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Psicologia Escolar e Educacional

Print version ISSN 1413-8557

Psicol. esc. educ. vol.8 no.2 Campinas Dec. 2004

 

ARTIGOS

 

Auto-avaliação da competência para ensinar: estudo preliminar de uma escala

 

Self-evaluation of teaching competence: preliminary study from a scale

 

 

Nilza Sanches TessaroI, 1; Raquel Souza Lobo GuzzoII, 2

I Departamento de Psicologia da Universidade Estadual de Maringá/PR
II Instituto de Psicologia programa de Pós-graduação Stricto Sensu da Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas/SP

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo teve por objetivo discutir questões relativas à competência do professor para ensinar, a partir de um conjunto de conhecimentos referente ao exercício da prática docente. Participaram deste estudo 36 professores de 1ª e 2ª série do ensino fundamental, de 7 escolas municipais de uma cidade no interior do Paraná. A maioria (72,22 %) dos participantes possui apenas magistério como grau de escolaridade, e 36,11% possuem pouca experiência profissional. Foi utilizada uma escala de auto-avaliação de competência para ensinar, a qual foi desenvolvida pela autora. É composta de 72 itens relativos às habilidades para prática docente. Os sujeitos escolheram entre cinco julgamentos nada, pouco, mais ou menos, muito e demais para cada item de habilidade pertencente à escala. Os resultados indicaram, a partir da análise das médias e porcentagens, que a população estudada percebe-se como competente e com habilidades pertinentes à prática docente.

Palavras-chave: Auto-avaliação, Competência para ensinar, Aprendizagem escolar.


ABSTRACT

This research intended to discuss the questions relating to the teacher competence to teach, from a set of knowledge related to the teacher‘s job. 36 primary school teachers of the first and second grade took part in this study. These teachers were from 7 municipal schools of a city in the interior of Paraná. Most of them (72,22%) have done only the Magistério and 36,11% have a little professional experience. A scale of self-evaluation of the teaching competence of the participants was used. The referred scale is composed by 72 items - abilities for the teacher‘s job - was developed by the researcher. The teachers should choose among 5 judgement from the scale. The judgement was: nothing, more or less, a lot, too much. The results, from the analysis of average and percentages, indicated that the population studied, assessed themselves as competent and with abilities in teaching.

Keywords: Self-evaluation, Teaching competence, School learning.


 

 

Introdução

Torna-se evidente, ante o insucesso das crianças na escola, que a formação do professor no Brasil, ainda apresenta-se “deficitária”, ou melhor, precária e fragilizada. Os professores não estão sendo devidamente preparados para enfrentar a realidade escolar, principalmente da escola pública, que é uma instituição destinada a atender alunos advindos de várias classes socioeconômicas e culturais. Infelizmente, observa-se que muitos professores, ao contrário do que se faz necessário, continuam sendo formados para atuar com uma população homogênea, desconsiderando as diferenças individuais, sociais, culturais e econômicas.

Fazer-se professor não se caracteriza um processo simples e imediato, mas complexo e longo. Para Lara, Mosquera e Ramos (1998), um professor não surge de repente, isto é, do dia para a noite. Para tornar-se um verdadeiro professor, é preciso um processo de formação profissional que lhe possibilite uma vasta liberdade de escolhas, atuação consciente e comprometimento social, fundamentado em valores que o levarão a desenvolver uma ação competente, crítica, transformadora e interativa.

Para Apple (1996), ensinar refere-se a uma profissão em que professores estão continuamente descobrindo, incorporando e aplicando novas e mais eficientes habilidades e conhecimentos sobre o desenvolvimento e aprendizagem do aluno. Ensinar não significa apenas reproduzir conhecimento, representa um processo contínuo de construção e reconstrução do conhecimento. Para um professor ensinar uma criança, não basta apenas conhecer as teorias de aprendizagem, é preciso, como assinala Ribas (1997), entender os processos de aprendizagem, o que lhe possibilitará estabelecer um caminho para ensinar.

