponto de perceber tais elementos defensivos: trata-se de uma característica fundamental da escuta de si, o ato de estar atento à sua própria figura de analista, o que permitiu a Ferenczi dar voz ao seu sentimento e propor uma nova forma de intervenção. Dito de outro modo, diante da estagnação de certos processos analíticos, Ferenczi (1928/2011) pôde escutar a voz da "sentinela" que vive dentro de cada um e, atento às emoções que se faziam presentes, propor um tipo de intervenção contrária à neutralidade que era de praxe ao enquadre das análises. Mais ainda, foi possível ir na direção contrária à da "hipocrisia do analista" (FERENCZI, 1932/1990), que responsabilizaria a psicopatologia do analisando para justificar o fracasso do tratamento.

O método em questão foi denominado de técnica ativa (FERENCZI, 1919a/2011, 1919b/2011, 1921/2011, 1926/2011) e indica uma atividade por parte do analisando que deve ser operada mediante interdições e injunções do analista. Em momentos específicos e sob circunstâncias igualmente especiais de retraimento elaborativo, Ferenczi aponta como a técnica ativa pode ser um instrumento auxiliar, vindo em socorro de um tratamento que se encontra paralisado devido ao acomodamento dos analisandos no amor transferencial. Para ele, trata-se de tomar a direção contrária à do princípio de prazer e desfazer certas formas autoeróticas de satisfação, aumentando a tensão (um incremento na produção de angústia) e produzindo novas distribuições de libido, possibilitando novas associações para o material recalcado.

Encarando a formulação da técnica ativa como a primeira contribuição técnica de Ferenczi para a prática clínica, o movimento que vem a seguir seria o de avaliação de resultados decorrentes do emprego dessa ferramenta. Assim, no texto Contraindicações da técnica ativa (FERENCZI, 1926/2011), é elaborada a autocrítica de seu trabalho. Nele, o autor examina de que forma os excessos da atividade se faziam presentes nas análises conduzidas por seu colega Otto Rank. A elaboração do trabalho de crítica supracitado levou Ferenczi a considerar os aspectos autoritários e infrutíferos dessa técnica e seu objeto de reflexão. Novamente, retornou o pensamento para as formas de atuação do analista; desta vez, tendo em vista que os analisandos em jogo eram sujeitos em que se apresenta uma dinâmica traumática marcada pelo desmentido (Verleugnung)2 3.

O passo seguinte de suas modificações foi mais que uma síntese de seu percurso nesse período. Ferenczi considerou o ofício do analista através de suas reflexões sobre a elasticidade da técnica. Pensar a postura clínica dando a ela flexibilidade foi possível somente porque Ferenczi mantinha um solo firme de sustentação de suas ideias. Certamente, toda psicanálise é feita em um campo de assimetria; contudo, Ferenczi não se furta de criticar os excessos desse aspecto, que podem ser considerados uma defesa dos próprios analistas. Também ocorre, nessa fase de suas reflexões, a abertura para se pensar a mutualidade da experiência de duas pessoas, uma deitada e a outra sentada, que compartilham uma experiência analítica.

É esse elogio à qualidade estética do encontro que dará a Ferenczi a inspiração para fazer do encontro clínico um momento de valorização da experiência vivida (Erlebnis), fato que Haynal (2013) considera a principal característica do autor, isto é, o seu profundo desejo de ligar a emoção ao processo de insight. Ferenczi era radicalmente preocupado em tornar a experiência de uma psicanálise um evento promotor de uma experiência emocional profunda.

A escolha feita por Ferenczi do termo elasticidade foi aprovada por Freud (1918[1914]/2010), que compartilhava da opinião de que a técnica analítica poderia sofrer modificações mediante certos tipos de tratamento. Inclusive, deve-se apontar como, na breve oportunidade que teve de manifestar suas indicações sobre a técnica, Freud deu conselhos de caráter essencialmente negativos, deixando margem para que analistas como Ferenczi apontassem modificações como as contidas no "tato do analista", no trabalho de 1928, foco de nossa atenção neste momento.

Em Elasticidade da técnica psicanalítica (1928/2011), Ferenczi se debruça sobre o modo de funcionamento do analista e sua metapsicologia. Mais do que proferir conselhos aos psicanalistas, o autor se interroga sobre as implicações do narcisismo aplicadas ao modo de atuação clínica; ou seja, ele aborda a hipocrisia dos clínicos que fazem uso do dispositivo da análise como forma de defesa contra as demandas dos analisandos. Não contente com a mera exposição da hipocrisia e dos possíveis efeitos iatrogênicos, Ferenczi propõe uma indicação de solução ao impasse: uma série de considerações levando em conta que é através da faculdade do "sentir com" que devem ser analisadas questões relativas ao momento e à forma como se comunica determinado conteúdo ao analisando; quando se pode considerar que o analista possui material suficiente para produzir uma interpretação; como é apropriado reagir a uma reação inesperada e em que momento o silêncio é uma forma de "tortura inútil" (1928/2011, p. 31).

