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Cadernos de psicanálise (Rio de Janeiro)

On-line version ISSN 1413-6295

Cad. psicanal. vol.40 no.38 Rio de Jeneiro Jan./June 2018

 

ARTIGOS

 

Figurações da adolescência e juventude na atualidade: metáforas da cultura

 

Figurations of adolescence and youth in the present: metaphors of culture

 

 

Maria de Fátima Pessoa de Assis*

Universidade Federal de Goiás - UFG - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este trabalho teve como objetivo analisar a juventude como metáfora da cultura na atualidade. Trata-se de pesquisa teórica, fundamentada na psicanálise desde Freud e em Fábio Herrmann, autor que nos permitiu realizar a recuperação do método psicanalítico na análise da cultura contemporânea. Neste quadro de referências, a cultura é psique mundanizada, concreta, sempre ativa, é o real humano simbólico. A porção do real sequestrada no interior do sujeito e que se esforça por representar a realidade é a identidade. A partir das leituras realizadas verificamos que o adolescente e o jovem metaforizam em si as dissonâncias do campo sociocultural, contexto em que encenam, em suas identidades, a crise de legitimação que assola a sociedade e a cultura na atualidade.

Palavras-chave: Adolescência, Juventude, Psicanálise, Cultura.


ABSTRACT

This work aimed to analyze youth as a metaphor of culture nowadays. It is a theoretical research, based on psychoanalysis since Freud and Fábio Herrmann, author who allows us to realize a recuperation of the psychoanalytical method in the analysis of the contemporary culture. In this frame of references, culture is the materialized, concrete and always active psyche, it is the symbolic human real. Identity is the portion of real that is kidnapped inside of the subject, and that strives to represent reality. From the readings performed, we verified that the adolescent and the young metaphorize in themselves the dissonances of the sociocultural field, context in which they display their identities, as well as the crisis of legitimation that devastates society and culture today.

Keywords: Adolescence, Youth, Psychoanalysis, Culture.


 

 

Introdução

Na encruzilhada entre a infância e a idade adulta, muitos perigos no caminho. Quem sou eu? O que buscar? O deixar a casa dos pais, este porto seguro, quando há, e ganhar as ruas, acompanhado pelo fascínio que este novo horizonte abre, é um movimento próprio ao adolescente. Na atualidade, no entanto, nem sempre ele sai de casa. Frequentemente troca as praças e ruas pelo próprio quarto, onde faz contato via on-line com seu grupo de pares, quando nas redes sociais conversam, jogam e trocam imagens pelos computadores interconectados.

Com efeito, este pequeno homem ou mulher não mais deseja revirar o mundo instituído e revitalizá-lo com suas reinvenções e interrogações, mas muitas vezes está em busca do objeto mesmo, sem mediações ideológicas ou poéticas. Tal constatação não pode passar despercebida ao olhar do pesquisador atento às mutações produzidas pelas sociedades de consumo da atualidade e suas implicações para as subjetividades.

Sendo assim, neste estudo, procuramos realizar uma reflexão sobre uma das metáforas da cultura na atualidade: a juventude. Para tanto, elegemos leituras que pudessem nos informar sobre os possíveis entrelaçamentos entre psicanálise, história e cultura, com destaque para a noção de "corpo da representação inconsciente" como recurso para conhecermos o que se passa nas subjetividades, na atualidade.

A psicanálise é tomada como instrumento teórico para realizarmos uma reflexão crítica da cultura atual, uma "psicanálise extramuros", expressão cunhada por Laplanche (1988) para designar o emprego do método psicanalítico à análise de questões de ordem social e cultural, contexto em que ela nos auxilia a elucidar o plano do imaginário coletivo.

A presente pesquisa situa-se no contexto dos estudos que abordam as consequências, para as subjetividades, da crise de legitimação que assola as sociedades na atualidade, em razão das transformações incessantes produzidas pelo capitalismo globalizado, sob o efeito da economia de mercado e da aceleração tecnológica (MELMAN, 2008; SAFATLE, 2008; SLOTERDIJIK, 2011; TÜRCKE, 2010; BAUMAN; DONSKIS, 2014; BIRMAN, 2014).

Trata-se de pesquisa teórica, que visa atualizar a problemática da adolescência, contextualizando-a nos enredamentos das sociedades de mercado, estes que tornam complexos os processos de constituição identitária do adolescente, em virtude do intenso desamparo simbólico produzido pela desestabilização das instituições normativas como Estado, Escola, Igreja e Família. Parte de nossa argumentação teórica resulta de pesquisa anterior1, quando defendemos a tese de que o corpo é trânsito de representações, metáfora da cultura, estudo no qual nos baseamos na Teoria dos Campos de Fábio Herrmann para tecermos uma reflexão sobre a cultura contemporânea.

Fábio Herrmann realiza uma interpretação da psicanálise que concebe o inconsciente como sendo o nosso mundo, o real psíquico que é a realidade tal qual o homem a representa e sendo assim, o real humano psíquico passa a ser entendido como sendo a própria cultura, um sistema gerador de sentidos. A cultura procura criar um mundo de dimensões humanas e um sistema de representações que dê conta, simultaneamente, da interioridade do sujeito e do exterior, representações de identidade e realidade (HERRMANN, 1999).

A atualidade aqui considerada é o período histórico conhecido como modernidade tardia (GIDDENS, 1991), contexto em que as consequências da modernidade estão se tornando radicalizadas e universalizadas, como a interdependência em escala mundial das economias e mercados, o ritmo vertiginoso das transformações tecnológicas, a intensificação do consumo, a intensa conexão entre o local e o global, as relações sociais desencaixadas ou deslocadas de seus contextos locais e reestruturadas através de extensões indefinidas de tempo-espaço, dentre outros. Ao longo do texto, o uso dos termos "atualidade" e "contemporaneidade" procura seguir a nomenclatura de cada autor, mas tendo em vista a noção de modernidade tardia, tal qual proposta por Antony Giddens, de modo que evitaremos entrar no debate que discute se estamos na pós-modernidade ou na modernidade avançada.

Verificamos que as mutações históricas e culturais engendram novos padrões de socialização, demandados pelo capitalismo de consumo, os quais passam a requerer um tipo de subjetividade adaptada não mais a instituições normativas que fixam modelos de conduta, mas a dispositivos de controle que invocam a flexibilização e a inconsistência dos modelos identitários e uma atitude de descrença em relação às normas e leis. Pensar a esfera da cultura hoje, a partir do aporte teórico da psicanálise, requer que possamos fertilizar seus instrumentos teóricos à luz das mutações histórico-culturais que lançam o sujeito em uma realidade que não é "levada a sério" e em um mundo "sem culpa", inexoravelmente ligado à lógica do mercado de consumo, onde as subjetividades devem mudar continuamente, de um instante a outro.