Pode-se dizer que pensar em uma escola eficiente significa, em um primeiro momento, pensar no professor eficiente, ou seja, naquele que é competente para ensinar. O que significa, então, ser competente para ensinar? São várias as vertentes teóricas em relação à competência do professor. Há autores que enfatizam a competência técnica, outros valorizam mais a competência política, ou pessoal, no entanto, acredita-se, que todas são fundamentais para a realização de um trabalho de qualidade nas escolas, ou seja, ao professor se faz necessário tanto a competência técnica quanto a política e a pessoal.

Perrenoud (2002) apesar de dar maior ênfase à competência técnica, não deixa de valorizar a competência política. O autor apresenta 10 grandes dimensões de competências que devem ser desenvolvidas no professor pelas instituições de formação inicial e contínua: organizar e dirigir situações de aprendizagem; administrar e dirigir a progressão das aprendizagens; conceber e fazer evoluir os dispositivos de diferenciação; envolver alunos em suas aprendizagens e em seu trabalho; trabalhar em equipe; participar da administração da escola; informar e envolver os pais; utilizar novas tecnologias; enfrentar os deveres e os dilemas éticos da profissão; administrar sua própria formação contínua. Perrenoud (2002) afirma, ainda, que ser um bom professor não significa apenas a capacidade de transferir conhecimento, se faz necessário uma postura reflexiva, capacidade de observar, de regular, de inovar, de aprender com outros.

Kuenzer (1998), que se encontra dentro de uma vertente de competência política, relata um novo perfil de professor que as instituições devem formar. Primeiro é importante que esteja preparado para compreender a nova realidade, buscando apoio nas distintas áreas do conhecimento, para produzir ciência pedagógica. É necessário que tenha competência para identificar os processos pedagógicos que ocorrem no nível das relações sociais mais amplas como nos movimentos sociais organizados, nas ONG‘s e não somente nos espaços escolares. Além disso, devem saber lidar com esses processos e com seus conteúdos próprios, quer nos seus espaços peculiares, quer construindo formas de articulação destes com a escola; serem capazes de dialogar com o governo em suas diferentes instâncias e com a sociedade civil, no processo de discussão e construção das políticas públicas, tanto para sua implementação, quanto no seu enfrentamento. Salienta-se também a capacidade de transformar a nova teoria pedagógica em prática pedagógica escolar, fazendo a articulação entre a escola e o mundo das relações sociais e produtivas por meio de procedimentos metodológicos apoiados em bases epistemológicas adequadas. E por fim que possa organizar e gerir o espaço escolar de forma democrática e organizar experiências pedagógicas escolares e não escolares tendo como meta uma educação com expressão do desejo coletivo de uma sociedade que se almeja.

Demo (1993), um outro importante autor nesta vertente, lembra que o professor deve ser capaz de desenvolver na criança a capacidade de raciocínio, de posicionamento, tornando-o desafiador, provocador e instigador. Mas, para tanto, é importante o professor aprender a ler criticamente; obter redação própria e expressar-se com desenvoltura; dominar conhecimentos e informações estratégicas do processo de transformação da realidade atual; pesquisar, iniciando com pequenas pesquisas, passando para elaborações mais exigentes, que já expressam capacidade de síntese, de compreensão global, de posicionamento crítico criativo; aprimorar habilidade metodológica para manejar e produzir conhecimento.

Dentro dessa mesma vertente, encontra-se também Freire (1996), que aponta que ensinar exige rigorosidade metódica; pesquisa; respeito aos saberes dos educandos; criticidade, estética e ética; corporificação das palavras pelo exemplo; risco e aceitação do novo e rejeição a qualquer forma de discriminação; reflexão crítica sobre a prática, reconhecimento e a assunção da identidade cultural, entre outros.

Freire (1996) não deixa de frisar que a prática educativa requer afetividade. O professor deve então, como afirma Codo e Gazzotti (1999), ser capaz de estabelecer uma relação afetiva com seu aluno, pois, na atividade de ensinar o afeto torna-se indispensável, constitui-se em obrigatoriedade, o que permitirá a efetividade do trabalho. Esses autores ressaltam, ainda, que quando não se estabelece a relação afetiva, ou melhor, o vínculo afetivo entre o professor e os alunos, torna-se “ilusório” pensar que o sucesso do educador será completo, ou seja, a aprendizagem do aluno não será significativa, ocorrerá lacunas no processo ensino-aprendizagem.

