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Psicologia Escolar e Educacional

Print version ISSN 1413-8557

Psicol. esc. educ. vol.9 no.2 Campinas Dec. 2005

 

ARTIGOS

Escrita, maturidade emocional, operatoriedade e criatividade num grupo de crianças de Uberlânida

 

Writing, emotional maturity, operativeness and creativity in a children´s group from Uberlândia

 

 

Claudia Araújo da Cunha1

Universidade Federal de Uberlândia.

Endereço para correspondência

 


RESUMO

Este trabalho teve como objetivo discutir as possíveis relações estabelecidas entre as dificuldades de aprendizagem na escrita, o nível intelectual, criatividade e maturacional de crianças de segunda série do ensino fundamental. Para tanto, utilizou-se a Escala de Avaliação na Aprendizagem na Escrita (ADAPE), a prova de conservação de comprimento, a prova de posições possíveis dos dados sobre um suporte e o teste do CAT-H. Os quatro testes foram aplicados em 40 crianças, de ambos os sexos, de duas escolas da rede pública de ensino da cidade de Uberlândia - MG. Os coeficientes de correlação por postos de Spearman sugerem que houve uma correlação positiva significante obtida entre as variáveis conservação de comprimento e criatividade. Quanto aos valores de U a partir da aplicação do teste de Mann-Whitney, a escola localizada na região mais central obteve diferenças significantes entre as variáveis erros do ditado e conservação de comprimento.

Palavras-chave: Dificuldade de aprendizagem, Nível cognitivo, Ensino fundamental.


  ABSTRACT

The aim of this paper is to discuss the possible relations established between learning disabilities in writing and the intellectual, creative and maturity levels of children in the second year of primary school. To do so, we have used the Scale of Learning Evaluation in Writing (ADAPE), the length conservation test, the test of possible positions of data about a support experiment and the CAT-H test. All four tests were applied in 40 children, of both genres, from two state schools in the town of Uberlândia. The Spearman correlation coefficient by ranks suggests that there has been a significant positive correlation of the creativity with the length conservation variables. Regarding the U-values acquired from the application of the Mann-Whitney test, the school located in the most central area obtained significant differences between the dictation error variable and the length conservation variable.

Keywords: Learning disabilities, Cgnitive assessment, Elementary school.


 

 

INTRODUÇÃO

O processo ensino-aprendizagem suscita inúmeros questionamentos acerca do desempenho escolar daqueles que não apresentam comportamentos condizentes ao esperado. Educadores, pedagogos, psicólogos e demais profissionais da educação buscam explicações plausíveis do que esteja acontecendo, ou melhor, das possíveis causas das dificuldades de aprendizagem de seus alunos. Dificuldades essas referentes a seis grandes áreas: perceptivo- atencional, psicomotora, lingüística, socioafetiva/emocional, pensamento lógico e também do pensamento criativo (Sisto, 2002A).

As dúvidas e questionamentos são muitos e, não é raro, encontrarmos nos mitos e preconceitos presentes no cotidiano escolar respostas ditas conclusivas que explicam o fracasso escolar de um grupo de alunos. Postulados oriundos do senso comum surgem com uma certa regularidade, tais como: “esta criança tem família desestruturada”, “emocionalmente abalada”, “criança pobre não aprende porque é desnutrida” e até mesmo “criança pobre não aprende porque é indisciplinada”. Essas e outras afirmativas colaboram com o surgimento e, posterior, manutenção de determinados padrões considerados “normais” em detrimento de outros menos esperados. Isso contribui com os assim chamados “comportamentos previsíveis”, no qual uma conduta leva necessariamente a outra. Se considerarmos tal posicionamento como relevante, estaríamos também afirmando, ou que o sujeito já nasce pronto e acabado ou que o ambiente o molda do jeito que convém, uma vez que o sujeito nasce uma tábula rasa.

Nem só o meio, como diriam os empiristas, nem só o sujeito pré-formado frente às requisições do meio, como postulam os inatistas constituem para Piaget e Gréco (1974) a base da aprendizagem construtivista. Aprendizagem construtivista para Piaget e Gréco (1974) não é pura aquisição de conhecimento nem também de constructos já formados. É uma aprendizagem construída em interações sucessivas entre sujeito e o objeto de estudo. Nesse sentido, cabe questionarmos: por que meu aluno não aprende frente a dado conteúdo, que fatores estariam contribuindo para o baixo rendimento escolar, poderíamos,, então, relacionar possíveis variáveis que estejam incidindo sobre tal conduta?

Dificuldade de Aprendizagem em Escrita

Segundo Sisto (2002A), o baixo rendimento escolar é uma das manifestações mais evidentes das dificuldades de aprendizagem. Se uma criança apresenta um bom desempenho escolar, mesmo que tenha dificuldade para aprender e com muito esforço a esteja superando, esta criança passará despercebida, da mesma forma que crianças que não estudam por falta de interesse ou preguiça correm o risco de serem classificadas como crianças com dificuldade de aprendizagem. As generalizações excessivas podem, por vezes, levar a confusões conceituais sérias em que pouco ou quase nada ajudam no diagnóstico das possíveis causas dos problemas de aprendizagem para as crianças que de fato apresentam dificuldades de aprendizagem.