Neste cenário de mutações contínuas verificamos uma crise do laço social (RASSIAL, 2012), sinalizada pelo declínio do pai simbólico, lócus de cultura e das leis que regem o pacto social.

Iniciaremos nossa abordagem ao tema pelo esclarecimento de alguns conceitos que foram utilizados como operadores analíticos de nosso estudo. A seguir, nos reportaremos ao tema da juventude em seus aspectos históricos e conceituais. Por fim, iremos discutir a problemática do jovem no âmbito da crise do laço social nas sociedades ocidentais da atualidade, momento em que iremos utilizar uma pequena vinheta do cenário urbano para ilustrar nossa argumentação.

 

O real humano simbólico

A juventude é imagem pregnante e como tal circula como um dos ideais do imaginário social, metáfora do sucesso e da estética na atualidade, quando todos querem parecer jovens. Além disso, o corpo jovem é plástico, alvo de reconfigurações constantes e emblemático da fluidez identitária e da desestabilização generalizada dos valores e conhecimentos.

Para a psicanálise freudiana, o corpo é psicossexual (FREUD, 1905/1980), ou seja, é corpo da representação inconsciente, o que permite a experiência de gratificação de desejos e atribuição de sentido ao vivido, enigma a produzir incessantemente uma linguagem metaforizada que nos desafia a perscrutarmos os sentidos e significados contidos em suas diversas formas de expressão. No dicionário Houaiss (2009), a palavra "metáfora" aparece assim descrita:

Designação de um objeto ou qualidade mediante uma palavra que designa outro objeto ou qualidade que tem com o primeiro uma relação de semelhança. (...) Sentido etimológico: do latim metaphorae; do grego methaphorá - mudança, transposição do sentido próprio ao figurado; do verbo transportar (HOUAISS; VILLAR, 2009, p. 1017).

As metáforas nos transportam para o real humano, universo de representações que vão compondo um tecido simbólico por intermédio do qual a realidade passa a fazer sentido para o homem. A possibilidade de obter outros sentidos encontra-se no cerne da comunicação advinda do inconsciente, cuja linguagem metaforizada revela-nos a riqueza infindável de possibilidades de representações de que o ser humano é capaz.

Para elaborarmos nossa reflexão sobre as metáforas da cultura, utilizaremos também alguns dos conceitos de Fábio Herrmann, particularmente em alguns pontos centrais:

- a consideração que este autor faz da teoria implícita do real, a realidade como representação subjetiva ou psique social, a qual possui as mesmas características do desejo inconsciente (HERRMANN, 1999);

- a relação dialética entre realidade e identidade, o que nos leva a conceber o inconsciente enquanto real humano, estrutura produtora de sentidos, que é sempre tanto singular quanto coletiva (HERRMANN, 1991, 1999, 2001);

- o valor heurístico do disfarce, segundo o modelo da interpretação dos sonhos de Freud em que os conteúdos do inconsciente obtêm acesso à superfície representacional da consciência por meio dos artifícios da censura. As metáforas-disfarces são os produtos da psique social, nossos pontos nodais, marcas simbólicas que nos mobilizam ao exercício de reflexão e deciframento (HERRMANN, 1999).

Dentro deste quadro de referências, a cultura é psique mundanizada, concreta, sempre ativa, é o real humano simbólico. A porção do real sequestrada2 no interior do sujeito e que se esforça por representar a realidade é a identidade (HERRMANN, 1999, 2001).

O autor procura explorar a teoria implícita do real que concebe a realidade como estrutura produtora de sentidos emocionais3, esta que somente chegou a representar-se por meio da consciência humana e que se expressa por meio do pensamento que toma forma na cultura. O inconsciente então seria a lógica que estrutura o pensamento: "o lugar do inconsciente só pode concebivelmente ser a lógica que organiza, seleciona e constrói nosso pensamento, o campo de toda e qualquer relação psíquica representada" (HERRMANN, 2001, p. 289).

Desta forma, para o autor, é preciso descrever o mundo real no âmbito da teoria implícita do real, entendido como o próprio processo psíquico que se encontra encarnado na cultura.

Ao trabalharmos com a teoria implícita do real, atingimos o realismo fantástico, pois o real humano é efeito do próprio modo de funcionamento inconsciente: "o inconsciente não é, de fato, individual nem coletivo, mas é o real, enquanto real humano. Surge do mundo para o homem e do homem para o mundo, de cá para lá e de lá para cá, num conflito produtivo e insolúvel" (HERRMANN, 2001, p. 294).

Dentro deste quadro de referências é que podemos compreender o valor do modelo de experimentação epistemológica proposto por Herrmann quando toma o campo representacional para estudo, em sua dupla face, interna e externa, respectivamente identidade e realidade. Nosso recorte de estudos são os campos de significação inconscientes, metáforas da identidade e da realidade, subconjuntos particulares, circunstanciais, histórica e socialmente determinados. A consideração da comunicação metaforizada como via de acesso aos campos de significação inconscientes é o exercício epistemológico de considerar a presença de sentidos outros, em produtos simbólicos contidos na cultura.

Herrmann (1999) nos mostra que a imagem de si mesmo desdobra-se em muitos "eus", posto que são inúmeras as identificações que o sujeito vai incorporando, ao longo de sua vida. Na adolescência, entretanto, vários "eus" são sacrificados para que o indivíduo adulto receba sua forma principal. Sendo assim, quando se estabelece o mundo adulto, as regras do quotidiano impõem ao sujeito que se encarne em certas referências identitárias, negando as demais.

No esforço por representar-se, o sujeito elege algumas lembranças e certas identificações, sacrificando e negando outras. Cada estrutura de nosso psiquismo apresenta o equivalente a uma identidade, isto é, mantém determinadas representações, às quais se deve manter fiel para que seja sustentada a ideia de que "isto sou eu". Afirma o autor: "a noção de identidade implica a de igualdade no tempo ou mesmidade. Possui identidade aquilo ou aquele que se mantém idêntico a si próprio por um tempo razoável. A mesmidade é uma preciosa característica humana, apesar de ser fatalmente ilusória" (HERRMANN, 1999, p. 182).

