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Psicologia Escolar e Educacional

versão impressa ISSN 1413-8557

Psicol. esc. educ. v.13 n.2 Campinas dez. 2009

 

ARTIGOS

 

A valorização do brinquedo na teoria históricocultural: aproximações com a Educação Física

 

The historical-cultural theory and the importance of toys: approaching Pysical Education

 

La valoración del juguete en la teoría Historico-Cultural: aproximaciones con la Educación Física

 

 

Telma Adriana Pacifico Martineli; Nataly de Carvalho Fugi; Keros Gustavo Mileski

Universidade Estadual de Maringá

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este estudo teve como objetivo analisar o brinquedo e o desenvolvimento infantil a partir da Teoria Histórico-Cultural. Fundamenta-se em fontes primárias e secundárias e parte de elementos da realidade concreta de trabalho com crianças em projetos institucionais e nas escolas da rede pública de ensino. Buscamos em Vigotski e em Leontiev fundamentos para entender o psiquismo infantil, como ele se processa no brinquedo e sua importância para o desenvolvimento. À luz deste referencial, analisamos a expressão das crianças na realidade, tomando como objeto o brinquedo e as brincadeiras gímnicas. Concluímos que o brinquedo é a atividade dominante das crianças, por isso consideramos necessário valorizá-lo no trabalho pedagógico na educação física, como contribuição para o desenvolvimento infantil e para o processo de humanização. Estudar a escola de Vigotski é um caminho para esta nova compreensão de desenvolvimento humano em uma perspectiva sócio-histórica.

Palavras-chave: Psicologia histórico-cultural, Brinquedos, Desenvolvimento.


ABSTRACT

In this study we aim at examining the toy related child development, from the Historico-Cultural Theory. We based our work on primary and secondary sources and also based on the reality of working with children in institutional projects in public schools. In order to understand the child psyche and the importance of toy for the psychological development we studied Vygotsky and Leontiev. Concerning this target we analyze the expression of children in reality, taking as the object the toy and gym games. We conclude that the toy is the children´s dominant activity, so we need to recover it when teaching physical education. This will contribute to the child development and the process of humanization. Studying Vygotsky´s work is a way of understanding human development from a socio-historical perspective .

Keywords: Historical-cultural psychology, Toys, Development.


RESUMEN

Este estudio tuvo como objetivo analizar el juego y el desenvolvimiento infantil, a partir de la Teoría Histórico-Cultural. Se fundamenta en fuentes primarias y secundarias y parte de elementos de la realidad concreta de trabajos con niños en proyectos institucionales y en las escuelas de enseñanza pública. Buscamos en Vigotski y en Leontiev fundamentos para entender el psiquismo infantil, como éste se procesa en el juego y su importancia para el desarrollo. Bajo este referencial analizamos la expresión de los niños en la realidad, tomando como objeto los juguetes y los juegos gímnicos. Concluimos que el juego es la actividad dominante de los niños, por esto consideramos necesario valorizarlo en el trabajo pedagógico en la educación física como contribución para el desarrollo infantil y para el proceso de humanización. Estudiar la escuela de Vigodski es un camino para esta nueva comprensión de desarrollo humano, en una perspectiva socio-histórica.

Palabras clave: Psicología histórico-cultural, Juguetes, Desarrollo.


 

 

Introdução

Ao longo do processo histórico, configuraram-se diferentes concepções de criança, de entendimento da infância e de desenvolvimento infantil. Uma breve incursão nas concepções historicamente produzidas sobre a criança e sobre a infância a partir das pinturas clássicas1 apresentadas por Soares (1998) em seu livro Imagens da educação no corpo reforça o entendimento de que as crianças não eram compreendidas nas suas particularidades.

A partir de diferentes vertentes da psicologia desenvolveram-se, mais marcadamente a partir do século XIX, distintas teorias sobre a infância e as especificidades do seu desenvolvimento, entre as quais podemos citar o behaviorismo, a gestalt, a psicanálise, o construtivismo e a teoria históricocultural, determinando uma diversidade de explicações sobre as questões a ela relacionadas. A abordagem construtivista, hegemônica na contemporaneidade, determina, no âmbito acadêmico, científico e pedagógico, uma visão unilateral de infância e de criança, a partir de uma perspectiva estruturalista de desenvolvimento.

Nossos esforços concentram-se em entender as determinações históricas, sociais e políticas e suas implicações no conceito atual de infância e de desenvolvimento infantil. Encontramos na perspectiva marxista, a partir da lógica dialética, fundamentos que nos possibilitam este entendimento.

Esta busca é desencadeada a partir da leitura da realidade do contexto educacional, em que professores das diversas áreas do conhecimento, inclusive da educação física, pedagogos e psicólogos estão tendo dificuldades para enfrentar os problemas no trabalho didático e pedagógico com crianças, tanto nas formas de ensinar quanto na compreensão de como se dá o processo de aprendizagem do aluno e, a partir dele, o seu desenvolvimento.

A busca por um referencial teórico e metodológico que fundamente as ações pedagógicas numa perspectiva crítica tem movido esforços de professores e pesquisadores com vistas a entender os processos de ensino e aprendizagem e o desenvolvimento humano, encontrando subsídios na Teoria Histórico-Cultural.

