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Psicologia da Educação

versão impressa ISSN 1414-6975versão On-line ISSN 2175-3520

Psicol. educ.  n.19 São Paulo dez. 2004

 

ARTIGOS

 

Identidade do eu, consciência moral e estágios do desenvolvimento: perspectivas para a educação

 

Ego Identity, moral conscience and stages of development: perspectives for education

 

Identidad del Yo, conciencia moral y niveles del desarrollo: perspectivas para la educación

 

 

Maria Augusta Salin Gonçalves1

Programa de Pós-Graduação em Educação da UNISINOS

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este artigo tem por objetivo apresentar reflexões sobre a formação da identidade do Eu, relacionando este conceito com teorias do desenvolvimento moral. No curso do desenvolvimento da identidade do Eu, que acontece em diferentes níveis, ocorrem processos de aprendizagem, tornados possíveis pelo amadurecimento de estruturas cognitivas e por processos motivacionais e afetivos. Conhecer as possibilidades e os limites do desenvolvimento e da formação moral pode auxiliar o professor a lidar com os conflitos que surgem na escola, de forma a possibilitar ao aluno a construção de identidade moral em nível pós-convencional. Educar no sentido da formação da identidade do Eu significa educar para a autonomia, para uma autonomia que abre o acesso comunicativo à própria natureza interna e se apóia em uma liberdade que põe limites a si mesma.

Palavras-chave: Identidade do Eu, Desenvolvimento moral, Autonomia.


ABSTRACT

The purpose of this article is to present a few reflections on the formation of the Ego identity, relating this concept to theories of moral development. During the development of the ego identity, which takes place at different levels, learning processes occur, being enabled by the maturation of cognitive structures and by motivational and affective processes, which are the foundation for interpersonal relations. Knowing the possibilities and limits of development and of moral formation can help teachers to deal better with conflicts that arise in their daily work at school, so as to enable the students to construct a moral identity at a post-conventional level. Educating to form the ego identity means providing education aimed at autonomy, an autonomy that opens the way for communication with one’s inner nature, and is supported by a freedom that imposes limits on itself.

Keywords: Ego identity, Moral development, Autonomy.


RESUMEN

El objetivo de este artículo es presentar reflexiones respecto a la formación de la identidad del Yo, relacionando este concepto con las teorías de desarrollo moral. En el curso del desarrollo de la identidad del Yo, que sucede en distintos niveles, ocurren procesos de aprendizaje, que se hicieron posibles a través del perfeccionamiento de estructuras cognitivas y por procesos motivacionales y afectivos. Conocer las posibilidades y los límites del desarrollo y de la formación moral puede ayudar al profesor a tratar con los conflictos que surgen en la escuela, posibilitando al alumno la construcción de identidad moral en nivel pos convencional. Educar hacia la formación de la identidad del Yo significa educar para la autonomía, a una autonomía que abre el acceso comunicativo a la propia naturaleza interna y se apoya en una libertad que pone límites a si misma.

Palavras clave: Identidad del Yo, Desarrollo moral, Autonomía.


 

 

Entre as muitas crises que a escola enfrenta atualmente, a crise no âmbito da interação social parece ser uma das mais graves. Violência, drogadição e furtos são acontecimentos que fazem parte do cotidiano da escola. No entanto, na maioria das vezes, o professor não se sente suficientemente preparado para lidar com esses problemas. Seguidamente, ele se faz questionamentos, buscando respostas que orientem as suas ações educativas: “Como devo agir em situações de conflito? Por que as crianças em geral não respondem aos conselhos, ponderações e advertências dos seus professores? Como posso auxiliá-las no sentido de possibilitar a emergência de interação social construtiva? Deve haver proibições na escola? O que deve ser proibido e o que deve ser permitido?”.

Questionamentos como esses são vivenciados pelo professor na vida real, concreta da escola, e envolvem decisões e ações, cujas conseqüências atingem alunos, professores, pais e a comunidade onde a escola se insere. São problemas prático-morais, que variam conforme a época e a cultura, mas são inerentes ao homem como ser psicossocial, e estão diretamente vinculados à formação da identidade pessoal e social dos indivíduos de uma determinada cultura.

A escola é uma das instituições responsáveis pela formação dos indivíduos e sua existência fundamenta-se, sobretudo, na necessidade de transmitir às gerações mais novas conhecimentos, crenças e valores, abrindo-lhes possibilidades para novas realizações. Embora ela não seja o único espaço que atua significativamente na formação da identidade, não há dúvidas de que a escola é o espaço por excelência onde o indivíduo teria possibilidades de vivenciar de modo intencional e sistemático formas construtivas de interação social, adquirindo saberes éticos que lhe propiciem as condições para o exercício da cidadania.

A formação de indivíduos críticos e participativos, que se constitui em um dos objetivos primordiais de uma educação transformadora, passa pela formação de uma consciência moral que capacite o aluno a interagir com base no respeito mútuo e no reconhecimento do outro como um ser social, com direitos e deveres; passa pela formação de uma consciência moral capaz de incorporar, criticar e transformar as normas implícitas em seu grupo social e cultural.

