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Psicologia da Educação

versão impressa ISSN 1414-6975versão On-line ISSN 2175-3520

Psicol. educ.  no.43 São Paulo dez. 2016

http://dx.doi.org/10.5935/2175-3520.20160003 

ARTIGOS

 

Relações interpessoais e recursos de adaptação para acadêmicos com deficiência na universidade

 

Interpesonal relations and adaptation resources for academics with deficiencies in the university

 

Relaciones interpersonales y adaptación de recursos para estudiantes con discapacidad en la universidad

 

 

Celso Francisco Tondin; Daiane Nadaletti Nardon; Tania Mara Zancanaro Pieczkowski

Universidade Comunitária da Região de Chapecó - UNOCHAPECÓ. tondin@unochapeco.edu.br

 

 


RESUMO

Esta pesquisa focaliza as relações interpessoais e os recursos de adaptação para acadêmicos com deficiência na universidade, tendo como objetivo entender tais relações e de que forma a instituição está investindo na inclusão destes estudantes. Como base teórica, dialoga com referenciais da educação inclusiva e com estudos sobre a subjetividade. Trata-se de pesquisa realizada a partir de estudo de caso de acadêmicos com deficiência, de uma universidade comunitária catarinense, tendo sido utilizados questionário, entrevista, observação e consulta a documentos. Os participantes foram cinco acadêmicos com deficiência, cinco de seus professores e 15 de seus colegas, além das coordenadoras acadêmica e pedagógica da instituição. A partir da análise de conteúdo, os dados foram discutidos por meio de três categorias: a) estrutura física; b) recursos metodológicos oferecidos aos acadêmicos com deficiência; e c) as relações interpessoais estabelecidas por eles e com eles. Constata-se que, no cenário da pesquisa, existem limitações na acessibilidade arquitetônica, atitudinal e comunicacional, apesar da mobilização institucional no sentido de superar tais lacunas. Identifica-se, também, a necessidade de intensificação de cursos de formação continuada para docentes, técnicos administrativos e estagiários.

Palavras-chave: inclusão, estudantes com deficiência, acessibilidade, educação superior, subjetividade.


ABSTRACT

This research focus on interpersonal relations and adaptation resources for academics with disabilities in the university, aiming to understand these relationships and the institution's investments to serve these students. As theoretical basis, it dialogues with references of inclusive education and studies on subjectivity. It is a qualitative research, based on case study methodology of academics with disabilities in a community university of Santa Catarina, Brazil, using questionnaire, interview, participant observation and consultation to documents. Participants were five students with disabilities, five of their teachers and 15 of their colleagues, in addition to academic and pedagogical coordinators of the institution. From the content analysis, data were discussed through three categories: a) physical structure offered to students with disabilities; b) methodological resources offered to them; and c) interpersonal relationships established by them and with them. It was observed that, in the research setting, there are limitations with regard to architectural accessibility, attitudes and communication, despite the institutional mobilization to overcome such gaps. The need of intensification of continuing education courses for teachers, administrative technicians and trainees was also identified.

Keywords: inclusion, students with disabilities, accessibility, higher education, subjectivity.


RESUMEN

Esta investigación focaliza las relaciones interpersonales y los recursos de adaptación para los académicos con discapacidad en la universidad. El objetivo es entender cómo estas relaciones son y cómo esta institución está dedicandose en incluirlos. El referencial teórico utilizado relaciona la educación inclusiva y los estudios sobre subjetividad. Es una investigación cualitativa, realizada a partir de la metodología de estudio de caso de los académicos con discapacidad de una universidad de la província de Santa Catarina, Brasil, se utilizarón cuestionarios, entrevistas, observación participante y consulta de documentos. Participaram cinco estudiantes con discapacidad, cinco de sus profesores, 15 de sus colegas, los coordinadores académico y pedagógico de la institución. A partir del análisis de contenido, los datos se analizaron a través de tres categorías: estructura física ofrecida a estos estudiantes, los recursos metodológicos que se les ofrecen y las relaciones interpersonales establecidas por ellos y con ellos. Parece que, en el local de la investigación, existen limitaciones en la accesibilidad arquitectónica, actitudinal y comunicacional, a pesar de la movilización institucional para superar estas deficiencias. También se identificó la necesidad de aumentar los cursos de formación continuada para los profesores, personal técnico administrativo y aprendices.

Palabras clave: inclusión, estudiantes con discapacidad, accesibilidad, educación superior, subjetividad.


 

 

As políticas e legislações relativas à educação inclusiva que, primeiramente, contemplaram a educação básica atualmente ganham crescente espaço na educação superior. São manifestações dessa realidade o aumento de matrículas desse público na universidade e o incremento pesquisas voltadas a esse cenário.

No Brasil, viveu-se, na última década, a expansão de vagas para a educação superior. As estatísticas oficiais mostram que contribuem para o aumento das matrículas neste nível de ensino também os estudantes com deficiência. Pessoas com deficiência, no Brasil, conforme o Censo Demográfico 2010, somam 45.606.048 milhões.