As crianças em idade pré-escolar apresentam características que muitas vezes não são bem compreendidas por aqueles que trabalham com elas como, por exemplo, as situações imaginárias que permeiam o mundo infantil.

O estudo das funções psicológicas superiores na perspectiva vigotskiana, como a atenção, a memória, a imaginação, a percepção, entre outras, que são essencialmente humanas, tem se revelado fundamental para o entendimento das situações imaginárias, tão presentes na infância, e sua importância para o desenvolvimento infantil.

Diante deste contexto, surgem as seguintes questões: como a Teoria Histórico-Cultural explica o imaginário infantil criado no brinquedo e nas brincadeiras gímnicas? Qual a sua importância para o desenvolvimento da criança? Como os pressupostos desta teoria podem contribuir para o ensino da Educação Física?

Este estudo teve como objetivo analisar o brinquedo e o desenvolvimento infantil a partir dos pressupostos da Psicologia Histórico-Cultural. Especificamente, buscamos estudar as situações imaginárias criadas no brinquedo e nas brincadeiras gímnicas e sua importância para o processo de ensino, aprendizagem e desenvolvimento, a partir deste referencial teórico.

Para a consecução destes objetivos, este estudo teórico buscou subsídios em fontes primárias e secundárias (Casimiro, Lombardi, & Magalhães, 2009), tomando como referencial a Teoria Histórico-Cultural.

Para tanto, no primeiro momento, nos dedicaremos a situar e contextualizar a Teoria Histórico-Cultural e, posteriormente buscaremos, na obra de Vigotski (1998, 2006 e 2007) e nos estudos de Leontiev (1978), elementos teóricos para entender o psiquismo infantil e como ele se processa no brinquedo, bem como a formação do mundo imaginário e sua importância para o processo de aprendizagem e desenvolvimento.

Em um segundo momento, contextualizaremos a educação física no âmbito específico da ginástica, com fundamento nos estudos de Soares (1998) e Soares e cols. (1992), buscando entender o sentido/significado do conhecimento gímnico historicamente produzido e suas características técnicas e artísticas. Buscaremos, também, identificar como a ginástica se expressa no imaginário infantil e nas brincadeiras das crianças.

Por fim, estabeleceremos relações entre a Teoria Histórico-Cultural, o brinquedo e a ginástica, resgatando elementos da realidade com crianças, buscando entender as situações que emergem desta realidade à luz da Teoria Histórico-Cultural e apresentando subsídios para o ensino da educação física/ginástica nesta perspectiva.

Teoria Histórico-Cultural: Contexto Histórico e Pressuposto Teórico

A psicologia histórico-cultural vem sendo estudada no campo educacional e fundamentando as análises sobre os processos de ensino, aprendizagem e desenvolvimento humano em uma base marxista. Para entendermos o mundo da brincadeira gímnica na infância e as possibilidades para a educação física, faremos uma breve contextualização da Teoria Histórico-Cultural e, a partir dela, dos pressupostos teóricos que consideramos necessários para a compreensão do nosso objeto de estudo.

O principal teórico desta vertente da psicologia foi Lev Semenovich Vigotski (1896-1934), que desenvolveu seus estudos e pesquisas com Alexei Nikolaevich Leontiev (1903-1979) e Alexander Romanovich Luria (1902-1977), fundamentalmente. Outros membros conhecidos da Escola de Vigotski são os psicólogos Daniil B. Elkonin (1904-1984), P. Ya. Galperin (1902-1988), A. V. Zaporózhets (1905-1981) e Vasili Vasilievich Davidov (1920-1998), entre outros.

Shuare (1990, p.57) ressalta que “corresponde a L. S. Vigotski o mérito invalorável de ser o primeiro em aplicar criadoramente o materialismo dialético e histórico à ciência psicológica e de tê-la colocado, com ele, ‘sobre seus pés’, provocando uma verdadeira revolução copérnica na psicologia”. A autora afirma que

[...] o tempo pessoal de Vigotski coincidiu plenamente com o tempo histórico que lhe tocou viver e sua criação, revolucionária na psicologia, coincidiu totalmente (por seu momento e por seu sentido) com o auge revolucionário em todas as esferas da vida (as relações sociais, a economia, a política, a literatura, a poesia, o teatro, as ciências etc.) na URSS (Shuare, 1990, p.58).

O teórico soviético Vigotski, inserido no período pósrevolução russa, teve seu pensamento influenciado pela tentativa de superação da sociedade capitalista:

Pode-se dizer que a análise de Vygotski em relação à crise da “velha” psicologia expressa a luta concreta pósrevolucionária pela superação das relações capitalistas de produção. A revolução socialista possibilitava a construção de uma “nova psicologia”, capaz de superar o antagonismo clássico entre materialismo e idealismo, da mesma forma que o capitalismo seria superado pelo comunismo (Tuleski, 2002, p. 61).

