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Cadernos de psicanálise (Rio de Janeiro)

On-line version ISSN 1413-6295

Cad. psicanal. vol.42 no.43 Rio de Jeneiro July/Dec. 2020

 

ARTIGOS

 

Uma ampliação do setting face a exclusão: contribuições de Winnicott para o cuidado clínico em equipe

 

A wider setting in the face of exclusion: Winnicott's contributions to clinical team care

 

 

Gustavo VieiraI*; Pablo CastanhoI, II, III**; Elisa M. Parahyba CamposI***

IUniversidade de São Paulo - USP - Brasil
IIInternational Association for Group Psychotherapy and Group Processes - IAGP - USA
IIINúcleo de Estudos de Saúde Mental e Psicanálise das Configurações Vinculares - NESME - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O artigo inicia abordando algumas experiências de Winnicott em situações que conjugavam sofrimento psíquico e questões sociais, destacando sua proposição de consultas terapêuticas em um "setting ampliado" pela colaboração de outros profissionais e serviços. Na sequência, discute-se o caso de Hesta, enfatizando a atuação conjunta de Winnicott com profissionais do território da paciente. A partir destes elementos, abordam-se aspectos do pensamento winnicottiano sobre o cuidado multiprofissional e sobre a psicodinâmica do trabalho em equipe. Por fim, analisa-se um caso acompanhado na Atenção Básica (SUS), apresentando contribuições sobre o cuidado clínico em equipe ante a exclusão social e subjetiva.

Palavras-chave: Winnicott, Exclusão, Consultas terapêuticas, Trabalho em equipe, Atenção Básica.


ABSTRACT

First, the article addresses some of Winnicott's experiences in situations that combined psychic suffering and social issues and presents his approach: therapeutic consultations in a "wider setting", with the collaboration of other professionals and welfare services. After, the article discusses the case of Hesta, emphasizing Winnicott's work together with professionals from her local context. Then, the article addresses Winnicott's thought about multiprofessional care and the psychodynamics of teamwork. Finally, a case study of Brazilian Primary Care is presented, offering contributions on clinical team care in the face of social and subjective exclusion.

Keywords: Winnicott, Exclusion, Therapeutic consultations, Teamwork, Primary Care.


 

 

1. Introdução

A partir da organização dos serviços componentes dos Sistemas Únicos de Saúde (SUS) e de Assistência Social (SUAS), assim como de outras políticas públicas e iniciativas do terceiro setor, é cada vez mais frequente a atuação de psicanalistas em "situações sociais críticas", contextos e casos que conjugam o desamparo psíquico e social (BROIDE; BROIDE, 2016). Neste campo de atuação, os analistas são frequentemente interrogados sobre as implicações de sua prática em contextos de pobreza extrema e junto a sujeitos excluídos do acesso a bens e direitos sociais (DEBIEUX, 2002).

A psicóloga social Bader Sawaia (2001) indica que, embora o conceito de "exclusão" possua contornos pouco precisos, esta noção possibilita pensar algumas relações complexas entre o âmbito psíquico e o social. Neste sentido, a autora destaca a dialética exclusão/inclusão, considerando que as desigualdades constitutivas da sociedade capitalista contemporânea produzem a concepção de pessoas "incluídas" e, por decorrência, a de "excluídas". Sawaia propõe que a exclusão abarca três dimensões inter-relacionadas: a desigualdade social (dimensão objetiva), a injustiça (dimensão ética) e o sofrimento (dimensão subjetiva).

Podemos considerar que a intervenção de psicanalistas em contextos de pobreza, marginalização e falta de acesso (ou violação) de direitos sociais coloca estes profissionais diante de aspectos da exclusão que exigem ampliar sua perspectiva e estratégias de atuação. Nestes cenários, é fundamental que os profissionais possam olhar para as desigualdades socioeconômicas e a importância da garantia de direitos, sem pender, contudo, para uma "negação da dimensão clínica do cuidado" (ONOCKO-CAMPOS, 2014). Assim, consideramos que algumas contribuições do psicanalista inglês Donald Winnicott possibilitam reflexões para uma perspectiva psicanalítica do cuidado em equipe em situações que conjugam o sofrimento psíquico e questões socioeconômicas. Embora esse psicanalista não faça uso do termo exclusão no sentido apresentado acima - visto ser uma noção introduzida nos debates das ciências sociais após seu falecimento1 -, abordaremos ao longo do artigo alguns elementos de sua obra que constituem aportes para pensar a exclusão em suas diferentes dimensões.

Para tanto, iniciamos abordando duas experiências nas quais Winnicott pensou a psicanálise de forma original para além do âmbito do consultório privado: seu trabalho em instituições de saúde pública e na evacuação de crianças durante a Segunda Guerra Mundial. Na sequência, apresentamos a concepção de Winnicott de consultas terapêuticas em um "setting ampliado", destacando o caso de Hesta, no qual o psicanalista conduz um manejo em equipe para uma adolescente que estava, em seu contexto, excluída do acesso a uma análise "tradicional". A partir destes elementos, discutimos a compreensão de Winnicott acerca do cuidado multiprofissional e da psicodinâmica do trabalho em equipe. Por fim, trazemos algumas considerações sobre as possibilidades de um cuidado clínico em equipe na contemporaneidade a partir de um caso acompanhado na Atenção Básica do SUS.

 

2. Entre o trabalho no hospital público e a atuação junto às crianças evacuadas na guerra: Winnicott e "a ampliação do valor social do analista"

Em 1923, no mesmo ano em que iniciou sua análise pessoal, Donald Winnicott começou a trabalhar em instituições de saúde, dentre as quais destacamos o hospital pediátrico público2 Paddington Green, no qual permaneceria por quarenta anos (RODMAN, 2003). De acordo com Alexander (2012), embora as anotações de caso de Winnicott nos revelem pouco sobre as condições sociais de seus pacientes, a maioria das famílias dos entornos do hospital eram trabalhadores de baixa renda, que viviam em moradias populares ou em "favelas" superlotadas (overcrowded slums). Especialmente devido à sua inserção em instituições públicas de saúde, Winnicott atendeu cerca de sessenta mil famílias ao longo de sua trajetória profissional (WINNICOTT, 1991).

Após ter concluído sua formação como psicanalista, Winnicott também atuou como consultor na evacuação de crianças para Oxfordshire, devido aos riscos de bombardeamento de Londres durante a Segunda Guerra Mundial. Nesta experiência, o psicanalista se deparou com o sofrimento psíquico e com as mazelas sociais de diversas famílias (KANTER, 2004a). Ao longo de alguns anos, o psicanalista conciliou o trabalho junto às crianças evacuadas com sua atividade na saúde pública e no consultório privado.