Por que o autor afirma que a noção de um eu total, unificado e coerente é ilusória? Porque para se manter, este eu total deve esforçar-se de forma ininterrupta por minimizar discrepâncias e negar percepções de diferenças entre o que fazemos de fato e o que pensamos ser. Na modernidade tardia, a luta por representar-se torna-se especialmente dramática na adolescência, uma vez que o sujeito contemporâneo experimenta uma crise constante de realidade e identidade, em razão da perda de estofo simbólico em um mundo em constante mutação.

Tendo em vista estas considerações preliminares, tomamos para análise uma das metáforas da cultura na atualidade: a juventude.

 

Figurações contemporâneas da juventude

A adolescência e a juventude são figurações que regem nossos parâmetros de ser e estar no mundo. Pelas forças do capital, em plena modernidade tardia, ser jovem virou slogan, clichê publicitário, um imperativo categórico. Neste cenário de imagens mutantes e falseadas, nossas referências conceituais para definir o que é a juventude são dificultadas. Kehl (2006) é porta-voz do que pretendemos expressar:

Difícil precisar o que é juventude! Quem não se considera jovem hoje em dia? O conceito de juventude é bem elástico: dos dezoito aos quarenta, todos os adultos são jovens. A juventude é um estado de espírito, é um jeito de corpo, é um sinal de saúde e disposição, é um perfil do consumidor, uma fatia de mercado onde todos querem se incluir (KEHL, 2006, p. 89).

A autora acrescenta que passamos de uma longa juventude, direto para a velhice, deixando vazio o lugar que deveria ser ocupado pelo adulto. Mas este grande prestígio da juventude é recente. Vamos então apresentar alguns elementos históricos e de definição para podermos melhor compreender este nosso personagem principal.

Ao procurarem delimitar o campo de pesquisa da adolescência e juventude, autores como Carrano (2000), Dayrell (2003), Pais (2005) e Matheus (2006) nos mostram que há uma distinção recorrente entre estes dois termos. Embora ambas as acepções designem a passagem da infância ao mundo adulto, a juventude é comumente compreendida como um momento posterior à adolescência.

O termo "juventude" tem sido mais utilizado em trabalhos de cunho sociológico, enquanto "adolescência" vem sendo usado com mais frequência nos estudos do campo da psicologia, ainda que a utilização de ambos os termos, sem distinção, seja bastante usual, de acordo com os autores mencionados. Neste trabalho optamos por usar os dois termos como sinônimos e também combinados, com o objetivo de destacar a amplitude de nosso foco de análise, que pretende abarcar tanto o olhar psicológico, quanto sociocultural, assim como os momentos iniciais (desde a puberdade) e mais tardios da adolescência, também conhecido como juventude.

Com efeito, trabalhos como os de Calligaris (2000), Dayrell (2003) e Kehl (2006), dentre outros, vêm apontando uma característica comum presente nos estudos sobre a adolescência e juventude, a de que é possível marcar um início da adolescência, quando o sujeito adquire a puberdade4 e a capacidade de procriar, mas fica cada vez mais difícil precisar critérios para delimitar quando se sai dela.

Carrano (2000) defende a posição de que como as idades não possuem um caráter universal, definir o que é ser jovem por critérios de faixa etária é um modo simplista de abordagem. Entende ser mais adequado compreender a juventude como uma complexidade variável, que se distingue por suas variadas maneiras de existir, nos diferentes espaços sociais.

Calligaris (2000) nos mostra que a adolescência como área de investigação é inaugurada por Stanley Hall, em 1904, com o trabalho Adolescence: its psychology and its relations to physiology, anthropology, sociology, sex, crime, religion and education. Além disso, o autor informa que nesta obra, Hall se preocupa com a precocidade dos jovens de seu tempo e foi à luta para que os benefícios da infância se prolongassem, de modo a atingir também a juventude, pois entendia que o jovem precisava de proteção por mais tempo.

O segundo texto fundador seria o trabalho da antropóloga Margaret Mead, Coming of age in Samoa, de 1928, estudo que procura confrontar com Hall, ao mostrar que a adolescência atormentada e difícil não é nenhuma necessidade fisiológica, nenhuma fatalidade, mas uma produção de nossa cultura.

O próximo trabalho listado por Calligaris é Delinquent boys: the culture of new gang, de Albert Cohen, trabalho clássico sobre os jovens delinquentes, escrito em 1955. Para Calligaris, a ideia da juventude como oposição à cultura e ao mundo adulto instala-se por impacto deste trabalho de Cohen.

Como contraponto a Cohen, Daniel Offen veio lembrar que os adolescentes reais são mais normais do que a "adolescência delinquente" de Cohen, argumento desenvolvido em seu trabalho de 1969, The psychological world of the teenager: a study of normal adolescent boys.

Outro marco importante é o trabalho de Erik Erikson, Identidade, juventude e crise, lançado em 1968. O autor entende a crise da adolescência como efeito dos nossos tempos. Para ele, a rapidez das mudanças da modernidade torna problemática a transmissão de uma tradição de pais para filhos adolescentes. Estes devem, então, lutar para se constituir e se inventar sem o auxílio de referências estáveis. Enfim, nestes trabalhos pioneiros mencionados por Calligaris, a adolescência se constitui e cresce como objeto autônomo de preocupação, perplexidade, reflexão e pesquisa.

Canevacci (2005), por sua vez, destaca que a juventude nasceu nos anos 1950, com o jovem teenager, o qual se afirmou na comunicação metropolitana do ocidente, principalmente por meio da difusão da mídia e do cinema. Para este autor, o contexto pós-guerra produziu a ascensão das culturas juvenis como "subculturas" e como "contraculturas", espaços de expressão veiculados pelos meios de comunicação social.

Canevacci informa que o cruzamento entre a escola de massa, a mídia e a metrópole fez emergir a constituição moderna do jovem como categoria social. Neste contexto urbano, a partir destes três eixos, os jovens são descobertos como consumidores privilegiados para uma produção de massa. A imagem do jovem conquista, então, um novo sentido, o de parâmetro para uma nova ordem social, marcada pela novidade. Conforme este autor, a expressão "contracultura"

(...) nasce pelo final dos anos 1960 e morre no início dos anos 1980. O prefixo "contra" atestava a dimensão da oposição que as novas culturas juvenis dirigiam à cultura dominante ou hegemônica. Ser contra significava que, antes de qualquer possibilidade de falar em cultura, aliás, ainda antes de chegar ao termo "cultura", era preciso ser antagonista, opositor. O prefixo não era casual: enfatizava também lexicologicamente um antes que informava tudo o que vinha depois. Por isso o duplo sentido do vocábulo. Por um lado, era possível produzir cultura somente se se declarasse, preventiva e publicamente, contra; era, pois, necessário postar-se contra a cultura dominante; não só contra os valores, os estilos de vida, as visões de mundo, ao poder, mas também contra a cultura intelectual dominante (a filosofia, a religião, a arte...) (CANEVACCI, 2005, p. 13).