Para que o professor esteja apto a orientar o aluno nesse sentido, é importante o conhecimento das teorias sobre o desenvolvimento da consciência moral e a formação da identidade, pois essas podem contribuir para embasar ações educativas que sejam adequadas para favorecer ao aluno a internalização de normas sociais construtivas. Em vista disso, este artigo tem como objetivo proporcionar ao professor subsídios para uma reflexão sobre o desenvolvimento da identidade do Eu, a partir das teorias do desenvolvimento que enfocam a dimensão da moralidade.

Não há dúvidas de que a formação de saberes éticos de modo intencional e sistemático tem que estar ancorada no contexto cultural onde a escola se insere. A ação do indivíduo no mundo é determinada por uma infinidade de componentes de natureza física, psicológica, cultural e social. As transformações que o indivíduo sofre ao longo do seu desenvolvimento não são resultantes somente de agentes de natureza sociocultural, pois esses não atuam no vazio, mas interagem com condições relativas ao homem como ser corpóreo e psíquico. A formação dos saberes éticos se dá em um espaço onde se entrecruzam, em uma interação dinâmica e impossível de ser fragmentada na realidade concreta, aspectos de crescimento e desenvolvimento, que possuem uma certa universalidade, e aspectos culturais, tais como classe social, gênero, etnia, que possuem especificidade contextual. A construção da identidade pessoal e da identidade cultural, que em si são inseparáveis, se dá, assim, na interdependência e na interpenetração das múltiplas realidades que constituem o homem em seu percurso histórico.

Pensamos que o conhecimento das teorias que resultam de amplos estudos e pesquisas interdisciplinares possibilita ao professor pontos de referência, que o auxiliam a compreender os alunos em seu processo de desenvolvimento, com as suas limitações e possibilidades, e, assim, organizar adequadamente ações educativas, levando em conta a relação dialética das condições específicas do desenvolvimento pessoal com a realidade sociocultural. Não há dúvidas sobre o papel relevante dos condicionantes socioculturais no processo de desenvolvimento da identidade do Eu. Nesse sentido, os estudos culturais trazem importantes contribuições aos estudos de desenvolvimento, na medida em que não ignorarem que esse se processa em uma relação dialética de interdependência entre a realidade interna e a realidade externa. As pesquisas no âmbito da Psicologia do Desenvolvimento elegem como foco o pólo da subjetividade e buscam entender como se dá esse processo no sujeito cognoscente, afetivo e moral. Isso não significa, entretanto, que ignoram ou subestimam a importância do meio sociocultural. Eliminar o pólo das influências externas seria negar o seu próprio pressuposto fundamental, isto é, que o indivíduo se desenvolve em interação dinâmica com o seu ambiente. Da mesma forma, os estudos culturais, ao privilegiar como foco de investigação aspectos de natureza sociocultural, não podem negar que a ação do homem no mundo é a ação de um ser total: corpóreo-espiritual. Na construção de sua identidade, em que a subjetividade se transforma através de um processo de amadurecimento, também participam, como produto da interação dinâmica com o meio sociocultural, transformações relacionadas com a maturação física. Toda a crítica que pretende eliminar um dos pólos da relação é sectária e não apreende o processo em todo o seu significado.

 

Estágios do desenvolvimento da identidade do Eu e a consciência moral

A reflexão sobre o conceito de desenvolvimento moral associado a um conceito mais amplo de identidade do Eu é realizada por Habermas. Para ele,”o desenvolvimento moral é parte do desenvolvimento da personalidade, o qual, por sua vez, é decisivo para a identidade do Eu” (1990, p.55). O desenvolvimento moral é, assim, visualizado sob os três aspectos: capacidade de conhecimento, linguagem e ação. A reflexão que visualiza o desenvolvimento moral inserido no processo de construção da identidade, a nosso ver, integra as dimensões sociocognitivas, motivacionais e culturais presentes nas ações morais.

Para Habermas, o conceito de identidade não tem apenas um caráter descritivo. Embora esse conceito tenha relação com o desenvolvimento de processos biopsíquicos, a identidade do Eu não é uma organização resultante de processos naturais de amadurecimento, estando fortemente vinculada a condicionamentos culturais e sociais. Identidade do Eu indica uma organização simbólica do Eu, que faz parte dos processos formativos em geral e que possibilita o alcance de soluções adequadas para os problemas de interação social, existentes nas diferentes culturas. Para Habermas, esse conceito “indica a competência de um sujeito capaz de linguagem e de ação para enfrentar determinadas exigências de consistência” (1990, p.54). Significa a continuidade do Eu no tempo e no espaço, e a capacidade dessa ser interpretada reflexivamente pelo agente, sob a perspectiva de sua história pessoal. Habermas destaca, nesse processo, a dimensão da linguagem, isto é, da interação lingüisticamente mediada, pois é através da linguagem e na linguagem que se revela de forma inteligível a compreensão de si.