No contexto do trabalho de evacuação de crianças, Winnicott conheceu em 1941 a Assistente Social Psiquiátrica Clare Britton, que se tornou a sua segunda esposa alguns anos mais tarde (RODMAN, 2003). É interessante notar que, segundo relato de Clare, foi no trabalho em Oxfordshire que Winnicott passou a perceber as potencialidades da atuação em equipe diante de casos que conjugavam o sofrimento psíquico e questões sociais (KANTER, 2004b). Além disso, conforme diversos autores, ao ter de lidar com os efeitos da separação de diversas crianças de seus lares de origem, assim como da grande complexidade de funcionamentos familiares, Winnicott passou a dar maior importância ao contexto familiar e social em sua compreensão da vida psíquica (KANTER, 2004a; PHILLIPS, 1988; RODMAN, 2003).

Além dos impactos do trabalho junto às crianças evacuadas na teoria de Winnicott, alguns autores consideram que esta experiência teve reverberações na estratégia clínica conduzida pelo psicanalista em seu trabalho hospitalar (ISAACS-ELMHIRST, 1996; KANTER, 2004a). De acordo com o próprio Winnicott (1965/1994), sua atividade institucional como pediatra foi progressivamente dando espaço para uma modalidade de intervenção denominada de "consultas terapêuticas". Ao justificar esta prática, o autor destaca a importância da "ampliação do valor social do analista", ao considerar haver maior demanda de cuidado em saúde mental que a oferta de psicanalistas ou psicoterapeutas. Na introdução de sua compilação de consultas terapêuticas, ele também acrescenta que esta modalidade de trabalho "tem uma importância que a psicanálise não possui ao atingir [meeting] a necessidade e pressão sociais nas clínicas" (WINNICOTT, 1971/1984, p. 10). Desta forma, consideramos que as consultas terapêuticas se alinham à expectativa de Freud (1919[1918]/1996) acerca da presença da psicanálise em instituições de saúde pública.

Tendo em vista esta breve contextualização, voltemo-nos agora para alguns elementos constitutivos das consultas terapêuticas desenvolvidas por Winnicott.

 

3. "Um setting mais amplo": o contexto clínico das consultas terapêuticas

Ao considerar as consultas terapêuticas como uma possibilidade de ampliar o valor social do analista, Winnicott (1965/1994) destaca algumas características dessa prática. Segundo ele, a consulta terapêutica correspondia ao início de um "outro" processo, distinto da psicanálise standard. Ele afirma: "(...) o que estou descrevendo aqui não é psicanálise. Se estiver iniciando uma análise, não adoto o procedimento aqui descrito" (WINNICOTT, 1965/1994, p. 244). Deste modo, o psicanalista caracteriza a consulta terapêutica como a exploração mais completa possível de uma ou poucas entrevistas por parte do terapeuta. Segundo o autor, a tônica nesta modalidade de atendimento tratava de "quão pouco é necessário ser feito" em cada caso (WINNICOTT, 1968/1994).

Conforme Winnicott (1965/1994), as consultas terapêuticas eram oferecidas para pacientes que não precisavam ou não podiam se engajar em um acompanhamento mais longo e intensivo (seja pela distância geográfica ou por questões socioeconômicas). Embora Winnicott (1955/1994) também realizasse esta modalidade de trabalho em seu consultório privado, foi no Hospital Paddington Green que o psicanalista exerceu esta prática de forma mais ampla. De acordo com o autor, o seu serviço neste hospital se constituía como um espaço de acolhimento aberto para a população e ressalta: "quem quer que desejasse ver-me poderia fazê-lo na clínica ambulatorial, simplesmente esperando algumas horas em um banco duro, na manhã apropriada" (WINNICOTT, 1955/1994, p. 227). Assim, em um cenário de acesso restrito à psicanálise, Winnicott concebeu uma clínica que acolhia o maior número possível de famílias.

Winnicott (1968/1994) declara que indicava o uso das consultas terapêuticas quando avaliava existir um ambiente de suporte suficientemente bom (p. ex. o lar ou a escola), que poderia continuar o trabalho iniciado pelo psicanalista. Na introdução de sua compilação de consultas terapêuticas, o autor assevera que nos casos em que não se podia contar com um "ambiente desejável médio", esta modalidade de atendimento deveria ser evitada (WINNICOTT, 1971/1984). No entanto, ao invés de identificarmos uma triagem rígida de pacientes - o que poderia excluir casos de famílias em maior dificuldade social e econômica -, verificamos nas consultas relatadas pelo psicanalista um esforço em auxiliar no apoio e composição de um contexto de suporte. Assim, se por um lado as consultas terapêuticas exigem um ambiente médio, de outro, podemos compreender que as condições deste ambiente também podem ser alvo de intervenção para favorecê-las, conforme abordaremos ao longo do artigo.

Ainda sobre o perfil das famílias atendidas em consultas por Winnicott, sua esposa Clare declara que o psicanalista acolhia os casos que lhe chegavam, buscava formas de fortalecer o apoio ambiental a partir da comunicação da criança ou adolescente e lançava mão de diversas estratégias de suporte junto às famílias como, por exemplo, a realização de visitas domiciliares (WINNICOTT, 1972). Além disso, conforme salientado por Alexander (2012), a postura de Winnicott frente às famílias atendidas representava inclusão de suas potencialidades de cuidado. Famílias da classe trabalhadora eram consideradas pelo psicanalista como "suficientemente boas", sem confundir o exercício do cuidado com nível econômico elevado ou com práticas educativas burguesas.

Outro elemento importante das consultas terapêuticas refere-se à necessidade de tais entrevistas serem pensadas em um contexto de trabalho coletivo e/ou interprofissional. Neste sentido, o autor afirma:

[...] é necessário efetuar este trabalho em um setting mais amplo em que haja a oportunidade para que um caso deslize para outro tipo de categoria de psiquiatria infantil. [...] Se a entrevista psicoterapêutica se mostrar insatisfatória mesmo quando se pergunta 'Qual é o mínimo que precisamos fazer neste caso?', então um mecanismo mais complexo pode ser colocado em ação. O caso pode tornar-se daqueles que necessitam de todo o sistema de administração psiquiátrica infantil (WINNICOTT, 1965/1994, p. 247).

Assim, o autor considerava a consulta terapêutica como um componente de uma rede de profissionais de saúde mental, dentre os quais o paciente poderia seguir em seu itinerário terapêutico, conforme a sua necessidade.

