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Psicologia da Educação

versão impressa ISSN 1414-6975versão On-line ISSN 2175-3520

Psicol. educ.  no.42 São Paulo jun. 2016

http://dx.doi.org/10.5935/2175-3520.20150027 

COMPARTILHANDO

 

Psicologia como profissão de saúde: relato de um processo de (re)formulação curricular

 

Psychology as a health profession: report of a process of curriculum (re) formulation

 

Psicología como profesión de la salud: informe de un proceso de (re)formulación de planes de estudios

 

 

Mônica Ramos DaltroI; Milena Pereira PondéII

IProfessora do Programa de Pós-Graduação, Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública. monicadaltro@bahiana.edu.br
IIProfessora da Graduação e Pós-Graduação, Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública

 

 


RESUMO

Este artigo descreve o processo dialógico de constituição de uma reformulação curricular do Curso de Psicologia da Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública. A fundamentação teórica concebe o currículo como campo político de produção de subjetividades, a Psicologia como uma profissão de saúde e o conceito de competência definido pela cubana González Maura (2000) que envolve a dimensão específica do fazer em Psicologia e a dimensão pessoal, atitudinal e motivacional. Trata-se de um relato de experiência que apresenta uma interpretação das DCN, destacando a subjetividade como central na formação em Psicologia, especialmente para o desenvolvimento da autonomia, capacidade de crítica e compromisso com valores sociais. O resultado do processo foi um modelo de currículo organizado em Módulos, a partir de Eixos Temáticos, com o uso de Metodologias Ativas e Práticas Interdisciplinares estruturados como sistemas abertos, de forma a contemplar diferenças e diversidades em permanente movimento de construção e desconstrução. Esses elementos estão sustentados por uma cultura de trabalho docente coletiva, pelo protagonismo discente e docente, pela comunicação com o mercado de trabalho e pela experiência do conjunto de subjetividades individuais que permitiram a emergência de um discurso formativo carregado de poder transformador que coloca a formação acadêmica em Psicologia articulada ao desenvolvimento de sujeitos, ultrapassando a perspectiva de construção de uma identidade ocupacional tecnicista.

Palavras-chave: formação em Psicologia; currículo por competência; profissão de saúde.


ABSTRACT

This article describes the dialogic process of constitution of a new manner for the curriculum made on the Psychology Major from Escola Baiana de Medicina e Saúde Pública. In theory the curriculum is treated as a political field to product subjectivities, the Psychology as a Health profession and the concept of competence defined by González Maura (Cuban, 2000), involving the specific dimension to do Psychology, united to the personal, attitudinal and motivational dimensions. That idea is based on an experience passage that presents an interpretation of the DCN's, which highlights subjectivity as central on Psychology formation, especially for the progress of: autonomy, critical capacity and commitment with social values. The result of the process was a Showpiece curriculum, divided in modules, starting from the Thematic Axis, using the interdisciplinary practices and active methodologies, structured as opened systems to contemplate differences and diversity in constant movement between construction and deconstruction. These elements are based on a docent collective working culture, by teachers and students, as important part of the story, by the link between the job market and the set of individual subjectivities. Those changes connect the academic formation in Psychology with the development of people, overtaking the perspective of construction of a Technicistic occupational identity.

Keywords: Psychology; curriculum; health care profession


RESUMEN

En este artículo se describe el proceso dialógico de formación de una reformulación del Curso de Psicología en la Escuela Bahiana de Medicina y Salud Pública. La fundamentación teórica concibe el currículo como un campo de subjetividades, y producción política, la Psicología como una profesión de la salud y el concepto de competencia definido por la cubana González Maura (2000), que involucra la dimensión específica del hacer en Psicología y la dimensión personal, actitudinal y motivacional. Presenta un relato de experiencia que trae una interpretación de las DCN que destaca la subjetividad como central en la formación en Psicología, sobre todo para el desarrollo de la autonomía, de la capacidad crítica y compromiso con los valores sociales. El resultado del proceso fue un modelo de plan de estudios organizado en Módulos, a partir de los ejes temáticos, con el uso de metodologías activas y prácticas interdisciplinares estructuradas como sistemas abiertos, para abarcar las diferencias, la diversidad en el movimiento permanente de construcción y deconstrucción. Estos elementos están apoyados en una cultura de trabajo docente colectivo, que tiene como protagonista el discente y el docente, la comunicación con el mercado laboral y la colección de experiencias subjetivas individuales que permitieron el surgimiento de un discurso formativo cargado de poder de transformación que pone la formación académica en Psicología articulada con en el desarrollo de los sujetos, superando la perspectiva de construcción de una identidad ocupacional técnica.