Entretanto, Canevacci assinala que todo este modelo da contracultura não funciona mais. Um processo que culminou nos anos de 1990 dissolveu qualquer possibilidade de uma cultura dominante, pois hoje, as culturas juvenis não mais se dedicam a contrastar-se com as hegemonias culturais. Elas não são mais contra, pois partem da premissa de que a cultura dominante diluiu-se, fragmentou-se numa série de poderes em competição entre si. Hoje falamos em "culturas extremas", as quais ocupam o espaço dos fragmentos, das parcialidades e das diferenças.

Na perspectiva de análise que vê o jovem como interminável, este emerge mais como um estado de espírito e ideal cultural do que como condição social destacada, uma vez que, sob este prisma, morrem as faixas etárias. No entanto, não se pode negar que as diferentes gerações partilham experiências que lhes são próprias, o que torna arriscado desconsiderarmos a adolescência e juventude como condição social que merece nossa atenção.

 

Juventude e adolescência: metáforas da cultura na atualidade

Matheus (2006) salienta que a noção de adolescência e juventude em crise acompanha a ideologia da própria modernidade, que, com a afirmação do indivíduo em crise, sinaliza a afirmação do exercício da razão crítica e questionadora, corolário da conquista iluminista, a qual, por sua vez, denuncia a existência de um conhecimento incessantemente revisto e reformulado.

Este mesmo autor argumenta, ainda, que as ideias de crise e de equilíbrio instável são características consideradas centrais na modernidade, em diferentes autores, os quais, na esteira de Erikson, afirmam que a crise da adolescência ocorre quando o jovem revive em si próprio o que há de incompleto e fragmentado na cultura e na sociedade da qual participa. Nesta perspectiva, a adolescência seria alvo das dissonâncias da organização social capitalista.

Calligaris (2000), nesta mesma linha de argumentação de Matheus (2006), isto é, na perspectiva de olhar a juventude como alvo das dissonâncias da subjetividade na atualidade, mostra-nos que a adolescência configura o prisma pelo qual o próprio adulto se vê. A tese de Calligaris é a de que a adolescência surgiu porque os adultos precisam dela tanto como ideal (ela representa os ideais de liberdade e hedonismo, por exemplo) quanto como realização de seus desejos reprimidos (transgressão, rebeldia, transformação, resistência etc.). Como intérpretes dos desejos dos adultos, caberia aos adolescentes tentar corresponder ao que deles se espera: transgressões, barulho, resistência, liberdade, dentre outros possíveis desejos, nossos avessos negados.

Como se sabe, Freud não trabalhou com a categoria de adolescência, mas com a noção de puberdade, termo mais usual na linguagem de sua época. Nos Três ensaios sobre a teoria da sexualidade, Freud (1905/1980) salienta que a experiência da puberdade introduz duas modificações no processo de constituição psíquica: a subordinação das zonas erógenas pré-genitais ao primado da zona genital e o processo de escolha objetal.

Neste trabalho, Freud concebe a puberdade como o segundo momento da constituição do sujeito, que se caracteriza pela busca de autonomia e de desprendimento da autoridade parental. A leitura da puberdade como retomada do complexo edípico e da angústia de castração encontra consenso entre os autores de referência psicanalítica.

A crise da adolescência é concebida, na leitura que Matheus (2006) faz do texto freudiano, como uma experiência singular do confronto de cada sujeito com o real humano, uma operação que expõe, para o sujeito, a cena social. O enfrentamento do real é um impacto de grande intensidade, momento em que cada um deve enfrentar a angústia de castração com os recursos subjetivos de que dispõe.

Desta forma, o escudo protetor do narcisismo, abafamento do real traumático, a tela protetora erguida pelos pais na infância, é agora rompida pelo adolescente, em sua luta por autonomia e singularização. Nas palavras de Freud, podemos ilustrar assim este processo de enfrentamento do real:

Os homens terão de admitir para si mesmos toda a extensão de seu desamparo e insignificância na maquinaria do universo; não podem mais ser o centro da criação, o objeto de terno cuidado por parte de uma Providência Beneficente. Estarão na mesma posição de uma criança que abandonou a casa paterna, onde se achava tão bem instalada e tão confortável. Mas não há dúvida de que o infantilismo está destinado a ser superado. Os homens não podem permanecer crianças para sempre; têm de, por fim, sair para a "vida hostil". Podemos chamar isso de educação para a realidade (FREUD, 1927/1980, p. 63).

Sendo assim, na adolescência e juventude, o enfrentamento do desamparo ocorre de forma dramática. Se na infância, o jogo do carretel (FREUD, 1920/1980) metaforiza a separação da figura materna, quando a criança joga com sua angústia ao fazer desaparecer e reaparecer o objeto primordial de amparo, na adolescência, a variação deste jogo é vivida na crise adolescente, quando o jovem precisa enfrentar a dura educação para a realidade, o desafio de separar-se do conhecido mundo familiar e lidar com o estranho e desconhecido que tem pela frente.

Desta forma, a crise adolescente ocorre quando o sujeito, até então preservado da cena social, é convocado a deparar-se com o real contraditório, no qual muitas vezes não encontra dispositivos de sentido para acolher a estranheza com a qual se depara. Argumenta Matheus (2006):

Se o corpo é um lugar de emergência do real, isto não se deve especificamente às transformações orgânicas pubertárias. Se estas se fazem presentes, é sobretudo a partir do olhar do outro ou da imagem especular que se anuncia para o sujeito, deparando este com um estranho a ser significado. Sabe-se, no entanto, que este olhar e esta imagem não estão presos à concretude da realidade, uma vez que esta é dada sobretudo pelo campo simbólico que a fundamenta e acompanha. Da realidade, busca-se ao menos um grão, que sirva de suporte para o real a ser confrontado, disparado na estranheza do olhar do outro (MATHEUS, 2006, p. 231).

O enfrentamento do momento segundo da sexualidade, pela via da reedição do complexo edípico na adolescência, envolve a dialética da unidade e da fragmentação em si mesmo e no real humano. Na vertigem deste enfrentamento, há que se enxergar o que está além do véu familiar, além dos disfarces.

