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Psicologia da Educação

Print version ISSN 1414-6975

Psicol. educ.  no.29 São Paulo Dec. 2009

 

A Psicologia da Educação enquanto disciplina da escola normal secundária em Maringá1

 

Education Psychology as a subject of regular secondary schools in Maringá

 

La psicología de la educación , disciplina de la escuela normal secundária en Maringà

 

 

Gesciely Barbosa da Silva-TadeiI; Analete Regina SchelbauerII; Sheila Maria RosinIII

IPsicóloga, Mestre em Educação pelo PPE/UEM e professora da Faculdade Noroeste Paranaense. E-mail: ciellys@yahoo.com.br
IIDoutora em Educação pela USP-SP e professora da Universidade Estadual de Maringá. E-mail: analeteregina@yahoo.com.br
IIIDoutora em Psicologia da Educação pela PUC-SP e professora da Universidade Estadual de Maringá. E-mail: sheilarosin@onda.com.br

 

 


RESUMO

O presente artigo tem como objetivo analisar a disciplina de Psicologia da Educação na Escola Normal Secundária de Maringá, nas décadas de 1950 a 1970, tendo como lócus de investigação três instituições de ensino: o Instituto de Educação Estadual de Maringá, o Colégio Santa Cruz e o Colégio Santo Inácio. O trabalho foi desenvolvido com base na análise dos documentos escolares e dos livros e manuais didáticos. Nesta pesquisa, verificamos que a autoria da maioria dos manuais escolares era de origem estrangeira; a aprendizagem foi o tema tratado com mais veemência pelos autores; o campo prático educacional foi o mais expressivo; o referencial teórico da psicologia comportamental foi o mais encontrado na literatura. O ensino da disciplina de Psicologia da Educação estava pautado nos preceitos escolanovistas, com alguns traços da pedagogia tecnicista.

Palavras-chave: Psicologia da Educação; escola normal secundária; instituições escolares; formação de professores.


ABSTRACT

This article is aimed at analyzing the Education Psychology subject at regular secondary schools in Maringá between the 1950s and 1970s of the XX century. The article has three schools as investigative locus: "Instituto de Educação Estadual de Maringá", "Colégio Santa Cruz" and "Colégio Santo Inácio". The work was developed from analyses of school documents, books and didactic manuals. In this research, we verified that most authors of didactic manuals were foreigners, the learning process was the most common theme dealt by such authors, the practical educational field was the most expressive, the theoretical referential of behavioral psychology was the most found in literature. The teaching of Education Psychology was based on the New School Movement precepts with some traces of technical pedagogy.

Keywords: Education Psychology; regular secondary school; schools. teachers formation.


RESUMEN

El presente artículo tiene como objetivo analizar la disciplina de Psicología de la educación en la Escuela Normal Secundária de Maringá, en las décadas 50 y 70 del siglo XX , teniendo como lugares de investigación tres instituciones de enseñanza: El Instituto de Educación Estatal de Maringá, el Colégio Santa Cruz y el Colegio Santo Ignácio. El trabajo fue desarrollado a partir del análisis de los documentos escolares, de los libros y manuales didácticos. En esta investigación, verificamos que la mayoría de los manuales escolares era de autores extranjeros; el aprendizaje fue el tema tratado con más énfasis por los autores, el campo práctico educacional fue el mas expresivo, la referéncia teórica de la psicología comportamental fue lo mas encontrado en la literatura. La enseñanza de la disciplina Psicología de la educación estaba regularizado según normas escolanovistas, con algunos rasgos de psicología técnica.

Palabras clave: Psicología de la Educación; escuela normal secundária; instituciones escolares; formación de profesores.


 

 

Introdução

Com o presente artigo objetivamos analisar a disciplina de Psicologia da Educação em três escolas normais em Maringá, por meio de documentos escolares, livros e manuais didáticos encontrados nas bibliotecas das instituições escolares que foram nosso lócus de investigação. Como referencial teórico no campo da história da psicologia, utilizamos Antunes (1998; 2004), Campos (2001; 2003) e Massimi (1990; 1996).

O eixo da investigação gira em torno da história da disciplina de Psicologia da Educação na Escola Normal Secundária de Maringá durante as décadas de 1950 a 1970. Uma história ainda pouco conhecida. Para reconstruí-la, buscamos uma metodologia pautada no caráter bibliográfico e qualitativo.

A delimitação temporal justifica-se pelo fato de que, no município de Maringá, o Ensino Normal teve início no ano de 1956, sendo uma modalidade de ensino que representava uma resposta aos anseios e reivindicações da comunidade maringaense em processo de formação. Como marco final, definimos a década de 1970 devido à Lei de Reforma do Ensino 5692/71, que marca o fim da Escola Normal e cria o Magistério de Segundo Grau. Com essa Lei, a formação no curso superior passou a ser um requisito para o exercício do magistério; esse fato, acrescido da criação, no ano de 1973, do Curso de Pedagogia na Universidade Estadual de Maringá, marca um novo momento da formação de professores no município.

O curso de Pedagogia passou a cumprir o proposto pela Lei 5692/71. Ressaltamos também que, no ano de 1974, foi formada a última turma de normalistas pelo Instituto de Educação Estadual de Maringá. Devido a isso, definimos o ano de 1974 como marco final para o nosso levantamento de fontes documentais.