Ainda no seu relato, Sisto (conforme citado por Lyon, 1995) afirma que atualmente os problemas fonológicos representariam cerca de 80% das dificuldades de aprendizagem. Além disso, acrescenta-se o fato de que as dificuldades morfológicas também estariam na base dessa problemática (Carlisle, 1995).

O estudo de Guimarães (2003) investigou a relação entre habilidades metalingüísticas (consciência fonológica e sintática) e desempenho na leitura e na escrita (ortografia) de palavras isoladas. Para tal, foram formados três grupos de sujeitos: 20 crianças com dificuldades em leitura e escrita, cursando 3a e 4a séries (grupo 1); 20 crianças da 1a série, com o mesmo nível de leitura e escrita, dos sujeitos do grupo 1 (grupo 2) e 20 crianças da 3a e 4a séries, com a mesma idade cronológica dos sujeitos do grupo 1 (grupo 3). A hipótese de que o grupo 1 apresentasse escores inferiores nas habilidades metalingüísticas, quando comparado aos outros grupos foi confirmada Não se observou, entretanto, diferença significativa entre os grupos 1 e 2, os quais tiveram um desempenho inferior ao do grupo 3. Conclui-se que as dificuldades em leitura e escrita estão relacionadas, predominantemente, com problemas de natureza fonológica.

Por outro lado também lidamos rotineiramente com crianças sem problemas fonológicos (consciência fonológica ou morfológica, uso da codificação fonológica, recuperação rápida pela memória da informação fonológica, amplitude de memória, percepção da fala, seqüências fonológicas complexas etc.) e com bom desenvolvimento na linguagem que podem vir a ter dificuldades durante o processo de alfabetização. Isso sugere que outras variáveis estariam incidindo nesse processo.

Vê-se, pois, que as dificuldades de aprendizagem associam-se a outros fatores e perpassam ao longo da vida das pessoas. Além disso, Sisto (2002A) reitera suas colocações, afirmando que há uma forte tendência explicativa atual das dificuldades de aprendizagem. Estas estariam relacionadas a problemas de cunho lingüístico e suas conseqüências, ao estarem associadas ao fracasso escolar, seriam a diminuição da motivação pelo rendimento escolar, da auto-estima, da auto-eficácia e problemas de auto-regulação ou metacognitivos.

A maturidade emocional e a dificuldade de aprendizagem na escrita

Inúmeros estudos tem sido realizados no intuito de demonstrar até que ponto os fatores emocionais/afetivos corroboram ou não dificuldades de aprendizagem na escrita. Destacaremos, pois, algumas pesquisas que contemplam essa investigação.

Sisto e cols. (2002) foram os precursores no estudo da integridade do ego e o desempenho em escrita. Participaram da pesquisa 56 crianças, de ambos os sexos, provenientes de três classes de 1a série do ensino fundamental da cidade de Campinas – SP. Os instrumentos utilizados foram o teste desiderativo e três tipos de ditados, estudados por Gualberto (1984) com quantidades de palavras e níveis de dificuldades também distintos. Os resultados permitiram constatar que os erros no ditado, tanto no que se refere a letras quanto de palavras incompletas estavam relacionados significativamente com o grau de força do ego. Quanto mais forte era o ego da criança, menor era a média de erros no ditado de palavras e letras.

Algumas pesquisas recentes (Cruvinel e Boruchovitch, 2003; Enumo, Ferrão, Ribeiro e Dias, 2003) têm destacado que a depressão e a ansiedade não se manifestam isoladamente, mas que vem associadas a outras dificuldades, principalmente a problemas comportamentais e escolares, ocasionando um prejuízo no seu funcionamento psicossocial.

Nesse sentido, Pacheco (2003) objetivou averiguar a relação entre variáveis psicossociais e as dificuldades de aprendizagem na escrita. Foram analisadas respostas de 123 crianças da 3a série do ensino fundamental, pertencentes a quatro escolas da rede pública da cidade de Campinas - SP. Utilizou a escala ADAPE - Avaliação das Dificuldades de Aprendizagem na Escrita - no intuito de detectar as dificuldades de aprendizagem na escrita, além da escala de personalidade para crianças. Os resultados apontaram que os sujeitos dissimulados socialmente, com pontuações mais baixas na escala sinceridade ou dissimulação social (S) apresentaram dificuldade de aprendizagem acentuada na escrita.

Dentro de um enfoque em que a interação pessoal também é constituída por percepções e expectativas em relação à(s) outra(s), Schiavoni e Martinelli (2003) investigaram a existência de relação entre o desempenho em escrita de crianças e como essas percebem as expectativas de seus professores. Participaram deste estudo 139 sujeitos, sendo 73 do sexo masculino e 66 do sexo feminino, freqüentando a 3a série do ensino fundamental.