A crise da adolescência configura-se como a crise de identidade que cada personagem da modernidade tardia deve atravessar para atingir a síntese, ainda que provisória, de si mesmo: "trata-se de suportar a angústia vivida, em função de um corpo que, de modo previsível, se mostra momentaneamente rebelde" (MATHEUS, 2006, p. 249).

Amaral (2001) enfatiza que, no momento em que se torna necessário integrar as diversas imagens de si mesmo e de seu corpo sexuado, o adolescente se depara com um real fragmentado, que o lança em um vazio de referências identitárias, situação que reduz as possibilidades de construção subjetiva deste.

Crise de identidade e instabilidade crônicas na modernidade tardia; crise e instabilidade nos adolescentes e jovens; identidades efêmeras e disfarces circulam no real humano e na psique; somos todos jovens intermináveis a negarmos incessantemente a nossa finitude e desamparo, reinventando a vida, sonhando com a eternidade.

Na superfície da psique social, as figurações juvenis representam o ideal cultural, sob a forma dos padrões estéticos que adquirem maior visibilidade no imaginário social.

Mas as figurações juvenis também encarnam as culturas extremas ao darem vida aos restos reciclados do capitalismo; compõem identidades que recusam qualquer congelamento, identidades fluidas, que incorporam os muitos fragmentos, que se "vestem" e se "travestem" de acordo com as circunstâncias, seus disfarces móveis.

 

A crise do laço social e seu impacto nos jovens

Quando indagamos sobre os possíveis horizontes éticos e até mesmo estéticos da juventude, na contemporaneidade, não podemos deixar de retomar a questão da formação do superego em Freud, e de refletir sobre de que forma os atuais modos de subjetivação imprimem novas configurações de relação com a lei internalizada.

Em O ego e o id, Freud (1923/1980) estuda as relações entre o ego e o superego, quando podemos encontrar a teorização sobre as origens do superego. Este último é considerado por Freud como efeito de identificações, que conformam o caráter do ego: "o caráter do ego é um precipitado de catexias objetais abandonadas e elas contém a história dessas escolhas de objeto" (p. 43).

Quando o objeto é perdido, há a retirada do investimento libidinal no objeto e a transformação da libido objetal em libido narcísica, pela via da identificação com o objeto perdido, sendo o ego um precipitado de identificações com objetos que foram significativos e dos quais a criança teve que se separar.

Por ocasião da dissolução do complexo edípico, produz-se uma identificação paterna e uma identificação materna, estas que se erguem como formações reativas, verdadeiras defesas contra os desejos incestuosos endereçados às figuras parentais. Sendo assim, a criança precisa abrir mão de sua relação amorosa com os pais e, no lugar destas, ergue identificações com estes, como se dissesse: "Se não posso tê-los, então me identifico com eles", como uma compensação pela perda.

Na conferência XXXI, das Novas conferências introdutórias sobre psicanálise (v. 22, p. 75-102), afirma Freud (1932/1980):

(...) quando a coerção externa é internalizada, o superego assume o lugar da instância parental e observa, dirige e ameaça o ego, da mesma forma como anteriormente os pais faziam com a criança. O superego, que assume assim o poder, a função e até mesmo os métodos da instância parental, é, porém, não simplesmente seu sucessor, mas também, realmente, o seu herdeiro (p. 81).

Como podemos observar, o superego é a instância que incorpora as identificações com os pais, em especial aquelas referentes às interdições e preceitos morais dos pais, o que o torna o herdeiro da autoridade parental. Assim, o superego assume a função de formação do caráter do ego, que também herda as interdições e preceitos morais.

Cabe ao superego as funções de auto-observação, consciência moral e manutenção de ideais que, em seu conjunto, conformam o caráter do ego. Freud nos mostrou que o conteúdo destes ideais internalizados é constituído pela tradição passada de geração a geração. A esse respeito, afirma Freud (1932/1980): "quando levamos em conta o superego, estamos dando um passo importante para a compreensão do comportamento social da humanidade - do problema da delinquência, por exemplo e, talvez, até mesmo dando indicações práticas referentes à educação" (p. 87).

Quando tomamos a noção de superego em Freud, faz-se necessário examinarmos o conceito de cultura para ele, para que possamos evidenciar a complexidade de fatores que estão presentes na relação do sujeito com a lei internalizada, esta que se desdobra também em sua relação com a vida sociocultural, permeada pela ambivalência dos afetos primordiais de amor e ódio, sendo, portanto, uma relação conflitual. A noção de cultura ou civilização pode ser encontrada no texto freudiano O mal-estar na civilização (FREUD, 1929/1980).

Com efeito, neste trabalho, verificamos que, por um lado, o acervo cultural corresponde a um esforço coletivo na direção da luta pela sobrevivência, e neste sentido, corresponde ao patrimônio de ações específicas, acumuladas por muitas gerações, para a satisfação das necessidades humanas, esforço que produziu o necessário domínio de conhecimentos como tentativa de controle sobre a natureza. Este aspecto da cultura a coloca como fonte primordial de satisfações narcísicas, uma vez que o valor de uma civilização encontra-se no conhecimento tecnológico acumulado, nos ideais estéticos e artísticos e nas ilusões coletivas contidas no conhecimento religioso, componentes que promovem a defesa contra o desamparo humano. Sendo assim, a cultura é fonte de gratificação e proteção.

Por outro lado, para que pudéssemos conviver em grupo, coube à cultura a missão de ajustar as relações dos homens entre si, uma vez que não apenas de amor se nutre a convivência humana, mas também de agressividade destrutiva ou violência, sendo esta última a maior inimiga da civilização. Além disso, neste trabalho, Freud (1929/1980) investigou mais de perto a presença da pulsão de morte na economia psíquica tanto individual quanto coletiva. Com efeito, ele observa que os homens não são criaturas que apenas desejam ser amadas e amar, mas apresentam uma poderosa quota de agressividade. Consequentemente, os outros servem ao indivíduo como objetos de amor e ação altruísta, mas também como meios para a satisfação da agressividade, da exploração da capacidade de trabalho, de humilhação e maus tratos. A cultura ergue-se, então, como regulação social, como esforço supremo no sentido de impor limites à expressão da pulsão de morte.