Realizamos a pesquisa em três instituições escolares: 1) Instituto Estadual de Educação de Maringá/IEEM (público); 2) Colégio Santa Cruz (confessional católico); 3) Colégio Santo Inácio (confessional católico). Essas instituições estabeleceram-se no município de Maringá para auxiliar na formação dos filhos dos pioneiros da cidade durante o processo de colonização, sendo, assim, responsáveis pela formação do professorado da região.

O IEEM iniciou o funcionamento da Escola Normal no ano de 1956; o Colégio Santa Cruz criou a Escola Normal no ano de 1959, e o Colégio Santo Inácio abriu o Curso Normal no ano de 1965. Essas escolas foram de suma importância, disseminando formas e maneiras de pensar e de educar alunos de acordo com as exigências da época.

Diante dessas questões, podemos então fazer as seguintes perguntas: partindo das fontes documentais pesquisadas, qual era a disciplina de Psicologia da Educação ensinada para as alunas da Escola Normal Secundária de Maringá durante as décadas de 50 a 70? Qual era o referencial teórico predominante na literatura disponibilizada às alunas? Quais foram os conteúdos ensinados para as normalistas?

Para responder a essas questões, realizamos um levantamento de fontes primárias e documentais (como provas, diários de classe, trabalhos dos alunos, currículos dos cursos, livros de chamada, livros e manuais didáticos, documentos arquivados em bibliotecas) nas instituições pesquisadas.

A partir dessas questões, a organização do artigo foi constituída em quatro eixos de discussão: primeiramente, traz uma revisão de literatura acerca dos estudos sobre a disciplina de Psicologia da Educação; em seguida, aborda a trajetória da disciplina de Psicologia da Educação no Brasil e a inserção da Psicologia como ciência no Paraná e na cidade de Maringá; faz uma compilação e uma sistematização de dados encontrados nas instituições de ensino pesquisadas e analisa os dados sistematizados na pesquisa.

 

Os estudos sobre a disciplina de Psicologia da Educação: uma revisão de literatura

Alves-Mazzotti (2002, p. 6) chama nossa atenção para a importância de uma boa revisão bibliográfica porque esta, segundo ela, pode comprometer toda a pesquisa realizada, uma vez que "não se constitui em uma seção isolada, mas, ao contrário, tem por objetivo iluminar o caminho a ser trilhado pelo pesquisador, desde a definição do problema até a interpretação dos resultados".

Iniciamos nossa revisão bibliográfica pelos resumos e abstracts e pelos trabalhos completos, encontrados no site da Anped, mais especificamente no Grupo de Trabalho de Psicologia da Educação - GT 20 (2007). Além da Anped, realizamos pesquisas na revista Psicologia da Educação, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2007), na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos (2007), no Portal do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP (2007), e fizemos um levantamento de dados referente às teses e dissertações presentes na base de dados multidisciplinar da Biblioteca Central da Universidade Estadual de Maringá (2007). Por meio dessa base de dados, tivemos acesso às bibliotecas das universidades: Universidade de São Paulo (USP), Universidade de Campinas (Unicamp), Universidade Estadual de São Paulo (Unesp) e Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

De forma geral, os trabalhos que encontramos estão situados entre os anos de 1985 e 2006, e, em 1985, localizamos a primeira referência de produção de trabalho desenvolvido acerca do tema que pesquisamos e, em 2006, obtivemos a última referência acerca de nosso tema.

Podemos observar que, naquilo que diz respeito a pesquisas referentes à disciplina de Psicologia da Educação:

• nos anos de 1987, 1990, 2001 e 2002, o índice de produções acadêmico-científicas acerca do tema pesquisado foi de 0,00% de um total de 100%;

• nos anos de 1985, 1986, 1988, 1989, 1991, 1998, 2004 e 2005, o índice de produções acadêmico-científicas acerca do tema pesquisado foi de 2,33%, o que equivale a uma produção científica por ano;

• nos anos de 1993, 1996, 1997 e 2000, o índice de produções acadêmico-científica acerca do tema pesquisado foi de 4,65 %, o que equivale a duas produções científicas por ano;

• nos anos de 1992 e 1999, o índice de produção acadêmico-científica acerca do tema pesquisado foi de 9,30%, o que equivale a quatro produções científicas por ano;

• nos anos de 1995 e 2006, o índice de produção acadêmico-científica acerca do tema pesquisado foi de 11,63%, o que equivale a cinco produções científicas por ano;

• no ano de 2003, o índice de produção acadêmico-científica acerca do tema pesquisado foi de 18,60%, o que equivale a um total de oito produções científicas no referido ano.

Percebemos que 2003 foi o ano em que houve maior quantidade de trabalhos acadêmico-científicos publicados, envolvendo direta ou indiretamente a disciplina de Psicologia da Educação.