A psicologia de Vigotski constitui-se na teoria histórico-cultural do psiquismo que apreendeu dos clássicos do marxismo o método para construir uma psicologia marxista, entendendo-a como a única forma de abordar de modo plenamente historicizado o psiquismo humano (Duarte, 1996). Shuare (1990) afirma que, desde o início, a psicologia soviética definiu-se como ciência que busca uma concepção filosófica determinada - o materialismo histórico e os marcos metodológicos pelos quais se desenvolve a investigação científica.

A Escola de Vigotski atribui importância à apropriação, pelo indivíduo, da experiência histórico-social e dos conhecimentos produzidos historicamente e já existentes no mundo em que o indivíduo vive. Leontiev (1978) e Luria (1979) dedicaram-se a estudar a cultura e as raízes da atividade consciente, respectivamente, e afirmaram que esta apropriação tem um papel fundamental no desenvolvimento psíquico do indivíduo e na diferenciação entre a ontogênese humana e a do animal.

Vigotski (2006), em seu livro Imaginação e a arte na infância, afirma que, na conduta do homem, em qualquer de suas atividades, é possível distinguir facilmente dois tipos básicos de impulso: atividade reprodutora ou reprodutiva e atividade criadora ou combinadora.

A atividade reprodutora está ligada à memória e sua essência reside em que o homem reproduz ou repete normas de conduta já criadas e elaboradas, ou ressuscita rastros de antigas impressões; já a atividade criadora é toda atividade humana que não se limite a reproduzir trechos e impressões vividas sem que se criem novas impressões, novas ações, pois o cérebro humano não se limita a ser um órgão capaz de conservar as nossas reproduções de experiências passadas, é também um órgão combinador, criador, capaz de reelaborar e criar, com elementos de experiências passadas, novas formas e definições.

Nesta perspectiva, a atividade reprodutora permitirá à criança memorizar as experiências acumuladas no decorrer de sua vida e essas experiências darão as condições para que novas combinações possam ser criadas, ou seja, para que a atividade criadora aconteça.

Por isso, Vigotski (2006) alerta-nos para a necessidade de ampliar a experiência da criança se quisermos proporcionar-lhe base suficientemente sólida para a atividade criadora. Quanto mais ela vir, ouvir e experimentar, quanto mais aprender e assimilar, de quanto mais elementos reais dispuser em sua experiência, tanto mais considerável e produtora será a igualdade das restantes circunstâncias, a atividade de sua imaginação. É neste processo de reprodução da cultura humana e de criação de novos conhecimentos que o homem humaniza-se.

Duarte (1996, p. 93) explica este processo de humanização ao afirmar que “O indivíduo se faz humano apropriando-se da humanidade produzida historicamente. O indivíduo se humaniza reproduzindo as características historicamente produzidas do gênero humano”. Por isso que é necessário, no trabalho educativo, reconhecer a historicidade do ser humano, valorizando a transmissão da experiência histórico-social e do conhecimento socialmente existente.

Vigotski defendeu o caráter humanizador da imitação, por considerar que a criança somente consegue imitar o que se encontra na zona de suas possibilidades intelectuais próprias (Duarte, 1996). Em seus estudos sobre a relação entre o ensino e o desenvolvimento intelectual, ele apresentou o conceito de “zona de desenvolvimento próximo”. Propõe a existência de dois níveis de desenvolvimento: o nível de desenvolvimento real, em que a criança resolve problemas de forma independente e autônoma, e a zona de desenvolvimento próximo, que abarca tudo que a criança não faz por si mesma, mas consegue fazer imitando adultos. Vigotski (2001) considera que o bom ensino é aquele que incide sobre a zona de desenvolvimento próximo.

Vigotski (2004) dedicou-se a estudar a formação dos conceitos espontâneos e dos conceitos científicos e desenvolveu outro conceito importante, o da “mediação”, pois “a psicologia soviética considera os processos de aprendizagem conscientemente dirigidos pelo educador como qualitativamente superiores aos processos espontâneos de aprendizagem” (Duarte, 1996, p. 91).

O Brinquedo e as Situações Imaginárias na Teoria Histórico-Cultural

Levando em consideração a área de estudo do desenvolvimento infantil em uma perspectiva histórico-cultural, encontramos na Teoria de Vigotski fundamentos para discutir o imaginário infantil criado no brinquedo e sua importância no processo de desenvolvimento.

Leontiev (1978) afirma que o jogo e a atividade lúdica ligada a ele constitui-se como atividade principal, ou seja, atividade dominante na infância, condicionando as principais mudanças nos processos psíquicos da criança. Vigotski (2007) ressalta a importância da compreensão do caráter das necessidades que são suprimidos na ação do brincar para entendermos o brinquedo como uma forma de atividade. Para ele,

Se ignorarmos as necessidades da criança e os incentivos que são eficazes para colocá-la em ação, nunca seremos capazes de entender seu avanço de um estágio do desenvolvimento para outro, porque todo avanço está conectado com uma mudança acentuada nas motivações, tendências e incentivos (Vigotski, 2007, p.108).

Nesta perspectiva, o brinquedo é uma necessidade e uma condição para que as crianças se desenvolvam, pois elas, diferentemente dos adultos, tendem a buscar prazeres imediatos, não se preocupando com o passado nem com o futuro, apenas com as realizações imediatas. Quando elas começam a sentir necessidades que não podem ser realizadas imediatamente, é que se tem o aparecimento do brinquedo.