Os apontamentos de Ferenczi relativos ao "sentir com" contidos na habilidade empática do analista direcionam os tipos de intervenção para o que seria o uso da função do tato. Sendo esta um dos elementos fundamentais para a clínica, a empatia constitui o que Kupermann (2017) considera um dos princípios fundamentais da ética do cuidado. Na medida em que Ferenczi se apropria, a seu modo, da categoria freudiana de tato (CANO; KUPERMANN, 2013), ele se torna o operador clínico essencial, que merece uma pormenorização.

A empatia é a habilidade relacional, estabelecida no campo transferencial, entre analista e analisando. Dela, se desdobra a compreensão da transferência enquanto um campo de compartilhamento afetivo, e é nesse encontro lúdico que se tem, entre os participantes, produções de sentidos que são particulares a cada um dos indivíduos, mas que podem ser permutados, contrapostos, comparados e analisados. Todavia, ao endereçar a transferência a uma relativa mutualidade, Ferenczi nos deixa o legado de pensar sobre os riscos da identificação do analista com os sofrimentos do analisando. Assim, é importante ressaltar que, se a empatia pressupõe a capacidade do analista de sentir, dentro de si, experiências que pertencem ao campo do analisando, podendo se misturar a esses afetos, isso não exclui, de forma alguma, a função de vigilância consciente do seu funcionamento mental. Dito de outro modo, apesar de ser fundamental "sentir com" os analisandos seus sofrimentos (e, assim, aproveitar a vantagem estratégica de ultrapassar as fronteiras da resistência), também é inestimável a atenção para a situação dinâmica em questão.

Circunstanciar esse direcionamento significa que ser empático - ao menos, como proposto por Ferenczi - é um movimento duplo e pendular de identificação e aproximação por um lado, e de retirada do investimento libidinal na figura do analisando por outro. Esse segundo tempo funciona para obter-se uma avaliação da situação feita com a frieza necessária para que ocorra uma intervenção. Com isso, busco reafirmar que, necessariamente, em nenhum caso, os sentimentos devem ser o único guia do analista (FERENCZI, 1928/2011 p. 32).

Ainda a respeito do momento correto no qual o analista pode se pronunciar, o autor é explícito em caracterizar metapsicologicamente o momento de fazer uma comunicação ao analisando. No sentido tópico, trata-se de "sentir com" em um nível pré-consciente, e não inconsciente - fato que é explicado por Ferenczi, pois o mesmo tem a preocupação de retirar do nível místico e intuitivo a faculdade do tato. Podemos nos questionar o que mobiliza tanto Ferenczi a dar ao tato e ao "sentir com" um lugar metapsicológico, e a resposta para tal problema deve ser encontrada em suas considerações a respeito do valor do trauma na constituição do psiquismo.

 

O retorno à centralidade do trauma como núcleo do sofrimento psíquico

Quando o papel da sedução infantil é retomado por Ferenczi enquanto o núcleo do pensamento psicanalítico (1930/2011, 1933/2011), surge a possibilidade de reeditar o que significa tal processo. De antemão, adianto que a consequência desse ressurgimento será interpretar o papel da técnica enquanto um processo de adaptação do analista às necessidades dos analisandos, para evitar repetir um fenômeno traumático. A esse respeito, Ferenczi dirá:

O que esses neuróticos precisam é de ser verdadeiramente adotados e de que se os deixe pela primeira vez saborear as bem-aventuranças de uma infância normal (...), a psicanálise moderna consegue restabelecer a harmonia destruída e corrigir a distribuição anormal da energia entre as forças intrapsíquicas, melhorando assim de forma notável as capacidades e a eficácia do analisando. Mas as forças intrapsíquicas apenas representam o conflito que se desenrolou na origem entre o indivíduo e o mundo externo (1930/2011, p. 77, grifo do autor).

A preocupação de Ferenczi relativa ao nascimento é de tons paradoxais. Ao mesmo tempo que o autor aponta o nascimento como um momento de sucesso dos processos de maturação biológicos, também o coloca como o momento em que a pulsão de morte e seus efeitos de desligamento se fazem mais fortes. Esse momento potencialmente traumatogênico da relação do indivíduo com o mundo precisa ser mediado por figuras de cuidado implicadas com o estabelecimento da comunicação com o infans.