A formação da identidade do Eu se dá por mecanismos de aprendizagem, através dos quais, na relação dialética do organismo com o meio, estruturas externas se transformam em internas. Mecanismos como esses se encontram descritos em Piaget (interiorização), e também na psicanálise e no interacionismo (internalização) (Habermas 1990).

A formação de uma identidade do Eu supõe valorações que se inserem em uma compreensão de si que envolve uma apropriação de sua história pessoal, vista então no contexto das tradições culturais que a constituíram. Essa compreensão de si significa não somente o modo como uma pessoa se descreve, mas também como ela desejaria ser. O Eu ideal, com os valores éticos e morais incorporados ao longo de seu desenvolvimento, constitui um componente integrante da identidade do Eu.

O desenvolvimento da identidade do Eu se dá em direção a uma crescente autonomia, o que significa que o Eu, conseguindo cada vez mais resolver problemas com sucesso, torna-se progressivamente mais independente em relação às determinações sociais, culturais, parcialmente interiorizadas, e aos seus próprios impulsos.

O processo de desenvolvimento moral, integrado no conceito de identidade do Eu, abrange o conceito de consciência moral. Nessa perspectiva, consciência moral é um componente constitutivo do agir moral: o seu aspecto reflexivo. Isso significa que a consciência moral exerce uma avaliação dos nossos atos; envolve, portanto, um ato de julgamento. Lima Vaz define consciência moral “como o necessário lugar de mediação entre a existência ética como existência pessoal por definição e o universo ético como horizonte objetivo do agir, cuja realidade é proposta à pessoa sobretudo sob a forma de normas e instituições” (1998, p.462). Significa, portanto, o espaço de confluência da identidade pessoal com a identidade cultural, espaço esse pleno de questionamentos, contradições, adesões e lutas, no qual aspectos motivacionais, cognitivos e culturais, em movimento, se fragmentam e se reconstroem em justificativas e argumentações, orientando ações e decisões morais. A consciência moral é, assim, uma dimensão constitutiva da identidade do Eu, ou seja, é essa mesma focalizada em sua relação com as normas e os valores da cultura na qual o indivíduo se insere.

Nessa linha de pensamento, Habermas define a consciência moral como “a capacidade de usar a competência interativa para elaborar conscientemente conflitos de ação moral relevantes” (1990, p. 67)). Por competência, Habermas entende a capacidade de resolver determinadas classes de problemas, sejam de ordem empírico-analítica ou prático-moral. Nos diferentes níveis, ocorrem processos de aprendizagem, tornados possíveis pelo amadurecimento de estruturas cognitivas, construídas nas interações do sujeito com o meio, as quais são fortemente ligadas a processos motivacionais e afetivos, que estão na base das relações interpessoais. As experiências que o indivíduo vivencia no decorrer de sua vida em interação com a realidade sociocultural, bem como as motivações e emoções que são parte integrante dessas experiências, são, sem dúvida, determinantes na formação de estruturas cognitivas e das combinações que essas possibilitam, impulsionando ou retendo a passagem para um plano superior no curso do desenvolvimento. Para Habermas, “colocando o sujeito agente sob o imperativo de elaborar conscientemente os conflitos, a consciência moral é um indicador do grau de estabilidade da competência geral na interação” (1990, p. 71).

Visualizando o desenvolvimento moral dentro de um processo mais amplo de desenvolvimento das estruturas gerais do agir comunicativo e da formação da identidade do Eu, Habermas (1989) associa os estágios de desenvolvimento moral de Kohlberg às perspectivas sociais de Selman, por um lado, e a estágios de interação social, por outro lado. Neste sentido, baseia-se em uma lógica do desenvolvimento, segundo a qual, nas dimensões da consciência moral, do saber prático, do agir comunicativo e da solução consensual dos conflitos de ação, ocorrem, tanto em nível individual quanto em nível social, mutações nas estruturas normativas (valores, idéias morais, normas, etc). Essas dependem tanto dos processos culturais históricos, com seus condicionamentos econômicos, quanto dos processos de aprendizagem, que são a resposta aos desafios impostos por esses processos, produzindo formas de integração social cada vez mais maduras. Nesse processo, há estruturas da intersubjetividade lingüisticamente produzidas, que constituem estruturas da personalidade e também sistemas da sociedade, que aparecem na moral e no direito e definem formas de interação social.

Habermas toma como referência a teoria do desenvolvimento moral de Kohlberg (1984), segundo a qual as estruturas de pensamento e ação, que se formam ao longo do desenvolvimento, podem ser compreendidas em diferentes níveis, descritos por ele como pré-convencional, convencional e pós-convencional. Kohlberg refere-se essencialmente à capacidade de julgamento moral, onde é dada ênfase, sobretudo, aos processos cognitivos. Cada nível se constitui de dois estágios, também hierárquicos, sendo que o segundo estágio é alcançado através de um processo de reflexão sobre o primeiro. Cada novo estágio supõe uma reorganização das estruturas presentes nos estágios inferiores, o que significa a transformação na percepção e no julgamento de ações e a aquisição de novas formas de resolver conflitos morais. Essas estruturas são descritas nos diferentes estágios e representam as condições máximas possíveis, para que aporte uma determinada forma de julgamento moral.