Para Vigotski (2007), o imaginário infantil é colocado nas representações que as crianças fazem do mundo em que estão inseridas. Elas se imaginam sendo mães, pais, professores, ou seja, elas brincam como personagens do seu meio social (Arce & Duarte, 2006). A criança imaginase a si mesma como mãe e a boneca como criança, assim as crianças pequenas podem fazer coincidir a situação de brinquedo e a realidade. Segundo Elkonin (1998, p. 31), nesse tipo de brincadeira “influi, sobretudo, a esfera da atividade humana, do trabalho e das relações entre as pessoas e, por conseguinte, o conteúdo fundamental do papel assumido pela criança é precisamente a reconstituição desse aspecto da realidade.” Desta maneira, a criança opera com significado alienado numa situação real e o mundo imaginário infantil é o lugar onde as crianças fantasiam suas realidades e tornam possíveis os seus desejos e sonhos.

Vigotski (2007) afirma que a ação numa situação imaginária ensina a criança a dirigir seu comportamento não somente pela percepção imediata dos objetos ou pela situação que a afeta de imediato, mas também pelo significado dessa ação, pois é neste momento que a ação não está regida pelo objeto:

No brinquedo, o pensamento está separado dos objetos e a ação surge das idéias, e não das coisas: um pedaço de madeira torna-se um boneco e um cabo de vassoura torna-se um cavalo. A ação regida por regras começa a ser determinada pelas ideias e não pelos objetos. Isso representa uma tamanha inversão da relação da criança com a situação concreta, real e imediata, que é difícil subestimar seu pleno significado (Vigotski, 2007, p. 115).

O brinquedo cria uma situação imaginária que não é algo fortuito na vida da criança, mas sim, “a primeira manifestação da emancipação da criança em relação às restrições situacionais” (Vigotski, 2007, p. 117). Isto significa que ela consegue fazer no brinquedo o que na situação real seria restringido. Vigotski (2007, p. 123) explica esta questão afirmando que o que ocorre é uma reprodução da situação real: “Uma criança brincando com uma boneca, por exemplo, repete quase exatamente o que sua mãe faz com ela. Isso significa que, na situação original, as regras operam sob uma forma condensada e comprimida. Há muito pouco de imaginário”.

Nesse sentido, é uma situação imaginária, mas é compreensível somente se a considerarmos no contexto situação real que, de fato, tem acontecido. Por isso, o brinquedo, para este psicólogo, é muito mais a lembrança de alguma coisa que realmente aconteceu do que imaginação. É, portanto, mais a memória em ação do que uma situação imaginária nova.

Outro aspecto que merece ser destacado é que

[...] a criança que memoriza com a ajuda do material auxiliar organiza a operação num plano distinto da que o memoriza de forma imediata, porque da criança que utiliza signos e operações auxiliares não se exige tanto a memória ou habilidade para criar nova conexões, para criar uma nova estrutura, mas que possua uma imaginação rica, às vezes uma forma de pensamento desenvolvido, ou seja, certas qualidades psíquicas que na memorização imediata não desempenham um papel importante (Vigotski, 1998, p. 42).

Em toda situação imaginária no brinquedo há regras, mas não regras que sejam previamente formuladas e mudem durante o jogo, mas sim as que têm origem na própria situação imaginária; ou seja, quando a criança está representando o papel da mãe, ela obedece às regras do comportamento maternal. O papel que a criança representa e a relação dela com um objeto originam-se das regras. Vale destacar que

Essa subordinação estrita às regras é quase impossível na vida, no entanto, torna-se possível no brinquedo. Assim, o brinquedo cria uma zona de desenvolvimento proximal da criança. No brinquedo, a criança sempre se comporta além de seu comportamento habitual de sua idade, além de seu comportamento diário; no brinquedo, é como se ela fosse maior do que é na realidade. Como no foco de uma lente de aumento, o brinquedo contém todas as tendências do desenvolvimento sob forma condensada, sendo, ele mesmo, uma grande fonte de desenvolvimento (Vigotski, 2007, p.122).

O autor esclarece que, à medida que o brinquedo se desenvolve, observa-se na criança um movimento em direção à realização consciente de seu propósito:

Em um sentido, no brinquedo a criança é livre para determinar suas próprias ações. No entanto, em outro sentido, é uma liberdade ilusória, pois suas ações são, de fato, subordinadas aos significados dos objetos, e a criança age de acordo com eles (Vigotski, 2007, pp. 123-124).

Existe diferença entre o significado do brinquedo para crianças pequenas e para crianças em idade escolar: para as primeiras, brinquedo sério significa que ela brinca sem separar a situação imaginária da situação real. Por outro lado, para uma criança em idade escolar, o brinquedo tornase uma fase de atividade mais limitada, predominantemente do tipo atlético, que preenche um papel específico em seu desenvolvimento. Estes brinquedos atléticos não têm o mesmo significado do brinquedo para uma criança em idade pré-escolar. “Na idade escolar, o brinquedo não desaparece, mas permeia a atitude em relação à realidade” (Vigotski, 2007, p.124).