Ao afunilarmos os trabalhos pesquisados, atendo-nos mais especificamente ao nosso objeto de pesquisa, observamos trabalhos importantes como: Puttini (1988), com a dissertação de mestrado O ensino de Psicologia aplicada à educação no curso de habilitação ao magistério; Feitosa Júnior (1991) e a dissertação de mestrado A Psicologia Educacional na opinião do aluno do curso-habilitação para o magistério; Gouvea (1992) em seu trabalho de mestrado Caracterização da disciplina de Psicologia da Educação para a formação de professores em nível de 2º grau no âmbito do Centro Específico para a Formação e Aperfeiçoamento do Magistério (Cefam); Ióris (1993) e sua pesquisa de mestrado As contribuições da Psicologia da Educação na formação de professores no Estado do Paraná; Almeida (1993), em sua tese de doutorado Psicologia da Educação nas escolas normais (DF); Silva (1995), em sua dissertação de mestrado A disciplina de Psicologia no magistério: contribuições para o ensino; Saisi (1996), em sua tese de doutorado Psicologia da Educação: retrospectiva de uma disciplina; Mastrobuono (2004) com sua tese de doutorado A Psicologia da Educação no ensino normal de uma escola confessional católica da cidade de São Paulo (1941-1961).

As dissertações e teses mencionadas situam-se entre os anos de 1988 e 2004. Encontramos também artigos de revistas científicas com temas de pesquisa pertinentes ao nosso. Mencionaremos apenas os autores e o título da publicação, os quais são: Gebrim (1996) discutiu a "Psicologia da Educação no Brasil - uma história contada pela revista brasileira de estudos pedagógicos"; Centofanti (2006) abordou "Os laboratórios de Psicologia nas escolas normais de São Paulo: o despertar da psicometria"; Mastrobuono e Antunes (2006) trouxeram "A Psicologia da Educação no curso normal de uma escola confessional católica da cidade de São Paulo (1941-1961)"; Nadaleto, Asbabr, Silva, Souza e Schindwein (2006) realizaram um estudo com o título "Grupo de Trabalho Psicologia da Educação: uma análise da produção acadêmica (1998 - 2004)".

Durante nossa sistematização de dados, não pudemos deixar de observar o expressivo número de dissertações e teses defendidas na PUC-SP. Verificamos que o Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: Psicologia da Educação iniciou suas atividades de Mestrado na PUC-SP em 1969, e as de Doutorado em 1982. Foi o primeiro programa do Brasil de pós-graduação em Psicologia da Educação e um dos primeiros na área de Educação, tendo papel fundamental na origem da própria Pós-Graduação da PUC-SP (Pós-Graduação PUC-SP, 2007). Pensamos que essa tradição nos estudos em Psicologia da Educação contribuiu para essa expressão da referida instituição.

 

Estudos acerca da Psicologia da Educação no Brasil e a inserção da Psicologia enquanto ciência no Paraná e na cidade de Maringá

O caminho percorrido das ideias psicológicas à constituição da Psicologia da Educação e sua inserção no currículo normalista constitui o foco deste item do artigo. Para organizá-lo, apoiamo-nos em Gadotti (1993), na Educação, e Patto (1987), na Psicologia, pois ambos realizam a divisão da história, de cada área, em períodos semelhantes entre si.

O que destacamos é a proximidade enfatizada pelos autores da Educação e da Psicologia, naquilo que diz respeito ao processo histórico. No primeiro período, comum aos dois autores, tem-se a vinda da Família Real para o Brasil, um marco para a Educação do país, a qual era de ordem religiosa, destacada pela atuação dos padres jesuítas, componentes da Companhia de Jesus, e que possuíam pleno apoio da Coroa Portuguesa (SILVA, 2007). Esse apoio ocorreu porque era necessária uma instituição, representada pela Igreja Católica, que ditasse normas e regras para uma população mestiça e miscigenada como a brasileira, em sua maioria analfabeta.

Nesse período, predominou no país a Educação Tradicional ou Pedagogia Tradicional "centrada no adulto e na autoridade do educador, marcadamente religiosa, e o ensino privado" (GADOTTI, 1993, p. 17). O referido período é definido como modelo "agroexportador" por Patto (1987), uma sociedade basicamente agrária, regida pela oligarquia.

O segundo momento, mencionado por Gadotti (1993) e Patto (1987), compreende o período de 1930 a 1964. Nessa fase, temos uma população brasileira em transição, ou seja, uma sociedade agrária e oligárquica rumo a uma sociedade urbano- industrial.

Com o êxodo rural, ocorreu uma crise no modelo agroexportador, a sociedade passou a ser mais acentuadamente urbana, necessitando de condições para o desenvolvimento capitalista. A luta contra o analfabetismo tornou-se mais acirrada, visto que havia necessidade de mão-de-obra qualificada para o mercado de trabalho. A procura pela educação foi intensificada e exigia-se da escola o ensino da leitura e da escrita. Destacamos aqui a entrada do escolanovismo no país.

O terceiro momento trazido por Gadotti (1993, p. 17) compreende o período pós-1964, que foi "iniciado por uma longa fase de educação autoritária dos governos militares, em que predominou o tecnicismo educacional".

A Pedagogia Tecnicista foi introduzida no Brasil entre as décadas de 1950 e 1970, mas sua existência já era notada nos Estados Unidos no período pós-1950. Para essa visão, as exigências do meio são de suma importância; assim sendo, o homem, como um produto desse meio, necessita ser formado e, porque não "controlado". Patto (1987) define essa fase como a "internacionalização do mercado interno". A burguesia nacional aliada ao capital internacional buscava a instalação, no país, das multinacionais.

No ano de 1964, com o golpe militar, observamos que o maior interesse pela educação centrava-se no ensino profissionalizante, que era a tônica no referido período. O controle das massas era o foco desse sistema de governo. Medidas ideológicas foram tomadas, como, por exemplo, o cerceamento da liberdade de opinião, a censura dos meios de educação, a proibição de atividades políticas estudantis, dentre outros. Os objetivos eram a disciplina e o controle de estudantes e operários (PATTO, 1987).