Palabras clave: psicología; plan de estudios; profesión de la salud.


 

 

O curso de Psicologia, aqui apresentado como contexto para a discussão sobre a inclusão da dimensão subjetiva da graduação, está vinculado a uma tradicional Fundação sem fins lucrativos que há mais de 60 anos forma profissionais de saúde na Bahia, Região Nordeste do Brasil. Oferece 100 vagas anuais, é diurno, organizado em 10 semestres letivos, em regime seriado. Seu objetivo é a preparação de profissionais de formação generalista, aptos a atuarem em contextos distintos de prática, com elevado nível técnico, integrados de forma crítica, à sociedade, à realidade e ao mercado de trabalho.

Este relato descreve o processo de construção desse novo PPPC, fundamentado nos teóricos pós-estruturalistas e no método de problematização que embasa a educação transformadora proposta por Paulo Freire. Apresenta uma estrutura curricular que concebe a Psicologia como uma profissão de saúde e trabalha como conceito de competência, definido pela cubana González Maura (2000), que envolve competências específicas ao fazer em Psicologia, mas também, de natureza pessoal, atitudinal, motivacional, sustentada em uma formação conceitual sólida e promove o desenvolvimento da autonomia, da capacidade de crítica e compromisso com valores sociais.

Trata-se de um relato de experiência composto pela descrição do processo e pela análise de documentos produzidos de 2009 a 2010, no âmbito da reformulação curricular. Entre os documentos está um conjunto de 12 questionários, contendo oito questões abertas, aplicadas à época, numa população de sujeitos que participaram do Encontro de Parceiros convidados a colaborar com a avaliação da proposta curricular. Com o conjunto dos dados foi possível apresentar um modelo capaz de promover a formação do psicólogo como profissional de saúde, a partir do conceito ampliado de saúde.

 

PROJETO POLÍTICO-PEDAGÓGICO

O processo de construção do novo Projeto Político-Pedagógico (PPPC) do curso de Psicologia da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública (EBMSP), teve início em 2009, com a proposta de atualização da estrutura curricular. Em 2010, o PPPC foi concluído e o currículo, em sua natureza política e produtora de subjetividades (Silva, 2014) segue, na atualidade, seu fluxo no cotidiano acadêmico, transformando e sendo transformado, a cada encontro, a cada novo momento institucional e histórico.

O currículo está teoricamente fundamentado como campo de produção cultural, espaço de coexistência viva, espaço-tempo de fronteira, que implica relações de poder e produção de singularidades, como um território de mutações (Silva, 2014). A descrição da construção do currículo em questão se apresenta em etapas, que não estiveram organizadas temporalmente de forma sucessiva, mas que revelam o trabalho de tessitura realizado incluindo movimentos simultâneos, contraditórios, complementares e de transversalidades.

 

CONSTRUÇÃO DE UMA CULTURA DO TRABALHO DOCENTE COLETIVO

O processo de trabalho com os docentes teve início com a apresentação das DCNs e um convite para discutir a Psicologia que estava sendo ensinada. Imediatamente, o conteúdo programático e suas respectivas cargas horárias emergiram como centrais para a discussão. Entretanto, não se tratava de um convite a selecionar conteúdos teóricos melhores ou mais necessários ao desempenho da profissão, mas, sim, uma convocação para que os docentes se implicassem como sujeitos. Daí três questões passaram a guiar o processo: Como você gostaria de ter estudado Psicologia? Quem são seus alunos na atualidade e como eles aprendem? Que psicólogos queremos formar para dar conta das novas demandas da sociedade?