Além disso, ao realizar uma leitura atenta das consultas terapêuticas de Winnicott, percebemos que esta prática clínica era também ampliada por inúmeras interfaces com profissionais que não pertenciam, em sentido estrito, às instituições de saúde mental, como trabalhadores da educação, assistência social e da saúde geral (p.ex. médicos de família). Na introdução à segunda parte de sua compilação de casos, Winnicott (1971/1984, p. 138) afirma: "Em muitos casos outras agências estão trabalhando para ajudar outras crianças ou talvez os próprios pais, de modo que a consulta terapêutica assim descrita necessita ser encarada como apenas uma entre muitas coisas que estão acontecendo numa vasta área do trabalho social". Logo, o autor considerava as consultas terapêuticas como parte de ampla rede de cuidado.

Assim, as consultas terapêuticas apresentam uma lógica clínica que pode inspirar, na atualidade, intervenções em equipe frente a situações sociais críticas. A fim de aprofundar algumas outras características importantes das consultas terapêuticas, voltemo-nos para um dos casos apresentados pelo próprio psicanalista.

 

3.1. O caso de Hesta: da exclusão à ampliação do cuidado no território

Dentre as entrevistas relatadas por Winnicott (1971/1984), o caso da adolescente Hesta apresenta alguns elementos técnicos e éticos que constituem balizadores de grande valor para o tema abordado em nosso artigo. Um primeiro aspecto relevante consiste no fato de que Hesta estava excluída da possibilidade de realizar uma análise "tradicional", primeiramente por não morar em Londres, onde a análise de crianças e adolescentes estava disponível em seu país (DETHIVILLE, 2013). Além disso, é possível que outros fatores - não explicitados no caso - também se somem ao não acesso da adolescente a um tratamento psicanalítico de longa duração.

A consulta da adolescente tem uma dimensão de trabalho em equipe desde o seu início, visto ter sido o médico de família (general practitioner) de sua localidade que solicitou a consulta, assim como enviou por carta seu diagnóstico sobre o que ocorria com Hesta. A adolescente tinha dezesseis anos, morava com ambos os pais e era a terceira filha, tendo mais três irmãos. Conforme os dados comunicados pelo médico a Winnicott (1971/1984), as dificuldades da adolescente se iniciaram aos quatorze anos, período em que ela começou a ficar nervosa, o que coincidiu com seu primeiro fluxo menstrual; ainda nesta idade, o relacionamento de seus pais estava em crise. Segundo o autor, aos quinze anos, a adolescente não conseguia dormir, sendo "hipersensível em relação ao que os outros pensavam a seu respeito, e carregava sentimento de inadaptação tanto na escola quanto em sua vida pessoal"; além disso, Hesta tinha receio de que pudesse ser lésbica e eram notadas oscilações maníaco-depressivas. Aos dezesseis anos, a condição da adolescente se agravou, "apresentando sintomas bizarros" que levaram ao medo de a paciente cometer suicídio. Uma internação foi considerada, mas a paciente recusou ser hospitalizada; neste contexto, Hesta foi tratada em casa e gradualmente perdeu sua hostilidade, mas consequentemente ganhou bastante peso. Além disso, no contexto do caso clínico, indica-se haver queixas referentes a dificuldades de aprendizagem.

Hesta e a mãe viajaram (de uma cidade do interior até Londres) para uma consulta com Winnicott. Após recebê-las, o psicanalista ficou a sós com a adolescente para realizar a entrevista clínica e, embora Hesta parecesse inicialmente hostil, foi possível estabelecer uma comunicação com a adolescente desde o primeiro momento (WINNICOTT, 1971/1984). Neste ponto, podemos identificar importante aspecto ético do psicanalista em suas entrevistas: Winnicott (1965/1994) enfatiza a importância de ver primeiramente a pessoa sobre a qual recai a queixa. Este elemento é de grande importância, para que as informações eventualmente recebidas em um trabalho cooperativo com outro profissional não se sobreponham à escuta clínica. Conforme veremos abaixo, esta postura do psicanalista foi fundamental para que a perspectiva da adolescente não fosse excluída de seu próprio processo de tratamento.

Na consulta de Hesta, é interessante notar que Winnicott (1971/1984) opta por iniciar a consulta se colocando de maneira bastante pessoal: ele relata à adolescente sobre sua dificuldade de retomar a rotina de trabalho em um dia especialmente quente, depois de um período de recesso em Plymouth, sua cidade natal3. Consideramos que este conteúdo não foi trazido pelo psicanalista por acaso, visto que Hesta enfatiza gostar muito de viver no interior, assim como revela "detestar" ir a Londres. Desta forma, a partir da referência de Winnicott sobre sua cidade de origem, entendemos que a adolescente também se sente à vontade de falar sobre seu território - contexto que se mostrará importante na condução de seu caso. Neste sentido, o autor sinaliza ainda que Hesta conseguiu se abrir sobre questões importantes desde o começo da consulta: abordou suas dificuldades em obter sucesso na escola e conversou sobre dificuldades familiares. O autor relata: "A atitude de Hesta era firme e [ela] achava-se com razão muito normal; o único problema, [na perspectiva da adolescente], era que 'tinha pais anormais'. Contou-me sobre os problemas que tinha com o pai e a mãe. Disse: 'Se me deixam sozinha, fica tudo bem'" (WINNICOTT, 1971/1984, p. 189).

O início da consulta de Hesta indica a importância, para Winnicott (1971/1984), de esperar o movimento da paciente em pedir ajuda, sustentando um espaço de comunicação. Como resposta, a adolescente pôde se expressar acerca da história de conflitos entre os seus pais e a depressão que atravessou aos quatorze anos. Em relação aos conteúdos trazidos pela paciente, Winnicott percebeu que Hesta não se identificava com a teoria - sustentada pelo médico de família - de que seu adoecimento era decorrente dos ciclos menstruais.

Na sequência, Winnicott propõe à adolescente o jogo do rabisco, modalidade de comunicação em que ele realizava um rabisco, convidando o/a paciente a completá-lo; na sequência, as posições se invertiam e o psicanalista completava o rabisco do/a paciente (WINNICOTT, 1994). A partir do uso deste jogo, o autor surpreende-se com a "capacidade de Hesta para brincadeiras imaginativas e criativas". É interessante notar que, ao longo da produção conjunta no jogo do rabisco, o psicanalista identifica que haviam realizado um desenho da própria adolescente, momento sobre o qual o autor afirma: "Fiquei surpreso com o modo como juntos, de uma forma ou outra, conseguimos um retrato dessa menina" (WINNICOTT, 1971/1984, p. 196). A nosso ver, Winnicott está afirmando que, para além da produção gráfica, ele pôde incluir a adolescente na construção de seu "retrato" clínico.