Salientamos que, com base na delimitação temporal trazida por Gadotti (1993) e Patto (1987), a periodização de nosso trabalho está situada entre o predomínio, no país, da Pedagogia Nova e da Pedagogia Tecnicista.

Percebemos que quando se discute a história da Psicologia brasileira, como Patto (1987) fez, entende-se que há uma relação entre esta e a Educação, ambas unem-se, em especial, pela via de propagação dos conhecimentos sistematizados que a Educação favoreceu à Psicologia desde o ensino dos jesuítas, no período colonial (Massimi, 1990).

No período referente à implantação da Psicologia no Brasil, o que se buscava era a normalização da população e a escolaridade da mesma (Patto, 1987). A Psicologia veio atender a uma demanda que era a classificação e a seleção por meio da testagem e da análise laboratorial, com o principal intuito de melhorar a organização do ensino no país. Sob essa ótica, notamos que é necessário o reconhecimento acerca da importância da Psicologia para a Educação no Brasil.

A história da Educação e da Psicologia no estado do Paraná e no município de Maringá seguiram a tônica do restante do país. Salientando, no caso do Paraná, a atuação do Inspetor Geral de Ensino César Pietro Martinez, responsável pela manutenção da qualidade do ensino no estado e adepto do modelo positivista de educação escolar (MIGUEL, 1997).

Ressaltamos também, entre os educadores que contribuíram para a melhoria da instrução escolar no Estado do Paraná, o nome de Erasmo Pilotto (1910-1992), educador e técnico a serviço do estado que tomou importantes medidas referentes à organização do sistema escolar, desenvolvendo propostas para os Cursos Normais Regionais (ibid.). Foram educadores como Pilotto que ajudaram na construção da história da Educação no Paraná.

A Psicologia no Paraná, como ocorreu em outros estados brasileiros, também estava ligada à Escola Normal Secundária e ao trabalho realizado em clínicas particulares voltado para o atendimento de alunos com questões a serem resolvidas na área da aprendizagem. Alves (1997) afirma que as Escolas Normais foram centros difusores de cultura e entusiasmo pela Psicologia, tendo no currículo o foco para a teoria de Piaget, os estudos da Escala Binet, os trabalhos de Claparède, dentre outros.

Em 1968, foi criado o primeiro Curso de Psicologia do Paraná, na Universidade Católica do Paraná, hoje Pontifícia Universidade Católica (PUC-PR). Segundo Trevizan (1991, p. 17):

A iniciativa da PUC-PR foi seguida por outras instituições, que resolveram implantar cursos de Psicologia: em março de 1972, na Universidade Estadual de Londrina, e em agosto deste mesmo ano, no Cesulon - Centro de Estudos Superiores de Londrina, ambos na cidade de Londrina; em 1973, na Universidade Federal do Paraná, em Curitiba; em 1974, na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras Tuiuti, em Curitiba; em agosto de 1979, na Universidade Estadual de Maringá.

No município de Maringá, encontramos também uma Psicologia ensinada com afinco nas Escolas Normais. A cidade foi alavancada pela agricultura e teve grande influência da Companhia Melhoramentos para a delimitação de território e organização e sistematização da cidade (Pelegrini, 2005).

O município de Maringá foi projetado, de acordo com Zanirato (2005, p. 145), "para abrigar duzentos mil habitantes, em seiscentos alqueires entrecortados por avenidas com quarenta e cinco metros de largura e com reservas florestais em pleno perímetro urbano". A cidade, conforme a autora, começou a ser criada ao final da década de 1930 e, em maio de 1947, deu-se a fundação oficial. A localização privilegiada no centro geométrico da zona colonizada favoreceu sua conversão em um dos principais núcleos urbanos.

No ano de 1952, Maringá tornou-se município e Inocente Villanova Júnior foi eleito prefeito, e dentre suas principais preocupações estava a de construir várias escolas, seguindo assim a tendência nacional. A preocupação da época era o ensino da leitura e da escrita, mas, na Educação municipal, havia uma ausência marcante de professores habilitados (Hegeto, 2005).

Devido a esse quadro, a professora Dirce de Aguiar Maia foi convidada para encaminhar as questões relativas à Educação de Maringá. Ela se tornou responsável pela formação e orientação dos docentes para a atuação nas escolas. Aos poucos, os professores foram nomeados pelo estado. É cabível ressaltar que não havia diretrizes quanto à condição do ensino local, as orientações federais e estaduais sobre Educação eram dadas para a Delegacia do Ensino em Londrina e repassadas à professora Dirce que as divulgava para os demais professores.

Em Maringá, destacamos a criação da Escola Normal Secundária no atual Instituto de Educação Estadual de Educação. Essa primeira instituição escolar foi contemplada, em 1956, com a denominação Escola Normal Amaral Fontoura. A fim de auxiliar na melhoria do quadro educacional da cidade, ocorreu a instalação da rede particular de ensino. O primeiro colégio a ser criado foi o Colégio Santa Cruz, no ano de 1952, fundado pelas Irmãs Carmelitas da Caridade de Vedruna, que vieram da Espanha. Inicialmente, o Colégio oferecia apenas o curso primário e a Educação era pautada nos princípios escolanovistas. Em 1956, foi criado o Curso Ginasial, o que favoreceu a abertura do Curso Normal Secundário em 1959, reconhecido em 1968 (Hegeto, 2005).