Motivados pelo desafio de construir um novo projeto político-pedagógico que possibilitasse formar os melhores psicólogos da cidade, os professores responderam as questões a que foram desafiados, apresentando suas histórias, seus desejos, seus territórios e pertencimentos. No início do processo, eles sustentaram reuniões quinzenais em encontros de duas a quatro horas de duração em pequenos grupos temáticos (por semestre, estágio, básicas, pesquisa, psicoterápicas) ou todos juntos.

Sequencialmente, foram identificadas lideranças docentes, representantes desses grupos temáticos que constituíram o Núcleo Docente Estruturante (NDE). O NDE, que consiste em um grupo de docentes, com atribuições acadêmicas de acompanhamento, atuante no processo de concepção, consolidação e contínua atualização do projeto pedagógico do curso. Assumiu o processo de gestão acadêmica, em parceria com a coordenação, em encontros semanais, de duas horas de duração, nos quais sistematizavam as propostas de mudanças decorrentes das reuniões docentes e simultaneamente discutiam as demandas acadêmicas cotidianas.

Durante um ano, aproximadamente, pôde-se observar, em ato, a realização dos quatro pilares para a educação propostos pela Unesco (1998), na medida em que os personagens envolvidos puderam apreender, conhecer, fazer e se tornarem responsáveis pela construção de uma nova realidade educacional. Para isso, precisaram conviver com as tensões da diversidade, tiveram que negociar, ceder e construir. O resultado desse processo foi o desenvolvimento de uma cultura de trabalho em grupo, rara nas estruturas educacionais de ensino superior. Nasceu uma equipe, capaz de atuar respeitando as diferenças culturais, políticas e ideológicas, e apta ao deslocamento, mas não sem sofrimento ou esforço, mas com consciência da importância do movimento e da flexibilidade, em um trabalho de dimensão tão simbólica como a educação. Constituiu-se, assim, um grupo construtor de uma prática pedagógica interdisciplinar pautada nos princípios do debate, da ética e da coexistência plural (Daltro, Vilas Boas& Danon, 2013).

Durante o processo, as questões centrais em pauta, na Psicologia, emergiram, marcando seus tradicionais territórios de poder: a reforma manicomial, a clínica na formação, conhecimentos básicos em oposição a novas práticas, avaliação psicológica, responsabilidade do psicólogo com os direitos humanos, formação ética, limites e possibilidades do grupo, o lugar da coordenação, cientificismo versus antropologia, ciências naturais e ciências humanas, neurociências e Psicologia social, concepções de saúde, de interioridade e de subjetividade. Violência, desigualdade social, transexualidade e outros embates teóricos e políticos que a contemporaneidade engendra se fizeram presentes também.

Mais do que a dimensão de conteúdos teóricos ou da técnica, as discussões foram revelando a dimensão política da experiência curricular, que envolvia a circulação de distintas formas e discursos sobre o poder, ora presente no tensionamento entre gestão acadêmica e gestão institucional, entre a gestão acadêmica e o corpo docente, entre o corpo docente e o corpo discente. Além disso, as abordagens teóricas da Psicologia emergiram de forma evidente no campo das disputas, seja por espaços, mercados e carga horária. Ficou evidente, também, a força dos discursos das especialidades tentando sobrepor-se aos generalistas.

A perspectiva epistemológica adotada circunscrevia o processo de formação como um campo no qual subjetividades, identidades, interioridades são produzidas e transformadas a partir das relações, concepções de ciência e opções metodológicas. Um campo mestiço como afirma Ferreira (2006). Neste contexto, foi possível observar as afinidades entre a Psicologia e a Saúde, conforme proposto pela Organização Internacional do Trabalho (OIT). É evidente que a concepção de Saúde que circulou nesse processo não esteve referida à ausência de doença, nem ao hegemônico modelo biomédico, que se sustenta um cientificismo dedicado à busca de verdades. Isso porque, no conjunto das discussões, não era possível considerar a Psicologia a partir de uma identidade fixa. O conceito ampliado de Saúde emergiu, exatamente, como uma possibilidade de garantir a formação generalista proposta pelas DCNs e oferecer uma formação que possibilitasse a expansão da Psicologia no sentido de responder às demandas da sociedade contemporânea, oferecendo assistência, prevenindo agravos, mas, também, investindo no desenvolvimento e empoderamento de sujeitos e comunidades (Contini, 2010).