Carol Gilligan, que trabalhou inicialmente como assistente de Kohlberg na Universidade de Harvard, por considerar inadequado o modelo de Kohlberg para entender a moralidade feminina, propõe um novo modelo, que tem como base do desenvolvimento o crescimento do Eu. A teoria do desenvolvimento de Gilligan (1994) introduz, assim, a questão do gênero no âmbito da discussão sobre o desenvolvimento moral. Ela afirma que homens e mulheres diferem no que diz respeito aos modos de enfocar problemas morais e de vivenciar as relações do Eu com os outros. Com base na psicanálise, ela explica como, ao longo do seu desenvolvimento, homens e mulheres constroem suas identidades, adotando características dos respectivos papéis, conforme os valores da sua cultura. Gilligan propõe três níveis de desenvolvimento moral: Orientação para a Sobrevivência Individual, Bondade como Auto-sacrifício e Responsabilidade pelas Conseqüências da Escolha. Em cada nível, é resolvido um conflito entre o Eu e os Outros, isto é, entre a responsabilidade consigo mesmo e a responsabilidade com os outros. O desenvolvimento se dá em direção a um equilíbrio entre a satisfação das necessidades, interesses, expectativas e idealizações do Eu e as necessidades, interesses, expectativas e idealizações dos Outros.

O processo de construção do Eu, – que abrange o processo de desenvolvimento das estruturas gerais da capacidade de consciência, de linguagem e de ação, e a busca de equilíbrio entre os sentimentos de cuidado e responsabilidade com os outros e o cuidado e responsabilidade consigo próprio –, se caracteriza pela descentração progressiva do próprio Eu e, ao mesmo tempo, pela sua delimitação em face da objetividade da natureza externa e do mundo social.

No centro de toda teoria do desenvolvimento, no âmbito da Psicologia, está o conceito de estágio de desenvolvimento. As teorias psicológicas cognoscitivistas e psicanalíticas, que lidam com a questão do desenvolvimento, segundo Habermas, “já recolheram provas evidentes em favor da afirmação de que o desenvolvimento do Eu realiza-se por estágios” (1990, p.16). Ele distingue quatro estágios de desenvolvimento do Eu: a) o simbiótico, b) o egocêntrico, c) o sociocêntrico-objetivista e d) o universalista (1990).

Esses níveis de desenvolvimento se distinguem de forma hierárquica quanto à reflexividade, à abstração e diferenciação, e à generalização (Habermas, 1990).

Esses níveis de desenvolvimento se distinguem de forma hierárquica quanto à reflexividade, à abstração e diferenciação, e à generalização (ibid.).

 

Período Simbiótico

Este período corresponde ao estágio sensório-motor de Piaget (1967, 1971), que vai do nascimento aos dois anos aproximadamente. Durante o primeiro ano de vida, a criança tem, com a pessoa de referência, em geral a mãe, e com o ambiente que a cerca, uma relação tão estreita que podemos dizer que forma com o mundo exterior uma simbiose. Por causa da indissociação do Eu e não-Eu, tudo o que é percebido é centralizado sobre a própria atividade. Gradualmente, o bebê começa a perceber os objetos do seu ambiente como permanentes. Não sendo capaz, no início, de perceber o seu corpo como próprio, gradativamente, no decorrer desse período, a criança vai aprendendo a conhecer os limites do seu corpo e a distingui-lo do mundo que o cerca. A partir da diferenciação de sua natureza interna em relação à realidade externa perceptível, a criança vai delimitando o seu Eu e construindo sua subjetividade, vendo a si mesma como um corpo entre os outros que habitam o seu ambiente. Ao mesmo tempo, vai construindo o mundo objetivo, passando a vivenciar os objetos do mundo como distintos de si e existindo externamente. Quando a criança aprende a estabelecer o limite entre o seu corpo e o ambiente, percebendo o caráter transtemporal do seu corpo, que conserva os próprios limites nas transformações, podemos dizer que ela possui uma identidade “natural”.

Neste nível, não podemos ainda falar de consciência moral.

 

Período egocêntrico

Este período coincide com o estágio de pensamento pré-operacional de Piaget (1967, 1971), que segue ao período sensório-motor e estende-se até o início do período das operações concretas (7 a 9 anos). Embora já seja capaz de perceber os objetos como permanentes, a criança, no início desse período, ainda não distingue a esfera física da social. Pensa o mundo de modo pré-operacional, intuitivo, em que todas as coisas são relativizadas a partir do Eu infantil. Na interação social, as expectativas de comportamento são concretas e inseridas em ações singulares, ações essas vivenciadas e avaliadas na dimensão prazer/desprazer, e suas conseqüências, em gratificações e sanções.