Ferenczi compreende por trauma real um tipo de relação entre crianças e adultos que é perpassado por autoritarismos e desautorizações das formas de sentir particulares das crianças. Para ele, o substrato do encontro desse caso é a confusão de línguas. Em sua compreensão, o adulto traumatizador faz um uso do corpo da criança sem permitir que ela fantasie livremente sua sexualidade. Assim, trata-se de um retorno à teoria da sedução proposta por Freud, mas que, contudo, não retorna a uma categorização ultrapassada da Psicanálise. Ferenczi propõe uma torção importante nesse conceito: o trauma diz respeito à consequência que decorre da promoção de um sentido unívoco - e não compartilhado - da palavra (PINHEIRO, 1995). Impõe-se sobre a sexualidade infantil interpretações de sentidos através da ótica do adulto, e tais formulações submetem a criança a uma lógica precoce e inapreensível, pois estão além de seu momento de desenvolvimento psicossexual.

O dispositivo analítico clássico, segundo a ressalva feita por Ferenczi, na medida em que não considera a empatia como ponte central e configuradora do campo transferencial, acaba por impor uma relação de poder entre analista e analisando. Nela, o sentido acaba sendo fixado e único, construído através de uma interpretação dos conteúdos, veiculada por um suposto sujeito neutro e abstinente de afetos. Diante dessa visão sobre o trauma, surge a proposta de relaxamento como um princípio organizador básico do encontro. Essa modificação técnica está contida na noção da neocatarse - para Ferenczi, a total sinceridade, veiculada com tato, é o único artifício válido para lidarmos com analisandos traumatizados.

Por "sinceridade" compreendo uma articulação em oposição ao fator traumatogênico inicial. O analista deve admitir a ambivalência, a riqueza e a polissemia de sentidos que estão contidos na comunicação analítica, sem pretender assumir para si a função de quem detém as possibilidades de produzir sentido - como o adulto que significa o corpo e a sexualidade da criança. Todavia, não se trata de uma diretriz clínica atenta à rede linguageira que perpassa o enquadre. O analista deve perceber sensivelmente os movimentos afetivos que se produzem mediante o encontro da dupla que faz a análise e se debruçar sobre eles, questionando e produzindo sentidos compartilhados.

Ao comparar a situação do nascimento com os modos de trabalho do analista em sua clínica psicanalítica, Ferenczi aposta que é a repetição do trauma em análise que faz um sujeito sucumbir à doença psíquica. Dessa dinâmica, o autor introduz ao conjunto da problemática da prática clínica um aspecto relacional que até então não havia sido pormenorizado: o papel que o analista deve desempenhar, antes de ser interpretativo, diz respeito às funções de acolhimento de seu analisando, mediado por funções empáticas que estão presentes na comunicação não-verbal. Tendo em vista a fragilidade dos sujeitos que buscavam Ferenczi, observo que sua forma de se adaptar às necessidades de cada atendimento faz do autor, definitivamente, um seguidor da primeira regra de Hipócrates: primum nil nocere4.

A modificação técnica decorrente da concepção traz o trauma de volta para o centro da problemática psicanalítica e produz a concepção de que deve haver, na atmosfera transferencial com o analisando, um "princípio de permissão"5 (FERENCZI, 1930/2011) que autorize o analisando a sentir seus próprios sentimentos. Tal medida costuma ser entendida através da ideia de laissez-faire, que remonta a uma oposição frente ao desmentido. Nesse contexto, o analista não deve atrapalhar a regressão do analisando sob transferência, ou seja, o analista não deve insistir em frustrar as demandas de acolhimento e os pedidos de adaptação. Pelo contrário: faz-se necessário aceitar até certo ponto o que um analisando demanda, para que, a partir de um verdadeiro solo emocional, seja possível fazer uma interpretação honesta.

Tendo apontado tanto a gênese da doença neurótica como o fator que agrava tal intercorrência, seria mediante a elasticidade de posturas que a cura analítica poderia ser produzida. A figura do "joão-teimoso" (FERENCZI, 1928/2011) entra em cena para metaforizar a atitude terapêutica flexível, capaz de receber a expressão afetiva de hostilidade do analisando sem oferecer uma resposta igualmente hostil. Em outras palavras, contrapondo a fixidez de um analista que segue regras técnicas que procuram domar e extinguir a transferência negativa mediante interpretações tão hostis e selvagens como as expressões da afetividade desamparada e traumatizada de um sujeito, Ferenczi aponta como o analista deve absorver os ataques do analisando sem perder sua sustentação no solo teórico que garante a retomada de sua posição.

Kupermann (2008), a respeito da importância da sensibilidade do psicanalista no contexto analítico, comenta que a postura de Ferenczi diante da insensibilidade era de declará-la como uma defesa contra a afetação que se dá no encontro analítico. Nesse sentido, seria ainda possível atribuí-la a um caráter obsessivo, esquizoide ou mesmo perverso por parte dos analistas. Considero marcante como a qualidade do encontro afetivo era uma preocupação acentuada da clínica ferencziana, e tal postura se torna viável na medida em que se pode sentir com o analisando, sem ser como o mesmo (PINHEIRO, 2017).