De acordo com o Censo da Educação Superior 2013 (Brasil/Inep, 2015), o número de estudantes com deficiência na educação superior vem aumentando. Em 2003, eram 5.078 matriculados, em 2011, eram 23.250 estudantes e, em 2013, 29.034 estudantes. Observa-se um crescimento significativo no número de matrículas, com aumento de 590,78% em dez anos.

Este estudo aborda as relações interpessoais e adaptações para acadêmicos com deficiência na universidade, tendo como objetivo entender como estas relações acontecem e de que forma esta instituição está investindo na inclusão destes estudantes. A opção pelo termo "pessoas com deficiência" atende à necessidade de se contemplar todos os participantes da pesquisa, superando-se a ideia de que tais pessoas portam uma deficiência, que sua condição é temporária e que suas necessidades educacionais são iguais.

No ambiente universitário, há produção de subjetividade que, no pensamento de Guattari e Rolnik (1999),é essencialmente fabricada. Para os autores, as máquinas de produção da subjetividade variam. Por exemplo, em sistemas tradicionais, a subjetividade é fabricada por máquinas mais territorializadas, mas no "sistema capitalístico", a produção é industrial, se dá em escala internacional e é rizomática.

Esses autores afirmam que tudo que é produzido pela subjetivação capitalística não é apenas uma questão de ideia ou de transmissão de significações através de enunciados significantes. Também não se reduz a modelos de identidade. Trata-se de sistemas de conexão direta entre as grandes máquinas produtivas, as grandes máquinas de controle social e as instâncias psíquicas que definem a maneira de perceber o mundo. Por isso, as forças sociais que administram o capitalismo hoje entenderam que a produção de subjetividade é mais importante que qualquer outro tipo de produção, mais essencial à manutenção da sociedade do que qualquer recurso tecnológico.

Guattari e Rolnik (1999) afirmam ainda que fazemos parte de uma cultura de massa que, de modo bastante dissimulado, produz subjetividade que não se situa no campo individual, mas no nível social e em todos os níveis de produção e consumo. Por isso, podemos falar de mutações da subjetividade, que

(...) não funcionam apenas no registro das ideologias, mas no próprio coração dos indivíduos, em sua maneira de perceber o mundo, de se articular como tecido urbano, com os processos maquínicos do trabalho, com a ordem social suporte dessas forças produtivas. (Guattari & Rolnik, 1999, p. 26)

Ou seja, os indivíduos são serializados, registrados e modelados a partir de padrões universais, produzindo inclusive as suas representações inconscientes de como trabalhar, como se relacionar, como estudar, como falar, como se alimentar etc.

Para González Rey (2004), a construção da subjetividade não está subordinada à razão humana, embora se expresse e seja influenciada por ela. A subjetividade não é

um sistema racional. (...) As posições racionais do ser humano são, na realidade, produções de sentido, na medida em que se organizam sobre a base dos interesses e necessidades relacionados aos contextos desde os quais atua, e a partir de suas histórias nesses contextos (...). A razão está subordinada a uma produção histórica de sentidos e não ao contrário. (p. 130)

Esse autor afirma ainda que a subjetividade social e a individual constituem um mesmo sistema complexo, sendo dois espaços diferentes que se interrelacionam permanentemente. A subjetividade individual permite a produção de posições específicas, singulares, diante dos espaços de subjetividade social.

Referindo-se à deficiência, Martínez (2005) afirma que ela é um elemento que participa da constituição subjetiva do indivíduo que a possui. Entretanto, a forma pela qual a deficiência é subjetivada é diferenciada devido aos contextos sociais e sistemas relacionais nos quais é significado e vivenciado pelas pessoas.

Para González Rey (2004), o sujeito individual está ligado ao curso dos processos sociais por sua subjetividade, porém, dado o caráter singular dessa subjetividade, ele representa sempre uma opção de mudança através de sua ação particular, podendo marcar o início de novos processos de subjetivação em nível da subjetividade social.

Só o sujeito poderá decidir, dentro da complexidade de vivências e processos simbólicos produzidos nos cenários de sentido em que atua, o rumo de suas ações, as quais, desde o momento de sua decisão e durante todo o processo de sua consecução, se transformam em uma nova rota de produção de sentido. O sentido subjetivo dessas ações se expressa, entre outras coisas, na congruência e continuidade que o sujeito sente nelas e, por sua vez, entre elas a sua condição pessoal. Esse sentido subjetivo das ações humanas define a identidade (...). (González Rey, 2004, p. 158)

A subjetividade, para Paraíso (2012, p. 30), é produzida "(...) pelos diferentes textos, pelas diferentes experiências, pelas inúmeras vivências, pelas diferentes linguagens pelas quais os sujeitos são nomeados, descritos, tipificados". Segundo Foucault (2010, p. 278), "Há dois significados para a palavra sujeito: sujeito ao outro através do controle e da dependência, e ligado à sua própria identidade através de uma consciência ou do autoconhecimento (...)". Revel (2005, p. 82) salienta que o termo subjetivação, para Foucault, designa "(...) um processo pelo qual se obtém a constituição de um sujeito, ou, mais exatamente, de uma subjetividade".