Identificadas as opções epistemológicas e políticas, optou-se por organizar os componentes curriculares norteados por seis eixos temáticos, distribuídos ao longo dos semestres e estruturados de forma a abranger as diferentes teorias, áreas de conhecimento, métodos de investigação, intervenção e pesquisa em Psicologia e, acima de tudo, diversas formas de ver o ser humano. Desse modo, buscou-se garantir a concepção identitária mestiça, própria do modo de a Psicologia existir.

Nesse processo, a seleção de conteúdo e a distribuição de carga horária - em que os espaços de poder estão histórica e tradicionalmente constituídos - foram deslocadas para o pano de fundo, trazendo para a tribuna, para a discussão central, o compromisso do grupo em formar psicólogos a partir de valores éticos, tornando-os cidadãos preparados para atuar como agentes transformadores na construção de uma sociedade mais democrática e menos desigual, trabalhando com seres humanos nas dimensões psicossocial, psicodinâmica, institucional e comunitária. O resultado desse processo demandou que conteúdos e nomenclaturas fossem negociados, disciplinas fossem suprimidas e estruturas metodológicas fossem constituídas, para garantir a circulação de novos saberes e diferenças, conforme descrito a seguir, que apresenta a ementa dos eixos temáticos eleitos para sustentar a circulação da formação teórica proposta:

Ser humano e ciclo de vida (Estudo do ser humano nas diversas fases de sua existência, incluindo a multideterminação do processo saúde-doença,as teorias do desenvolvimento, a dimensão psicopatológica articulada ao contexto político e sociais); Fundamentos de Psicologia (Estudo das bases epistemológicas da Psicologia a partir de fundamentos históricos, filosóficos, socioantropológicos e dos marcos teóricos da Psicanálise); Psicologia, sociedade e cultura (Estudo do corpo teórico que embasa o campo da Psicologia como ciência e profissão, considerando a relação dialógica entre o ser humano, a cultura e o fenômeno psicológico); Intervenções em Psicologia (Estudo de diferentes técnicas e instrumento de atuação do psicólogo); Pesquisa em Psicologia (Estudo de métodos e técnicas de produção e circulação do conhecimento científico); Práticas pré-profissionalizantes (Aprendizagem em serviços como experiência de integração entre teoria e prática).

Os eixos temáticos cumprem a função de sustentar a organização dos componentes curriculares. O compromisso de cooperação firmado entre os docentes apontava para uma gestão longitudinal do processo de ensino e aprendizagem, pensado ao longo dos cinco anos de graduação, alimentado pela estrutura seriada por semestres, espaço no qual são estabelecidos os diálogos temáticos e teóricos entre si, proporcionando uma visão interativa dos componentes curriculares a cada semestre do curso.

Essa estrutura curricular integrada tem nos eixos temáticos, seus pontos de referência para o desenvolvimento de competências gerais em Psicologia. Em uma orientação didática, cinco competências, articuladas em um circuito dialógico, foram identificadas de maneira a nortear o ensino sobre o fazer em Psicologia em qualquer contexto de prática em que o psicólogo(a) esteja inserido e, a partir de qualquer abordagem teórica, conforme apresentado na Figura 1.

 

 

Essa formulação dirige o processo de aprendizagem em uma lógica que entrelaça competências atitudinais, técnicas e conceituais, perspectiva que desafia o processo formativo ao combinar experiência, ambiente e capacidades individuais à teoria (Lima, 2005). Considera-se, a partir daí, que a construção do saber-fazer, no âmbito da Psicologia, deve estar ancorada no princípio da dialética e na integração teoria-prática, vinculada ao caráter prático-social na dimensão da integralidade, na qual diferentes saberes são reconhecidos e valorizados e a avaliação, pensada como estratégia de desenvolvimento e transformação. Integralidade - é o reconhecimento, na prática dos serviços, de que: cada pessoa é um todo indivisível e integrante de uma comunidade; que as ações de promoção, proteção e recuperação da saúde formam também um todo indivisível e não podem ser compartimentalizadas; que as unidades prestadoras de serviço, com seus diversos graus de complexidade, formam também um todo indivisível configurando um sistema capaz de prestar assistência integral. Enfim: o homem é um ser integral, biopsicossocial e deverá ser atendido com essa visão integral por um sistema de saúde, também integral, voltado a promover, proteger e recuperar sua saúde (Brasil, 2006).