Notadamente, Ferenczi abre caminho para toda uma série de desenvolvimento na Psicanálise quando fala a respeito da "atmosfera psicológica" (FERENCZI, 1930/2011). Ele aposta como a postura de frieza e distanciamento, úteis quando o objetivo é de observação objetiva e reservada, são fatores que reproduzem o trauma por desmentirem sua realidade. Em outra direção, prescreve uma atitude ativa de amistosa benevolência, capaz de evitar os efeitos iatrogênicos decorrentes da atualização do trauma.

Espero ter sido capaz de expor com clareza como Ferenczi propõe que a adaptação do analista-ambiente às demandas de seu analisando deve proporcionar uma regressão deste último à formas de contato afetivo relativas à infância, para que, nesse território, ele possa viver com espontaneidade. A ênfase dada por Ferenczi à relação do sujeito com os objetos externos abriu caminho para diversas formas de trabalho dentro da Psicanálise, sendo Winnicott um continuador natural desse pensamento.

 

As reverberações do pensamento de Ferenczi nas ideias de Winnicott

É de nosso amplo conhecimento que, para Winnicott (1963/1983), o desenvolvimento afetivo se dá na necessidade de Ser e na tendência inata à integração. A esse respeito, ressalto como inicialmente o bebê, que vive a experiência de não integração, vai obtendo uma série de conquistas psíquicas que o encaminham na direção da integração de uma unidade possível de ser, nomeada como Self.

A aquisição dessa unidade de sentido será fundamental na organização do sujeito. Ela se dará através da delimitação do mundo externo e do mundo interno, processo que depende do desenvolvimento da unidade psicossomática. A constituição do Self se dará pela apropriação da relação com a realidade externa, compartilhada consensualmente, como também através da sobreposição do mundo interno, processo inaugurado pela sensorialidade dos limites corporais (Winnicott, 1989b/1994). Notoriamente, esse percurso em direção à integração não é automático e está enraizado na função materna, que é uma forma especializada de cuidado capaz de promover a maturação, sendo constituída por meio de um tipo particular de comunicação.

As primeiras relações do bebê com seu entorno foram estudadas por Winnicott (1945/2011) a partir da díade mãe-bebê, levando em consideração a preocupação materna primária. Em sua teorização sobre o desenvolvimento emocional primitivo, o autor aponta como a amamentação funciona como um paradigma para a comunicação com o recém-nascido. Com isso, estou ressaltando que, nos momentos inaugurais da vida, mãe e bebê estão em estado de indiferenciação, não sendo possível pensarmos de forma cartesiana essa dupla, ou seja, separando mãe e bebê em duas unidades completas. Pelo contrário, o pensamento proposto por Winnicott vai na direção de conceber a relação entre mãe e bebê como uma mônada - o bebê e os cuidados promovidos pela mãe formam um só conteúdo, uma espécie de unidade dual na qual o recém-nascido é absolutamente dependente dos cuidados que recebe de sua mãe.

São as formas especializadas de cuidado materno que serão os primeiros responsáveis por promover a maturação do psiquismo. Para falar da qualidade desses cuidados, Winnicott (1958[1956]/2000) se refere à ideia de uma preocupação materna primária. A mãe, ainda no período anterior ao parto, ingressa em um estado de refinada identificação com seu bebê, que promove um aguçamento de sua sensibilidade para o que virão a ser as necessidades da criança no momento após o nascimento. Ressalto que, no meu entender, há uma correlação entre o tipo de relação promovida entre mãe e bebê e os apontamentos feitos no começo deste texto referentes ao tipo de sensibilidade presente na empatia proposta por Ferenczi. Sendo assim, para cumprir o objetivo de uma relação de aproximação e continuidade entre os autores, a melhor ponte está nas considerações que estabelecem, como a preocupação materna primária, em que a mãe é capaz de integrar seu bebê na medida em que pode oferecer holding enquanto ele se desenvolve naturalmente (WINNICOTT, 1945/2011). Assim, o bebê é, em grande parte, a própria mãe, e ela também é o bebê (WINNICOTT, 1958[1956]/2000).

Winnicott fala que, no momento da preocupação materna primária, existe também o ponto de vista da criança. De acordo com essa ótica, ainda não existe a possibilidade de perceber os cuidados maternos como tais, e, para o bebê, ainda não existe noção de exterioridade. Consequentemente, quando a mãe oferece o seio para que seu bebê se alimente, tudo o que se apresenta é a satisfação mágica de uma necessidade. Porém, mais do que uma superposição, essa experiência é também um atestado da presença concreta da mãe e de seu desejo de alimentar - atitude que proporciona ao bebê a satisfação de sentir a realidade do objeto de que necessitava enquanto uma criação sua. Trata-se de um momento fértil para o surgimento da área intermediária da experiência contida no cruzamento das duas realidades psíquicas, que cria uma situação de mutualidade (WINNICOTT, 1969[1968]/1996).