Sacrificando a livre expressão de Eros, tanto quanto da pulsão de morte, a cultura impõe um fardo pesado à existência humana, o que Freud sinalizou quando denunciou "o mal-estar" na civilização. Com efeito, o desenvolvimento cultural traz em seu bojo a luta entre Eros e a pulsão de morte, presentes tanto no plano individual, quanto no coletivo. A história das culturas, na ótica freudiana, representou a luta da espécie humana pela vida, luta contra a agressividade cravada no coração do homem.

No entanto, faz-se necessário enfatizar, com Mezan (2002), que a oposição entre pulsões de um lado e sociedade do outro não pode ser mantida, uma vez que a própria cultura repousa sobre o campo pulsional e representa o esforço humano tanto de busca pela satisfação (obtida por toda sorte de gratificação sublimada, a partir do acervo artístico-intelectual) quanto pelo controle pulsional (pelo sistema de normas e regras que coíbem a livre expressão da agressividade destrutiva). As pulsões, portanto, possuem um papel fundamental na construção da cultura, de modo que os objetos que satisfazem a pulsão só existem na e pela cultura.

Se o conteúdo simbólico do superego é retirado do contexto social e histórico, este que disponibiliza o que valorizar, respeitar e obedecer, como já anunciara Freud, o que os jovens valorizam hoje recebe profundas influências das transformações vertiginosas que ocorreram desde a década de 1960, até os dias atuais.

É nos anos sessenta, de acordo com Birman (2016), a partir do surgimento da pílula anticoncepcional e de seu impacto na desconstrução social da família nuclear burguesa, o que também abriu caminho para a desestabilização das funções materna e paterna, que podemos situar o marco inicial de transformações antropológicas sem precedentes.

Se as mães saíram de seu papel restrito à maternidade, passaram ao trabalho fora do lar e a se inscrever no espaço social em condição de igualdade com os homens, a estrutura dos papéis familiares se modificou e o regime do patriarcado passou a ser desconstruído de maneira radical, conforme salienta Birman (2016), autor que coloca em relevo, em sua argumentação sobre o narcisismo contemporâneo, a drástica desordenação das funções parentais no interior das famílias ocidentais:

Com efeito, não se pode esquecer que a função materna e a posição estratégica da figura da mãe no campo da família nuclear burguesa foram cruciais para o investimento intenso dos infantes na modernidade e na modernidade avançada, investimento de ordem libidinal e narcísica. A figura do bebê-majestade, tal como foi descrita no discurso freudiano, foi a consequência inequívoca deste processo social, e as mulheres foram então reduzidas à condição restrita de serem mães (...) Como as mulheres passaram a resistir a serem confinadas à exclusiva condição de ser mãe buscando se inscrever no espaço social em condição de igualdade com os homens, foi a estrutura da família nuclear burguesa que começou a ruir, pois esta dependia efetivamente dessa posição estratégica então atribuída à figura da mulher-mãe (BIRMAN, 2016, p. 38-39).

No encalço das conquistas sociais realizadas pelas mulheres, estão as crianças e adolescentes que se depararam com o esvaziamento da presença de ambos os pais nos lares, o que também os subtraiu do olhar que nutre de substância simbólica suas subjetividades em construção, lançando-os em desamparo. Com efeito, são os pais e educadores que com sua presença atenta ensinam que a realidade não está aí para produzir objetos de satisfação sempre que se deseja.

Passemos a um breve flash do cenário urbano que nos permite introduzir e ilustrar a crise do laço social no âmbito da adolescência.

Nas cidades brasileiras em crescimento e nas grandes metrópoles, as camadas sociais médias e altas, quando não se refugiam em condomínios fechados e vigiados por guaritas armadas, vêm utilizando aplicativos em celulares com o objetivo de monitorarem o movimento da vizinhança. Tentativas de roubo ou movimentos suspeitos aparecem em imagens obtidas por câmeras de segurança que são socializadas entre moradores. O que nos chama a atenção, quando nos deparamos com postagens de um destes grupos de WhatsApp, é a participação de crianças e adolescentes em furtos.

Em uma destas cenas, observa-se um garoto que aparenta possuir cerca de doze ou treze anos caminhando pela rua, quando percebe o portão da frente de uma casa entreaberto e uma janela por onde pula. Segundos mais tarde, a câmera registra sua saída apresentando um computador portátil nas mãos. Uma vez de posse do objeto, sai correndo em linha de fuga. O episódio aqui narrado nos mobiliza a indagar: o que há por trás desta cena?

Como vimos, a apropriação dos limites e da moralidade, sob a forma da internalização do superego cultural como já preconizava Freud, é o que assegura, para o jovem em crescimento, suas coordenadas ético-sociais. No entanto, como salienta Rassial (2012), a contemporaneidade encontra-se acompanhada por uma crise do laço social, contexto em que os adolescentes e jovens são as principais vítimas, testemunhas e agentes de uma crise de valores no campo social e cultural, uma vez que este último não mais provê insígnias estáveis para consolidar as identidades em construção e não mais assegura nenhum lugar, ou produz discursos que possam apoiar a constituição de ideais éticos.

Sendo assim, o adolescente não é o mesmo, de uma geração a outra, mas reflete a imagem da cultura que o porta: "a crise ocorre na articulação que produz os laços sociais do mundo humano, como mundo simbólico, contra a barbárie do sem sentido da coisa" (ANDREOZZI, 2012, p. 295).

O garoto que se deixou seduzir pela porta e janela entreabertas de onde obteve o lampejo do objeto almejado é como um ser que não mais acredita nas promessas dos pais da infância, como na ilusão do Coelho da Páscoa ou do Papai Noel. Ele se vê diante de um mundo repleto de novidades tecnológicas que muitas vezes se encontram aquém de suas possibilidades de consumo. Frente ao que entende como uma enganação do adulto, não só porque este não consegue aplacar a fúria consumista, mas também por falta de respostas que lhe permitam inscrever sua busca de reconhecimento no âmbito simbólico. Com efeito, ele se encontra só e sem referências:

Em qual fiador pode-se acreditar definitivamente que o verdadeiro é verdadeiro e o falso é falso? Este fiador não é mais o adulto. Ele foi pego em flagrante mentindo. Quando não é mais o pai ou mãe, será o professor ou a professora? Senão, onde se deve ir para encontrá-lo? (HAMAD, 2012, p. 97).