Vigotski (2007) esclarece que, apesar de a relação brinquedo-desenvolvimento poder ser comparada com a relação instrução-desenvolvimento,

[...] o brinquedo fornece ampla estrutura básica para mudanças da necessidade e da consciência. A ação na esfera imaginativa, numa situação imaginária, a criação das intenções voluntárias e a formação dos planos da vida real e motivações volitivas - tudo aparece no brinquedo, que se constitui, assim, no mais alto nível de desenvolvimento préescolar. A criança desenvolve-se, essencialmente, através do brinquedo (Vigotski, 2007, p. 122).

Contribuindo com este entendimento Facci (2006) afirma que o desenvolvimento psíquico da criança e a formação de sua personalidade são influenciados pelo jogo. Nessa perspectiva, “[...] a evolução do jogo prepara para a transição para uma fase nova, superior, do desenvolvimento psíquico, a transição para um novo período evolutivo” (Elkonin, 1998, p. 421).

A psicologia histórico-cultural nos permite entender a importância da memória e da imaginação que se desenvolve a partir das experiências acumuladas, especialmente na atividade de brinquedo que alavanca o desenvolvimento infantil.

Ginástica como Manifestação da Cultura Corporal e sua Relação com o Brinquedo

A ginástica é uma prática corporal historicamente produzida pelos homens e, em cada momento histórico, teve características próprias, de acordo com as necessidades sociais, políticas e econômicas e os interesses de classe. Soares (2004) e Soares e cols. (1992) relatam que seus movimentos foram produzidos ao longo do processo histórico nas diferentes culturas e na modernidade ocidental, na cultura européia.

A ginástica nos séculos XVII e XVIII tinha como núcleo o entretenimento. Nas festas, nos bares, nas praças, nas ruas, as mais variadas formas de expressão gímnica eram exibidas por acrobatas, bailarinos, trapezistas, equilibristas, malabaristas, mímicos (Soares, 1998), caracterizando-se como arte da cultura popular. Estas práticas corporais eram ricas nos aspectos técnicos, artísticos e culturais e, em seu bojo tinham um caráter político, pois eram carregadas de um sentido de liberdade, comicidade e sátira à realidade e às relações sociais vigentes.

No século XIX, a ginástica assegura o seu lugar na sociedade burguesa. Sua prática, em diferentes países da Europa, faz nascer um grande movimento que foi chamado de Movimento Ginástico Europeu. Como expressão da cultura, este movimento se constrói “a partir das relações cotidianas, dos divertimentos e festas populares, dos espetáculos de rua, do circo, dos exercícios militares, bem como dos passatempos da aristocracia. Possui em seu interior princípios de ordem e disciplina coletiva que podem ser potencializados” (Soares, 1998, p. 18).

Para a sua aceitação, ao movimento ginástico é exigido “o rompimento com seu núcleo primordial, cuja característica dominante se localiza no campo dos divertimentos” (Soares, 1998, p. 18). Neste contexto, a ginástica, com suas prescrições, passa a se enquadrar em uma pedagogia da “educação do corpo” e assume preceitos e normas a partir da ciência e da técnica e das condições políticas de uma Europa que, no século XIX, consolida-se como centro do Ocidente. Destaca-se seu caráter ordenativo, disciplinador e metódico que “balizou o pensamento moderno em torno das práticas corporais que se construíram fora do mundo do trabalho, trazendo a idéia de saúde, vigor, energia e moral coladas à sua aplicação” (Soares, 1998, p. 20), mas o caráter disciplinador dos exercícios ginásticos era necessário à ordem fabril e industrial.

A urbanização e a proletarização da Europa, decorrentes da Revolução Industrial, especialmente na França e na Inglaterra, demonstram e exportam para o mundo um tipo de vida degradante para grande parte da população. A moralização sanitária tratará de reorganizar o espaço de vida dos indivíduos e por isso “seu discurso normativo veiculará a ideia de que as classes populares vivem mal por estarem impregnadas de vícios, de imoralidade, por viverem sem regras” (Soares, 2004, p. 11). A educação física incorpora este discurso, constituindo-se em um instrumento capaz de promover a assepsia social, viabilizar esta educação higiênica e moralizar os hábitos.

A ginástica científica do século XIX, de modo sistemático, marcou a negação de elementos cênicos, funambulescos, acrobáticos e, sobretudo, “uma retórica de recusa aos espetáculos próprios do mundo circense e das festas populares onde o corpo ocupa o lugar central” (Soares, 1998, p. 25). É que o circo, os espetáculos de ruas e feiras traziam consigo, marcadamente, uma compreensão do corpo enraizada na fértil cultura cômica e popular da Idade Média e do Renascimento.

Para Soares (1998, p. 20), “este é o movimento que pode ser pensado como o conjunto, sistematizado pela ciência e pela técnica, do que ocorreu em diferentes países ao longo de todo o século XIX, especialmente na Alemanha, Suécia, Inglaterra e França”. O conteúdo básico fora definido a partir de parâmetros formulados pela cultura grega, que a compreendia ligada à idéia de saúde, beleza e força. Estes métodos adentraram os sistemas nacionais de ensino na Europa e, disseminando-se pelo mundo, chegaram ao Brasil e foram institucionalizados na educação brasileira.