Além disso, através de complexas figuras criadas conjuntamente, o psicanalista introduziu também as temáticas da vida sexual e da diferença entre os sexos ao longo da consulta. Neste quesito, o autor afirma: "me senti convencido da capacidade de Hesta de aceitar a puberdade e o crescimento para ser uma mulher adulta" (WINNICOTT, 1971/1984, p. 197), elemento que novamente indica que o diagnóstico do médico que encaminhou a paciente não restringiu o olhar de Winnicott. Assim, podemos considerar que a escuta da adolescente por parte do psicanalista permitiu que ele desenvolvesse sua própria compreensão sobre o caso, o que contribuiu para um trabalho em equipe, conforme abordaremos logo adiante.

Após a consulta, o psicanalista avaliou que a conduta clínica era a de conversar somente com Hesta, declarando a ela: "Claro que posso ouvir o ponto de vista de sua mãe, e este será muito diferente do seu, mas no momento estou interessado no seu ponto de vista" (WINNICOTT, 1971/1984, p. 203). Em um manejo também cuidadoso em relação à mãe, o psicanalista entendeu a importância de ressaltar para a adolescente que a sua perspectiva precisava ser incluída no caso. Ao salientar que tal decisão deixou Hesta "muito aliviada", podemos aventar que esta escolha de Winnicott foi importante para que a adolescente não sentisse que seu ponto de vista poderia ser novamente excluído.

De acordo com o psicanalista, a consulta terapêutica permitiu que Hesta se posicionasse em relação a seu sofrimento, o que se desdobrou em um movimento mais amplo de busca de ajuda. O autor afirma:

Após a consulta, ela [Hesta] parecia querer, bem como necessitar de ajuda. Abandonou a instável afirmação de sua própria capacidade, para se tornar muito infantil; talvez se possa dizer que, embora estivesse com 16 anos, agia como uma menina de 8 anos. Os pais conseguiram encontrar uma garota para atuar como enfermeira [...] mental [a girl to act as a mental nurse] para ela, alguém que não era treinada em enfermagem, mas que tinha entendimento e tolerância naturais, e este plano funcionou bem, porque Hesta se tornara capaz de se enfrentar como uma pessoa doente. Continuou, entretanto, a insistir que seus vários médicos eram seus amigos (WINNICOTT, 1971/1984, p. 188).

Desta forma, Winnicott desvela que a busca de ajuda por Hesta foi acompanhada de um movimento regressivo, no qual se fez necessário um novo apoio: uma garota da cidade de Hesta, localidade que era importante para a adolescente. Embora esta garota não fosse uma especialista, o autor considera que ela atuou de forma sensível como uma "cuidadora da mente" (mental nurse). Em nossa perspectiva, a participação desta personagem indica a possibilidade de o "setting ampliado" incluir também pessoas do território que, mesmo sem um título de especialista, possam operar como parte do ambiente suficientemente bom de suporte - tema que retomaremos ao longo do artigo. A partir deste novo cenário, a adolescente pôde lidar ainda, em alguma medida, com a sua própria condição de adoecimento. Porém, o autor sublinha igualmente a não complacência total de Hesta, visto que, ao "insistir que os médicos eram seus amigos", a adolescente também questiona o papel de "doente" atribuído por seu ambiente.

Além do apoio da "garota da comunidade", Winnicott (1971/1984) relata outros desdobramentos da consulta. Apresentando uma troca de cartas com o médico de família, Winnicott destaca que tanto este profissional como seus pais deixaram de tentar convencer a adolescente quanto à sua doença. Neste sentido, podemos compreender que, foi a partir da convocação de Hesta para o tratamento - incluindo sua voz e interessando-se sobre o seu ponto de vista - que o caso pôde se desenrolar. Neste contexto, o psicanalista afirma: "Tenho tido novas entrevistas com a menina [Hesta] e percebo que ela continua a me usar de uma maneira muito especial, como alguém acessível. Fora deste tempo ela é muito dependente dos pais e do P.G. [médico de família]" (WINNICOTT, 1971/1984, p. 188). Assim, o psicanalista sublinha um movimento importante em sua intervenção junto ao caso: embora sua consulta tenha permitido que a adolescente apresentasse sua divergência em relação aos diagnósticos recebidos anteriormente, Winnicott não deslegitima o cuidado do médico e dos pais de Hesta, que seguem como referências de cuidado no território. Ao se manter como alguém acessível à adolescente, o psicanalista se coloca como uma retaguarda clínica para o caso e se dispõe a realizar novas entrevistas caso sejam necessárias. Este arranjo de trabalho em equipe é explorado pelo autor em outros trabalhos, conforme abordaremos na sequência.

Ao final do relato de caso, o psicanalista declara sobre o desdobramento atual do caso, no momento de sua escrita:

Esta paciente continua a ser tratada em casa, com a ajuda do médico da família e de uma garota que atua como enfermeira [girl who acts as nurse]. Hesta procura-me "esporadicamente", e por isso a vejo meia dúzia de vezes por ano. Houve uma diminuição do elemento maníaco e uma depressão controlável é geralmente o traço clínico principal. Houve retorno voluntário à escola. A primeira entrevista que aqui descrevi continua a ser a base do trabalho de equipe que está sendo feito agora com algum sucesso. O resultado não pode ser previsto enquanto as mudanças rápidas e violentas da puberdade dominarem a cena (WINNICOTT, 1971/1984, p. 205, grifo nosso).

Logo, o autor considera que, a partir da consulta terapêutica, organizou-se um trabalho em equipe, conduzido principalmente pela família e profissionais da comunidade de Hesta, assim como sustentado clinicamente pelo apoio do psicanalista. Ademais, é muito interessante verificar a leitura de Winnicott da função clínica - para além do título profissional - de cada um nesta equipe: por um lado, ele verifica a necessidade de problematizar a conduta de um colega médico e, por outro, reconhece a capacidade de uma garota da comunidade como alguém que atua como cuidadora e parte integrante de sua equipe. A sensibilidade do psicanalista em olhar e reconhecer as potencialidades entre os membros da comunidade nos parece uma contribuição fundamental para o trabalho em equipe, de grande valor para a intervenção em situações sociais críticas.

Tendo em vista os elementos ilustrados pelo caso Hesta, voltemo-nos agora para algumas referências em que Winnicott apresenta considerações teóricas sobre a relação entre a psicanálise e outras modalidades de cuidado, assim como acerca da atuação em equipe.

 

4. Winnicott e o cuidado em equipe

4.1. A psicanálise e outras modalidades de cuidado

Winnicott apresenta, ao longo de seus trabalhos, algumas distinções entre a clínica realizada por um psicanalista e o cuidado oferecido por outros profissionais de saúde. Por um lado, o autor enfatiza a especificidade da clínica psicanalítica, esclarecendo que um médico não poderia meramente "aprender" psicanálise em termos teóricos, visto que a escuta analítica dependia de uma formação e experiência pessoais (WINNICOTT, 1949/1994, 1945/1997). Por outro lado, ao longo de diversos escritos, o autor também relaciona outras formas de cuidado - exercidas por diferentes profissionais - à sua teoria do amadurecimento emocional.