A comunicação contida na dada experiência serve de aporte metafórico para aproximar os autores e estabelecer uma conceituação do que seria a experiência de "sentir com". Ora, se a mãe, ao compreender empaticamente as necessidades de seu bebê, se oferece enquanto ambiente para que ele se identifique com ela e possa, a partir daí, integrar suas experiências no espaço e no tempo, torna-se possível afirmar que o analista, ao oferecer uma escuta sensível e benevolente aos afetos, também cria as condições para o desenvolvimento dos analisandos traumatizados. Nessa perspectiva, é fundamental marcar como a mãe é concebida por Winnicott como uma figura acometida pela preocupação materna primária, que tem a capacidade de regredir ao ponto de experimentar em si o que são as necessidades do bebê. Novamente, essa via sensível de compreensão pode ser explorada clinicamente como um tipo de atitude do analista, que se ocupa de promover um ambiente elástico, capaz de se adaptar ao ritmo do analisando, não impondo qualquer forma de direcionamento tácito (FERENCZI, 1928/2011).

A obra de Winnicott, na forma como estou propondo sua leitura, continua a esclarecer o estilo clínico de Ferenczi, na medida em que o autor inglês pode ser considerado um continuador das inaugurações do húngaro (Figueiredo, 2002). Ao tomar como axioma que Ferenczi é uma influência determinante para o pensamento de Winnicott, estou levantando a questão dos motivos que levariam o autor inglês a não citar esta fonte. Sei que explicar esta complexa relação - intimamente entranhada no jeito de ser de Winnicott e capaz de esclarecer o problema da "angústia de influência" - exige um trabalho à parte - que, para a minha sorte, já foi feito por Franco (2012). Logo, sem me deter nesse debate, irei apenas destacar que não citar suas influências é uma escolha do psicanalista-pediatra, que estava interessado em fazer com que suas ideias fossem usadas, e não apenas pensadas.

Concordo com Franco (2012) ao dizer que o pensamento de Winnicott funciona como uma fôrma delimitadora de contornos por onde seus leitores podem se espalhar e ocupar de forma pessoal. A imagem da fôrma (ou molde) é extremamente útil para mim neste contexto, pois contempla a dimensão de, ao ser retirada após o uso, deixar como rastro apenas seu negativo - efeito que Winnicott produz tanto de forma explícita, quando não cita suas influências, como implícita, sentida por mim no contato sensível com sua obra. Retomando a argumentação sobre as possibilidades de regressão para estados infantis e a utilização do espaço do jogo, acredito que esses elementos foram desenvolvidos por Winnicott, que compartilha da opinião de Ferenczi a respeito do tipo de manejo necessário com casos de analisandos severamente traumatizados. O autor inglês compreende os traumatizados interpretando-os enquanto sujeitos paralisados em seu processo de desenvolvimento e com uma integração egoica que se encontra comprometida. Para tais casos, a análise deve lidar com os estágios iniciais do desenvolvimento emocional primitivo.

Em um trabalho desse porte, a ênfase recai sobre o manejo atento das necessidades dos analisandos. Comparando a forma como o cuidado materno via holding é praticado na atenção materna primária com o tipo de postura analítica que deve ser assumida para tratar dos pacientes em questão, compreendo que essa postura clínica deve garantir os aspectos concretos do setting, como horários e o uso ou não do divã, para fornecer ao analisando algo próximo à ilusão de sustentação absoluta. Dito de outro modo, trata-se de criar condições de confiabilidade para que a regressão à dependência seja possibilitada - atividade viabilizada através do manejo que se sustenta pela empatia capaz de captar quais são as necessidades básicas e imediatas de cuidado.

Ressalto ainda que, por "manejo", Winnicott se refere à capacidade do analista de ser um bom ambiente, isto é, de adaptar-se até certo ponto, suficientemente bem, aos modos de subjetivação do analisando - passagem que remete à postura ferencziana a respeito da "sentinela", que monta guarda diante da mistura intersubjetiva que tais situações induzem.

As formulações elaboradas por ambos os autores vão em direção oposta às noções clássicas da psicanálise freudiana, que pensavam o manejo como dosagem de frustração necessária para manter o fluxo da associação livre. Não é necessário muito esforço para perceber como as ideias de Ferenczi contidas em A adaptação da família à criança (1928/2011), a respeito da adaptação ativa do ambiente, fertilizaram o solo para o desenvolvimento posterior de Winnicott. Nesse trabalho, Ferenczi apontou como pode vir a ser traumático o momento do desmame e a supressão de maus hábitos nas crianças, se seus pais não forem capazes de se lembrar de sua própria infância e, desta forma, adquirirem uma compreensão profunda das vivências infantis.