Enfim, ao tomar-se a subjetividade como central na análise desta pesquisa é de se considerar que qualquer mudança na direção da inclusão das pessoas com deficiência em instituições de educação superior deverá

(...) considerar que uma revolução, uma mudança social a nível macropolítico, macrossocial, diz respeito também a uma produção da subjetividade, o que deverá ser levado em conta pelos movimentos de emancipação. (Guattari & Rolnik, 1999, p. 26)

Após essa introdução, na qual se fez a delimitação do tema, objetivo e relevância do presente estudo e se abordaram duas definições centrais para seu desenvolvimento: pessoas com deficiência e produção de subjetividade, são tratados, na sequência, o método, os resultados e a discussão dos dados construídos no decorrer da investigação de campo.

 

MÉTODO

Esta pesquisa se filia à epistemologia qualitativa, como apregoa González Rey (1997), e se materializa a partir do estudo de caso que, de acordo com Chizzotti (2003), é uma caracterização abrangente para designar uma diversidade de pesquisas que coletam e registram informações de um caso particular ou de vários casos a fim de organizar um relatório ordenado e crítico de uma experiência, ou avaliá-la analiticamente com o objetivo de tomar decisões ou propor uma ação transformadora.

Participantes

Os participantes foram acadêmicos com deficiência, seus colegas e professores, bem como a coordenadora acadêmica, responsável pelo setor que faz os registros da vida acadêmica (matrícula, expedição de histórico, confecção de diploma etc.) e a coordenadora pedagógica, responsável pelo setor que coordena as ações de formação continuada dos professores de uma universidade do Estado de Santa Catarina, Brasil, doravante denominada de Universidade X.

Os acadêmicos foram: um do sexo masculino e outra do sexo feminino, com deficiência física, que serão identificados pelas letras B e C; duas acadêmicas com deficiência auditiva, identificadas pelas letras A e P; e uma acadêmica com deficiência visual, identificada pela letra K.

Materiais

Os instrumentos utilizados para coleta de dados foram o questionário, a entrevista, a observação e a consulta a documentos.

Procedimento

Os questionários foram aplicados aos cinco dos seis alunos com deficiência então matriculados, conforme informação obtida junto à secretaria da Universidade X. Um deles não foi entrevistado por não estar mais frequentando as aulas no momento da aplicação do instrumento.

Os questionários também foram aplicados a 10% dos colegas destes alunos, o que totalizou 15 alunos, que foram escolhidos por sorteio entre aqueles que se dispuseram a participar do estudo. Ao contrário dos acadêmicos com deficiência, que serão identificados por letras, seus colegas não serão identificados, nem mesmo de forma fictícia.

Foram aplicados os questionários a, ainda, 10% dos professores desses alunos, o que totaliza cinco docentes, escolhidos igualmente por sorteio entre aqueles que se disponibilizaram. As falas dos professores também não serão identificadas individualmente.

As entrevistas foram realizadas com a coordenadora acadêmica e com a coordenadora pedagógica, a fim de conhecer as providências tomadas no sentido de promover a inclusão.

Foi ainda realizada a observação do ambiente em geral da instituição, a fim de melhor compreender e contextualizar o que foi apontado nos questionários e entrevistas.

Por fim, foram consultados documentos considerados atinentes ao intento da investigação: a) o histórico da Universidade e b) o material da campanha de seu vestibular e processo seletivo especial, por se entender que veiculam ideias da instituição, o primeiro como registro do percurso dela e o segundo como peça contemporânea.

Os dados coletados foram organizados e sistematizados visando a sua compreensão e interpretação. A partir da análise de conteúdo, nos termos propostos por Bardin (2009), organizou-se a discussão por meio de três categorias: a) estrutura física oferecida aos acadêmicos com deficiência, b) recursos metodológicos oferecidos a eles e c) relações interpessoais estabelecidas por eles e com eles.

 

RESULTADOS E DISCUSSÃO

a) Estrutura física oferecida aos acadêmicos com deficiência

As pessoas com deficiência ainda enfrentam alguns obstáculos relacionados à estrutura física na Universidade X. A opinião de um colega dos acadêmicos com deficiência reflete a realidade desta instituição com relação à estrutura física: "Alguns ambientes da universidade oferecem dificuldades aos acadêmicos com deficiência, porém já existem espaços no campus que auxiliam bastante estes acadêmicos". Assim, é possível perceber que a universidade ainda não está suficientemente preparada para receber as pessoas com deficiência, pois realiza adaptações conforme surgem as necessidades, o que sugere disposição para tal, mas não um planejamento adequado.

O despreparo para receber estes estudantes encontra, conforme a coordenadora acadêmica, um elemento facilitador que é a própria omissão dos interessados nas adaptações das condições físicas. Ela conta que, no momento da matrícula, existe um formulário no qual há um campo próprio para o estudante assinalar se tem ou não alguma deficiência. Tem-se percebido que alguns não assinalam o campo e após o início das aulas solicitam recursos de adaptação ao setor. Nesse sentido, afirma-se que este comportamento pode ser uma expressão dos modos de subjetivação produzidos no ambiente social e, também, no sistema educacional, que tem levado à política de se esperar o "perfil" da pessoa "normal". Sabe-se que as formas de deficiência são variadas, bem como as necessidades relacionadas a cada uma delas. Dessa maneira, torna-se difícil para a universidade realizar todas as adaptações antecipadamente.