Em palestra feita a trabalhadores da área social de proteção à infância, Winnicott (1957/2013) destaca o papel que estes profissionais exercem junto às pessoas que escutam quando conseguem "guardar" e "conter" (contain) em si mesmos os problemas pessoais, familiares e sociais do usuário, sem pretender aconselhar ou oferecer uma resposta. Utilizando como exemplo o médico, o autor assevera que quando problemas são "contidos temporariamente" pelo profissional e, na sequência, devolvidos à pessoa escutada, a solução poderia "aparecer por si só" em alguns casos. Neste mesmo sentido, o autor enfatiza os riscos implicados na tentativa de aconselhar aquele que conta sobre seus sofrimentos. Além disso, Winnicott sublinha a importância de um "quadro" ou estrutura (framework) para o trabalho de escuta, salientando que em um lugar adequado e tempo delimitado os profissionais podem ser mais confiáveis do que o são em suas vidas pessoais, facilitando o movimento de colocar em suspenso suas concepções morais.

Além disso, em uma palestra para assistentes sociais, Winnicott apresenta interessante contribuição sobre como estes profissionais poderiam atuar junto às famílias4. Ele afirma: "Muitas vezes, em nosso trabalho profissional, agimos como psicoterapeutas, embora não façamos interpretações do inconsciente. Lidamos com a depressão, prevenimo-la e resgatamos pessoas que nela estão imersas. Somos enfermeiras da mente [mental nurses]" (WINNICOTT, 1958/2013, p. 80). Logo, assim como Winnicott nomeou a função da "garota da comunidade" no cuidado junto a Hesta, o psicanalista considera que os assistentes sociais também podem atuar no papel de "cuidadores da mente" (mental nurses). No ano seguinte, em palestra sobre os "Tipos de psicoterapia", Winnicott (1961/1999) destaca que, embora um assistente ou trabalhador social não seja, de modo geral, um psicoterapeuta para casos de psiconeuroses, este profissional pode ser considerado um "terapeuta" ante casos decorrentes de falhas importantes nos cuidados iniciais (que carecem de atendimento das necessidades dos pacientes). Em ambos os artigos, o psicanalista sugere que este cuidado seja oferecido ao longo de certo período, indicando para a importância longitudinal que certas pessoas e profissionais podem operar ao constituir um ambiente de apoio às pessoas em sofrimento.

Em palestra realizada ao final de sua vida, o psicanalista destaca que "cura", em suas raízes, significa "cuidado". Neste contexto, ele declara:

O que as pessoas querem de nós, médicos e enfermeiros? O que queremos de nossos colegas, quando somos nós que ficamos imaturos, doentes ou velhos? Essas condições - imaturidade, doença e velhice - trazem consigo a dependência. Segue-se que é necessário haver confiabilidade [dependability]. Como médicos, assistentes sociais e enfermeiros, somos chamados a ser confiáveis de modo humano (e não mecânico), a ter confiabilidade construída sobre nossa atitude geral (WINNICOTT, 1970/1999, p. 106).

Deste modo, na passagem acima, Winnicott agrupa diferentes situações que levam à dependência (imaturidade, doença, velhice), indicando que estas demandam a confiabilidade (dependability) das diferentes profissões do cuidado. Além disso, no contexto do artigo, o psicanalista indica que todos - inclusive os próprios profissionais - também vivenciam situações de dependência, sendo o contexto profissional que possibilita que, por exemplo, um médico, enfermeiro ou assistente social ofereça a confiabilidade necessária.

Na continuidade do artigo, Winnicott (1970/1999) propõe que o cuidar-curar seja compreendido como uma extensão do conceito de holding, ou seja, o conjunto de características exercidas pela mãe-ambiente ao adaptar-se de maneira suficientemente boa ao bebê, facilitando o seu processo de amadurecimento emocional. Desta forma, ao estabelecer um paralelo com a função de mãe, o psicanalista salienta a importância de os profissionais do cuidado ofertarem um contexto confiável para que a "cura" possa seguir seu processo nos pacientes/usuários. Assim, embora não proponha que estes profissionais realizem interpretações do inconsciente, Winnicott estende sua compreensão psicodinâmica para o papel do cuidado de diferentes pessoas que conseguem sustentar um espaço de expressão e escuta.

Após abordarmos o entendimento amplo do psicanalista sobre a "cura-cuidado", passemos então para algumas considerações de Winnicott sobre a atuação em equipe.

 

4.2. Um olhar psicodinâmico para a atuação em equipe

Embora não seja possível identificar uma teoria sistematizada na obra de Winnicott sobre o trabalho em equipe, consideramos haver um olhar psicodinâmico de grande relevância a partir do modelo de casework (trabalho de caso), termo utilizado em sua época no trabalho social com indivíduos e famílias (TIMMS; TIMMS, 1982c). Sobre este tema, é relevante destacar que sua esposa Clare foi referência importante para as interfaces entre o casework e a psicanálise, tendo influenciado o autor em relação a este tema (BRITTON, 1955; KANTER, 2004a).

Em palestra realizada para profissionais da proteção social, Winnicott (1959/2013) apresenta considerações detalhadas sobre o casework5 em casos que conjugavam questões psíquicas e sociais. O autor introduz o trabalho afirmando:

O atendimento de caso [casework] é descrito como um processo de solução de problemas. O termo atendimento de caso é usado para descrever a função total de uma agência6 particular no trato de um determinado problema. A psicoterapia é coisa totalmente diferente, e muitas vezes se desenrola sem que um atendimento de caso se desenvolva em paralelo, uma vez que o paciente infantil é apresentado por adultos que reconhecem nele um distúrbio, e o paciente adulto é capaz de realizar seu próprio atendimento de caso após livrar-se das inibições, compulsões, mudanças de humor e outros sintomas que derivam sua energia dos conflitos emocionais inconscientes (WINNICOTT, 1959/2013, p. 177).

Lançando mão de uma linguagem corrente no serviço social britânico do início do século XX, Winnicott salienta que o casework permite que uma agência particular (p.ex. serviço de assistência social ou saúde) possua uma "função total" frente a determinada questão ou sofrimento, auxiliando na integração do paciente ou da família. É interessante notar que, na citação acima, o psicanalista advoga que o adulto é capaz de realizar seu próprio trabalho de caso; contudo, em alguns escritos posteriores, há indicações de dificuldades também em adultos em gerirem sozinhos o seu próprio cuidado (Cf. WINNICOTT, 1964/1994, 1969/2005).