Partindo desse ponto de vista, a Figura 2 apresenta um circuito que norteia o processo de ensino e aprendizagem sustentando uma prática profissional com referências éticas e comprometidas com a produção de subjetividades.

Escuta e compartilhamento de saberes com a comunidade

No processo, emergiu de forma orgânica, a necessidade de consultar a comunidade sobre a proposta desenhada, de forma que ela pudesse aprimorá-la a partir da percepção sobre o psicólogo que esperavam receber. Uma formação ampla não pode estar aprisionada às demandas do mercado de trabalho (Chauí, 1999), mas, também, elas não podem ser negligenciadas, especialmente no âmbito da Psicologia, uma profissão cujos objetos de intervenção estão em permanente movimento de produção, transformando e sendo transformada.

O reconhecimento dessa especificidade da Psicologia motivou a realização da consulta aos parceiros do mercado de trabalho. Em março de 2010, promoveu-se o II Encontro de Parceiros do Curso de Psicologia, com o objetivo de discutir a proposta curricular elaborada. Para participar do evento, foram convidados todos os parceiros responsáveis por receber, de 2000 a 2010, estagiários e egressos do curso. Essa ação reconhece o mercado como protagonista do processo de formação e o convoca como parceiro a estabelecer com a instituição de ensino um debate acadêmico que possibilite colocar em movimento uma cultura de ensino-aprendizagem dialógica, focada na construção de sentido para a aprendizagem (Daltro et al., 2013).

Foram analisados 12 questionários respondidos por parceiros presentes no Encontro de Parceiros, que aceitaram responder ao questionário. O grupo de respondentes estava composto por dois médicos e 10 psicólogos. A maior frequência de participantes era de profissionais da área de Psicologia organizacional 58% (7); 25% (3) da Saúde Pública; 16% (2) da área clínica; 8% (1) da docência; 8% (1) da Psicologia social. Questionados sobre a avaliação de sua formação acadêmica, a falta de experiência prática durante a graduação foi considerada unânime entre os respondentes como elemento vulnerável. Em relação ao que esperavam de um estagiário ou de um psicólogo no campo de trabalho, três categorias de respostas emergiram: Competências Atitudinais (60,35% das respostas); Valores (25,86%); Conhecimento Técnico (13,79%). Esses dados destacam a necessidade de investimento numa formação que integre o desenvolvimento de competências que articulem valores, atitudes, técnica e fundamentação teórica, concordando com as proposições formativas defendidas por Bernardes (2012) e Senne (2012).

Depois de sistematizados, os dados foram apresentados ao coletivo de docentes para discussão, dando suporte à definição dos objetivos educacionais que passará a incluir conteúdos atitudinais como manejo de relações interpessoais, capacidade de comunicação clara, trabalho em grupo, pró-atividade, liderança e educação continuada sustentada no aprender-a-aprender. Surgiu, assim, a discussão sobre a necessidade de colocar o estudante numa posição ativa, diante da construção do conhecimento, partindo do princípio referido por Paulo Freire (2011) de que o conhecimento só se realiza quando ocorre a apropriação do aprendido; transformado e reinventado, o conhecimento se realiza concomitante a uma ação transformadora sobre a realidade, ampliando a relação dialógica de cada sujeito com o mundo e consigo mesmo.

Encontros e desencontros no campo da aprendizagem

Nessa etapa, uma parte importante do PPC já estava desenhada, escolhas epistemológicas realizadas, campo teórico proposto, habilidades específicas identificadas. Cabia, agora, conhecer para quem a formação estaria sendo oferecida e como seria oferecida. Essa discussão foi iniciada a partir do questionamento aos professores sobre suas experiências como estudantes, sobre como aprenderam ser psicólogos. Ficou evidente a força de uma aprendizagem baseada em aulas teóricas, expositivas e na exaustiva leitura de textos longos, em especial clássicos. Os relatos referentes a essa experiência estavam acompanhados de uma insatisfação diante da pouca experiência prática vivida ao longo do curso e à consequente angústia diante do primeiro encontro com o paciente ou qualquer outro sujeito da ação profissional. Alegavam não terem tido a oportunidade de observar um psicólogo em ação, exceção feita àqueles que estavam vivenciando uma psicoterapia pessoal.