Com a aquisição da linguagem, que acontece no início desse período, as ações físicas são interiorizadas e tornam-se representações, ocorridas devido a um processo de reconstrução e reorganização em um novo plano, no plano de pensamento representativo. Com o desenvolvimento da linguagem, as perspectivas Eu-tu são exercitadas através dos papéis de falante e de ouvinte. Aos três anos, a criança já sabe dizer “eu”, tomando consciência de si mesma. A afirmação do Eu manifesta-se nas atitudes de extrema teimosia e rebeldia, que se observam, muitas vezes, em crianças dessa idade. Nesse momento, podemos dizer que se inicia o processo de construção da identidade do Eu.

O egocentrismo cognitivo e moral (1990), presente nesse nível, na forma de a criança julgar as ações morais, caracteriza a fase inicial do primeiro nível de desenvolvimento do julgamento moral, que Kohlberg denominou de Nível Pré-Convencional.

No primeiro estágio desse nível, Estágio do Castigo e da Obediência, o indivíduo não considera os interesses dos outros e não é capaz de reconhecer que eles diferem dos seus, nem relaciona dois pontos de vista diferentes. A correção da ação moral é julgada pelas conseqüências dessa ação, ou seja, pela recompensa ou pelo castigo que dela possam advir. O importante é obedecer às regras e evitar o castigo, sendo que a perspectiva da autoridade é confundida com a sua própria.

Mais tarde, ao tornar-se capaz de perceber a diferenciação entre características físicas e psicológicas das pessoas, a criança adquire a capacidade de diferenciação entre atos intencionais e não-intencionais. Torna-se capaz de entender e satisfazer expectativas singulares de comportamento por parte de um outro, passando a outro estágio.

No segundo estágio do Nível Pré-Convencional, denominado Objetivo Instrumental Individual e da Troca, há elementos de troca e reciprocidade. O indivíduo segue o seu interesse imediato e aceita que os outros também o façam, sendo capaz de estabelecer um acordo nesse sentido, pois reconhece que os outros também possuem interesses próprios. É capaz de obedecer a regras e de pôr-se na pele dos outros. A reciprocidade limita-se, entretanto, a interpretações feitas de modo físico-pragmático. Não é ainda capaz de compreender e julgar situações independentemente do seu ponto de vista, sendo sua perspectiva ainda ligada ao próprio corpo.

O nível Egocêntrico tem o seu correlato, no primeiro nível da Ética do Cuidado ou Ética da Responsabilidade de Carol Gilligan. Nesse nível, o indivíduo tem um sentimento de atenção voltada primordialmente ao Eu, visando à sua sobrevivência e proteção, sendo incapaz de ultrapassar interesses e expectativas particulares. A superação desse nível envolve a capacidade de o indivíduo sair de uma perspectiva centralizada no Eu, avançando progressivamente na possibilidade de visualizar e sentir uma determinada situação a partir de referenciais externos.

Nesse período do desenvolvimento, as ações educativas que auxiliam as crianças a superarem esse nível caracterizam-se pelo estabelecimento de regras em jogos, ou, em situações reais, o seu cumprimento, possibilitando a compreensão dessas regras para o alcance dos objetivos do grupo. O desenvolvimento da capacidade de reconhecer as necessidades e interesses dos outros pode ser incentivado em diálogos, em que a criança verbaliza as suas necessidades e os seus objetivos e aprende a ouvir, compreender e verbalizar as necessidades e objetivos das outras pessoas.

 

Período sociocêntrico-objetivista

Este estágio, que coincide com o período concreto-operacional de Piaget (1971), abrange o período que vai aproximadamente dos 7 aos 12 anos de idade e traz consigo transformações significativas na inteligência, na consciência, na afetividade e na socialização.

No nível cognitivo, o pensamento infantil se caracteriza pela reversibilidade das ações, pela presença de estruturas estáveis e coerentes, por sistemas de classificação, de ordem, por conceitos de medida, causalidade, etc.

No período anterior, nos primeiros cinco ou seis anos de vida, gradualmente a criança vai adquirindo a autoconsciência, passando progressivamente a localizar-se no mundo social. Com o início do período das operações concretas, a criança avança consideravelmente no sentido da construção de um sistema mais consistente do Eu, delimitando a sua subjetividade em relação à natureza externa e à sociedade. Nesse estágio, já é capaz de fazer coordenação lógica de diversos pontos de vista, desenvolvendo também a capacidade de compreender o sentido das regras. Nessa fase, podem ser introduzidos jogos e atividades recreativas com regras que exigem uma maior capacidade de compreensão. Ela passa a participar de forma mais eficiente nas interações, sendo que o seu universo simbólico não consiste mais apenas de ações que expressam intenções singulares, mas ela torna-se capaz de entender as ações como realização de expectativas de comportamento generalizadas ou como infrações. Essa mediação é realizada inicialmente pela doação simbólica operada por pessoas de referência primária, e, mais tarde, pelo reconhecimento social obtido em grupos mais amplos, como, por exemplo, na escola. Nesse período, a criança já consegue superar motivos de ação exclusivamente egocêntricos e integrá-los em motivos de ação culturalmente interpretados.