No decorrer do artigo sobre o casework, Winnicott (1959/2013) indica ainda existirem três tipos de casos distintos: (1) "aqueles integrados a partir do interior", ou seja, cujo ambiente e a própria criança possuem recursos para a recuperação; (2) aqueles que contêm um elemento desintegrador ou (3) cuja ruptura ambiental já foi consumada. Segundo o psicanalista, somente para o segundo e o terceiro tipos de casos seria pertinente que o casework fosse realizado por uma agência externa à família. Desta forma, entendemos que as contribuições do autor, embora privilegiem a infância, enriquecem uma discussão abrangente sobre as famílias e casos que precisam de maior suporte social.

Conforme Winnicott (1959/2013), embora psicoterapia e casework sejam distintos - não substituindo um ao outro -, existe uma relação estreita entre ambas as práticas, pois em muitos casos há "algo a ser feito" com os pais, familiares, escola ou outras pessoas pertencentes ao ambiente do paciente. Neste sentido, o psicanalista declara que "o termo atendimento de caso [casework] parece aplicar-se, um tanto vagamente, a todas essas ações que não constituem a psicoterapia propriamente dita" (WINNICOTT, 1959/2013, p. 181). Na experiência de Winnicott, este trabalho de articulação poderia ser realizado por ele mesmo (p.ex. em sua clínica privada) ou por meio de parceria com outros profissionais, conforme ocorria em sua atividade no Hospital Paddington Green.

Na perspectiva de Winnicott (1959/2013), a atuação em equipe era uma "maquinaria complexa" e era importante trabalhar de modo que os casos não ficassem "desintegrados" pelas atividades dos diversos componentes da equipe. Neste sentido, ele indica primeiramente a relevância de seu olhar, como psicanalista, nas discussões de caso (case conferences7) da equipe. Além disso, ele destaca sua forma de realizar o casework:

Devido a meu modo de trabalhar, aproveitei-me nos últimos anos da vantagem de ter como colegas assistentes sociais psiquiátricos e psicólogos, compartilhando casos com eles e beneficiando-me do princípio de que duas cabeças pensam melhor do que uma. Em certo número de casos, e de acordo com a disponibilidade do assistente social, tive a satisfação de poder delegar-lhe todo o trabalho, seja temporariamente, seja por um longo período. É como se eu passasse um caso para algum de meus colegas psiquiatras, com a diferença de que permaneço ainda detentor da responsabilidade médica pelo que ocorra, de modo que espero ser informado pelo assistente social do correr dos acontecimentos (WINNICOTT, 1959/2013, p. 191).

Desta forma, Winnicott destaca que um profissional (p.ex. assistente social) acompanhava o caso "em sua integralidade", enquanto o psicanalista permanecia numa posição de apoio e retaguarda. É interessante notar que nesta experiência Winnicott não estava realizando encaminhamentos, mas propondo uma atuação verdadeiramente compartilhada. Esta concepção de trabalho abre perspectivas de grande valor para o cuidado em equipe em situações sociais críticas, assim como possui uma interface interessante com as noções de corresponsabilização entre profissionais e serviços na atuação em rede no Brasil8. Além disso, o psicanalista estabelece um paralelo entre o papel de holding da mãe e da família em relação ao bebê, com a função das equipes e instituições frente aos casos que padecem - em termos sociais e psíquicos - pelos efeitos de menor integração em seu amadurecimento emocional.

Ao apresentar alguns casos de extrema complexidade psicossocial, Winnicott (1959/2013) assinala a importância de que os pacientes possam contar com a estabilidade de uma equipe ou de um serviço, o que consistiria na ampliação social de seu conceito de ambiente facilitador. Neste sentido, o psicanalista apresenta o caso de Anthony, que viveu importante ruptura do ambiente facilitador e foi acompanhado em Paddington Green dos oito anos até a idade adulta. Na perspectiva do autor, a Clínica Infantil da instituição foi "a única coisa que teve continuidade" na vida do paciente, enfatizando que a estabilidade do serviço foi muito importante pelo efeito integrador em Anthony, assim como em outros casos. Podemos considerar que o caso Anthony é perpassado pelas dimensões objetiva e subjetiva da exclusão (SAWAIA, 2001), diante das quais uma abordagem em equipe propiciou suporte e cuidado.

Desta forma, conforme pudemos demonstrar, a abordagem de Winnicott acerca do casework permitiu ao psicanalista apresentar uma concepção psicodinâmica de grande valia acerca da atuação multiprofissional. Segundo Kanter (2004b), o modelo do casework foi fortemente criticado no âmbito do trabalho social inglês a partir do final da década de 60, sob o argumento de não atuar nas causas da exclusão socioeconômica. Contudo, conforme sublinhado por este último autor, embora o casework não substitua a importância das lutas e progressos sociopolíticos, este modelo permitiu contribuições psicanalíticas valiosas por parte de Clare e Donald Winnicott para o cuidado em equipe em situações de desamparo psíquico e social, aportes que utilizaremos para analisar na sequência um caso clínico na atualidade.

 

5. Pensando o cuidado em equipe no Brasil: um caso clínico na Atenção Básica no SUS

Embora a prática institucional de Winnicott tenha sido realizada em outro contexto social e histórico, consideramos que diversos aspectos do raciocínio do psicanalista inerentes às consultas terapêuticas e ao cuidado em equipe contribuem de forma ampla para problematizações contemporâneas na atuação em contextos marcados pelas diferentes dimensões da exclusão. Neste sentido, apresentaremos um exemplo clínico, advindo de nossa prática na Atenção Básica no Sistema Único de Saúde (SUS) em um bairro periférico de uma metrópole, região que possui Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) baixo. Neste contexto, trabalhamos junto a algumas equipes de saúde da família, compostas por médico, enfermeiro, técnicos e/ou auxiliares de enfermagem e Agentes Comunitários de Saúde. Em nossa experiência, dispúnhamos de alguns horários semanais para conduzir sessões individuais ou em grupos com pacientes, mas grande parte de nossa atividade era realizada em uma perspectiva de trabalho compartilhado9 e em interface com o pensamento psicanalítico.

Dentre os casos que acompanhamos no cenário descrito acima, o caso de Elisa10 se destacou pelo arranjo do setting que construímos conjuntamente à equipe de saúde da família. O primeiro contato do serviço de saúde com o caso deu-se quando a Agente Comunitária de Saúde (ACS) Mônica foi parada pela mãe de Elisa, que lhe contou sobre suas preocupações acerca dos "cortes" que a filha de 14 anos fazia em seus próprios braços e pernas. A equipe de saúde da qual Mônica era ACS estava realizando algumas visitas domiciliares e conversaram sobre a possibilidade de realizar também uma visita à residência de Elisa naquele dia.