Uma estudante afirma "sempre nos colocavam num lugar sem adaptação, ou seja, a sala era adaptada, mas com dificuldade para chegar até ela. Eles têm uma noção diferente de adaptação, não preocupam-se com a distância" (Acadêmica C).

De acordo com Abenhaim (2005), para pensar em inclusão, deve-se romper com a ideia de que o normal é o igual e adotar que normal é a diversidade e a instituição educacional inclusiva é aquela capaz de trabalhar com a diversidade humana com qualidade. Observa-se que a Universidade X, por exemplo, em suas campanhas de vestibular, utiliza como modelos sempre jovens considerados "bonitos" e ditos "normais". A universidade também recebe acadêmicos da terceira idade, acadêmicos com deficiência, indígenas, negros, orientais, entre outros. Está a universidade preparada para lidar com a diversidade? Que sentidos são construídos a partir da não inclusão da diversidade nas campanhas de divulgação? Não seria essa uma forma de exclusão? Por outro lado, outros sentidos estão sendo construídos a partir da entrada cada vez maior da diversidade no ambiente universitário

Os acadêmicos B e C referem que os laboratórios de informática, de contação de histórias, de línguas e coordenações de cursos encontram-se no segundo piso de prédios sem elevador, dificultando ou até mesmo impossibilitando o acesso deles. O depoimento do acadêmico B acerca de sua vida acadêmica evidencia a limitação de acesso e revela o consequente empobrecimento dos processos interativos: "Durante o curso todo não tive acesso à coordenação, quando precisava falar com alguém tinha que pedir para uma colega chamar, e aguardar no pé da escada". Já a acadêmica C conta que "O laboratório de contação de histórias não era adaptado, algumas alunas me ajudavam a subir as escadas para assistir aula, mas no último semestre me recusei a assistir aula neste local"; "Também o laboratório de línguas é no 2º piso sem adaptação, então nunca fui até lá".

É importante reconhecer que esforços vêm sendo feitos na Universidade X para melhorar as condições oferecidas às pessoas com deficiência. Esta percepção também está presente nas respostas de alguns colegas de acadêmicos com deficiência, participantes da pesquisa: "Percebo que a universidade procura fornecer as condições necessárias até aqui solicitadas e penso que ela é muito grande para deixar estas pessoas de fora do sistema"; "Quanto mais conhecermos o problema, suas dificuldades, maiores serão os recursos a oferecer. (...) Creio que há a preocupação em facilitar cada vez mais a vida, o dia a dia destas pessoas".

Os professores também reconhecem esforços da Universidade X para a inclusão dos acadêmicos com deficiência. Uma professora afirma perceber dificuldades com relação aos recursos de adaptação, mas considera isso compreensível, uma vez que este trabalho pela inclusão tem se acentuado nos últimos tempos. Outra professora considerou que foram providenciados os recursos para o aluno com deficiência que frequenta o curso no qual ela trabalha.

A coordenadora acadêmica afirma que a Universidade X está providenciando adaptações. Alguns prédios estão passando por reformas e serão instalados elevadores. Também há um projeto de reforma das calçadas para facilitar a circulação de acadêmicos com deficiência visual e de instalação de softwares para pessoas com deficiência visual na biblioteca. A profissional declara que a Universidade X tem procurado oferecer as condições, mas que, por vivermos em uma sociedade despreparada, muitas vezes as pessoas não respeitam os espaços reservados para pessoas com deficiência, a exemplo das vagas para cadeirantes nos estacionamentos.

Paralelo às críticas e ao reconhecimento do que já foi feito, os participantes apresentaram sugestões que podem ser resumidas em uma afirmação: o ideal seria que todas as adaptações fossem realizadas antecipadamente, pois muitos constrangimentos seriam evitados e os acadêmicos com deficiência sentir-se-iam efetivamente incluídos e mais capazes de realizar as mesmas atividades que os demais acadêmicos realizam.

b) Recursos metodológicos oferecidos aos acadêmicos com deficiência

Além da estrutura física, pode-se perceber problemas com relação aos aspectos metodológicos. Foram encontradas limitações referentes a recursos para acadêmicos com deficiência auditiva, visto que, mesmo havendo intérprete em sala de aula, ainda existem barreiras: "Tem professores que escolhem filme sem legenda e para eu entender, precisa ter legenda. E também quando os professores explicam e escrevem junto não consigo acompanhar a intérprete" (Acadêmica P). Quando a perda da audição é parcial, o uso do aparelho auditivo auxilia, porém, mesmo assim há dificuldades em alguns momentos: "No caso de palestras, videoconferências e similares, o fornecimento de fones auxiliaria na audição e compreensão do assunto tratado" (Acadêmica A).

Também foi apontada a necessidade de instalação de programas nos laboratórios de informática que auxiliariam no cotidiano do acadêmico com baixa visão: "Os recursos facilitariam as pesquisas consultadas nos laboratórios de informática com a instalação dos programas jaws e doswos em pelo menos dois dos computadores em cada laboratório" (Acadêmica K).