Do ponto de vista da psicanálise, é nessa idade que ela estrutura o seu Superego, internalizando as normas do grupo social, a partir da interação que ocorre, primeiramente no grupo familiar, depois se expande para outras instâncias da sociedade. Nesse primeiro momento, a identidade de papel é centrada em torno das características referentes ao sexo, à idade e à imagem do próprio corpo, a partir das vivências mais diretamente ligadas à estrutura familiar. Gradualmente, quando a criança se apropria de sistemas extrafamiliares de papéis, a identidade torna-se mais abstrata e, ao mesmo tempo, mais individual. Ao aprender a distinguir entre ações de pessoas singulares e as características dos papéis sociais, que vão se desvinculando das intenções e falas de pessoas particulares, a criança passa a incorporar as universalidades dos papéis sociais e, mais tarde, as normas do seu grupo social, ancoradas na tradição. Os papéis sociais assumem, nessa etapa, a forma de autoridade generalizada, e refletem o poder unificado de um grupo concreto, ao qual o indivíduo se sente ligado por laços de lealdade. Possuem um poder de sanção, que vai perdendo o seu caráter de imperativo de ordem superior, à medida que a criança interioriza as normas coercitivas das instituições e as ancora em seu Eu como um sistema de controle interno (Habermas, 1989).

Nesse período, é importante para a criança a sua aceitação no grupo de companheiros, sendo que o papel que ela desempenha no grupo é fundamental para o desenvolvimento da identidade do Eu. O grupo proporciona uma medida realista das suas habilidades e capacidades, o que leva à construção de um autoconceito positivo ou não, influindo na sua auto-estima. O grupo de companheiros ajuda a criança a reinterpretar valores e atitudes expressos pelos pais e outras pessoas próximas, caminhando em direção a uma interpretação própria.

Em vista do processo de incorporação no Eu dos papéis sociais, durante esse estágio, a identidade “natural” é substituída pela identidade de papéis.

O período sociocêntrico-objetivista coincide com o segundo nível de desenvolvimento moral de Kohlberg, o Nível Convencional. O julgamento moral, nesse período, se caracteriza pelo fato de uma força externa de caráter social – regras, normas sociais e leis – justificar a decisão por determinada ação moral, afastando-se gradualmente de uma perspectiva egocêntrica.

No primeiro estágio desse nível, o Estágio das Expectativas Interpessoais Mútuas, dos Relacionamentos e da Conformidade, a ação moral correta é a que corresponde às expectativas ligadas a papéis sociais, às regras e às normas neles implícitas, envolvendo valores como bondade, gratidão e lealdade. O indivíduo, nesse nível, em geral tende a desempenhar o papel de pessoa amável, correspondendo às expectativas das pessoas próximas.

No segundo estágio, o Estágio da Preservação do Sistema Social e da Consciência, a ação moral correta se justifica por cumprir o dever, mantendo a ordem social e o bem-estar na sociedade. As leis devem ser cumpridas, a não ser que entrem em conflito com outros deveres e direitos sociais, garantindo o funcionamento da sociedade como um todo. Ao justificar ações morais, o indivíduo leva em consideração as conseqüências dessas ações, questionando: “se todos fizessem o mesmo?”.

Na interação social, as crianças são capazes de reconhecer a perspectiva um do outro, havendo, nesse nível, reciprocidade de sentimentos e pensamentos. A reciprocidade abre a possibilidade para o reconhecimento do outro, devendo a criança ser orientada no sentido de respeitar idéias e sentimentos, exigindo o mesmo para si próprio.

Com a reciprocidade de perspectivas, os papéis comunicacionais da primeira e segunda pessoa tornam-se eficazes para a coordenação das ações. A criança torna-se capaz de, através de combinações, coordenar as suas ações com a dos companheiros, selecionando meios adequados para atingir fins comuns. O desenvolvimento lingüístico-comunicativo, atingido gradualmente durante esse período, vai proporcionando à criança o domínio de um sistema de atos de fala, o qual, por sua vez, amplia as possibilidades de interação social, permitindo a articulação de expectativas generalizadas de comportamento. É importante, nessa fase, a criança ter oportunidade de vivenciar em jogos ou dramatizações, ou mesmo em situações reais, diferentes papéis sociais, com suas normas específicas, sendo incentivada a compreendê-los, levando em conta, nas suas ações, as características desses, preparando caminhos que possibilitam uma reflexão crítica.

No segundo nível de desenvolvimento da consciência moral de Kohlberg, seja no estágio do modelo de papéis sociais, seja no estágio da lei, prevalece, no julgamento moral, a adoção de um ponto de vista externo. Na Ética do Cuidado, de Gilligan, também no segundo nível, é o Outro – exterior ao Eu – com seus interesses e necessidades, que está em primeiro lugar, impulsionando a ação moral. Embora o indivíduo já seja capaz de compreender a perspectiva do Outro e colocar-se em seu lugar, não consegue ainda visualizar a sua perspectiva e a do Outro em sua relação mútua, como uma totalidade, o que possivelmente a impede de encontrar um equilíbrio entre o cuidado do Outro e de si mesmo.