Ao chegar à casa - bastante pequena e, em nossa perspectiva, pouco estruturada para uma família numerosa - a ACS Mônica e a enfermeira Cíntia se apresentaram a todos que estavam presentes: Elisa, sua mãe, seu padrasto e três irmãos. Após as profissionais conversarem por alguns minutos com Elisa e seus irmãos na sala, a adolescente quis mostrar o quarto que dividia com seus irmãos e alguns objetos que eram de valor especial para ela. Ao dirigir-se a um espaço com um pouco mais de privacidade, Elisa indica uma expectativa de encontrar ajuda e relata, depois de alguns minutos de conversa, que vinha passando por um período de tristeza e que já havia se machucado com objetos cortantes. Embora em uma visita breve, estas duas profissionais "generalistas" puderam oferecer um espaço de escuta à adolescente, sem realizar conselhos ou pré-julgamentos. Neste contexto, a enfermeira Cíntia sinalizou também que, "em alguns momentos, precisamos da ajuda de profissionais", destacando que havia um psicólogo que trabalhava com elas na Unidade de Saúde. Em resposta, a adolescente indicou receio em conversar com um psicólogo, mas sinalizou abertura para encontrar as profissionais outras vezes.

Ao longo da semana, a ACS Mônica e a enfermeira Cíntia discutiram o caso com o psicólogo e, embora sentissem a necessidade de apoio especializado para Elisa, consideraram que um vínculo pôde ser iniciado na visita. Neste sentido, mais especificamente a ACS demonstrou interesse em continuar participando do cuidado de Elisa, situação pouco convencional no contexto daquela unidade de saúde. Logo, a equipe sugeriu uma consulta conjunta entre a ACS e o psicólogo no contexto da UBS, onde a adolescente poderia ter mais privacidade que em sua casa. Embora inicialmente não tivéssemos clareza de qual seria o papel de Mônica no acompanhamento da adolescente, entendemos que a sua presença poderia servir como mediação importante na acolhida da adolescente.

Alguns dias mais tarde, a partir do convite feito pela ACS, Elisa compareceu para uma consulta com o psicólogo e com Mônica, situação em que referiu considerar a mãe "muito invasiva", relatando que ela tentava controlar seu contato com o pai biológico. Em um período de muita angústia, refere ter produzido escoriações em si mesma, mas desde então percebia que sua família começou a tratá-la como "louca". Além disso, Elisa compartilhou o sentimento de não ter "espaço", relatando dividir o seu quarto com vários irmãos, mas ampliando os sentidos de tal verbalização para a falta que sentia de amizades significativas ou atividades em seu bairro (que contava com poucos equipamentos de cultura e lazer). No atendimento de Elisa, deparamo-nos com diferentes aspectos da exclusão: a pobreza, a restrição de acesso a direitos sociais básicos, a falta de espaço de pertença e expressão, assim como grande sofrimento psíquico.

Ainda na primeira consulta, emergiu a queixa de Elisa sobre "não poder fazer nada", verbalização que lhe devolvemos na perspectiva de ouvir o que ela desejava, ou ainda, sobre as alternativas que ela conseguia vislumbrar frente à situação que lhe causava tanta aflição. A partir desta consulta, decidimos escutar conjuntamente a adolescente mais uma vez; além disso, diante de toda a complexidade das dificuldades familiares, também foram realizadas propostas de cuidado para a mãe por outros profissionais da equipe.

Na segunda consulta conjunta, surgiu um pedido, por parte de Elisa, de ajuda para encontrar nos bairros próximos uma instituição que oferecesse um curso de artes, algo que a adolescente desejava muito fazer. Entendemos neste movimento, para além do interesse na atividade, a busca de Elisa de ter um momento "privado" com a ACS, fazendo uso do setting mais típico desta profissional: as ruas dos bairros no entorno do serviço de saúde. Mônica acolhe a proposta de Elisa, não apenas acompanhando a sua busca de matrícula em um curso de artes, mas dispondo-se também a escutar e "conter" relatos valiosos para a adolescente. Neste processo, a ACS também se posiciona como parte da equipe e do serviço de saúde - e não como uma amiga - esclarecendo que diante de algumas situações teria de conversar com os outros profissionais de sua equipe, mas indicando também que tais situações seriam abordadas com a própria adolescente.

Ao longo das semanas, a ACS vai se constituindo como uma figura importante para Elisa, o que permite que ela se sinta mais "integrada" - tanto no que se refere a pertencer a um curso e a um novo grupo de colegas, como no que tange a sentir-se cuidada de forma integradora por Mônica. Paralelamente à atuação da ACS, são ofertadas consultas individuais de psicologia a Elisa, cujas queixas se reduzem ao ponto de ela não sentir mais a necessidade deste atendimento. Em nossa perspectiva, a inclusão subjetiva da adolescente, que passa a encontrar continência na escuta da ACS, tem importante efeito em fazer cessarem os sintomas de autoagressão que vinham durante longo período.

Pudemos acompanhar, a partir de nosso trabalho conjunto com a equipe, mais de dois anos de vinculação entre Mônica e Elisa, tanto em idas da adolescente ao centro de saúde, como em visitas daquela profissional ao bairro da adolescente. Ao longo do tempo, Elisa teve períodos em que os sintomas de autoagressão se fizeram novamente presentes, sendo então acompanhada por um serviço especializado em saúde mental infanto-juvenil. Contudo, entendemos ser importante salientar que, neste processo, Mônica se manteve como importante figura de mediação entre a adolescente e o serviço de saúde especializado, assim como uma referência integradora para a adolescente ao longo do tempo.

No caso de Elisa, chama a atenção a potência da ACS como "cuidadora da mente" (mental nurse), com alguma semelhança à garota da comunidade que serviu de referência a Hesta (na consulta relatada por Winnicott). Além disso, embora sem formação técnica ou superior, Mônica se engajou em um trabalho equivalente ao casework, dispondo-se a um vínculo muito significativo para a adolescente, que pôde contar em diversos momentos com a sua "estabilidade" como parte de uma equipe e de um serviço de saúde.

Compreendemos que devido a diversas razões - por exemplo, geográficas e socioeconômicas - Elisa e seus familiares teriam dificuldade em aderir inicialmente a um serviço especializado ou atendimento psicanalítico mais tradicional (mesmo que este fosse ofertado gratuitamente). Contudo, uma ampliação do setting permitiu um lugar para a psicanálise desde o acolhimento de Elisa, contribuindo para pensar o cuidado em equipe em uma perspectiva clínica.