Segundo Pieczkowski (2014), para que o estudante com deficiência seja incluído, entendendo-se o acesso e a participação, é essencial que a universidade disponibilize tecnologias assistivas, dentre elas:

(...) adequações posturais; comunicação aumentativa e alternativa (CAA); recursos para cegos ou para pessoas com baixa visão; recursos para pessoas surdas ou com déficits auditivos; mobiliários adaptados; auxílios para a vida prática, incluindo a mobilidade; adequações arquitetônicas; adaptações em veículos, recursos de acessibilidade ao computador, etc. Os recursos de acessibilidade ao computador, que são hardwares e softwares voltados às pessoas com deficiências sensoriais e motoras, têm se mostrado bastante eficientes na acessibilidade educacional, a exemplo de teclados modificados, teclados virtuais com varredura, mouses especiais, softwares de reconhecimento de voz, ponteiras de cabeça, monitores especiais, leitores de texto, impressoras Braille, entre outros. (Pieczkowski, 2014, pp. 92-93)

O conjunto de saberes implicados na afirmação acima revelam a complexidade do trabalho docente. São amplos os desafios da docência universitária, especialmente diante das demandas distintas provocadas pela inclusão de estudantes com deficiência, do papel da universidade e das lacunas na aprendizagem de estudantes com deficiência, muitas vezes consequentes de uma educação especial pautada na filantropia, na caridade e no assistencialismo. Por outro lado, como fazer para não penalizar tais estudantes pela falta de adequação institucional?

Os professores que conviveram com acadêmicos com deficiência manifestaram a necessidade de formação docente para saber lidar melhor com estes alunos: "Deveria haver instrução pedagógica aos professores para lidar melhor com os alunos que tenham dificuldades"; "Em síntese, eu diria que há necessidade de adequar mais o espaço físico, promover a capacitação dos educadores e de todos que de certa forma se envolvem com os acadêmicos com alguma deficiência".

Araujo (2011), com base na ideia da proteção constitucional das pessoas com deficiência, fortalece a visão de que estes estudantes devem estudar nas mesmas salas dos demais. Por isso, os professores precisam se capacitar para a inclusão, porém, não pode recair somente sobre eles o compromisso de buscar a formação para atuar com a diferença. Segundo as duas coordenadoras entrevistadas, os setores sob sua responsabilidade têm realizado ações conjuntas relacionadas aos acadêmicos com deficiência, como por exemplo, ciclos de estudos para os professores, nos quais se discute sobre "inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais na universidade". Porém, a participação docente tem sido reduzida.

A necessidade de intensificar a formação é apontada pela coordenadora pedagógica, ao declarar que as ações ainda são insuficientes, embora crescentes, a exemplo de "convites para palestras, preocupação com disposição de intérpretes para alunos surdos, equipamentos adaptados para pessoas cegas e deficientes físicos. Porém, muitas ações ainda são isoladas." A profissional relata que há uma preocupação na elaboração dos projetos pedagógicos dos cursos com relação ao ensino de pessoas com deficiência e que, "(...) devido à demanda que vem ampliando, é possível que seja necessária a criação de um programa de apoio à pessoa com deficiência". Tal afirmação demonstra a sensibilidade e a preocupação da gestão universitária em formular uma política de atendimento aos acadêmicos, a fim de melhorar as condições de ensino. Decorrente disso, a Universidade X conta atualmente com um setor de acessibilidade, responsável pelo cadastro dos estudantes, orientações aos docentes e coordenadores de cursos e orientações à comunidade universitária em relação à acessibilidade nos diferentes espaços.

A acessibilidade nas IES é um dispositivo legal, atualmente adotado pelo Ministério da Educação (MEC) como critério para credenciamento das instituições e reconhecimento de cursos. O Instrumento de Avaliação Institucional Externa, que subsidia os atos de credenciamento, recredenciamento e transformação de organização acadêmica (presencial), das IES, publicado em 2014 pelo MEC (Brasil, 2014), apresenta alteração nos requisitos legais e normativos. Esses requisitos são regulatórios e seu atendimento é obrigatório. O instrumento apresenta 18 dispositivos legais/normativos e dois deles são vinculados à inclusão/acessibilidade de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida e com Transtorno do Espectro Autista. Trata-se dos dispositivos legais de número quatro e cinco, este inserido na última versão do instrumento. O dispositivo quatro é descrito nos seguintes termos:

Condições de acessibilidade para pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, conforme o disposto na CF/88, Art. 205, 206 e 208, na NBR 9050/2004, da ABNT, na Lei Nº 10.098/2000, nos Decretos Nº 5.296/2004, Nº 6.949/2009, Nº 7.611/2011 e na Portaria Nº 3.284/2003. (BRASIL, 2014).