A partir do século XX, os métodos ginásticos sofreram mudanças, ganhando características diversas. O movimento tecnicista pós-Segunda Guerra Mundial deu impulso ao processo de desportivização da ginástica. Os campeonatos mundiais e os jogos olímpicos fomentaram a prática esportiva da ginástica. As ginásticas compensatórias e de condicionamento físico ganharam força em função das necessidades do sistema produtivo e do mercado.

Em decorrência deste processo histórico e neste contexto de contradições entre cultura popular e cultura “científica”, cômico e moral, social e biológico, livre e ordenativo/ disciplinador; e em consequência das características particulares que incorporou, a ginástica é entendida como um conhecimento clássico da educação física.

É possível constatar a riqueza técnica, artística, rítmica e expressiva nas diversas manifestações da ginástica, essencialmente naquelas em que se mantiveram as características da cultura artística popular, influenciadas pela arte cênica, a música e a dança - apesar de herdarem fortes traços da ginástica científica. Esta riqueza foi determinada pelo processo histórico e pelo desenvolvimento científico e tecnológico da ginástica.

Soares e cols. (1992, p. 81) consideram que se constituíram como fundamentos da ginástica: “saltar”, “equilibrar”, “rolar/girar”, “trepar” e “balançar/embalar”, por serem elementos que traduzem significados de ações historicamente desenvolvidas e culturalmente determinadas.

Estes fundamentos estão presentes nas diversas formas de ginástica (acrobática, artística, rítmica, geral ou para todos, trampolim acrobático), praticadas sem e com aparelhos, sejam eles fixos, como: traves, barras, trampolins, etc; manuais, como, por exemplo: cordas, arcos, bolas, fitas; não convencionais, como: malabares, barangandans, faixas, pneus, bastões; entre outros. Por isso, tem um grande potencial de reprodução, combinação/criação.

Os fundamentos da ginástica podem ser realizados isoladamente ou combinados, formando composições coreográficas. Podem ser praticados com ou em aparelhos, em diferentes níveis, planos e trajetórias, com acompanhamento musical de diferentes estilos e ritmos. É por isso que Soares e cols. (1992, p. 77) afirmam que a prática da ginástica “abre possibilidades de atividades que provocam valiosas experiências corporais, enriquecedoras da cultura corporal das crianças, em particular e do homem, em geral”.

Retratando a realidade da prática corporal infantil, a autora destaca que

[...] em praias, praças públicas e ruas, vemos diariamente as mais graciosas e ousadas exibições de: ‘plantar bananeira’, ‘estrelinhas’, ‘roda bola’, ‘bunda canastra’, ‘cambalhota’ etc., executadas por crianças das mais variadas idades e características corporais. Estas destrezas não são outra coisa senão o conteúdo da ginástica artística no saber popular (Soares e cols. 1992, p. 88).

Nesta afirmação, evidencia-se a relação entre o conceito espontâneo, que se forma a partir das relações sociais e é transmitido de geração em geração no cotidiano das pessoas, e o conceito científico, neste caso, a ginástica artística, que se forma a partir do processo de escolarização.

Estes conceitos espontâneos expressados na prática social e também no contexto educativo têm característica de brincadeira gímnica, pois ao mesmo tempo em que as crianças brincam, elas executam movimentos da ginástica que foram transmitidos nas relações sociais de geração em geração. Pular corda, bambolear, balançar em uma barra ou se equilibrar em uma base estreita também fazem parte da história das brincadeiras infantis, têm características gímnicas e estão presentes na ginástica sistematizada.

Educação Física, Ginástica e Brinquedo: Aproximações com a Teoria Histórico-Cultural

Ao longo de 12 anos de desenvolvimento do projeto “Escola de Ginástica” e particularmente no trabalho com crianças, em observações do Estágio Supervisionado do Curso de Licenciatura em Educação Física (UEM) e, ainda, na prática pedagógica desenvolvida por professores na Educação Infantil e nas primeiras séries do Ensino Fundamental, muitos aspectos nos chamaram a atenção.

Durante o trabalho e as observações percebemos que, ao ensinar a ginástica às crianças menores, elas reproduziam práticas históricas, utilizavam termos próprios da cultura infantil e criavam situações imaginárias, oportunizadas pelo brinquedo, que davam sentido e significado à sua prática.

Neste momento, apontaremos alguns questionamentos que emergiram deste contexto, analisando-os à luz da Teoria Histórico-Cultural e apresentando subsídios para o ensino da ginástica nesta perspectiva. Buscamos o desenvolvimento, na escola, de uma atividade educativa comprometida com a apropriação do historicamente criado pelo homem e, em decorrência disso, com o desenvolvimento humano das gerações mais novas.

Vamos então aos questionamentos. Em nosso trabalho no projeto, observamos que as respostas às atividades propostas para as crianças são bem mais positivas quando são transmitidas como representação de algo que já tenha significado para elas. Por que isto acontece?