 

6. Considerações finais

Ao longo do artigo, apresentamos alguns elementos da obra de Winnicott que podem ser considerados como aportes da psicanálise para atendimentos em contextos de exclusão (SAWAIA, 2001). Neste sentido, destacamos que sua prática de consultas terapêuticas em um horizonte de trabalho cooperativo possibilitava uma ampliação das possibilidades de intervenção clínica, incluindo uma população que não teria acesso a essa modalidade de atendimento e considerando fatores sociais subjacentes aos casos em seu manejo, notadamente pela perspectiva de um trabalho com outros profissionais, como assistentes sociais. Além disso, a escuta privilegiada da pessoa a quem é levada a queixa possui uma ética de inclusão fundamental para o atendimento, muitas vezes desconsiderada no atendimento das pessoas em situação de pobreza e exclusão social. Por fim, as contribuições de Winnicott sobre a "ampliação do setting " trazem aportes relevantes para lidar com as correlações entre as dimensões objetiva e subjetiva do sofrimento, incluindo o sujeito e seu território no horizonte de intervenção.

Em nossa perspectiva, ao salientar as possíveis contribuições de Winnicott, é fundamental considerar também o seu escopo de atuação junto ao paciente, à família ou rede de apoio, ponderando que os contextos de exclusão demandam igualmente respostas comunitárias e governamentais que considerem suas causas estruturais. No entanto, sustentamos que a reflexão acerca das contribuições presentes na obra do psicanalista pode compor uma perspectiva de atuação em equipe que - sem deixar de lado a dimensão sociopolítica - também não exclua a dimensão clínica do cuidado.

Embora o caso de Elisa, apresentado acima, seja ambientado na saúde pública, entendemos também que diversos de seus elementos podem ser úteis para pensar o cuidado em equipe em outros setores e instituições brasileiras, incluindo as não governamentais. Deste modo, fazendo uso de alguns raciocínios oferecidos pelas experiências clínico-institucionais de Winnicott, consideramos ser possível pensar diversos elementos do cuidado em equipe como ampliação do setting e do valor social da psicanálise.

 

 

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Artigo recebido em: 06/07/2020
Aprovado para publicação em: 28/09/2020

Endereço para correspondência
Gustavo Vieira
E-mail: gustavovs@usp.br
Pablo Castanho
E-mail: pablo.castanho@usp.br
Elisa M. Parahyba Campos
E-mail: elisa.ops@terra.com.br

 

 

*Psicólogo. Doutorando em Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Integrante do grupo de pesquisa (CNPq/USP) Clínica de Grupos e Instituições: Abordagem Psicanalítica (CLIGIAP) e do Laboratório Interinstitucional de Estudos da Intersubjetividade e Psicanálise Contemporânea (LIPSIC). São Paulo, SP, Brasil.
**Professor Doutor do Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Líder do grupo de pesquisa (CNPq/USP) Clínica de Grupos e Instituições: Abordagem Psicanalítica (CLIGIAP) e membro do Laboratório Interinstitucional de Estudos da Intersubjetividade e Psicanálise Contemporânea (LIPSIC). Membro da International Association for Group Psychotherapy and Group Processes (IAGP) e do Núcleo de Estudos de Saúde Mental e Psicanálise das Configurações Vinculares (NESME). São Paulo, SP, Brasil.
***Livre Docente pelo Departamento de Psicologia Clínica do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (IP-USP). Vice Líder do grupo de pesquisa e práticas clínicas em Psicossomática inscrito no Diretório de Grupos de Pesquisa CNPq. Criadora e coordenadora do Laboratório Chronos de atendimento a pacientes portadores de câncer e seus familiares. Psicanalista pela Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo (SBPSP). São Paulo, SP, Brasil.
1O conceito de exclusão, nas acepções mais utilizadas nas ciências humanas e sociais, é um conceito proposto em 1974 por René Lenoir, três anos após o falecimento de Winnicott (WANDERLEY, 2001; RODMAN, 2003).
2Conforme Alexander (2012), o Hospital Paddington Green foi financiado de forma filantrópica até 1948, ano de sua incorporação ao sistema de saúde inglês (National Health Service).
3A informação de que o psicanalista havia passado o recesso em sua cidade natal (Plymouth) é revelada no caso em um dos desenhos produzidos por Hesta ("Lady of Plymouth"), o que indica que eles abordaram suas próprias relações com o interior da Inglaterra (WINNICOTT, 1971/1984; RODMAN, 2003).
4Ao longo de sua carreira, Winnicott teve grande interlocução com os assistentes ou trabalhadores sociais (social workers). Destacamos, neste sentido, que o autor ensinou durante muitos anos no prestigiado curso de Child Care na London School of Economics, formação de destaque no campo do serviço social britânico, que foi dirigida entre 1947 e 1958 por sua esposa Clare (KANTER, 2004b).
5Optamos por manter neste trabalho o termo original, visto considerarmos resguardar melhor o sentido desta noção teórica, assim como por não haver consenso na versão brasileira quanto à tradução.
6Conforme Timms e Timms (1982a), o termo agência (agency) no contexto do trabalho social britânico referia-se tanto às organizações de serviço social - que se dedicavam ao trabalho social como tarefa primária - como aos serviços que precisavam lidar com problemáticas sociais em um nível secundário, a exemplo dos hospitais.
7Segundo Timms e Timms (1982b), case conference era um termo utilizado nas políticas públicas inglesas para denominar a discussão entre vários profissionais de casos complexos, visando atribuir as responsabilidades para o seguimento dos casos.
8Esta perspectiva pode ser evidenciada, por exemplo, na corresponsabilização entre serviços da atenção básica em saúde e da atenção especializada em saúde, na corresponsabilização entre serviços da proteção social básica e proteção social especial, ou ainda nas articulações intersetoriais nas redes de garantias de direitos (JUNQUEIRA, 2004).
9As ações realizadas por profissionais de saúde mental de forma conjunta às equipes de saúde da família - a exemplo de discussões de caso, visitas domiciliares e consultas conjuntas - recebem a denominação de "apoio matricial" na política de saúde brasileira (CHIAVERINI et al., 2011).
10A fim de resguardar o sigilo, alguns dados do caso foram modificados, mantendo-se os elementos essenciais para o escopo do artigo.
11Para as citações dos textos de Winnicott encontrados nas obras A família e o desenvolvimento individual, Consultas terapêuticas em psiquiatria infantil, Explorações psicanalíticas e Tudo começa em casa, utilizamos as traduções brasileiras cotejadas com as edições em inglês (WINNICOTT, 1965/1995, 1971/2018, 1986/1990, 1989/2018).

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