Em ambas as perspectivas éticas, de Kohlberg e Gilligan, neste nível, o julgamento e ação moral ocorrem por submissão a forças exteriores. A passagem desse nível para um nível superior exige uma superação da identidade de papel, que ocorre em direção a um desenvolvimento da autonomia do indivíduo na sua forma de pensar e agir, deixando de ligar sua identidade a papéis e normas sociais preexistentes. Esse desenvolvimento permite que, na adolescência, o indivíduo comece a questionar as “verdades” até então aceitas sem restrições e passe a relativizar as normas morais, sendo capaz de visualizá-las como meras convenções, ao examiná-las à luz de princípios.

 

Período universalista

Este período inicia-se na adolescência, quando, gradualmente, a identidade de papel é substituída pela identidade do Eu.

Neste período, no domínio cognitivo, o indivíduo torna-se capaz de realizar operações combinatórias, adquirindo o seu pensamento uma mobilidade crescente, que permite ao jovem raciocinar sobre “possíveis”, formulando hipóteses. O pensamento hipotético muda a forma de argumentação discursiva. Por meio de hipóteses, o adolescente é capaz de adotar o ponto de vista do outro e deduzir as conseqüências lógicas que ele implica, julgando o seu valor. O pensamento hipotético torna o jovem capaz de interessar-se por problemas que estão além de seu campo imediato de experiências, o que lhe permite compreender e construir teorias. As normas sociais, até então vistas como naturais, espontâneas e restritas às perspectivas do grupo social, passam a ser questionadas e visualizadas sob diferentes perspectivas. Desses questionamentos emergem princípios que possibilitam que conflitos morais possam ser resolvidos de modo argumentativo. A crítica e a justificação das interpretações das necessidades podem adquirir a força de orientar a ação.

O processo de constituição da identidade do Eu se dá na medida em que o Eu generaliza essa capacidade de superar a velha identidade e aprende a resolver as crises de identidade, reconquistando, em nível mais alto, o equilíbrio perdido entre si próprio e uma realidade social visualizada, nesse momento, sob novas perspectivas. O jovem liberta-se, assim, progressivamente, do dogmatismo do período anterior do desenvolvimento, ao mesmo tempo em que o sistema de delimitações do Eu torna-se reflexivo. A formação da identidade do Eu não requer apenas a competência na interação comunicativa no que diz respeito ao seu aspecto cognoscitivo, mas também à capacidade de inserir as próprias necessidades nas estruturas comunicativas, enfrentando e reconciliando conflitos internos.

Os conceitos sociocognitivos fundamentais do mundo social e da interação guiada por normas formam-se no quadro de uma compreensão descentrada do mundo, que se deve à diferenciação das perspectivas do falante e do mundo (Habermas, 1989). Com o desenvolvimento da capacidade de descentração, o adolescente torna-se capaz, não somente de compreender a perspectiva das outras pessoas, mas também de ver o sistema de relações entre elas – do qual ele próprio faz parte – como uma totalidade. Torna-se capaz de assumir reciprocamente as perspectivas e também trocar as perspectivas de participante pela de observador e transformá-las uma na outra. A adoção da perspectiva de terceira pessoa ou do outro generalizado é o que permite ao participante da interação sair fora abstratamente de uma situação e considerar as perspectivas de si próprio e dos outros e a totalidade da situação, construindo o mundo social (ibid.). O adolescente torna-se, assim, capaz de distanciar-se dos valores e crenças de sua cultura e examinar a situação concreta à luz de outros princípios e valores. Nessa fase, esses valores são questionados, trocados por outros e reconstruídos, e se encontram em processo de transformações.

O relacionamento do adolescente com o grupo de companheiros é fundamental nesse sentido. Precisando “romper” os laços com a família para adquirir independência, o adolescente atribui grande importância aos valores e atitudes do grupo de iguais. As discussões realizadas nesse grupo são significativas para a crítica e reinterpretação dos valores veiculados em sua cultura, possibilitando o desenvolvimento da autonomia. Em vista disso, a escola deve proporcionar ao aluno diversas oportunidades de participação e diálogo, incentivando-o a justificar argumentativamente as suas idéias e orientando-o no sentido da aquisição de valores, como respeito mútuo, solidariedade, cooperação e responsabilidade social.

O nível pós-convencional, segundo a classificação de Kohlberg, ou “baseado em princípios”, que se inicia no período da adolescência, supõe autonomia nas decisões morais, isto é, essas são justificadas a partir de princípios e valores, sendo que os princípios da justiça são a reciprocidade e a igualdade.

No primeiro estágio desse nível, o Estágio dos Direitos Originários e do Contrato Social, a maioria dos valores é relativa ao grupo social, todavia, as regras estão apoiadas no interesse da imparcialidade e representam o contrato social. Valores não-relativos, como a vida e a liberdade, justificam as decisões morais.

No segundo estágio desse nível, o Estágio de Princípios Éticos Universais, as decisões morais justificam-se com apoio em valores universais. As leis se apóiam em princípios racionais e, no caso de esses princípios serem violados, devem eles estarem acima das leis. São princípios universais de justiça, que geram decisões particulares. A premissa moral básica é a máxima kantiana: “ver as outras pessoas como fins e nunca como meios”.