A falta de adaptação do ambiente à experiência infantil promove uma espécie de trauma, que, no sentido ferencziano do termo, tem por consequência o risco da progressão traumática até o ponto da formação de um falso self, como concebido por Winnicott (1949/2000, 1945/2011). Winnicott (1986/1999) dá continuidade à visão de Ferenczi sobre a adaptação da família à criança, apontando como uma falha do ambiente no momento da dependência absoluta, fruto de intrusão perturbadora ou do abandono, acarreta uma ruptura na continuidade do ser diametralmente oposta ao desenvolvimento normal, isto é, aquele onde as reações espontâneas, guiadas pelo gesto criativo, constituem o mundo.

O bebê/sujeito traumatizado precisa estar atento ao ambiente o tempo todo e termina por buscar um controle excessivo desse espaço mimetizando os adultos à sua volta e constituindo um jeito de ser no mundo com os outros que não só é bem adaptado - diria excessivamente bem adaptado -, mas também sustentado pelo intermédio de uma base de submissão ao ambiente. Colocando mais uma vez os autores em franco diálogo, imagino que Ferenczi interpretaria como uma "progressão traumática" (FERENCZI, 1933/2011) essa forma de desenvolvimento descrita por Winnicott. Tendo em vista esse desenvolvimento psicopatológico, imagino que ao analista cabe:

restituir as condições para que o analisando volte a ter autonomia para enfrentar seus problemas e para viver sua vida por si mesmo, ainda que seja uma vida sofrida, mas sem falsas existências (falso self) e sem falsas soluções (uma solução falsa é aquela que não foi encontrada pelo próprio analisando). (FULGÊNCIO, 2011 p. 53)

Quando penso a respeito das formas como o analista pode mobilizar o setting para garantir uma forma de trabalho dentro das diretrizes citadas, vem em minha cabeça a ideia de jogo de Winnicott (1953[1951]/2000, 1971/1975). Tendo em vista que se trata do gesto criativo e mesmo da própria capacidade de criação, buscarei, a seguir, referenciar como a capacidade de regressão em análise é capaz de fortalecer as capacidades do analisando para constituir um gesto espontâneo. Agora, estou me remetendo diretamente às concepções sobre a modalidade de funcionamento psíquico presente no período da dependência absoluta, já explicado em outro momento deste texto. Mas, ao retornar uma vez mais a esse ponto, pretendo destacar como a "ilusão de onipotência" que ocorre nesse período é fundamental para compreendermos o tipo de trabalho proposto pelo autor.

A ideia de uma ilusão de onipotência diz respeito à falta de destacamento que ocorre entre o eu e a alteridade, momento em que o bebê sente criar seu próprio ambiente cuidador. O "objeto subjetivo" se constitui desse campo da experiência e é exemplificado por Winnicott na figura do seio materno. Esse objeto estaria, em um primeiro momento, sob controle mágico pelo bebê. Nesse momento, surge o que o autor chama de experiência de onipotência, sobre a qual se dá a integração do self, espaço em que o bebê tem a oportunidade de constituir, nas relações com o mundo, uma experiência de verdadeira criatividade, possibilitada pelo espaço transicional, no qual o brincar (seja ele solitário ou compartilhado) será o modo do bebê de criativamente constituir seu mundo e dar sentido às suas experiências. Este viver criativo, como é explicado por Winnicott (1971/1975), só pode se dar na terceira área da experiência, isto é, no espaço transicional - um lugar onde os objetos subjetivos, criados pelo bebê, se encontram com os objetos objetivos fornecidos pelo ambiente. Daí decorre a já explicitada relação mãe-bebê.

É ímpar como a falha no cuidado mais primitivo tem efeitos desastrosos, pois caracteriza uma ruptura na continuidade do ser. Contudo, tendo em vista que esse cuidado deve prezar pela adaptação suficientemente boa da mãe, não sendo uma tentativa maníaca de controle de todas as variáveis do cenário ou mesmo de uma compreensão perfeita e integral das necessidades do bebê, está em jogo a capacidade de desiludir gradativamente o sujeito de sua onipotência. Tal processo dinâmico ocorre clinicamente dentro de um trabalho feito pela via regressiva.

Concluindo, a regressão em análise é um recurso terapêutico proposto tanto por Winnicott como por Ferenczi, cada um à sua maneira, enquanto um retorno estratégico à situação original e bem-sucedida dos momentos mais primitivos do desenvolvimento. Para ambos, a justificativa quanto ao uso dessa ferramenta está no fato de que ela permite ao analisando a possibilidade de voltar a se desenvolver a partir dos pontos que ficaram congelados em decorrência de experiências traumáticas defensivas.