Para Freire (1998), ao bom professor também se faz necessário as seguintes qualidades: humildade; amorosidade; a tolerância; a capacidade de decisão; segurança; tensão entre paciência e impaciência; parcimônia verbal. Arends (1995) complementa a afirmando que, aos futuros professores, nas próximas décadas, serão exigidos conhecimentos de Pedagogia, que vão além de conhecimentos relativos aos conteúdos específicos, como também serão responsáveis por recursos e práticas educativas que sejam eficazes. Acredita o autor que, ao professor do século XXI, será exigida a capacidade em vários domínios como, por exemplo: escolar, pedagógico, social e cultural, como também que sejam reflexíveis e capazes de resolver problemas.

Vasconcellos (1998 p. 7) assinala que “ser dador de aula, tomador de conta de aluno é fácil, mas ser professor, no sentido radical, não é fácil não”. Fazer-se, tornar-se, ser professor é muito difícil, principalmente quando se pensa no sucesso do aluno. Não basta apenas se dizer professor, tem de ser capaz de ensinar, ou melhor, fazer com que o aluno aprenda. Para tanto, como se verificou na literatura, o professor precisa de muitas competências.

A competência do professor deve constituir-se em aspecto relevante da educação em geral e da organização escolar neste novo século, pois se torna cada vez mais evidente que o sucesso da escola depende de sua prática profissional. Não bastam apenas escolas, mais vagas para alunos, melhor estrutura física, é preciso um professor que seja capaz de ensinar os alunos e transformá-los em cidadãos críticos e criativos. Em face ao referencial apresentado e das necessidades de se conhecer melhor a problemática aqui considerada, foram estabelecidos os seguintes objetivos para a presente investigação: identificar dados demográficos, como escolaridade, tempo de profissão, tempo de experiência na série, em professores de 1ª e 2ª série do ensino fundamental; verificar o índice de aproveitamento dos alunos por sala de aula; avaliar a competência do professor, pela auto-avaliação, por meio de uma escala de competência, desenvolvida para a pesquisa; comparar os resultados da auto-avaliação de competência do professor com o índice de aproveitamento dos alunos e algumas variáveis como grau de escolaridade e experiência profissional.

 

Método

Participantes

Participaram 36 professores, que atuavam na 1ª e 2ª série do ensino fundamental, em 7 escolas públicas municipais de uma cidade localizada no interior do Estado do Paraná, no ano de 2000. Os participantes eram todos do sexo feminino, com idade média de 30,25 anos, sendo que o de menor idade tinha 21 anos e o de maior idade 46 anos. A maioria dos participantes (72,2%) tinha apenas o Ensino Médio (habilitação magistério) como grau de escolaridade. O tempo médio da experiência no magistério foi de 7,5 anos, sendo que 9 participantes (25%) possuíam entre 6 a 10 anos de experiência, 17 (47,2%) tinham de 1 a 5 anos de experiência docente, 6 (16,68%) entre 11 a 15 anos, 2 (5,56%:) entre 16 a 20 anos e apenas 2 participantes (5,56%) tinham mais de 20 anos de experiência no magistério.

Material

Ficha de identificação. Por meio desta foi possível obter informações sobre idade, sexo, grau de escolaridade e experiência profissional;

Escala de Auto-avaliação da Competência para Ensinar.

Trata-se de um instrumento elaborado pelas autoras, composto por 72 itens –habilidades para a prática docente com cinco julgamentos para cada item: nada, pouco, mais ou menos, muito e demais. Esse instrumento foi desenvolvido a partir de um estudo-piloto que objetivou identificar as competências e habilidades necessárias para ensinar de acordo como o ponto de vista de professores; leitura e reflexão de textos –livros, artigos, teses e dissertações que tratam do assunto –competências e habilidades necessárias à prática docente. Foram identificadas algumas dimensões, dentre as quais se destacaram três características fundamentais para carreira docente e seus aspectos preponderantes: competência pessoal –que se refere aos itens de habilidades que avaliam aspectos da personalidade do professor relacionados à prática docente tais como afetividade, motivação, disciplina e equilíbrio; competência política –refere-se aos itens de habilidades que avaliam o valor político atribuído à atividade docente tanto no âmbito individual como coletivo, tais como compreensão do valor político da educação, ação política no cotidiano escolar, avaliação do impacto da educação; competência técnica – refere-se aos itens de habilidades que avaliam os conhecimentos técnicos do professor relacionado à prática docente, tais como técnica de ensino, manejo de classe, domínio de conteúdo, planejamento e avaliação.