No glossário que compõe o referido instrumento de avaliação, dos 31 termos indicados, quatro são relativos à acessibilidade às pessoas com deficiência, mobilidade reduzida ou necessidades educacionais especiais, o que evidencia a relevância deste aspecto. A seguir, destaca-se o conceito de acessibilidade presente no instrumento:

Acessibilidade: Condição para utilização, com segurança e autonomia, total ou assistida, dos espaços, mobiliários e equipamentos urbanos, das edificações, dos serviços de transporte e dos dispositivos, sistemas e meios de comunicação e informação, por pessoa com deficiência ou com mobilidade reduzida. No âmbito educacional, a acessibilidade pressupõe não só a eliminação de barreiras arquitetônicas, mas a promoção plena de condições para acesso e permanência na educação superior para necessidades educacionais especiais. (Brasil, 2014)

Convém destacar o fato de as questões relacionadas à inclusão e acessibilidade serem tratadas, no instrumento de avaliação, como requisito legal e não como item a ser avaliado.

c) Relações interpessoais

Atualmente, tem-se procurado pensar em uma instituição educacional diferente do modelo tradicional, uma instituição que não pretenda ser equalizadora, formatadora e a favor de um mundo homogêneo, mas que estimule e respeite as diferenças. Porém, não basta simplesmente falar em acolher as diferenças, mas conceber a escola,

(...) como um ambiente de tradução entre culturas, um ambiente de tradução entre experiências culturais e formas de vida diferentes, e não a escola como uma equalizadora de culturas. Não se quer mais aquele processo que costumo chamar de inclusão moderna, de inclusão iluminista, que é incluir para manter excluído. (Veiga-Neto, 2005, p. 59)

É necessário cuidar como as pessoas com deficiência são acolhidas. Estarão elas sendo incluídas ou apenas inseridas? Entende-se que o processo inclusão/exclusão perpassa em grande medida pelas interações cotidianas que acontecem nas instituições educacionais. Por isso, nesta pesquisa, procurou-se também investigar acerca das relações interpessoais dos acadêmicos com deficiência com seus professores e colegas, partindo das experiências vivenciadas por eles próprios e da percepção de seus colegas e de seus professores.

Constata-se que, na Universidade X, alguns esforços têm sido feitos com relação à acessibilidade nas suas múltiplas facetas, ou seja, pode-se perceber que as pessoas com deficiência estão sendo integradas ao ambiente universitário, mas para ocorrer a inclusão, os estudantes com deficiência, seus colegas e professores devem atuar de forma ativa.

Afirmações dos colegas dos acadêmicos com deficiência, como as seguintes: "Penso que, o que falta realmente é, nós ditos 'normais', conhecer melhor a realidade e o modo de aprender de nossos colegas"; "É um relacionamento um pouco fechado, talvez por não ter 'espaço' para a comunicação entre os colegas, porque não temos a prática necessária para nos comunicar"; provocam a reflexão sobre o papel dos "normais" na inclusão. Se a inclusão é um processo de mudança social, todos precisam se envolver nele, pois depende da atuação e iniciativa da pessoa com deficiência e também das pessoas que não são deficientes.

Acerca do relacionamento interpessoal com colegas e professores, os acadêmicos com deficiência o referiram como sendo "bom": "Acredito que foi normal, em relação a minha deficiência. Nunca me senti discriminada, pelo contrário, alguns colegas foram muito prestativos (...). E os professores também nunca me trataram com diferença" (Acadêmica A); "Muito bom, os colegas mais próximos e que sabem do meu problema de audição são todos compreensíveis. Tenho um bom relacionamento com os professores, pois sempre os deixo a par da minha situação" (Acadêmica P). Porém, cabe questionar: o que seria um bom relacionamento na concepção deles? Seria um relacionamento de coleguismo e igualdade ou apenas um relacionamento de cordialidade?

A utilização de questionários nesta pesquisa permitiu que fossem captadas algumas dimensões da relação, porém pode não se ter conseguido captar outras. Por isso, acredita-se que uma relação é diferente da outra e, portanto, em alguns casos pode representar solidariedade e em outros apenas cordialidade.

Embora os acadêmicos com deficiência afirmem que o relacionamento com colegas e professores é bom, relatam que a falta dos recursos de adaptação dificulta o relacionamento: "A falta de adaptação deixa a pessoa com deficiência um pouco reservada, nem sempre participamos ou nos aproximamos, pois pedir ajuda em algumas situações fica constrangedor" (Acadêmico B); "Para ascender a certos locais (...) fico limitada. Isso reduz as chances de contato com as pessoas, evidentemente. Em consequência, reduz os relacionamentos prováveis" (Acadêmica C). A entrevistada relata também que as limitações estruturais somadas às limitações do estudante com deficiência desperta atitudes de solidariedade, favorecendo as interações. Pode-se inferir dessa narrativa que a deficiência pode reverberar em aproximação. Percebe-se que a deficiência pode não apenas limitar a convivência como, ao contrário, servir como fator de aproximação, promovendo a solidariedade entre os estudantes.

Os professores respondem distintamente acerca do relacionamento interpessoal dos acadêmicos com deficiência e seus colegas: "Não observei nenhum tipo de preconceito ou algo que dificultasse o relacionamento". Outro professor declara perceber um certo isolamento, pois identifica mais facilmente a aproximação dos colegas ao estudante com deficiência do que o inverso.

Para Guattari e Rolnik (1999), a subjetividade é essencialmente fabricada e modelada no registro do social. Ela está em circulação nos conjuntos sociais de diferentes tamanhos. É essencialmente social, e assumida e vivida por indivíduos em suas existências particulares. Para González Rey (2004, p. 145),

A subjetividade não é um sistema abstrato e impessoal. Ao contrário, seu sistema é formado por sujeitos concretos e ela se constitui nesses sujeitos e eles, por sua vez, vão influenciando constantemente sua trajetória e se configuram subjetivamente através de sua ação nos vários espaços da vida social.