Logo após, foi instalado o Colégio Santo Inácio, no ano de 1957, coordenado pelas Irmãs Missionárias do Santo Nome de Maria, de origem alemã. A congregação foi fundada na Alemanha, em 1920, pelo bispo Wilhelm Berning com a finalidade de expandir o catolicismo. Em um primeiro momento, as Irmãs ofertaram o Jardim de Infância, o qual se oficializou como escola no ano de 1957. Nos anos seguintes, foram inclusos o Curso Ginasial e a Escola Normal.

As Escolas Normais foram os primeiros espaços destinados à formação sistematizada de docentes para a atuação no ensino primário, e tiveram um papel importante para o sistema educacional do município de Maringá, estando incrustada no desenvolvimento político, econômico e social da cidade.

 

Compilamento e sistematização dos dados encontrados nas instituições de ensino pesquisadas

Com o compilamento e a sistematização de dados, buscamos reconstruir a história da disciplina de Psicologia da Educação na Escola Normal Secundária em Maringá. Esse intuito guiou-nos à procura dos vestígios e indícios dessa história nas primeiras instituições a ofertarem a disciplina de Psicologia da Educação para as normalistas.

Dentre as fontes encontradas, estão os documentos dos arquivos (pontos de prova, currículos, atas, notícias de jornal) e as fontes bibliográficas (livros e manuais didáticos) que eram disponibilizadas às normalistas acerca da disciplina em questão.

No Instituto de Educação Estadual de Maringá - IEEM, encontramos os documentos arquivados e as fontes bibliográficas. Na pesquisa, em um primeiro momento, realizamos o levantamento dos livros e manuais didáticos acervados na biblioteca que foram disponibilizados para as normalistas na disciplina de Psicologia da Educação. De acordo com a funcionária da biblioteca, alguns exemplares já não estavam no estabelecimento de ensino, outros já haviam sido recolhidos para a parte dos fundos da biblioteca e seriam descartados.

Em alguns exemplares, conseguimos a ficha de empréstimo do volume, em outros tivemos acesso à data de aquisição da obra pela instituição de ensino, por estar carimbada na capa ou na contracapa do livro. Foi dessa maneira que selecionamos o material, de acordo com o ano referenciado no livro e que estava disposto ou na ficha de empréstimo ou no timbre de aquisição da instituição. No caso das fontes bibliográficas (livros e manuais didáticos), por exemplo, organizamos os quadros em dez itens, os quais compreendem: 1) Título do livro; 2) Nome do autor/autora; 3) Nacionalidade do autor/autora; 4) Ano de publicação; 5) Editora; 6) Resumo do livro (breve); 7) Tema tratado pelo autor; 8) Campo prático; 9) Relação com a prática pedagógica; 10) Referencial teórico utilizado. Essa organização foi utilizada também para as demais instituições pesquisadas, ou seja, para o Colégio Santa Cruz e para o Colégio Santo Inácio.

No Colégio Santa Cruz, o período de funcionamento da Escola Normal estendeu-se do ano de 1959 ao ano de 1972 e nele encontramos uma rica fonte documental arquivada; a biblioteca já não estava disponível, mas nos documentos antigos pudemos ter acesso a alguns dos autores e títulos encontrados, o que foi de grande valia, uma vez que isso nos deu um vislumbre sobre o autor mais utilizado na época, assim como a linha teórica em questão.

No Colégio Santo Inácio, não tivemos acesso a fonte documental, uma vez que a mesma havia sido incinerada. Mas havia na instituição uma vasta biblioteca que ainda não havia sido desfeita. Nesse local, o período de funcionamento da Escola Normal estendeu-se do ano de 1966 ao ano de 1996.

Verificamos que temos os seguintes documentos sobre o período de 1950 a 1970, no que tange à disciplina de Psicologia da Educação em Escolas Normais Secundárias em Maringá:

• No IEEM, temos a fonte documental (atas, pontos de prova, currículos, notícias de jornal) e as fontes bibliográficas (livros e manuais didáticos);

• No Colégio Santa Cruz, temos a fonte documental (atas, pontos de prova, currículos) e uma amostra de livros e manuais didáticos disponibilizados para as normalistas, que foram encontradas em um registro de ata do ano de 1962;

• No Colégio Santo Inácio, temos as fontes bibliográficas (livros e manuais didáticos), um breve relatório acerca da criação da escola e uma entrevista com a secretária geral da instituição.

No caso das referências encontradas na biblioteca do IEEM, somam um total de 33 títulos, dispostos em 17 quadros demonstrativos organizados de acordo com o ano. O primeiro data de 1956 e o último data de 1974. A maioria dos autores, 22, é de origem estrangeira; Paul Henry Mussen; Ofélia B. Cardoso e Jean Piaget foram os autores com uma bibliografia mais expressiva no que se refere ao número de títulos encontrados; as editoras mais expressivas foram Flamboyant, Melhoramentos, Zahar e Olympico; 24 referências bibliográficas tinham relação com a prática pedagógica; dois livros eram de cunho religioso; aprendizagem foi o tema tratado com maior veemência pelos autores; o campo prático educacional foi o mais expressivo; o referencial teórico da Psicologia Comportamental foi o mais observado.