Procedimento

Para a coleta de dados, inicialmente, foi feito um primeiro contato com todos os participantes, no qual realizou-se a exposição do trabalho que seria desenvolvido. Por se tratar de uma pesquisa que analisa a questão da competência do docente para ensinar o aluno, foram explicitadas a necessidade do sigilo e a liberdade da participação ou não na pesquisa. Após a anuência dos participantes, foi feito o levantamento do índice de aproveitamento dos alunos que foram atendidos por eles no ano de 2002. Posteriormente, os participantes preencheram a ficha de identificação. Em seguida foi realizada a aplicação da escala de auto-avaliação de competência para ensinar, que foi individual e na própria escola com duração de aproximadamente 40 minutos.

 

Resultados e discussão

De posse de todos os dados fez-se à descrição e discussão dos resultados. Os dados apresentados na Tabela 1 revelam que o menor número de pontos atribuído na escala de auto-avaliação da competência para ensinar pelos professores foi de 240, apenas um professor se atribuiu essa pontuação. O maior número de pontos foi de 324, sendo que também apenas um professor se atribuiu esse total de pontos. Dos 36 professores, onze se atribuíram um número de pontos acima de 300, 20 se atribuíram um total de pontos entre 274 a 298 pontos. Os demais, ou seja, cinco se atribuíram um total de pontos entre 240 e 265. A média de pontos atribuída pelo grupo foi de 288 pontos.

Torna-se importante destacar que a média de auto-avaliação da escala na competência, atribuída pelo grupo foi de 4,0 (muito competente). A menor média de auto-avaliação na competência atribuída pelos participantes foi de 3,33, sendo que apenas um participante se atribuiu essa média, a maior média foi de 4,50, a qual foi atribuída também por um participante.

 

 

Esses resultados sugerem que os professores que participaram da pesquisa percebem-se como profissionais que, no momento, possuem muita competência para ensinar. O que evidencia acreditarem eles, que detêm com muita intensidade um conjunto de habilidades e conhecimentos profissionais pertinentes à sua prática profissional. Esse autoconceito positivo dos professores pode ser entendido como bom. Entretanto, deve-se considerar que para uma prática profissional eficiente se faz necessário muito mais do que apenas um autoconceito positivo, é preciso também, como aponta Perrenoud (2000) uma postura reflexiva, capacidade de observar, de regular, de inovar, de aprender com os outros. Freire (1996) acrescenta afirmando que o verdadeiro professor, ou seja, o competente é aquele que tem como meta que ensinar não significa apenas transferir conhecimento, mas também criar as possibilidades para sua própria construção.

 

 

Os resultados apresentados na Tabela 2 mostram que a dimensão prevalente foi a relacionada às características pessoais, pois o grupo se atribuiu uma média de 4,26, o que sugere ser essa a dimensão em que os participantes percebem-se como mais competentes. Em contrapartida, a dimensão em que os participantes se atribuíram menor média foi a relacionada às características técnicas, em que o grupo se atribuiu uma média de 3,80. Na dimensão características políticas o grupo se atribuiu uma média de 3,99.

Os resultados também revelam que a maior média na auto-avaliação atribuída pelos participantes na dimensão características pessoais foi de 4,71 e a menor média foi de 3,42; a menor média atribuída pelos participantes na dimensão características políticas foi 3,28 e a maior média foi de 4,61; na dimensão características técnicas, observou-se que a média maior atribuída pelos participantes foi de 4,37 e a menor média foi de 3,17.