A avaliação do desempenho em escrita foi medida por meio de um ditado padronizado e elaborado (ADAPE) por Sisto (2002a) que detecta as dificuldades mais comuns na escrita de crianças, sendo constituídos três grupos de acordo com o desempenho em escrita. A percepção dos sujeitos em relação ao que pensam ser a opinião de seus professores a seu respeito foi obtida através de um instrumento contendo vinte afirmações, dez positivas, que indicam boa percepção do aluno, e dez que indicam uma percepção negativa, cujas opções de respostas eram sempre, às vezes ou nunca. Os resultados indicaram que quanto pior o desempenho em escrita, mais negativa a percepção que as crianças acreditam terem seus professores a seu respeito.

Borges e Martinelli (2003) pesquisaram as possíveis relações entre dificuldades de escrita e a força do ego. Para tal, aplicou-se a escala ADAPE para avaliar a dificuldade de escrita e para avaliar a força do ego, utilizou- se o teste desiderativo. A amostra foi composta por 100 crianças, ambos os sexos, da 3a série do ensino fundamental.

Os resultados apontaram que as dificuldades de escrita por erros por palavras e erros por letras estão significativamente relacionados à força do ego. Assim, quanto maior a força do ego maior a dificuldade de escrita e quanto mais bem estruturado o ego se apresenta, melhor desempenho na escrita. Os pesquisadores, contudo, ressaltam que não há como generalizar de que toda criança que possui um ego bem estruturado terá sucesso, uma vez que é sabido que este não se constitui como único fator que interfere no processo de aprendizagem da escrita, sendo necessário considerar a multifatorialidade do fracasso escolar.

Sisto e Bartholomeu (2003) procuraram analisar as relações entre a intensidade de problemas emocionais e os erros na escrita. Os participantes foram 88 alunos de classes de 2a série do ensino fundamental de uma escola pública. Foram utilizados o Desenho de Figura Humana e o ADAPE (Escala de Avaliação de Dificuldades de Aprendizagem em Escrita). Os resultados evidenciaram que crianças que apresentam maiores dificuldades na aquisição da escrita, encontram-se acompanhadas por indícios de problemas emocionais.

Dificuldades de Aprendizagem, Operações Concretas e a Abertura de Possíveis

Yaegashi (1992), Martinelli (1992), Liesenberg (1992), Louro (1993), Sisto e Yaegashi (1994); Silva (1995), Pereira (1995) e Pavanello (1995) foram os precursores na literatura nacional acerca das possíveis relações estabelecidas entre as operações concretas e a formação de possíveis.

Yaegashi (1992) objetivou responder ao efeito da abertura para novos possíveis na prova de recorte de quadrados num conteúdo operatório (prova de inclusão de classes). Foi interesse também da autora verificar a estabilidade ou não do conteúdo aprendido.

O grupo experimental composto por 4 sujeitos de 6 anos, 3 sujeitos de 7 anos e 3 de 8 anos foi submetido a um processo de intervenção por conflito cognitivo. O intuito foi o de realizar intervenções que desequilibrassem as concepções das crianças. Já o grupo controle não passou por nenhum tipo de intervenção.

Os resultados evidenciaram que todos os sujeitos submetidos a um processo de intervenção para aprendizagem dos possíveis na prova de recorte de um quadrado evoluíram para o nível dos co-possíveis. Nenhum dos sujeitos retornou ao nível analógico depois do pós-teste. Não se constatou, entretanto, uma influência muito nítida entre aprendizagem em possíveis e um conteúdo operatório. Apenas dois sujeitos passaram a apresentar o conceito de inclusão de classes e, mesmo assim, demonstraram-no somente algum tempo depois do processo de intervenção. Já o grupo controle não sofreu alteração do começo ao final do experimento.

Semelhantemente ao trabalho de Yaegashi (1992), Liesenberg (1992) também objetivou averiguar a possibilidade da ocorrência de aprendizagem por conflito cognitivo na prova formas possíveis de uma realidade parcialmente escondida, e qual a influência desta na aquisição da conservação de líquido. Foram selecionados somente os sujeitos que apresentaram comportamento analógico puro na prova de possíveis e não conservadores na prova de conservação de líquido.

Os resultados também evidenciaram a eficácia do processo de intervenção na aquisição de novos possíveis pela criança. Entretanto, a relação entre possíveis e operatoriedade também se mostrou tênue, pois o grupo controle também apresentou progressos na conservação. Logo, não foi possível atribuir tal conclusão à intervenção propriamente dita, mas ao acaso. Além disso, a autora também constatou que nos dois grupos, experimental e controle, quando houve mudança evolutiva em conservação, os dois grupos também atingiram o nível dos co-possíveis no pós-teste retardado.

O estudo de Louro (1993) seguiu uma trajetória inversa a das pesquisas anteriormente citadas, uma vez que a autora interviu numa prova de conteúdo operatório (conservação de massa) e tentou verificar se essa aquisição possibilitaria ao indivíduo manifestar uma abertura aos co-possíveis na prova de posições de três dados sobre um suporte. O grupo experimental foi composto por 11 sujeitos entre 4 a 6 anos e o controle por seis sujeitos na mesma faixa etária. Os resultados do experimento mostraram que os sujeitos que sofreram intervenção no conteúdo operatório apresentaram uma evolução do nível analógico constatado no pré-teste para o nível dos co-possíveis no pós-teste. Tal evolução permaneceu até o pós-teste retardado.