Gilligan caracteriza o terceiro nível de sua teoria, a Ética do Cuidado, como o que descreve uma personalidade madura: aquele no qual o indivíduo consegue um equilíbrio entre a satisfação das necessidades, interesses, expectativas e idealizações do seu Eu e as necessidades, interesses, expectativas e idealizações dos outros. Assume a responsabilidade de cuidar do Outro, sem, no entanto, descuidar- se do seu próprio Eu, ante o qual também se percebe como responsável.

Essa atitude exige, da mesma forma que no terceiro nível de Kohlberg, a capacidade de vivenciar e avaliar uma situação concreta segundo valores que a transcendem. A atitude de equilíbrio, de “colocação de limites” ao Outro, protegendo o Eu e, ao mesmo tempo, de “abertura” ao Outro, no plano cognitivo e afetivo, só é possível quando o indivíduo é capaz de deixar em suspenso as normas morais vigentes no contexto cultural e adquirir o olhar de uma terceira pessoa que examina a validade dessas normas e as interpreta em sua relação com a situação existencial concreta. O equilíbrio da responsabilidade consigo mesmo e com o Outro nas decisões e ações morais, que Gilligan aponta como característica de maturidade emocional, a nosso ver, supõe a capacidade de reorganizar e construir julgamentos e decisões morais em função da visão crítica da situação concreta como uma totalidade de relações que envolve o Eu, os outros e os valores vigentes em sua cultura.

O processo de construção de uma identidade do Eu madura envolve a aquisição de autonomia nos julgamentos e ações morais. Isso significa ter como base de julgamento e ação valores que transcendem perspectivas individualistas e oferecem pontos de referência para a avaliação da situação concreta como um todo, possuindo, portanto, um certo grau de abstração e universalidade. Ao mesmo tempo, a reflexão sobre esses valores deve permitir a compreensão de decisões, ações e suas conseqüências em uma situação existencial, histórica, vivenciada em um determinado contexto cultural. Na dimensão da moralidade, universal e particular se entrecruzam.

 

Saberes éticos e a educação

O saber ético constitui, sem dúvida, uma dimensão essencial na formação da identidade do Eu, visualizada como objetivo de uma educação transformadora. Seu âmbito se circunscreve a ações e decisões realizadas na trama concreta e temporal das interações sociais, envolvendo comprometimento com valores que assegurem a participação, a autonomia, o diálogo, o pensamento crítico, a responsabilidade por si mesmo e pelo outro e a solidariedade.

As reflexões a respeito do desenvolvimento da identidade do Eu e da consciência moral que trazemos neste artigo pretendem contribuir para a educação, oferecendo aos professores alguns subsídios que possam auxiliá-los a desenvolver com seus alunos, no contexto da escola, ações educativas que propiciem a emergência de interações sociais construtivas.

Conhecer as possibilidades e os limites da formação da consciência moral, ancorada em um processo do desenvolvimento de estruturas internas, que se constroem no processo de interação com as outras pessoas, em um determinado meio cultural, pode ajudar o professor a lidar melhor com os conflitos que surgem no cotidiano escolar, auxiliando o aluno a caminhar no sentido de construção de uma consciência moral pós-convencional. Uma consciência moral que se fundamente no diálogo para a solução dos conflitos inevitáveis que surgem na convivência humana, caminhando em direção a uma identidade do Eu crítica e participativa.

Com inspiração em palavras de Habermas (1990), parece-nos válido afirmar que educar no sentido da formação da identidade do Eu significa educar para a autonomia, para uma autonomia que abre o acesso comunicativo à própria natureza interna, e se apóia em uma liberdade que põe limites a si mesma. Esses limites só têm sentido se vinculados ao reconhecimento do Outro em sua identidade pessoal e cultural.

 

Referências

Gilligan, C. (1994). La moral y la teoria – Psicologia del desarrollo femenino. México, Fondo de Cultura Económica.        [ Links ]

Habermas, J. (1989). Consciência moral e agir comunicativo. Rio de Janeiro, Tempo Brasileiro.        [ Links ]

_______ (1990). Para a reconstrução do materialismo histórico. São Paulo, Brasiliense. Kohlberg, L. (1984). Essays on moral development: The psychology of moral development. Vol. 2. San Francisco, Harper and Harper.

Lima Vaz, H. C. (1998). Crise e verdade da consciência moral. Belo Horizonte. Síntese Nova Fase, v. 25, n. 83.        [ Links ]

Piaget, J. (1967). O raciocínio da criança. Rio de Janeiro, Record.        [ Links ]

_______ (1971). A evolução intelectual entre a adolescência e a maturidade. Coimbra. Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra – Instituto de Estudos Psicológicos e Pedagógicos.        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
E-mail: guta@bage.unisinos.br

Recebido em junho de 2003.
Aprovado em agosto de 2004.

 

 

1 Professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos. Centro de Ciências Humanas

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