Dessas considerações, entendo que Ferenczi inaugurou uma perspectiva clínica cuja técnica visa validar as ações espontâneas dos pacientes e a revivescência de suas tendências originais, in loco, postas em ação dentro da dinâmica transferencial com o analista. A manutenção de um setting planejado para tolerar as regressões aos estados infantis de dependência dos pacientes e, inclusive, acolher os estados afetivos que antes eram vividos de forma dissociada é uma positivação da regressão6 em análise como ferramenta terapêutica eficiente, viabilizada pelo uso da empatia do analista, que, ativamente, evita ser ativo - atitude paradoxal cujo resultado é a manutenção de uma postura capaz tanto de resistir, como de consentir e aceitar servir de sustentação para o paciente.

Por último, percebo nas considerações de Winnicott sobre o gesto criativo um modo pelo qual tais modalidades de relação empáticas podem se desenvolver. Dito de outro modo, a ideia winnicottiana em questão constitui a direção do tratamento, marcada pelo abandono de uma perspectiva mecânica do mesmo, ou, como diria Winnicott a esse respeito:

Num contexto profissional, dado o comportamento profissional apropriado, pode ser que o doente encontre uma solução pessoal para problemas complexos da vida emocional e das relações interpessoais; o que fizemos não foi aplicar um tratamento, mas facilitar o crescimento. (WINNICOTT, 1986/1999, p. 113-114).

Espero ter conseguido transmitir de forma suficientemente clara o meu ponto de vista a respeito de como Winnicott desenvolveu o pensamento de Ferenczi a respeito das relações com o objeto, bastando agora salientar que, na visão do pediatra e psicanalista inglês, a constituição subjetiva se dá através de um processo de desenvolvimento, e tal contribuição coloca adiante a compreensão das relações do ser com os objetos - proposta que, no percurso analítico, indica um horizonte de encontro afetivo que ocorre na relação entre a dupla, locus do gesto criador.

 

 

Referências

AVELAR, André S. P. O psicanalista diante do vazio. Cadernos de Psicanálise-SPCRJ, Rio de Janeiro, v. 30, n. 33, p. 177-196, 2014.         [ Links ]

CANO, Tatiana; KUPERMANN, Daniel. O uso da Einfühlung em Freud no horizonte da dimensão sensível da experiência psicanalítica. Elasticidade de limite na clínica contemporânea. São Paulo: Escuta, 2013.         [ Links ]

FIGUEIREDO, Luís Claudio. A tradição ferencziana de Winnicott - apontamentos sobre regressão e regressão terapêutica. Revista Brasileira de Psicanálise, São Paulo, v. 36, n. 4, p. 909-928, 2002.         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1909). Transferência e introjeção. São Paulo: Martins Fontes, 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 1).         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1919a). A influência exercida sobre o analisando em análise. São Paulo: Martins Fontes, 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 3).         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1919b). Dificuldades técnicas de uma análise de histeria. São Paulo: Martins Fontes, 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 3).         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1921). Prolongamentos da "técnica ativa" em psicanálise. São Paulo: Martins Fontes, 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 3).         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1926). Contraindicações da técnica ativa. São Paulo: Martins Fontes, 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 3).         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1927). O problema do fim da análise. São Paulo: Martins Fontes. 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 4).         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1928). Elasticidade da técnica psicanalítica. São Paulo: Martins Fontes, 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 4).         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1930). Princípio de relaxamento e neocatarse. São Paulo: Martins Fontes, 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 4).         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1932). Diário clínico. São Paulo: Martins Fontes, 1990.         [ Links ]

FERENCZI, Sándor (1933). Confusão de língua entre os adultos e a criança. São Paulo: Martins Fontes, 2011. (Obras completas Sandór Ferenczi, 4).         [ Links ]

FRANCO, Wilson. Autorização e angústia de influência em Winnicott. Dissertação (Mestrado). Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo, IPUSP, São Paulo, 2012.         [ Links ]

FREUD, Sigmund (1904). O método psicanalítico de Freud. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2017. (Obras completas, 6).         [ Links ]

FREUD, Sigmund (1918[1914]). História de uma neurose infantil. Rio de Janeiro: Companhia das Letras, 2010 (Obras completas, 14).         [ Links ]

FULGENCIO, Leopoldo. A ética do cuidado psicanalítico para D. W. Winnicott. A PESTE: Revista de Psicanálise e Sociedade e Filosofia, v. 3, n. 2, 2011.         [ Links ]

HAYNAL, André. Ferenczi now and then: an introduction to his world. In: Ferenczi and His World: Rekindling the Spirit of the Budapest School. USA: Karnac, 2013.         [ Links ]