Embora não tenhamos encontrado referências bibliográficas de Afro do Amaral Fontoura, em uma entrevista com uma das normalistas que estudou no IEEM no período de 1962 a 1965, a mesma afirma que esse autor teve grande expressão na época. Fontoura era o representante da Escola Viva, uma vertente católica da Escola Nova. Seu trabalho pautava-se basicamente no estudo da criança e do seu desenvolvimento. Em Maringá, ele participou da formatura da primeira turma de normalistas, no ano de 1958, e sua vinda à cidade teve forte impacto no meio educacional.

No que diz respeito às fontes documentais encontradas na instituição, temos, resumidamente, que as fontes documentais que pesquisamos no IEEM pautam-se em atas referentes a datas comemorativas, pontos de provas, currículos, atas pertinentes a registros de palestras, campanhas, concursos e cursos, além de projetos desenvolvidos pela instituição de ensino. Os documentos foram organizados em três momentos: 1956-1960; 1961-1966; 1967-1974.

Nos documentos, destaca-se uma forte preocupação com o civismo, em especial nos desfiles do dia sete de setembro, para a comemoração da Independência do Brasil e a data comemorativa de XV de novembro, em homenagem à Proclamação da República. Algumas datas foram comemoradas com desfile cívico em todo o período, ou seja, de 1956 a 1974, como é o caso: Dia do Trabalho, Dia das Mães, Tiradentes, Aniversário de Maringá, Semana da Árvore, Dia dos Pais, 7 de Setembro, Semana da Criança, Dia do Professor e XV de Novembro.

Além disso, ocorreram outras comemorações, como a Semana do Enxoval, apenas entre os anos de 1956 a 1960; o Dia de Instalação da Escola, somente de 1961 a 1966; o Dia do Soldado, de 1956 a 1966; Páscoa, de 1961 a 1974; e a Semana do Livro de 1956 a 1960 repetiram-se por períodos que variaram de cinco a 14 anos. Referências a exposições de ciências e também projetos de reciclagem, campanha social de luta contra a varíola, concurso de monografia, campanha de higienização eram também comuns nos documentos da época.

No que diz respeito à disciplina escolar, no ano de 1957, a disciplina foi denominada "Psicologia" e esteve presente no quadro curricular em 1958. Foi assim denominada também nos anos 1959, 1960 e até a segunda série do ano de 1961.

A partir da terceira série do ano de 1961 até a segunda série do ano de 1962, a disciplina recebeu a nomenclatura de Psicologia Educacional. Na terceira série do ano de 1962 até a terceira série do ano de 1966, voltou a ser denominada Psicologia.

De 1967 até a segunda série do ano de 1972, a disciplina de Psicologia foi retirada do currículo da Escola Normal Secundária. Observamos que foram incorporadas novas disciplinas, como é o caso de Artes Femininas, Educação Moral e Cívica, Higiene e Administração Escolar.

No ano de 1972, a disciplina voltou sob a denominação de Psicologia Educacional para a terceira série do curso. Assim permaneceu até 1974, período em que a Escola Normal cede espaço, devido às implicações da Lei de Reforma 5692/71, ao Magistério, o qual se iniciou no ano de 1973 no IEEM. As normalistas continuaram seus estudos apenas até a turma vigente concluir a sua formação naquela modalidade de ensino.

Já no Colégio Santa Cruz, coordenado pelas Irmãs Carmelitas de Vedruna, de origem espanhola, obtivemos uma expressiva quantidade de fontes documentais referentes ao período da Escola Normal Secundária, em especial na década de 1960. A disciplina aparece a partir da segunda série da Escola Normal Secundária, sendo ministrada três horas por semana.

Partindo do material encontrado na instituição, podemos inferir que a Psicologia do período era focada no indivíduo, na experimentação, análise e observação laboratorial. O que se observa nos itens dos programas da disciplina de Psicologia Educacional dos anos de 1960 e 1961: Psicologia Experimental Racional; Questionário Prático; Extropecção e Experimentação; Barlond e a Experimentação; Métodos e Inquéritos; Medida de Intelige Speraman e a Inteligência; Os Testes.

Além do programa da disciplina, observa-se a mesma questão nos pontos da prova oral para as alunas da segunda série: O método de Inquérito; A Medida de Inteligência; A Psicologia Experimental; Os Testes e os Métodos de Inquérito; Os Testes; Conceito e Provas de Inteligência; A Experimentação; Psicologia Infantil; A Personalidade do Escolar e o Ajustamento Social; Características da Primeira Infância; O Psiquismo do pré-escolar; As Diferentes Fases do Psiquismo na Primeira Infância.

Temos ainda a relação dos trabalhos práticos elaborados pelas normalistas na disciplina de Psicologia durante o ano de 1962. Os temas sugeridos refletem, igualmente, o foco no indivíduo, na experimentação, análise e observação laboratorial: 1) relatar fatos psicológicos pessoais; 2) testes de desenho e de inteligência; 3) pesquisas em equipe e com debate - observações sobre as crianças; 4) pesquisa sobre adolescentes e crianças problema; 5) caderno de Psicologia Geral - álbum da Psicologia Infantil.