A pergunta do adolescente é uma pergunta ética, pois interroga a ética social e cultural, a lógica que o sustenta. No entanto, no âmbito do capitalismo de consumo lhe são ofertadas respostas imediatas, sob a forma de objetos-coisa, prontos para serem consumidos, o que faz com que as questões que o angustiam sejam entorpecidas, empalidecendo sua busca desejante, pois o artefato tecnológico aparece para tamponar a falta. Em seu olhar, ele busca o reconhecimento do outro, sob a forma da posse de objetos que sinalizam não somente status, mas a condição mesma de existir, como se dissesse: "Sem tablet, celular ou o tênis do momento, eu não existo!".

Ao refletirmos sobre a cena do adolescente que rouba, não poderíamos deixar de dialogar com Winnicott (1956/2005), autor que discute o tema da delinquência, fenômeno para o qual prefere usar a expressão "tendência antissocial". Afirma o autor: "a tendência antissocial não é um diagnóstico. Não se compara diretamente com outros termos diagnósticos, como neurose e psicose. Pode ser encontrada num indivíduo normal ou num individuo neurótico ou psicótico. (...) também pode ser encontrada em todas as idades" (WINNICOTT, 1956/2005, p. 138).

Para o autor, a criança ou adolescente precisa estar ciente de um quadro de referências se quiser sentir-se livre e ser capaz de brincar. No começo, ele tem necessidade de viver num círculo de amor e força, com a consequente tolerância do entorno familiar em relação aos seus impulsos, sejam estes de amor ou de ódio. Se o lar consegue suportar tudo o que a criança/adolescente pode fazer para desorganizá-lo, ele consegue não sentir um medo excessivo de seus próprios pensamentos e dos produtos de sua imaginação, conquista que o faz confiar em si e no mundo externo. No entanto, se o lar faltar à criança antes de ela ter adquirido uma ideia de um quadro de referências de limites necessários e também de amor e tolerância, ela vai buscá-lo na sociedade, de modo que, quando rouba, "está procurando a boa mãe; também procura o pai" (WINNICOTT, 1956/2005, p. 130).

Com efeito, a tese do autor é a de que há uma relação direta entre a tendência antissocial e a privação, e sendo assim, quando há uma tendência antissocial, houve um verdadeiro desapossamento, e não uma simples carência, ou seja, houve a perda de algo bom e positivo até uma certa data e que depois foi retirado, sendo este o sentido da experiência de privação. Tal retirada estendeu-se por um período maior do que aquele em que a criança ou o adolescente pode manter viva a lembrança da esperança de que pode recuperar o que foi bom. Assim sendo, o amor materno é uma espécie de indulgência, uma terapia para quando este mesmo amor falha, o que nos leva a pensar, acompanhando o autor, que as frustrações recorrentes da relação mãe-bebê sempre podem ser compensadas pela presença e continuidade de provisão de amor por parte da mãe. No caso da verdadeira privação, estamos falando, de fato, de uma experiência inicial boa e que foi perdida por um tempo muito longo, o que faz a criança/adolescente reivindicá-la na sociedade.

Na atualidade, constatamos, como já foi dito, que as condições de provisão de cuidados, autoridade e limites na vida dos mais jovens se encontram dificultadas de forma dramática, em razão dos pais passarem cada vez mais tempo fora do lar. Mas como já anunciara Winnicott (1956/2005), a terapêutica da privação é a estabilidade do suprimento ambiental que possa permitir a restauração do amor dos pais com a recuperação de sua presença, única capaz de garantir os limites e as referências simbólicas de que os rebentos necessitam para crescer. Entretanto, o adulto, este que seria o suporte da autoridade e das leis que regem o pacto social, também se vê fragilizado em suas possibilidades de exercer o lugar de pai/mãe, pois mimetiza em si a mesma fragmentação da realidade, esta que se encontra esvaziada de sentido humano. Voltemos a Herrmann, para ampliarmos a argumentação de Winnicott sobre a noção de tendência antissocial.

Herrmann (2004) procura mostrar que "tudo se passa como se o indivíduo fosse o ponto de encontro e o efetor (a via de descarga nos termos da época de Freud) de uma psique social extremamente complexa e contraditória" (HERRMANN, 2004, p. 19). Para ele, mesmo que o sujeito contemporâneo não demonstre qualquer manifestação delirante na esfera ideativa, sua psicose, se assim pode ser chamada, é uma psicose de ação, na qual o ato sobrevive, mas sem sentido, sem nenhuma mediação, como uma espécie de atentado.

O "regime de atentado", expressão utilizada por Herrmann (2004), designa uma nova ordem social, plenamente instalada, efeito da condição traumática da psique do real. Neste contexto, os campos culturais agem interna e externamente no sujeito, como regime de atentado, processo no qual o pensamento reflexivo e a potência de ação são drasticamente reduzidas e, sendo assim, o ato humano se encolhe e introverte, até se transformar em ato puro. Com efeito, o sujeito do atentado tende a zero em um mundo encurralado pela tecnologia e pela cultura de massa, um tempo que se precipita na psicose de ação.

Ao aproximarmos as ideias de Winnicott, sobre a tendência antissocial, das de Herrmann, quando nos fala do "regime de atentado", podemos inferir a proximidade destas duas noções, tendo em vista que, independentemente da idade, vivemos todos sob o regime social da condição traumática da psique do real. Portanto, estamos todos na iminência de nos tornarmos antissociais, de forma a reivindicarmos algum limite face à intensa fragmentação do real. Nesta busca, nos precipitamos no ato puro, quer seja este o roubo, a mentira ou a violência. Mas voltemos ao nosso personagem principal, o adolescente infrator.

Com efeito, ele se constitui em meio à fragilidade da ordem simbólica, onde dispõe de mediações precárias para conter a violência pulsional que o habita, cenário em que a palavra que investe as leis, normas e regras do pacto social perdeu sua força e as instituições também se enfraqueceram. Trata-se do que Minerbo (2014) chama de "fragilidade do símbolo", contexto em que as instituições não mais sustentam o lastro simbólico que representam.

A instituição forte tem poder para subjetivar as pessoas, uma vez que elas passam a pensar, sentir e agir a partir das significações veiculadas por aquela. Quando as mediações simbólicas se fraturam, a palavra torna-se um som vazio de significação, contexto em que o jovem não mais acredita no conjunto afetivo-representacional que a palavra evoca.

O mesmo ocorre quando um juiz ou um político aceita suborno ou é desautorizado, o que leva a um esvaziamento semântico dos lugares de autoridade instituídos e a descrença nas narrativas que regem a ordem simbólica.