Sisto e Yaegashi (1994) trabalharam com a relação da criatividade lógica e de operações concretas. Para tanto, foram utilizadas as prova de conservação de massa, o recorte de quadrados e a posição dos dados.

Os resultados apontaram que não houve uma relação de antecedência entre a prova de conservação de massa e de posição dos dados. Nos recortes livres, contudo, a operatoriedade parece sucedê-la enquanto nos recortes livres em dois, recorte em dois iguais, recorte em três e três iguais, sugeriu-se que a presença do nível dos copossíveis não implica em conservação, mas conservar implica em apresentar co-possíveis quaisquer.

O estudo realizado por Silva (1995) partiu da hipótese de que a formação de possíveis antecede as operações concretas. O autor trabalhou com dois processos diferentes de intervenção para a aquisição da conservação de massa em sujeitos não conservadores. Uma das técnicas utilizou-se somente do conflito para resolver a conservação e a outra uniu o uso do conflito e possíveis.

A primeira técnica caracterizou-se por subtrair ou adicionar pedaços de massa e, a segunda pelo acréscimo de questionamentos quanto à possibilidade de solucionar o problema de outras maneiras ou imaginar outros jeitos de amassar as bolinhas e chegar aos resultados possíveis com a massa, por ele previsto.Foram selecionados 20 sujeitos entre 6 a 7 anos que não apresentavam indício de operatoriedade. Dois grupos experimentais foram formados com 10 sujeitos cada.

Os resultados apontaram para uma eficácia maior da intervenção somente com conflito cognitivo, pois esse tipo de intervenção possibilitou o aparecimento da operatoriedade de forma mais rápida que a proporcionada pela intervenção com conflito e possíveis. Isto pode ter sido explicado pelo número de conflitos.

Pereira (1995) por sua vez, questionou até que ponto o recorte de quadrados interferiria ou provocaria a seriação operatória. Pesquisou 56 crianças, com idade entre 4,9 a 6,9 anos, de ambos os sexos de uma creche com nível sócio-econômico baixo. Os sujeitos foram prétestados na prova de recorte de quadrados e na seriação de bastonetes. Aqueles classificados como analógicos e ausentes, quanto à criatividade e à operatoriedade formaram o grupo experimental e controle. As intervenções, em número de oito, na forma de conflito cognitivo, terminaram, uma vez alcançado o nível dos co-possíveis.

Os resultados evidenciaram que todos os sujeitos do grupo experimental apresentaram evolução em seus níveis. Tal constatação manteve-se no decorrer dos póstestes 1 e 2. Contudo, não houve influência da prova de possíveis sobre o conceito da aquisição de seriação operatória. Somente cinco crianças alcançaram o nível de seriação operatória, o que leva a crer que tal conceito já se encontrava em fase de formação, fazendo parte de um desenvolvimento espontâneo.

Pavanello (1995) pesquisou a aprendizagem de possíveis por conflito cognitivo na prova da maior construção de Piaget (1985). Também foi interesse da autora averiguar a influência do procedimento experimental na conservação de comprimento, de área e na evolução da prova de realidade parcialmente escondida. Os sujeitos do grupo experimental apresentaram uma evolução na prova da maior construção no primeiro pósteste. O mesmo não foi encontrado no segundo pós-teste, que demonstrou pouca estabilidade.

Na prova de conservação de comprimento ocorreram mudanças positivas nos sujeitos, porém, não foram mudanças uniformes para todos os sujeitos. Com relação à prova de conservação em área, tanto o grupo experimental como o controle manteve-se no nível de não conservação. Na prova de realidade parcialmente escondida não ocorreu evolução em ambos os grupos. A conclusão a que a autora chegou foi que o conflito cognitivo mostrou-se eficaz na melhoria do desempenho dos sujeitos na prova em que foi aplicado como procedimento. Contudo, no que se refere às estruturas operatórias, as mudanças foram atribuídas ao acaso.

Em síntese, os autores apontaram que sujeitos, quando submetidos a um processo de intervenção para aprendizagem, seja em provas de criatividade ou em conteúdos operatórios, evidenciaram mudanças de nível cognitivo. Entretanto o que não se pôde afirmar foi a influência clara entre aprendizagem em possíveis e conteúdo operatório.

Conflito cognitivo e a formação de possíveis

Os estudos de Martinelli (1992; 1998) e Costa (1995) colocaram uma problemática diferente a dos demais autores citados, pois além de terem utilizado o conflito cognitivo como procedimento nas sessões de aprendizagem, procuraram discutir as relações existentes entre duas provas de possíveis.