Neste momento, poderíamos refletir: o comportamento de isolamento citado pelo professor não seria fruto de uma subjetividade produzida, no qual as pessoas com deficiência sentir-se-iam ou seriam consideradas por seus colegas como "inferiores"? Ou pelo fato de terem alguma deficiência considerarem-se ou serem consideradas como "incapazes", como fora da norma?

Veiga-Neto (2001) salienta o conceito e o uso da norma como estratégia de dominação. Afirma a negação abstrata dos anormais (no plano epistemológico), da qual resultam as práticas de exclusão mais explícitas e radicais.

Trata-se de práticas de exclusão que têm no racismo o seu ponto imediato de convergência, se entendermos por racismo não apenas a rejeição do diferente, mas, também, a obsessão pela diferença, entendida como aquilo que contamina a pretensa pureza, a suposta ordem, a presumida perfeição do mundo. (Veiga-Neto, 2001, p. 107)

Os depoimentos a seguir referem-se ao relacionamento entre os acadêmicos com deficiência e seus colegas, a partir da visão destes últimos e trazem alguns dados instigantes: "Bom, pois sabemos entender suas dificuldades!". A pessoa é aqui reconhecida pelas dificuldades e deficiência e a impressão é de que o relacionamento é bom devido à solidariedade dos colegas do estudante com deficiência, o que acaba por parecer uma certa inferiorização desse.

Nessa perspectiva de problematização das afirmações feitas pelos colegas, outra delas é interessante: "O relacionamento é normal, converso normalmente com ele sem nenhum constrangimento". Porém, a afirmação a seguir sugere que a diferença é vista como algo não desejado: "Não há diferença alguma na forma de relacionamento". A partir de um pensamento inclusivo todos somos reconhecidos como diferentes e tratamos cada um de forma diferente, as relações não são padronizadas, então, por que não poderia haver diferença nelas? Afinal, o reconhecimento da diferença é primordial para as interações, como bem nos aponta Veiga-Neto (2001).

Tratando-se do respeito e do incentivo às diferenças, é interessante citar duas declarações de professores: "Os professores têm sempre a sensibilidade de saber se estão indo muito rápido"; "É preciso ter alguns cuidados. Por exemplo, tive dois alunos com deficiência visual grave e para eles era necessário disponibilizar o material para cópia ampliada". Tais atitudes representam o respeito ao ritmo de cada um, o que significa um grande passo para o processo de inclusão.

Edler Carvalho (1998) afirma que existem barreiras fora dos indivíduos, assumindo formas injustas, como as produzidas pelo imaginário social, considerando a pessoa com deficiência como incapaz e dependente. "As próprias pessoas com deficiência confirmam essa observação na medida em que 'vivem' suas diferenças, muito menos pelas limitações que sofrem em decorrência de suas deficiências e, muito mais, pelas representações sociais a respeito de suas limitações (...)" (Edler Carvalho, 1998, p. 103).

Na percepção dos colegas, o relacionamento também é bom, não o diferenciando daqueles estabelecidos com os demais: "Percebo que há uma preocupação, que a solidariedade ainda existe em algumas pessoas". Há quem acredite, segundo Edler Carvalho (1998), que a questão da socialização parece estar atendida na medida em que estes alunos puderem transitar nos mesmos espaços que os demais. Porém, mesmo que haja possibilidade de ocupação dos mesmos espaços, corre-se o risco de apenas ocorrer a inserção da pessoa com deficiência no convívio com outros estudantes, sem que se efetivem, entre todos, trocas interativas enriquecidas pela plena aceitação das diferenças.

Sobre tal afirmação, percebe-se que a Universidade X ainda não está atendendo à primeira etapa, referente à circulação nos mesmos ambientes, já que as pessoas com deficiência física não têm acesso a alguns deles. Quanto à segunda etapa, que são as trocas interativas e a aceitação destas pessoas na instituição, parece ser uma conquista gradativa que já está ocorrendo no contexto universitário.

Considerando as afirmações de Carneiro (1997) e Martínez (2005) destaca-se a importância das relações interpessoais para a constituição subjetiva destes acadêmicos. Porém, é necessário enfatizar que estas relações acontecem de forma recíproca, então, no caso das pessoas com deficiência, ambas devem buscar a mudança: elas devem buscar relacionamento com as demais e estas também devem buscar maneiras de interagir, não esperando apenas que a pessoa com deficiência se adapte a sua realidade.

Para González Rey (2004), o sujeito individual está ligado ao curso dos processos sociais por sua subjetividade, porém, dado o caráter singular dessa subjetividade, ele representa sempre uma opção de mudança através de sua ação particular, podendo marcar o início de novos processos de subjetivação em nível da subjetividade social. Considerando esta teoria, pode-se afirmar, então, que as pessoas com deficiência não necessariamente se deixam determinar pela concepção hegemônica de sociedade, mas conseguem construir mudanças através de sua ação particular. Dessa forma, estão superando os obstáculos que encontram e mostrando cada vez mais seu potencial a toda a sociedade, como demonstra a seguinte fala:

Tenho uma boa expectativa, quando terminar desejo fazer uma pós-graduação e se possível mestrado e doutorado e exercer minha profissão. (Acadêmica A)

Cabe a todos(as) na universidade trabalhar criticamente a subjetividade social construída a respeito das pessoas com deficiência, estimulando que a subjetividade individual dos sujeitos promova uma mudança nos processos de subjetivação, para que tais pessoas não sejam consideradas incapazes e sejam efetivamente incluídas não apenas no espaço institucional, mas em todos os espaços sociais.