Os elementos gímnicos na prática infantil apresentam-se, na linguagem corporal e na oralidade, como representações de animais como “elefantinho” e “gatinho”, mas também de outros objetos, coisas e até de plantas da natureza, tais como: “estrelinha”, “cambalhota” ou “cambota”, “bananeira”. Qual o significado disto para as crianças e como podemos explicá-lo?

Nas atividades lúdicas propostas para as crianças menores que envolvam elementos gímnicos como saltar, equilibrar, girar/rolar, balançar/embalar e trepar, por que elas demonstram maior interesse e envolvimento na atividade quando o professor cria situações e usa uma linguagem própria da cultura infantil?

Os estudos desenvolvidos sobre a concepção de desenvolvimento psicológico relacionada à vida históricocultural da criança nos permitem entender estas questões e estabelecer relações entre o brinquedo, as situações imaginárias e a ginástica e, ao mesmo tempo, considerar a importância de sua valorização no processo de ensino e aprendizagem como meio de desenvolvimento.

A partir dos estudos e das observações realizadas durante o desenvolvimento do projeto e nas escolas, podemos afirmar que os “elementos gímnicos” são nomeados pelas crianças levando em conta a sua característica e a sua forma. Vejamos: como a criança não pode ser um elefante que fica com a tromba no chão e as pernas para cima (tal qual se apresenta no circo e “povoa” o imaginário infantil), ela pode expressar corporalmente esta prática colocando a cabeça e mãos no chão e elevando as pernas na posição vertical2; como a estrela tem “quatro pontas”, ela pode girar colocando as duas mãos no chão e com as pernas passando na vertical, mostrando com o seu corpo a figura de uma estrela3.

Nestes exemplos, é possível considerar que as situações imaginárias permeiam estas práticas corporais “gímnicas” que estão presentes nas brincadeiras infantis, dando-lhes sentido e significado e permitindo que as crianças experienciem possibilidades que, se não fossem em situação de brincadeira, seriam limitadas. Com fundamento na psicologia histórico-cultural, entendemos que este desejo de se expressar por meio da linguagem corporal na brincadeira impulsiona o desenvolvimento das crianças, daí a importância de sua valorização no ensino.

Outro aspecto que nos chama a atenção é: por que, ao se deparar com cordas, bolas, arcos (popular bambolê), as crianças imediatamente os pegam e saem pulando, quicando, bamboleando? O que estes “instrumentos” de brinquedo despertam nas crianças? Qual a sua importância histórico-cultural?

Estes objetos e instrumentos de brinquedo foram produzidos pelo homem e fazem parte de sua cultura, por isso têm um significado histórico e carregam em si um conhecimento acumulado. Leontiev (1978, p. 286) nos ajuda e entender esta questão ao afirmar que a “experiência sócio-histórica da humanidade se acumula sob a forma de fenômeno no mundo exterior objetivo. Este mundo, o da indústria, das ciências e da arte é a expressão da história verdadeira da natureza humana”.

Este psicólogo afirma que

Para se apropriar dos objetos ou dos fenômenos que são o produto do desenvolvimento histórico, é necessário desenvolver em relação a eles uma atividade em que se reproduza, pela sua forma, os traços essenciais da atividade encarnada, acumulada no objeto (Leontiev, 1978, p. 286).

A partir desta concepção, a bola, a corda, o arco, bem como os demais objetos ou instrumentos que foram historicamente utilizados nas atividades lúdicas e na prática da ginástica têm uma atividade encarnada, acumulada em si. Ao tocar nestes objetos, a mão do homem integra-se ao sistema sócio-historicamente elaborado das operações incorporadas nestes instrumentos e é a mão que a ele se subordina, conforme explicita Leontiev.

Para Leontiev (1978, p. 287-288), “a aquisição do instrumento consiste, portanto, para o homem, em se apropriar das operações motoras que nele estão incorporadas. É ao mesmo tempo, um processo de formação ativa das aptidões novas, de funções superiores ‘psicomotoras’, que ‘hominizam’ a sua esfera motriz”.

Neste processo, percebemos que as crianças têm um grande interesse e prazer em se apropriar das operações motoras e dos conhecimentos contidos nos objetos, especialmente aqueles que historicamente se constituíram como brinquedos de gerações precedentes (pais, avós...) e que serão também transmitidos às novas gerações.

Neste sentido, pular ou girar a corda, quicar ou lançar a bola ou bambolear o arco são atividades encarnadas nestes objetos, são operações incorporadas neles e se apropriar destas atividades significa formar capacidades novas, funções superiores “psicomotoras”4 que enriquecem a nossa cultura corporal e nos humanizam.

 

Considerações Finais

A partir da implementação da LDB (9394/96) e das discussões científicas na área, a educação física passa a atuar de forma mais expressiva na educação infantil. Alguns destes estudos, que fundamentam a atuação dos professores, seguem uma perspectiva pedagógica materialista histórica, como Soares e cols. (1992). Tais estudos entendem como conteúdo da educação física, os jogos e brincadeiras e a ginástica, tratados de forma mais detida neste artigo, e também as danças, os esportes, as lutas, produzidos histórica e culturalmente. Nesta perspectiva histórica, o professor de educação física toma, como objeto de ensino, estes conteúdos, mediando o processo de apropriação destes conhecimentos.