Martinelli (1992) também desenvolveu um modelo de conflito cognitivo com 60 crianças entre 5 e 7 anos, utilizando, especificamente, os recortes livres, a mediação em partes iguais, a multiplicação de possíveis e sua atualização como a única solução correta além da construção de arranjos espaciais e de eqüidistância, na qual a partir de inúmeras possibilidades, o sujeito deveria chegar à solução mais aceitável que seria o círculo, resultando numa variedade, dos possíveis admitidos.Os resultados apontaram para uma alta concentração de sujeitos no nível dos co-possíveis e sua gradativa organização ao possível exigível. Contudo, a autora colocou que devido ao pouco tempo de realização do estudo, não foi possível determinar relações significativas entre aprendizagem em eqüidistância e abertura dos possíveis na prova de recortes.

Costa (1995) procurou verificar até que ponto a manipulação de um material é capaz de desencadear o possível dedutível quando os sujeitos são submetidos a um processo de intervenção que se utiliza do conflito cognitivo. As provas utilizadas foram posições possíveis de três dados sobre um suporte e um caso de possível dedutível.

Participaram da pesquisa 38 sujeitos entre 5 a 6,8 anos de idade, classificados como analógicos no préteste, que compuseram dois grupos: 16 do grupo experimental e 17 do grupo controle. Os resultados demonstraram que 10 sujeitos do grupo experimental apresentaram movimentação cognitiva e seis sujeitos apresentaram ausência de movimento do pré para o pósteste 2. Na prova posições possíveis de três dados, houve alguma movimentação no grupo controle.

Martinelli (1998), mais recentemente, realizou uma pesquisa com o objetivo de verificar se houve relação entre o tempo de intervenção e quantidade de conflito no desempenho de grupos. Fizeram parte desse estudo 77 sujeitos entre 4,7 a 6,8 anos, divididos em quatro grupos. Os dois primeiros grupos foram submetidos a sessões de aprendizagem em apenas uma prova. O primeiro grupo trabalhou com a prova de formas parcialmente escondidas e o segundo grupo em eqüidistância O terceiro grupo seguiu a seguinte seqüência de aprendizagem: eqüidistância e posteriormente formas parcialmente escondidas. O quarto grupo seguiu a seqüência inversa.

Foram encontradas diferenças significativas entre idade e desempenho na prova de realidade parcialmente escondida. Em relação ao tempo e à quantidade de conflito na mesma prova não foram encontradas diferenças entre os grupos. Em eqüidistância, os resultados mostraram alguma diferença com relação ao tempo. As pesquisas apontaram que, a aprendizagem em um conteúdo específico pôde favorecer a aprendizagem em outro conteúdo também de possível. Isto significou que quando alguns conteúdos foram adquiridos, esses podiam facilitar a aquisição de outros. Pôde-se afirmar que houve aprendizagem de formas, além de conteúdos.

Partindo da premissa de que a dificuldade de aprendizagem na escrita perpassa por um processo no qual aspectos afetivos, lógicos e de criatividade, dentre outros, podem exercer alguma influência na construção do conhecimento de grupos de crianças, a presente pesquisa objetivou investigar as relações estabelecidas entre a dificuldade de aprendizagem da escrita, o nível cognitivo, formação de possíveis e o nível de maturidade emocional, em sujeitos do ensino fundamental.

 

MÉTODO

Participantes

Participaram da pesquisa 40 sujeitos, alunos da 2a série do ensino fundamental, de ambos os sexos, sendo 57,5% (n=23) do sexo feminino e 42,5% (n=17) do sexo masculino, de nível sócio-econômico baixo, de duas escolas públicas estaduais da cidade de Uberlândia - MG, uma delas periférica e a outra localizada no centro da cidade. Foram aplicados os testes em 10 crianças da escola periférica e 30 da escola no centro da cidade. As crianças da escola periférica tinham idades variando de 7 anos e 6 meses a 8 anos e 3 meses, com média de 7 anos e 11 meses e desvio padrão de 3 meses. As idades das crianças que freqüentam a escola mais central variavam de 7 anos completos a 8 anos e 4 meses, com média de 7 anos e 9 meses e desvio padrão de 4 meses.

Instrumentos

Avaliação de Dificuldades na Aprendizagem da Escrita – ADAPE. (Sisto, 2002a). O texto da escala de Avaliação de Dificuldades na Aprendizagem da Escrita (ADAPE) foi construído e validado numa versão mais atual descrita em Sisto (2002a), seguindo alguns critérios como: palavras usuais no cotidiano escolar das crianças; uma mesma palavra poderia conter mais de uma dificuldade; e deveria haver pelo menos um terço de palavras trissílabas e/ou polissílabas.

O texto é constituído por 114 palavras, com 60 delas apresentando algum tipo de dificuldade classificada como encontro consonantal, dígrafo, sílaba composta e sílaba complexa, e 54, não. Cada uma das palavras foi considerada um item ou unidade de medida para efeitos de pesquisa. Para a correção dos ditados, cada palavra foi considerada uma unidade e qualquer erro ortográfico ou ausência de palavra foi considerada erro, assim como acentos e letras maiúsculas e minúsculas indevidas, sendo a soma dos erros a pontuação de cada criança. Quanto à classificação: até 20 erros (sem dificuldade de aprendizagem); entre 21-49 erros (início de indicação de dificuldade de aprendizagem); 50-79 erros (dificuldade de aprendizagem leve) e 80 ou mais erros (dificuldade de aprendizagem média).