Os resultados evidenciam que os professores se auto-avaliaram com maior valor na dimensão que envolve as características pessoais do que naquelas que envolvem as características políticas e técnicas. Talvez isso se justifique pelo fato de os professores acreditarem que as habilidades relacionadas com a afetividade (vínculo com o aluno, diálogo, gostar do aluno...) e a motivação (gostar da profissão, considerar o trabalho importante...) sejam as mais importantes para sua prática profissional, ou, ainda, porque são as que reconhecem com mais facilidade. Vale destacar nesse momento a posição de autores como Codo e Gazzotti (1999) e Freire (1996) os quais estabelecem que a prática educativa requer afetividade. Acrescentam que é necessário se estabelecer uma relação afetiva com o aluno, caso contrário a sua aprendizagem não será significativa, podendo ocorrer lacunas e insucessos.

Torna-se importante ressaltar que há várias vertentes teóricas em relação à competência docente. Alguns autores, como pode ser observado na introdução enfocam a competência técnica, outros mais a competência política e pessoal. Entretanto, acredita-se que ao professor se faz necessário tanto as habilidades relacionadas com a competência pessoal (estabelecer vínculo, diálogo...) como a técnica (domínio de conteúdo, manejo de classe, planejamento, etc.) como a política (compreender que a educação é um processo amplo que tem impactos nas relações sociais, desenvolver o trabalho pedagógico a partir da compreensão da realidade vivida pelos alunos...).

Os dados apresentados na Tabela 3 revelam que o grupo de professores que possui curso superior se atribuiu uma média na auto-avaliação de 3,82, enquanto que o grupo de professores que tem apenas o magistério se atribuiu uma média de 4,04.

 

 

O grupo com menos escolaridade se atribuiu uma média maior, o que indica que esse grupo se percebe ainda mais competente que o outro. Essa diferença para menos pode indicar que esses profissionais foram mais exigentes em relação à sua auto-avaliação porque têm uma autopercepção mais crítica de sua atuação. Todavia não deixa de ser um resultado estranho, considerando-se que autores como Demo (1993), Garcia (1995), Nóvoa (1995), entre outros, enfatizam a necessidade de o professor ter uma boa formação inicial. Garcia (1995) afirma que tanto a formação inicial como contínua se constituem em aspectos fundamentais no desenvolvimento profissional de docentes.

Os resultados relativos à variável auto-avaliação por participante na categoria de experiência profissional podem ser observados na Tabela 4.

 

 

Por meio dos resultados explanados foi possível constatar que ao grupo de participantes com pouca experiência se atribuiu uma média de 4,04 na auto-avaliação da competência para ensinar e o grupo com experiência se atribuiu uma média de 3,83 e o grupo com muita experiência se atribuiu uma média de 4,07. O que sugere que a variável experiência profissional não está sendo considerada representativa nesse grupo de professores. Entretanto, vale destacar que autores como Arends (1995), Guarnieri (2000) e Porto (2000) enfatizam a importância da prática e da experiência profissional. Arends (1995) afirma que para um professor se tornar competente ele precisa do desenvolvimento profissional, e isso acontece por meio da formação contínua incluindo a experiência profissional. Ficam aqui, então, os seguintes questionamentos: o que pode ter ocorrido com esse grupo de professores? Por que essa variável também não foi tão representativa nesse grupo? Seria um problema de autopercepção dos professores?

A Tabela 5 mostra o índice de aprovação dos alunos, sendo que o maior índice foi de 83%, apenas 2 professores conseguiram esse percentual. Houve um professor que não conseguiu aprovar nenhum aluno. Torna-se importante destacar que doze professores alcançaram um índice de aprovação de alunos igual ou inferior a 50% e 24 atingiram um índice de aprovação superior a 50%. É preciso observar, todavia, que, neste último caso, mais de 50% dos professores –13 dos 24 –obtiveram um percentual de aprovação abaixo de 64%.

 

 

Merece destaque o fato de o professor se auto-avaliar com mais ou menos competência não representou maior ou menor índice de aprovação dos alunos. Por exemplo, o participante que se atribuiu a maior média (4,50) de avaliação na escala não foi o que aprovou mais alunos. O mesmo ocorreu com o participante que se atribuiu a menor média na escala (3,33) não foi o que obteve o índice de aprovação menor.