Questionados em seguida sobre a experiência de ensinar e as percepções sobre como seus alunos aprendem, os professores, de forma geral, desenharam um rol de queixas referindo a postura imatura dos discentes, refletida na falta de compromisso como seu próprio processo de aprendizagem, com a leitura, o horário, as avaliações, os colegas, com a construção propriamente dita do conhecimento; o uso múltiplo e inadequado dos smartphones em sala de aula; a dificuldade de permanência contínua em sala, assim como de compreender o sentido dos textos.

Quando essas percepções foram confrontadas, ficou evidente o desencontro existente entre a forma de ensinar, baseada em modelos tradicionais - vivenciados pelos professores como estudantes - e o novo perfil de estudantes da contemporaneidade.

O processo educacional do ensino superior brasileiro está organizado como educação de adultos e se fundamenta, essencialmente, na concepção acumulativa de conhecimentos, frequentemente apresentados de maneira tradicional, ou seja, de forma fragmentada, disciplinar, embasada no saber de expertises (Vilela, 2012).

De acordo com os documentos analisados, constatou-se que a população ingressante no curso de Psicologia era composta por dois grupos claramente definidos. A maioria era de jovens, de 17 a 21 anos, oriundos de escolas privadas, apresentando posturas e modos de operar a vida tipicamente adolescentes, buscando a realização imediata de seus desejos, relações descartáveis, imagens e textos curtos, de forma a consumirem um grande número de informações e com a maior rapidez possível, revelando pouca intimidade com a dimensão mais aprofundada do estudo. Do outro lado, um grupo menor, composto por adultos, que optaram pela Psicologia como uma segunda profissão, focados em metas, indisponíveis para a vida acadêmica ampla, por serem frequentemente trabalhadores, declarando a indisponibilidade para perder tempo com outros assuntos além da aula.

Emergiu, então, a discussão sobre o uso de diferentes metodologias de ensino como estratégia de capturar o desejo de aprender desse novo aluno, a partir do sentido da aprendizagem. Assentiu-se, assim, à proposta institucional de aderir ao uso de metodologias ativas de aprendizagem, focando a visão crítico-emancipatória, voltada para o desenvolvimento da autonomia intelectual, da solidariedade, da ética, a ser implantada do primeiro ao último semestre e trabalhada de forma coletiva (Daltro et al., 2013).

As discussões sobre as metodologias de ensino na graduação não são de praxe, no Brasil. O costume vigente é que professor eleja a metodologia de ensino, baseado em seus interesses ou habilidades pessoais e as aplique de acordo com sua disponibilidade pessoal, o que revela a fragilidade dos projetos pedagógicos, frequentemente apresentados como documentos desconhecidos pela comunidade acadêmica. Na proposta curricular instituída, o desafio colocado na mudança de cultura e de atitude diante da forma de ensinar exigiu a definição de uma estrutura metodológica transversal que engatasse todo o processo de formação. Constituiu-se um discurso ao qual a escolha metodológica precisava estar afiliada aos objetivos educacionais de forma integrada em longo e curto prazo.

Para sustentar essa perspectiva, uma abordagem metodológica foi definida e organizada, de forma didática, em três módulos complementares, com objetivos educacionais definidos e metodologias distintas, definidos por semestre: Módulo I, do 1º ao 6º semestre, Módulo II, do 7º ao 8º, e Módulo III, do 9º ao 10º semestre.

O Módulo I, organizado de forma a apresentar a Psicologia, seus objetos de estudo e intervenção, sua fundamentação teórica, técnicas e instrumentos de intervenção. Suas práticas didáticas envolvem ações e avaliações interdisciplinares, com vistas a contemplar, de forma respeitosa e não competitiva, a diversidade da Psicologia.