Prova de Conservação de Comprimento

A prova de conservação de comprimento originouse da prova intitulada “deformação de linhas a comparar” (Piaget, 1976). Foram utilizados os seguintes materiais: a)quatro palitos de madeira medindo 7 cm de comprimento por 0,8 cm de largura, denominados palitos grandes, e nove palitos pequenos, medindo 4 cm de comprimento por 0,8 cm de largura, denominados palitos pequenos, b) uma folha de registro elaborada para esta prova. Nela foram anotadas as respostas de cada sujeito e o tempo de duração.Quanto aos critérios de classificação da prova, três tipos de respostas foram considerados: a) ausência de conservação, quando os sujeitos não afirmaram a igualdade das retas; b) reações intermediárias: quando as crianças oscilavam entre a conservação e a nãoconservação e c) resposta de conservação, quando o sujeito coordenou as operações de partição e de colocação ou deslocamento. A aplicação do teste foi de aproximadamente 10 minutos.

Prova de Posições Possíveis dos Dados

A prova de posições possíveis dos dados utilizou os seguintes materiais: a) três dados de papelão coloridos, b) dois suportes de papel duro, nas formas triangular e circular, c) uma folha de registro elaborada para esta prova.A criança era classificada no nível IA (possível analógico mais elementar) quando trabalhava com pequenas variações e dentro de uma só família. Quando apresentava maiores variações e até duas famílias, era considerada intermediária (IB, possível analógico mais avançado). O nível II (co-possíveis) caracterizava-se quando as variações eram marcantes e havia presença de pelo menos três famílias de possíveis. Para o nível III (co-possíveis quaisquer) era necessário que a criança aceitasse que não havia limite nas formas de colocar os dados, isto é, sempre poderia ter mais um jeito diferente de colocar os dados. O tempo de duração da prova foi de aproximadamente 10 minutos.

Teste Projetivo de Apercepção Temática Infantil Humano (CAT-H)

O Teste Projetivo de Apercepção Temática Infantil Humano (CAT-H) confeccionado por Bellak e Bellak (1965) foi realizado mediante a apresentação de dez pranchas com figuras humanas, no qual cada criança deveria elaborar uma breve história com base na cena representada por cada uma das pranchas. Essas histórias deveriam conter os sentimentos e pensamentos dos personagens, o que gostam de fazer e o que estava acontecendo com eles em cada cena apresentada.A análise interpretativa está dividida em dez variáveis, quais sejam, tema principal; herói; quais as figuras são visualizadas e, diante delas, como a criança reage; qual a concepção de mundo; figuras, objetos e circunstâncias externas introduzidas; objetos ou figuras omitidos; natureza das ansiedades; conflitos significativos; severidade do superego; integração do ego (nível de maturidade emocional). Nesta última, avalia-se o nível de maturidade da criança, caracterizando-a como aquém, dentro do esperado ou além, de acordo com a idade da mesma.

A atribuição de escores seguiu critério de Cunha, Freitas e Raymundo (1993). O escore zero foi atribuído na ausência de resposta ou quando a criança não conseguia cumprir a tarefa; ou seja, quando a verbalização, se existente, era muito rudimentar e a criança ou se limitava a apontar ou a enumerar um item, ou no máximo, dois itens, mas de forma não adequada. O escore 1, quando a verbalização se restringia à enumeração adequada de pelo menos dois itens, presentes na gravura estímulo. O escore 2, quando a verbalização se limitava, no máximo, a uma descrição simples, com inclusão de uma ação (ou de ações com significado idêntico), justificada pelo estímulo. O escore 3, quando a verbalização era uma descrição mais elaborada, constituída por uma justaposição de ações, justificadas pelo estímulo, sem estabelecer uma seqüência temporal. O escore 4, quando havia uma tentativa de estabelecer uma seqüência temporal, sugerida pela mudança no tempo dos verbos, uso de advérbios de tempo ou estabelecimento de relação de causa e efeito. O escore 5, quando existia uma seqüência temporal nítida, mas baseada num referencial externo, em rotina de vida diária (doméstica ou institucional). O escore 6, quando ocorria uma seqüência temporal nítida, que não dependia de um referencial externo de caráter rotineiro, sendo possível reconhecer início, meio e fim.

Procedimento

A aplicação dos testes foi feita em duas etapas. Primeiramente, foi aplicado o ditado proposto por Sisto e cols. (2002), realizado na própria sala de aula. Depois em sala apropriada, foram aplicados a prova de conservação de comprimento, a prova posições possíveis dos dados sobre um suporte e o teste CAT-H, administrados individualmente.

A aplicação do ditado foi feita pela professora da classe de 2a série, juntamente com um experimentador, depois de instruída para informar aos alunos que eles iriam fazer um ditado. A professora informou também aos alunos que cada palavra seria ditada uma única vez e nenhuma delas seria repetida e, por isso, precisariam prestar bastante atenção.