Um outro dado observado foi que uma professora que obteve como média de avaliação na escala 3,80, se considerando praticamente muito competente para ensinar, não conseguiu aprovar nenhum aluno em sua sala de aula. Isso sugere que esse professor, apesar de ter uma autopercepção positiva de sua competência, precisa de um maior investimento em seu desenvolvimento profissional, pois não é comum que um professor tenha como resultado final esse índice de aproveitamento de alunos.

Os dados apresentados na Tabela 6 revelam que não houve correlação linear entre as variáveis auto-avaliação média, tempo em sala de aula, quantidade de alunos aprovados e grau de instrução.

 

 

Os dados podem estar sugerindo uma ausência de associação entre essas variáveis e a competência do professor para ensinar. Nesse sentido, torna-se incoerente, principalmente quando se traz para consideração o valor e a importância que são atribuídos à formação inicial e contínua, assim como a experiência no desenvolvimento profissional do professor e seu compromisso competente na literatura educacional.

 

Considerações finais

Os resultados evidenciam que os participantes percebem-se como profissionais que, no momento, possuem muita competência para ensinar, pois a média da auto-avaliação de competência atribuída pelo grupo por meio da escala foi igual a 4,0. Esse resultado informa que os professores acreditam que detêm, com muita intensidade, um conjunto de habilidades e conhecimentos profissionais pertinentes à sua prática.

Considerando-se que não foram alunos bem-sucedidos que predominaram na maioria das salas de aulas dos participantes da pesquisa, pressupõe-se, então, que apesar de os professores se auto-avaliarem como muito competentes para ensinar, eles não se encontram totalmente preparados para prática docente. Pois se acredita que se os professores realmente fossem detentores de um conjunto de técnicas e habilidades pertinentes à prática docente o que prevaleceria como resultado em suas salas de aula seriam alunos bem-sucedidos.

Todavia, torna-se importante ressaltar que essa discrepância entre os resultados obtidos –por meio da escala de auto-avaliação para ensinar –e os resultados de aproveitamento dos alunos talvez se justifique pelo fato de os professores ainda entenderem o fracasso do aluno como um problema. Uma dificuldade apenas do aluno ou, ainda, por terem os professores identificado os itens de habilidades que constituíam a escala como todos importantes para sua prática profissional, respondendo, então, pelo grau de importância e não pelo grau de intensidade que tal habilidade ocorre com eles. Por fim, discute-se a validade do instrumento utilizado. Pode ser que não tenha sido estruturado de maneira a possibilitar obter informações mais coerentes e fidedignas sobre a competência do professor, pois como pôde ser observado, no método, trata-se de um instrumento elaborado pela autora que ainda está em estudo.

Acredita-se, entretanto, que o fracasso escolar, nas escolas que fizeram parte da pesquisa, poderá ser minimizado e até eliminado se ocorrer um melhor investimento no desenvolvimento profissional, ou seja, se ao professor for possibilitado a alcançar maior competência pessoal, política e técnica. Espera-se, então, que uma maior preocupação com a formação e preparação dos professores seja a tônica da educação nesse novo milênio, pois o professor, como apontam, Lara, Mosquera e Ramos (1998), não surge do dia para noite, mas, sim, a partir de um longo e rico processo de formação profissional que lhe possibilite uma atuação consciente e plena de comprometimento social.

Torna-se importante deixar claro que a intenção não é atribuir culpa a esses professores pelo fracasso dos alunos. No entanto, considera-se necessário conscientizá-los de que o sucesso da aprendizagem depende da qualidade de sua prática docente, ou melhor, da sua competência para ensinar.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Nilza Sanches Tessaro
Rua Rodolfo Luiz Enz, 153 –Jd. Brasília
CEP : 87140-000 - Paiçandu, PR
e-mail : nstessaro@uem.br
Raquel Souza Lobo Guzzo
Rua Santa Mônica, 136
CEP: 13.100-101 –Campinas, SP
e-mail : rguzzo@mpc.com.br

Recebido em: 01/07/03
Revisado em: 31/10/03
Aprovado em: 12/01/04

 

 

1 Docente adjunta do Departamento de Psicologia da Universidade Estadual de Maringá/PR.
2 Docente do Instituto de Psicologia e do programa de Pós-graduação Stricto sensu da Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Campinas/SP.