No percurso desse módulo, os eixos curriculares se integram. Destaca-se, aqui, a especificidade de dois que assumem certa centralidade em função de sua organização metodológica específica. Eixo do Desenvolvimento do Ciclo da Vida (DCV) organizado pelo uso do método da Aprendizagem Baseada em Problemas, conhecida como por sua denominação original em inglês Problem Basic Learning (PBL) e o eixo das Práticas Pré-profissionalizantes, que, inclui os estágios básicos, aqui denominados Técnicas e Práticas de Investigação em Psicologia (TEPIN).

No âmbito do (PBL), os docentes sofrem um deslocamento de sua conhecida e confortável posição de expertise para dar lugar à escuta, ao silêncio ativo e a mediar a circulação e produção do conhecimento e das subjetividades que ali são colocadas (Queiroz, 2013). E para garantir uma execução eficiente e eficaz desse trabalho, os docentes mantêm reuniões semanais e permanentes por eixo e por semestre, construindo problemas, interseções, destacando contradições, circulando e produzindo conhecimento coletivamente, estudando juntos, numa genuína experiência de educação continuada.

No âmbito das TEPINs, o compromisso pedagógico é colocar em ato a experiência teórico-prática interdisciplinar a cada semestre, focalizando o desenvolvimento de competências conceituais, técnicas e atitudinais, a partir da exposição a distintos campos de prática, em sua maioria integrados ao ambulatório docente-assistencial da própria IES. A experiência de aprendizagem parte da sala de aula e gradualmente garante o desenvolvendo de atividades com níveis de complexidade crescentes com sólida articulação teórica e sempre associada aos demais componentes curriculares do semestre. Esse processo envolve a apropriação gradativa dos novos códigos e formas de vinculação ao espaço, ao conhecimento. Para Coulon (2008), anterior à constituição identitária profissional, o sujeito precisa apropriar-se do ofício de ser estudante, e essa passou a ser uma das tarefas dos professores vinculados a esse módulo, a de dar suporte aos estudantes para circular como sujeito/estudante em espaço/tempo de transformação, favorecendo sua afiliação à instituição, ao discurso universitário, à Psicologia, de forma gradual.

O Módulo II acontece nos 7º e 8º semestres, e nele o estudante é inserido em práticas vinculadas ao Sistema Único de Saúde (SUS). Tem como objetivo apresentar aos estudantes distintas possibilidade do fazer-em-Psicologia. Nessa etapa, ele é convocado a assumir uma posição subjetiva mais adulta, no sentido autoral do termo. Terá que construir, ao longo dos dois semestres, um Trabalho de Conclusão de Curso individualmente, sob a supervisão de um orientador. Simultaneamente, será inserido no Internato, uma experiência de prática-assistida, em que, obrigatoriamente, passará por quatro contextos de prática, sendo assistido diretamente pelo professor, conforme relatado em Daltro, Cajado, Oliveira, Silva e Matos (2013). As atividades de campo acontecem em contextos externos de atenção à saúde primária, secundária e terciária, além do rodízio em uma organização onde atuará no setor de recursos humanos, preferencialmente, em um dos mesmos campos em que a prática da saúde se realiza, possibilitando uma compreensão mais ampla da complexidade do trabalho em uma instituição. As atividades educacionais são organizadas em quatro rodízios de 120 horas cada um, com 15 alunos por professor, em espaços extramuros. A natureza dessa modalidade está relacionada ao aprender-a-refletir-fazendo, agora trabalhando com casos reais integrados ao SUS, em consonância com as DCNs. Nesse contexto, o professor e o estudante são parceiros na construção da aprendizagem. Ao professor cabe o desafio de, além de mediar a aprendizagem, sem que tenha todo o controle do processo, necessite também administrar a relação com a equipe multiprofissional e as condutas de gestão do campo, assim como as distintas formas e expressões de poder que circulam nesses espaços docentes-assistenciais.