Além dos pontos dos programas da disciplina, dos pontos de prova, e dos trabalhos elaborados pelas alunas, a questão evidencia-se também nas conferências realizadas no período de 1954 a 1972 para as normalistas do Colégio Santa Cruz, sob títulos como Psicologia do amor; Psicologia da fé; O lar e a escola, conflito e complementação. Esses temas sinalizam para a compreensão do indivíduo e, no caso do colégio confessional, a união desse indivíduo com a fé e o amor.

Nos títulos de livros e manuais didáticos referentes ao ano de 1962, temos títulos como Deficiências intelectuais da criança; Noções de Psicologia experimental; Testes; Testes ABC. Acreditamos que os mesmos auxiliam na compreensão da Psicologia ensinada e aprendida na instituição.

A partir das informações acima descritas (programa da disciplina, pontos de prova, trabalhos elaborados e títulos de livros e manuais didáticos), podemos afirmar que a disciplina de Psicologia ensinada na época era pautada no indivíduo, na experimentação, análise e observação laboratorial.

Naquilo que tange esses manuais didáticos, temos que as referências encontradas na biblioteca da instituição somam um total de nove títulos, dispostos em cinco quadros demonstrativos e organizados de acordo com o ano. O primeiro data de 1950 e o último data de 1970. Os livros encontrados situam-se entre os anos de 1950 e 1970; a maioria dos autores, cinco, é de origem estrangeira; Afro do Amaral Fontoura foi o autor com a bibliografia mais expressiva no que se refere ao número de títulos encontrados. As editoras mais mencionadas foram Agir e Gráfica Editora Aurora; sete referências bibliográficas tinham relação com a prática pedagógica; cinco livros eram de cunho religioso; aprendizagem foi o tema tratado com maior veemência pelos autores; o campo prático educacional foi o mais expressivo; o referencial teórico da Psicologia Comportamental foi o mais observado, seguido da Epistemologia Genética de Piaget.

Quanto ao Colégio Santo Inácio, administrado pelas Irmãs Missionárias do Santo Nome de Maria, de origem alemã, não tivemos acesso às fontes documentais, mas tivemos a chance de observar 30 referências de manuais didáticos e livros dispostos às normalistas no período da Escola Normal Secundária.

Observamos que o primeiro manual data de 1956 e o último de 1973. Vinte e duas das referências bibliográficas tinham relação com a prática pedagógica, enquanto 8 não referenciavam; 4 livros eram de cunho religioso, 26 não tinham esse intuito; a maioria dos autores, 18, é de origem estrangeira; Theobaldo Miranda Santos; Maria Junqueira Schmidt e Ofélia B. Cardoso foram os autores com uma bibliografia mais expressiva entre os títulos encontrados. Ressaltamos que o primeiro escreveu manuais didáticos, as duas últimas escreveram livros para coleções ligadas à formação docente; as editoras mais expressivas foram Agir, Ao Livro Técnico S.A., Cia. Editora Nacional, Melhoramentos, Cultrix, Flamboyant e Zahar; 22 referências bibliográficas tinham relação com a prática pedagógica; 4 livros eram de cunho religioso; aprendizagem foi o tema tratado com maior frequência pelos autores; o campo prático educacional foi o mais expressivo; o referencial teórico da Psicologia Comportamental foi o mais observado.

Sucintamente, foram esses os dados encontrados e sistematizados a partir do material pesquisado nas instituições escolares. A partir disso, propomos uma análise, a qual será discutida em nosso próximo item.

 

Do compilamento à análise - considerações finais

Este artigo, estruturado a partir de uma pesquisa com fontes primárias e documentais, sobre a história da disciplina de Psicologia da Educação na Escola Normal Secundária de Maringá, procurou compreender o que as normalistas, em seu processo de formação como professoras, obtiveram de conhecimento psicológico e qual o referencial teórico utilizado na disciplina para essa formação.

O compilamento de dados auxiliou-nos no processo de compreensão sobre a história da disciplina de Psicologia da Educação em Maringá.

Os documentos arquivados vieram a confirmar esse posicionamento utilizado no ensino das normalistas que estudaram nas instituições escolares pesquisadas. O referencial teórico estudado pautava-se, basicamente, na Epistemologia Genética (Escola Nova) e na Psicologia Experimental (Pedagogia Tecnicista), duas correntes em voga no período.

O campo prático da Psicologia Educacional foi o mais explorado. Isso se deve, além de a pesquisa estar situada na área da Educação, ao fato de que a educação passa a ser vista como a redentora da humanidade, uma via para a solução dos problemas da sociedade. Entendia-se que era necessário um país de letrados para que o desenvolvimento socioeconômico fosse alcançado (Facci, 1998).

Os conteúdos, sistematizados pelos autores da bibliografia pesquisada, estavam pautados no desenvolvimento do ser humano, em especial, a fase da infância e da adolescência. Notadamente a infância, fase essa que mereceu destaque no século XX.

As fontes documentais pesquisadas nos arquivos do Instituto de Educação Estadual de Maringá e no Colégio Santa Cruz nos apontaram uma disciplina pautada em estudos acerca do indivíduo, na experimentação, análise e observação laboratorial.

As fontes bibliográficas (livros e manuais didáticos) encontradas nas bibliotecas do IEEM, do Colégio Santo Inácio, e as referências verificadas na pasta número três do Colégio Santa Cruz vem confirmar o acima citado.