A prova de conservação de comprimento foi iniciada colocando-se quatro palitos grandes alinhados em uma reta, construída pelo experimentador. A reta que a criança construísse deveria conter sete palitos pequenos para que ficasse do mesmo comprimento que a reta do experimentador. Em seguida, foram feitas mais quatro transformações, solicitando à criança que dissesse se existe igualdade no comprimento das duas estradas, acrescentando-se o pedido para que a criança justificasse sua resposta.

A prova posições possíveis dos dados foi iniciada quando se escolhia um dos suportes e solicitava-se à criança que colocasse os dados em cada um dos suportes da forma que quisesse. Em seguida, solicitava-se que colocasse de outra maneira, até que a criança afirmasse que tinham-se esgotado as possibilidades ou que poderia ser colocado de infinitas maneiras. As instruções dadas para a aplicação do CAT-Humano foram as seguintes: “Hoje iremos brincar de contar histórias. Você as contará olhando um desenho e nos dirá o que está acontecendo e o que as pessoas estão fazendo”.

 

RESULTADOS

Os resultados obtidos estão nas Tabelas 1, 2, 3 e 4. Todos esses dados foram computados.

A Tabela 1 ilustra a classificação de acordo com os erros cometidos pelas crianças na Escala de Avaliação das Dificuldades de Aprendizagem na Escrita - até 20 erros (sem dificuldade de aprendizagem); entre 21-49 erros (início de indicação de dificuldade de aprendizagem); 50-79 erros (dificuldade de aprendizagem leve) e 80 ou mais erros (dificuldade de aprendizagem média).

 

A Tabela 2 ilustra os critérios de classificação da Prova de Conservação de Comprimento. Três tipos de respostas foram considerados: ausência de conservação, quando os sujeitos não afirmaram a igualdade das retas; reações intermediárias: quando as crianças oscilavam entre a conservação e a não-conservação e resposta de conservação, quando o sujeito coordenou as operações de partição e de colocação ou deslocamento.

 

A Tabela 3 ilustra o nível de maturidade da criança, caracterizando-a como aquém, dentro do esperado ou além, de acordo com a idade da mesma. As respostas das crianças obedecem a alguns critérios, de acordo com Cunha e colaboradores (1993), assim como uma atribuição de escores, indo de 0 a 6 pontos.

 

A Tabela 4 ilustra a classificação das crianças na Prova de Posições Possíveis dos Dados sobre um Suporte: a criança era classificada no nível IA (possível analógico mais elementar) quando trabalhava com pequenas variações e dentro de uma só família. Quando apresentava maiores variações e até duas famílias, era considerada intermediária (IB, possível analógico mais avançado). O nível II (co-possíveis) caracterizava-se quando as variações eram marcantes e havia presença de pelo menos três famílias de possíveis. Para o nível III (co-possíveis quaisquer) era necessário que a criança aceitasse que não havia limite nas formas de colocar os dados, isto é, sempre poderia ter mais um jeito diferente de colocar os dados.

 

Com interesse em verificar a existência ou não de correlações significantes entre os resultados relativos às idades das crianças, ao número de erros cometidos no ditado, conservação de comprimento, aos escores obtidos no teste CAT e ao nível de criatividade, foi aplicado o Coeficiente de Correlação por Postos de Spearman (Siegel, 1975), aos valores das variáveis, combinados dois a dois. O nível de significância foi estabelecido em 0,05, em uma prova bilateral. Os resultados estão demonstrados na Tabela 5.

 

Foi encontrada uma correlação positiva estatisticamente significativa entre as variáveis “conservação do comprimento” e “criatividade”. Isto indica que, à medida que os valores de uma das variáveis aumentam, os da outra aumentam, também.

Com o objetivo de verificar a existência ou não de diferenças significantes entre os resultados obtidos pelos alunos das duas escolas estaduais, sendo uma periférica e outra mais central, foi aplicado o teste U de Mann-Whitney (Siegel, 1975), aos valores relativos às idades das crianças, aos erros do ditado, à conservação do comprimento, aos escores do teste CAT e ao nível de criatividade.O nível de significância foi estabelecido em 0,05, em uma prova bilateral. Os resultados estão demonstrados na Tabela 6.

 

De acordo com os resultados demonstrados na Tabela 6, foram encontradas diferenças significantes entre as variáveis “erros do ditado” e “conservação do comprimento”, sendo que os resultados mais elevados foram os relativos aos alunos da escola estadual localizada na região mais central da cidade de Uberlândia – MG.

 

DISCUSSÃO

Os resultados da pesquisa evidenciaram que a maioria dos sujeitos (n = 25) apresentaram-se intermediários no teste de conservação de comprimento, 27 crianças apresentam início de indicação de dificuldade de aprendizagem na escrita e 21 crianças no nível analógico mais avançado na abertura para novos possíveis, encontrando-se, também, dentro do esperado, segundo o nível de maturidade emocional. Tais dados demonstraram que nas quatro provas aplicadas, mais da metade dos sujeitos experimentais encontraram-se num nível de classificação posterior ao mais elementar. Ou foram sujeitos classificados como intermediários na prova de conservação de comprimento, ou num nível IB na prova posições possíveis dos dados, ou dentro do esperado, emocionalmente, para a faixa etária ou com indícios de dificuldade de aprendizagem na escrita. Isso demonstra que a maioria dos sujeitos não se encontrava no nível mais preliminar de classificação mas também não atingiram um nível de desenvolvimento mais avançado a partir da aplicação dos testes já mencionados.