Neste contexto, o cinismo tornou-se, na atualidade, um modo hegemônico de relação com a norma social em sociedades onde os sujeitos conhecem os pressupostos ideológicos que arregimentam a ação, mas não encontram razões para orientar, a partir daí, suas condutas, uma vez que a razão cínica dribla a lei e joga com a ambiguidade. Tudo se passa como se a norma fosse proposta para ser transgredida ou desconsiderada (SAFATLE, 2008).

Estaríamos perdendo a dimensão simbólica, a esfera da metáfora, da metonímia, da poesia, enfim? Ou não seria mais precisamente quando estamos perdendo o vigor da metáfora, como recurso interpretativo do humano, que mais fica patente a importância de reativarmos nossa humanidade, embotada no revigoramento da própria noção de inconsciente, no potencial deste como crítica da cultura?

O inconsciente constitui-se, assim, como um antídoto contra a desumanização; é ele que permite ao ser humano encontrar a sua morada, a sua singularidade, em um momento histórico tão desfavorável ao pensamento, à criatividade, à constituição de vínculos afetivos, à internalização das leis que regem a vida social e cultural (ASSIS, 2012).

Ao revisitarmos as muitas figurações da juventude e da adolescência na atualidade, encontramos nosso personagem principal em condição de extremo desamparo simbólico, contexto em que o jovem revive em si, no âmbito de sua busca identitária, o vazio de referências simbólicas do real que o cerca, este que não mais consegue cobrir de sentidos coletivos a estranheza que habita seu ser.

Na falta do lastro simbólico, ele se lança ao objeto, sem mediações, quando se dá a passagem ao ato, cada vez mais frequente, na atualidade. Com efeito, constatamos, através das mídias diversas, a presença crescente de crianças e adolescentes em cenas de transgressão e violência de todos os tipos, em que comparecem tanto como vítimas quanto como protagonistas.

 

Considerações finais

Com o objetivo de melhor conhecer a relação entre sujeito e cultura, e destacar a psicanálise como método de investigação da psique, buscamos na Teoria dos Campos de Fábio Herrmann subsídios para refletirmos sobre as figurações juvenis, metáforas da cultura na contemporaneidade.

A partir das contribuições de Herrmann, pudemos conceber a cultura como real humano simbólico, sistema de representações que está dentro, nas representações de identidade, e fora, nas representações de realidade. Nosso corpo enquanto corpo da representação é suporte das representações de realidade e de identidade, e como tal é destino dos embates que se forjam na esfera da cultura. Além disso, pudemos estudar o real por meio da realidade, o conjunto das representações que constituem a superfície aparente do mundo. As estampas do corpo que atingem grande visibilidade no cenário da atualidade são produtos de um acordo profundo entre sujeito e mundo, e como tal, sintetizam os embates entre desejo e interdição, amor e ódio. Cada estampa ou figuração do corpo, a exemplo da juventude, é assim concebida como uma síntese da identidade do eu que a elege para representá-lo, uma identidade principal, ponto nodal na trama múltipla de representações.

Como suporte das representações de identidade e de realidade, o corpo no cenário da cultura nos fornece múltiplas figurações. Sendo assim, o corpo jovem é o espelho onde projetamos nossos ideais de beleza; é o corpo do espetáculo do consumo, do novo e da novidade. Além disso, a juventude é também alvo das dissonâncias e crises da modernidade tardia ao metaforizar em si o que há de incompleto e fragmentado na cultura.

Na face da realidade, experimentamos o regime de atentado, a psicose de ação, plenamente instalados, ou seja, a presença do ato totalmente desprovido de pensamento, de substância reflexiva, os actings. Como consequência, verificamos a emergência cada vez mais numerosa de atos antissociais, os quais revelam o sujeito do regime de atentado, um ser empobrecido de recursos psíquicos para enfrentar as turbulências da vida, que explode em violência. Na face da identidade, experimentamos a fragmentação, a crise de sentido diante das transformações vertiginosas reinantes no âmbito sociocultural.

A partir do diálogo com diferentes autores, pudemos perscrutar alguns dos enigmas do homem contemporâneo, este que habita um mundo que espelha seu próprio funcionamento psíquico, a psique do real, um real absurdo e ficcional, posto que encarnado de sentidos humanos, que se repetem na história em múltiplos sentidos contraditórios e condensados como na linguagem mito-poética, esta onde a psicanálise buscou inspiração para construir o seu logos.

Quer como cultura extrema, criativa, sempre em renovação, quer como violência e transgressão ou como clichê publicitário, a imagem da juventude em suas variadas facetas dramatiza as contradições da cultura. Os corpos jovens encenam, em suas figurações, ora em concordância, ora em dissonância com as regras do pacto social, o retrato de uma cultura que se encontra em profunda crise de legitimação. Com efeito, como nos mostra Assis (2012), a adolescência e a juventude são metáforas da cultura.

 

 

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Artigo recebido em: 15/09/2017
Aprovado para publicação em: 15/03/2018

Endereço para correspondência
Maria de Fátima Pessoa de Assis
E-mail: mafapessoa@gmail.com

 

 

*Psicóloga, mestre em Educação, doutora em Educação Escolar, professora adjunto III do curso de psicologia, Regional Jataí/Universidade Federal de Goiás (UFG), coordenadora do laboratório de psicologia e processos clínicos.
1O leitor pode conferir em ASSIS, M. F. P. (2012). Corpo e psicossexualidade: metáforas da cultura. Tese de doutorado. Programa de Pós-Graduação em Educação Escolar, Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Ciências e Letras, Araraquara, SP.
2Herrmann (1999) utiliza a expressão "porção do real sequestrada no interior do sujeito" para designar a identidade. A palavra "sequestrada" designa a interiorização do real no sujeito, isto é, a realidade tanto quanto a identidade, para o autor, são representações, de modo que a realidade é o complemento simétrico da identidade. A realidade não é mero produto material a impor suas leis, pois o sujeito reconstrói o mundo material à sua maneira, e sendo assim, toma a forma humana consentida em sua cultura, contexto em que o mundo se torna encarnado de sentido humano.
3Para Herrmann (1999), o real é a própria cultura, entendida como sistema gerador de sentidos humanos. Afirma o autor: "o real é uma espécie de psique embrenhada no mundo" (p. 28). Sendo assim, para o autor inexiste percepção do mundo que não seja emocional, em razão da presença do inconsciente em nosso sistema de representação.
4Outeiral (2003) designa puberdade (de puber, pelos) como "um processo biológico que se inicia em nosso meio entre 9 e 14 anos aproximadamente e se caracteriza pelo surgimento de uma atividade hormonal que desencadeia os chamados caracteres sexuais secundários" (p. 3).

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