No Módulo III, acontecem os estágios específicos que ocorrem no 9º e 10º semestres e estão regulamentados pelas leis de estágio do Ministério do Trabalho. São desenvolvidos em diferentes contextos e a partir da escolha por afinidade do estudante. No estágio, o estudante experimenta a práxis no mundo laboral, participando e intervindo de forma a integrar as habilidades e competências desenvolvidas ao longo do curso, acompanhado por um supervisor especialista com carga horária mínima na instituição, de 20 horas semanais. O que singulariza essa etapa é a autonomia demandada ao estudante, que não será necessariamente assistido permanentemente pelo docente, que tem como tarefa a escuta sobre as experiências vividas no contexto de prática numa prática educativa de supervisão.

O sistema de avaliação, congruente com a fundamentação filosófica e epistemológica, privilegia uma prática avaliativa reflexiva e investigativa, contemplando compreensão, entendimento, consciência crítica, exercícios de mediação, avaliações intermediárias e variados instrumentos de avaliação como critérios norteadores do processo. São trabalhados os domínios cognitivo, procedimental e atitudinal que se configuram nas dimensões do saber, saber fazer e saber ser.

À proporção que o currículo foi sendo implantado e alimentado pelas discussões contínuas sobre as produções subjetivas decorrentes da exposição ao currículo, foram identificadas categorias de sentido relacionadas à vivência dos estudantes, que se constituíram como referências para pensar a práxis pedagógica a cada semestre:1º semestre: tempo de afiliação à instituição e aos discursos da ciência e da academia; 2º semestre: tempo de reconhecer e identificar a Psicologia e suas fundamentações teóricas; 3º semestre: tempo da desilusão, separações e escolhas; 4º semestre: tempo de identificar-se à escolha feita; 5º semestre: tempo de ver o outro; 6º semestre: tempo de desejar e duvidar; 7º semestre: tempo de experimentar; 8º semestre: tempo de decidir; 9º semestre: tempo de praticar; 10º semestre: tempo de planejar e ter angústia.

O conjunto da experiência de construção dessa proposta curricular está representado na Figura 2, a qual configura um conjunto de elementos que constituem o currículo de psicologia da Escola Bahiana de Medicina e Saúde Pública, envolvendo a dimensão subjetiva tecida no trabalho coletivo, os módulos construídos, assinalando as metodologias de ensino e os conteúdos transversais a todos os semestres. No fim da graduação, espera-se que cada estudante tenha apreendido sobre a sua forma singular de fazer-se psicólogo (a).

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O modelo curricular apresentado opta por considerar a concepção de saúde ampliada e seus princípios como referência do trabalho formativo, dirigindo a preparação de profissionais para atuar na assistência, na prevenção, na gestão, na promoção do empoderamento e da qualidade de vida de sujeitos, organizações e comunidades, com compromisso social. Essa estrutura complexa que se organiza mediante sistemas abertos, de forma a contemplar as diferenças, diversidades, em permanente movimento de construção e desconstrução referidos a partir de: temas transversais, em lugar de fixos conteúdos programáticos; componentes curriculares, em lugar de disciplinas; práticas interdisciplinares, problematização, uso de metodologias ativas, em lugar de verdades estabelecidas. Configura-se de forma geral, como um campo, um território dialógico no qual emergem contradições, tensionamento, deslocamentos, que permitem afirmar o currículo como um espaço vivo.

O artigo faz um recorte no processo vivido com um conjunto de sujeitos, em um determinado momento histórico e institucional que permitiu a constituição de uma cultura de trabalho docente coletivo, a emergência de estudantes ativos diante de seus processos de aprendizagem e de uma comunicação fluída com o mundo do trabalho, associadas ao conjunto de subjetividades individuais ali colocadas, sendo possível testemunhar a emergência de um discurso formativo carregado de poder transformador.

Estudantes, docentes, corpo técnico-pedagógico, gestora e pesquisadora foram desafiados a se deslocarem de seus confortáveis e históricos papéis, com vista a romper com a proposta pedagógica anterior, cuja natureza fragmentada não contemplava a possibilidade de colocar todos esses atores como parceiros na construção de um saber teórico-prático, construído em torno de uma visão interdisciplinar. Circunscreve assim a experiência educacional no campo simbólico, na produção de sentidos, da noção de ética, dirigida ao empoderamento desses sujeitos que ali circulam.

 

REFERÊNCIAS

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