KUPERMANN, Daniel. Presença sensível: cuidado e criação na clínica psicanalítica. São Paulo: Civilização Brasileira, 2008.         [ Links ]

KUPERMANN, Daniel. Estilos do cuidado: a psicanálise e o traumático. São Paulo: Zagodoni Editora, 2017.         [ Links ]

MAIA, Marisa S. Por uma ética do cuidado. Rio de Janeiro: Garamond, 2009.         [ Links ]

PEIXOTO JUNIOR, Carlos A. Sobre regressão e novo começo: Balint e a técnica psicanalítica. Revista Percurso, v. 29, n. 2, 2002.         [ Links ]

PINHEIRO, T. Ferenczi: do grito à palavra. Rio de Janeiro: Zahar, 1995.         [ Links ]

PINHEIRO, T. Ferenczi. Rio de Janeiro: Casa do Psicólogo, 2017. (Coleção clínica psicanalítica).         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1945). Primitive emotional development. Through paediatrics to psycho-analysis. London: Karnac Books, 2011.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1949). A mente e sua relação com o psicossoma. In: WINNICOTT, Donald Woods. Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas. Rio de Janeiro: Imago, 2000.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1951). Objetos transicionais e fenômenos transicionais. In: WINNICOTT, Donald Woods. Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas. Rio de Janeiro: Imago 2000. p. 316-331.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1953[1951]). Objetos transicionais e fenômenos transicionais. In: WINNICOTT, Donald Woods. Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas. Rio de Janeiro: Imago, 2000.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1958[1956]). Preocupação materna primária. In: WINNICOTT, Donald Woods. Da pediatria à psicanálise: obras escolhidas. Rio de Janeiro: Imago, 2000.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1963). Moral e educação. In: WINNICOTT, Donald Woods. O ambiente e os processos de maturação. Porto Alegre: Artmed, 1983.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1969[1968]). A amamentação como forma de comunicação. In: WINNICOTT, Donald Woods. Os bebês e suas mães. São Paulo: Martins Fontes, 1996.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1970). A experiência mãe-bebê de mutualidade. In: WINNICOTT, Donald Woods. Explorações Psicanalíticas. São Paulo: Artmed, 1994.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1971). O brincar: a atividade criativa e a busca do eu (Self). In: WINNICOTT, Donald Woods. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1986). Tudo começa em casa. São Paulo: Martins Fontes, 1999.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1987). A mãe dedicada comum. In: WINNICOTT, Donald Woods. Os bebês e suas mães. São Paulo: Martins Fontes, 1996.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1989a). Explorações psicanalíticas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.         [ Links ]

WINNICOTT, Donald Woods (1989b). O conceito de trauma em relação ao desenvolvimento do indivíduo dentro da família. In: WINNICOTT, Donald Woods. Explorações psicanalíticas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.         [ Links ]

 

Artigo recebido em: 05/03/2018
Aprovado para publicação em: 02/05/2018

Endereço para correspondência
Bartholomeu de Aguiar Vieira
E-mail: bartholomeu.vieira@gmail.com

 

 

*Mestre em Psicologia Clínica, Instituto de Psicologia/Universidade de São Paulo (USP), especialista em Psicologia Clínica com crianças/Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-RIO).
1Para um percurso a respeito dos efeitos dessa noção na prática clínica contemporânea, convido o leitor a ler O psicanalista diante do vazio (AVELAR, 2014).
2Por questões relativas ao objetivo do trabalho, isto é, horizontalizar as modificações técnicas de Ferenczi, tornando-as recursos dos analistas, e apontar Winnicott como um continuador de sua obra, não conduzirei o texto em direção a uma explicação sobre as particularidades dos pacientes marcados pela Verleugnung, pois isso acarretaria em um desvio muito longo. Contudo, sugiro conferir o trabalho O terceiro tempo do trauma, de Dal Molin (2013).
3Verleugnung é uma expressão que comporta algumas traduções. Por vezes, encontramos "desmentido"; outras vezes, "desautorizado". Escolhi usar a primeira opção, pois ela tem se tornado mais famosa e talvez se consagre nos próximos anos como oficial; contudo, ainda acredito que é interessante sustentar a incerteza quanto à tradução, pois aposto que a diferença de ênfase (no processo de trauma ou no processo terapêutico) será o fator definidor dessa tradução.
4"Primeiro, não prejudicar".
5Prinzip der Gewährung (FERENCZI, 1930/2011).
6Em nome da organização coerente de ideias e sistematização do pensamento, não é possível, no contexto deste trabalho, avançar sobre as pertinentes continuações feitas por Balint a respeito dessa modalidade de relação inaugurada por Ferenczi. No entanto, remeto o leitor interessado ao trabalho de Peixoto Junior (2002) sobre o tema do "novo começo".

Creative Commons License