A Universidade X tem se esforçado para proporcionar recursos que facilitem o cotidiano destas pessoas, mas é importante lembrar que, para um sistema educacional ser considerado democrático, deverá apresentar uma diversidade de estratégias prestando atendimento a todos os educandos, considerando e respeitando as diferenças.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A pesquisa possibilitou conhecer alguns aspectos da realidade vivenciada pelos acadêmicos com deficiência na Universidade X, seus relacionamentos com colegas e professores, as tecnologias assistivas disponibilizadas ou necessárias, mas ainda indisponíveis. Percebe-se que a Universidade X se mobiliza no sentido de propiciar acessibilidade, porém, ainda há muitas lacunas nas estruturas físicas, nas atitudes e, especialmente, no acesso à comunicação. Embora atualmente haja a disponibilidade de intérpretes para todos os estudantes surdos, a comunicação virtual, amplamente utilizada por esse público, a exemplo de vídeos institucionais, ainda carece de interpretação em Libras, o que é frequentemente reivindicado. Estudantes cegos também solicitam placas em Braille, pelas quais possam se localizar nos espaços da Universidade. Há também um limite na estrutura física da instituição, pois há muitos espaços que não comportam adaptações.

A Universidade X demonstra preocupação com a formação docente, mas apesar da oferta de cursos de capacitação, há necessidade de que eles sejam mais frequentes e tenham maior participação docente. Também é necessário que os técnicos administrativos e estagiários da instituição se capacitem, pois eles também interagem e prestam atendimento a estes alunos. Os setores da Universidade X responsáveis pelo atendimento aos estudantes e aos docentes poderiam agregar serviços de atendimento a estas pessoas, tornando-se referência para técnicos administrativos, professores e estudantes.

A inclusão não depende apenas de estrutura física, mas a partir dela podem ocorrer mudanças significativas no cotidiano destes acadêmicos. A inclusão ocorre principalmente a partir das atitudes da sociedade diante das pessoas com deficiência e se houver essa disposição muitas das limitações existentes serão superadas.

Deve-se considerar que as dificuldades enfrentadas pelas pessoas com deficiência não ocorrem somente na Universidade X. Por isso, para ocorrer a inclusão deve acontecer a melhoria das condições físicas, a mudança na postura da sociedade diante das pessoas com deficiência e oportunidades para que elas exerçam seu potencial. Há outra dificuldade vivenciada por tais pessoas, uma subjetividade socialmente produzida que as considera "incapazes". Apesar das dificuldades, a cada dia as pessoas com deficiência estão conquistando e ocupando espaços não só na universidade, mas na sociedade em geral.

A pesquisa mostrou que essas pessoas são capazes e têm objetivos de concluir a graduação, buscar uma especialização, trabalhar, entre outros aspectos da vida laboral e social. A necessidade de recursos de adaptação não as torna incapazes e o oferecimento de tais recursos é um direito das pessoas com deficiência. Olhar desse modo é perceber estas pessoas como potência de transformação das suas condições de vida bem como da estrutura social.

São louváveis os esforços que vêm sendo feitos, porém ainda há muito a ser mudado para que ocorra a inclusão efetiva das pessoas com deficiência no ambiente universitário. Dessa maneira, pode-se afirmar que a disposição das pessoas para realizar a inclusão pode ajudar a superar a falta de estrutura física, a minimizar os prejuízos aos estudantes, pois não adiantaria a disponibilização de toda a infraestrutura necessária, se as pessoas não estivessem dispostas a reconhecer as diferenças.

Lopes (2009) ampara-se em Veiga-Neto para afirmar que a inclusão e a exclusão são facetas de um mesmo jogo. A garantia de acesso e atendimento sugere a incorporação de princípios includentes, porém, no decurso dos processos de comparação e classificação, muitos sujeitos são excluídos. Isso significa que "o mesmo espaço considerado de inclusão pode ser considerado um espaço de exclusão. Conclui-se que a igualdade de acesso não garante a inclusão e, na mesma medida, não afasta a sombra da exclusão" (Lopes, 2009, p. 157).

Nesse sentido, Pieczkowski (2014, p. 182) menciona a ambivalência da inclusão, afirmando que sua manifestação está no fato de a escola inclusiva

(...) sinalizar para princípios como temporalidade distinta, solidariedade, respeito à diferença, porém organizar-se, predominantemente, com base em princípios da Modernidade sólida, com tempos e espaços fixos para todos.

Nesse contexto, como incluir estudantes com expressiva deficiência intelectual, por exemplo, que também estão acessando a universidade?

Sem o intuito de fornecer respostas definitivas, registram-se algumas inquietações que têm mobilizado setores acadêmicos e sociais a continuarem investigando esse cenário permeado por tensionamentos.

 

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