Após este percurso de estudos, consideramos que a Teoria Histórico-Cultural pode contribuir significativamente para o desenvolvimento da prática pedagógica do professor de educação física na Educação Infantil, provocando, por sua vez, avanços no desenvolvimento das crianças.

Os jogos e as brincadeiras podem, com as mediações necessárias, serem conteúdos importantes para promover o desenvolvimento das crianças da Educação Infantil. Por isso, os professores de educação física, ao trabalharem com crianças à luz da Teoria Histórico-cultural, devem pensar em possibilidades de ensino que envolvam situações imaginárias a partir do brinquedo, valorizando o cotidiano infantil e social, e enriquecendo a cultura corporal.

Palavras, objetos e ações têm significados para as crianças por serem parte da experiência acumulada ao longo das suas relações sociais. Por isso é preciso que o professor tenha clareza no sentido de favorecer o desenvolvimento de atividades educativas que resgatem estas experiências e que possam abrir possibilidades para que novas atividades sejam criadas e experienciadas. O processo de elaboração do conhecimento a partir do brinquedo promove o aprendizado e impulsionam o desenvolvimento infantil.

A partir deste entendimento, o ensino deve favorecer a atividade reprodutora, ou seja, atividades em que as crianças reproduzam, repitam, imitem um dado conhecimento para que elas acumulem experiências que ficam internalizadas, constituindo-se em uma base para a criança combinar, criar, imaginar novos elementos. O cérebro também é um órgão combinador, criador, capaz de reelaborar e criar, com elementos de experiências passadas, novas formas e definições. A imitação de práticas sociais produzidas pela humanidade - no nosso caso, a prática corporal da ginástica - é humanizadora, porque as crianças se fazem humanas por meio da apropriação da experiência acumulada historicamente. Neste entendimento, o trabalho pedagógico da educação física na Educação Infantil deve abrir possibilidades para a imitação como forma de aprendizagem.

Outro aspecto importante a ser destacado é que as crianças imitam algo que está na zona de desenvolvimento próximo. Imitar outras crianças saltando, equilibrando, girando, atividades muito comuns nas situações de brinquedo, significa que estes elementos estão situados dentro de sua zona de desenvolvimento proximal. O processo de mediação e apropriação destes elementos permite arrastálos para o seu desenvolvimento real. Destarte, promover atividades do tipo teatrinho, dramatizações e expressões artísticas são bastante interessantes, porque favorecem a criação de situações imaginárias e leva à criação de zonas de desenvolvimento próximo.

Consideramos, enfim, que os pressupostos da Teoria Histórico-Cultural podem contribuir significativamente para uma nova perspectiva de atividade educativa, para além das hegemônicas. Estudos fundamentados neste referencial teórico são uma necessidade histórica para a educação escolar e para as ações pedagógicas na educação física aqui reportadas, tomando como exemplo a especificidade da ginástica, tendo em vista que está arraigada a ela uma concepção de desenvolvimento biologicista e uma prática pautada neste referencial.

Os estudos sobre o brinquedo e sua relação com os processos de ensino, aprendizagem e desenvolvimento humano na perspectiva histórico-cultural necessitam ser intensificados na educação física, como forma de subsidiar o desenvolvimento do ensino na Educação Infantil e nas primeiras séries do ensino fundamental em uma perspectiva revolucionária e humanizadora para uma nova compreensão que supere as hegemônicas.

 

Referências

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Endereço para correspondência
Telma Adriana Pacifico Martineli
Universidade Estadual de Maringá - Departamento de Educação Física
Av. Colombo, 5.790 CEP 87020-900 Campus Universitário, Maringá - PR

Recebido em: 25/10/2008
Reformulado em: 04/12/2009
Aprovado em: 09/12/2009

 

 

Sobre os autores
Telma Adriana Pacifico Martineli (telmamartineli@hotmail.com)
Universidade Estadual de Maringá
Nataly de Carvalho Fugi (natikinha_cf@hotmail.com)
Universidade Estadual de Maringá
Keros Gustavo Mileski (kerosgustavo@hotmail.com)
Universidade Estadual de Maringá
1 A autora apresenta figuras de obras de arte clássicas como “Les jeux d’enfants”, quadro de Pieter Brueguel, pintado em 1560; “A família de Carlos IV”, quadro de Francisco de Goya, pintado entre 1800-01; “Os pequenos gigantes”, quadro pintado por Francisco de Goya nas últimas décadas do século XVIII, entre outras.
2 Cientificamente, este elemento é denominado “Parada de três apoios”.
3 Na literatura científica, este elemento é denominado “Roda”.
4 Funções Superiores Psicomotoras é o termo apresentado no livro Desenvolvimento do Psiquismo de Leontiev (1978, p. 288), necessitando ser entendido na perspectiva da formação do ser social, ou seja, a da ontogênese, a partir dos pressupostos marxistas da Teoria Histórico-Cultural. Para esta teoria, o sentido deste termo difere fundamentalmente da concepção biologicista e dualista de homem apresentada por Le Boulch (1978) em suas discussões e proposições sobre a “Psicomotricidade” com variantes como a “Psicocinética”.