Com relação à correlação positiva encontrada entre as variáveis conservação de comprimento e posições possíveis dos dados, é interessante destacar o fato de que quanto mais as crianças mostraram-se criativas, também demonstraram um nível de desenvolvimento cognitivo mais elaborado, isto é, com respostas de conservação. Sisto (2000) realça tal constatação quando coloca que aos poucos, a criança antes dominada por uma pseudonecessidade, qual seja, a de que a continuação de uma figura de um círculo encoberta pela metade, necessariamente tem que ser um círculo, começa a abrir-se para outros possíveis jeitos de terminar a figura que não seja círculo, e essas aberturas marcam o advento do pensamento operatório concreto. Começa, então, a se desvincular de pseudo-impossibilidades.

Já com relação à correlação positiva observada entre as variáveis erros do ditado e conservação do comprimento, a escola estadual localizada no centro da cidade foi a que apresentou o maior número de erros no ditado, evidenciando, pois, indícios de dificuldade de aprendizagem na escrita e/ou dificuldade de aprendizagem leve.

Em termos de operatoriedade, foi possível notar que essa mesma escola apresentou índices significativos de sujeitos classificados como conservadores no conteúdo conservação de comprimento. Isso demonstrou que apesar da ocorrência de dificuldades de aprendizagem na escrita, não houve evidência de ausência de operatoriedade. A noção de conservação não apresentou uma relação direta com a ausência de dificuldade de aprendizagem.

Com relação aos erros cometidos no ditado e os níveis de criatividade e operatoriedade também não foi possível detectarmos correlações positivas, o que demonstra que um indício de dificuldade de aprendizagem na escrita e/ ou uma dificuldade de aprendizagem leve não suscita 290 necessariamente níveis de criatividade precários e ausência de operatoriedade em dado conteúdo.

Tal constatação corrobora as colocações de Rossini e Santos (2002) de que o fracasso escolar tem sido um dos temas mais discutidos e explorados pela literatura científica, sendo possível constatar que, apesar de não se tratar de uma questão nova, trata-se de uma questão não resolvida, uma vez que inúmeras variáveis podem contribuir com o bom andamento do processo de aprendizagem, sejam fatores ditos afetivos-emocionais, ambientais, orgânicos e culturais.

Scoz (1994) afirma que contribuições de diversas áreas do conhecimento tais como a Antropologia, Sociologia e Lingüística vem tentando explicar as dificuldades de aprendizagem num âmbito mais geral, evitando, assim, a medicalização dos problemas de aprendizagem bem como ênfases exageradas na repercussão dos aspectos afetivos da aprendizagem. Podemos afirmar, assim, que inúmeros aspectos, de fato podem estar relacionados a problemas circunstâncias e, por vezes, mais duradouros de aprendizagem. Mas qual a intensidade de tais sintomas frente ao processo ensinoaprendizagem? Como se manifestam?

Sabe-se que a incidência de aspectos emocionais no processo ensino-aprendizagem ocorre com uma certa freqüência, porém, a presente pesquisa não constatou dados correlacionais significantes da variável maturidade emocional e os erros no ditado, o nível de criatividade bem como a operatoriedade nesse grupo de crianças por ora estudado. Isso pode ser explicado pela maioria dos sujeitos encontrar-se num nível de maturidade dentro do esperado para sua faixa etária.

Nesse sentido, Sisto (2002a) destaca a existência de uma interação entre fatores sociais, educativos e individuais como possíveis explicações para as dificuldades de aprendizagem. Assim, faz-se mister realçar que apesar dos inúmeros estudos e pesquisas que abordam as dificuldades de aprendizagem como um processo mais amplo, muitas das vezes, a culpabilização pelo fracasso ainda se encontra na criança/aluno.

Esses e outros questionamentos continuam a nos instigar: Até que ponto somos colaboradores passivos frente à explicação organicista do problema de aprendizagem? Cabe-nos investigar que se assim o fosse, não encontraríamos crianças que apesar de participarem de interações que envolvem fatores sociais, educativos e individuais bastante precários, aprendem rápida e facilmente a escrever muito bem (Sisto, 2002a). Outros estudos devem ser feitos nesse sentido, levando-nos a investigar segmentos, por vezes, negligenciados e, portanto, pouco explorados pela literatura vigente.

 

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Endereço para correspondência:
Claudia Araújo Cunha
Rua Saturnino Pedro dos Santos, 181 – apt 102 – Bloco B
Bairro Jardim Finotti
CEP 38408-090 – Uberlândia/MG
e-mail: ccunha@triang.com.br

Recebido em: 03/02/2005
Revisado em: 30/08/2005
Aprovado em:14/10/2005

 

1 Docente do Programa de Graduação e Pós-graduação em Psicologia Aplicada do Instituto de Psicologia da Universidade Federal de
Uberlândia.
Apoio: CNPq