Segundo Gebrim (2001, p. 145), as Escolas Normais2

[...] existiam desde a primeira metade do século XIX, iriam incorporar paulatinamente o conhecimento psicológico na educação, por meio do ensino da Psicologia, da produção de pesquisas e estudos em laboratórios e nas práticas desenvolvidas em sala de aula.

No período em foco, observamos que os livros estudados valorizavam, em maior escala, preceitos sobre como estudar os problemas do desenvolvimento infantil, os problemas da adolescência e os problemas com a aprendizagem, entre outros. Era para isso que a Psicologia, como ciência, estava voltada: para encontrar as diferenças humanas e classificar os indivíduos de acordo com as mesmas, selecionando os mais aptos dos menos aptos.

Embora o período analisado compreenda décadas marcadas pela repressão, característica da Ditadura Militar, não era esse o papel a ser desempenhado pela Psicologia. Essa ciência, de raízes filosóficas, ao seguir os padrões do sistema capitalista, acabou se resumindo a adaptar o ser humano às diversas contingências do meio, tendo como valioso instrumento para essa função os Testes Psicológicos.

Verificamos, ainda, que o engajamento das alunas das Escolas Normais Secundárias com a sociedade era expressivo. No IEEM, as normalistas participavam de projetos que abrangiam o contato com a sociedade, como a Campanha Social de Luta Contra a Varíola, no ano de 1964; o Curso de Reciclagem com o tema "Água na Favela", em 1961, e a Campanha de Higienização, também em 1961. Além da participação em desfiles cívicos, nas comemorações referentes a Tiradentes, ao Aniversário da cidade, ao Dia do Soldado, a 7 de Setembro e XV de Novembro.

No Colégio Santa Cruz, pudemos perceber que havia também essa preocupação, contudo, não tão declarada e observada como no Instituto. O que observamos, a partir de nossa pesquisa, foi uma Psicologia vinculada ao movimento da Escola Nova, mas já com sinais que evidenciavam que a Pedagogia Tecnicista entrava em cena.

Apoiando-nos em Duarte (1996), compreendemos que, na época estudada por nós, décadas de 1950 a 1970, a visão de homem e de sociedade passada para as alunas era uma visão reprodutivista. Mas por quê?

Isso ocorreu devido ao fato de esse período estar fortemente marcado pelo regime ditatorial, no qual estavam restritas as liberdades de pensamento e expressão, bem como a tradução, publicação e circulação de obras que explicitassem um pensamento crítico. Situação essa que seria alterada com o fim do regime militar, durante a década de 1980, marcada pela produção e circulação de livros que contestaram a visão reprodutivista do ensino e pela tradução e publicação de obras que colocaram em cena o conteúdo de uma psicologia de caráter histórico e social.

Somente a partir do final da década de 1970, impulsionado pelo debate nos cursos de pós-graduação em educação recém-criados, que um grupo de educadores passou a questionar a forma de conceber o homem e a sociedade, assim como o papel da educação. Nessa perspectiva de análise, o livro Escola e Democracia (Saviani, 2008), constitui um marco. Publicado em primeira edição no ano de 1983, num período de grande efervescência mediante as denúncias acerca dos problemas educacionais pós- ditadura militar, o livro inaugura uma nova perspectiva de análise das questões pedagógicas, denominada Pedagogia histórico-crítica.

No âmbito da Psicologia, essa reflexão de caráter histórico-crítico inicia-se no final da década de 1980, tendo como um dos balizadores o livro Psicologia e Ideologia (Patto, 1987) e as traduções para a língua portuguesa de autores como Vigostski (1896-1934), Alexander Romanovich Lúria (1902-1977) e Konstantin Nikolayevich Leontiev (1831-1891).3

Ao finalizarmos, é preciso ressaltar que os cursos de formação de professores das escolas normais secundárias "foram centros difusores de cultura, entusiasmo e interesse pela Psicologia. Da Psicologia relacionada com a Pedagogia. Da Psicologia aplicada aos problemas de ensino e aprendizagem" (Alves, 1997, p. 15).

Nesse sentido, enfatizamos a importância da realização de pesquisas históricas que trazem os indícios e os vestígios fundamentais para compreensão dos conteúdos psicológicos que formaram gerações de normalistas. Tais estudos podem contribuir tanto para a história dessa instituição formadora que é a Escola Normal quanto para a história da psicologia enquanto disciplina escolar e campo de investigação e atuação.

 

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1 O presente artigo faz parte da dissertação de mestrado intitulada A disciplina de Psicologia da Educação na Escola Normal Secundária de Maringá no período de 1950 a 1970, defendida na Universidade Estadual de Maringá, no ano de 2008 sob orientação das professoras doutoras Analete Regina Schelbauer e Sheila Maria Rosin. Foi apresentado no V Congresso Brasileiro de História da Educação, em Aracajú-SE, no mês de novembro de 2008.
2 De acordo com Antunes (1998), as Escolas Normais representaram um campo para a propagação do desenvolvimento da Psicologia, notadamente após a inclusão da mesma, por Benjamin Constant, na disciplina de Pedagogia, no curso normal, no ano de 1890.
3 A tradução e publicação dos livros: A formação social da mente (Vigotsky, 1987), Pensamento e linguagem (Vigotsky, 1988) e Linguagem, desenvolvimento e aprendizagem (Vygotsky, Leontiev e Luria, 1988), constituem um marco para a propagação de uma psicologia de caráter histórico-cultural no Brasil.

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