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Revista da ABOP

versão impressa ISSN 1414-8889

Rev. ABOP vol.1 no.1 Porto Alegre jun. 1997

 

ARTIGOS

 

O Teste Projetivo Ômega no diagnóstico em orientação profissional

 

 

Inalda Dubeux Oliveira 1

Faculdade de Filosofia do Recife

 

 


RESUMO

O artigo relata a experiência da autora com o Teste Projetivo Ômega como um instrumento auxiliar, no diagnóstico de orientabilidade em processos de facilitação da escolha profissional. A partir de casos práticos analisa-se a forma pela qual o recurso amplia a compreensão dos conflitos inerentes ao processo de decidir sobre o futuro.

Palavras-chave: Teste Projetivo Omega, Diagnóstico de Orientabilidade, Facilitação da Escolha.


ABSTRACT

This paper describes the author's experience with the Omega Projective Test, used as an auxiliary instrument for orientability diagnose in Vocational Guidance. Case studies are used to demonstrate the. rnanner in which this test is useful for the understanding of conflicts envolved in the process of deciding about future careers.

Keywords: Omega Projèctive Test, Vocational Guidance, Orientability Diagnose.


 

 

A Orientação Profissional, compreendida como uma facilitação da escolha junto a jovens que se deparam com a tarefa de descobrir quem ser através de um que fazer, tem sido parte importante da minha prática profissional nos últimos 18 anos tanto em consultório onde exerço psicologia clínica, como em escolas particulares do Recife. Durante todo este período, contando apenas com a certeza que queria algo diferente dos "testes vocacionais" então considerados como os únicos recursos na Orientação Profissional, e, apoiada nas idéias de Rodolfo Bohoslavsky, parti para uma forma de trabalho no qual focalizava o jovem como o sujeito de sua escolha.

Aprendi muito ao longo destes anos, principalmente com aqueles que constituíram a principal clientela: os alunos de li grau das escolas onde implantei os serviços de Psicologia Escolar e Orientação Profissional.

Hoje, ao definir Orientação Profissional como o processo de facilitar o momento da escolha do orientando, objetivo auxilia-lo a compreender sua situação específica de vida, na qual estão incluídos aspectos psicológicos, familiares e sociais. Este processo, que pode ser desenvolvido individualmente ou em grupo, enfatiza principalmente a responsabilidade daquele que escolhe seja ele o jovem vestibulando, o universitário que não se identifica com o que cursa, o adulto que precisa redimensionar sua carreira, ou o aposentado que se sente sem perspectivas. A tarefa da Orientação Profissional é exatamente coordenar o aprendizado da escolha, facilitar o desenvolvimento de um projeto de vida . Segundo Lucchiari (1992), coordenar não significa orientar, pois nós não conhecemos o melhor caminho. Cabe ao orientando aprender a encontrá-lo. Este aprendizado implica basicamente três parâmetros: o conhecimento de si, o conhecimento das profissões e a integração destes aspectos em uma síntese pessoal. Uma escolha que considera quem o sujeito foi, quem é, o que será e o que deixou de ser pelo que não escolheu. Objetiva ainda o ajudar a superar o conflito entre seu desejo e os obstáculos impostos pela realidade. Esta facilitação da escolha, qualquer quer seja o local onde se desenvolve: no consultório, nas empresas ou na escola, na qual o enfoque tem que ser mais pedagógico e informativo, tem um mesmo posicionamento teórico: partindo de um referencial psicanalítico, observamos os aspectos inconscientes que interferem na escolha, consideramos as interferências familiares e sociais e tentamos chegar a um diagnóstico da orientabilidade do indivíduo que, segundo Bohoslavsky (1971),"é identificar a possibilidade (em termos egóicos e estruturais) que o cliente apresenta de submeter-se a determinada técnica - neste caso, à Orientação Vocacional Ocupacional" (Levenfus, 1997, p.242).

Diagnosticar, neste contexto, não significa rotular e sim compreender para formular uma estratégia relativa ao processo de facilitar a escolha de uma profissão. E um diagnóstico que remete à problemática vocacional, que vai envolver mecanismos de decisão frente a opções ocupacionais. É basicamente responder às seguintes perguntas: "quem é esta pessoa?", "que acontece com ela?", "por que escolher uma profissão traz-lhe dificuldades?" "como posso ajudá-la?"

A resposta a tais questões implica em analisar critérios específicos que englobam desde as motivações conscientes e inconscientes, fantasias de resolução, tipos de ansiedade, mecanismos de defesas utilizados, identificações predominantes, o manejo da crise adolescente em sua busca por uma identidade pessoal e conseqüente identidade vocacional até as relações com o meio familiar, educacional e social.

Nesta forma de Orientação Profissional, o instrumento primordial é a entrevista, aberta e não diretiva, e é, através dela, que os pontos principais do diagnóstico devem ser estabelecidos. A forma como o entrevistado organiza as respostas, o que escolhe dizer ou não dizer, suas ansiedades, enfim, sua forma de comunicação, permite urna compreensão de sua dinâmica. Entretanto, o primeiro diagnóstico nada mais é que uma aproximação uma tentativa, sujeita a contínuas reformulações e, como urna forma de ampliar a percepção da problemática, além da entrevista, são utilizados recursos como: exercícios de dinâmica de grupo e de orientação profissional, auto avaliações e técnicas projetivas, quando necessárias. Atribuo, como Bohoslavsky (1971), um valor instrumental aos testes, e, na prática, tanto na escola como em consultório, quando utilizados, são inseridos no contexto de um processo de conhecimento de si, como forma de aprender a escolher.

 

O Teste Projetivo Omega

Os recursos projetivos são considerados de grande importância como instrumentos auxiliares para a compreensão dinâmica dos conflitos do sujeito, suás angústias, resistências e negações. Dessa forma, o teste projetivo, quando usado adequada e oportunamente, pode "acrescentar, confirmar ou não as hipóteses levantadas na entrevista." (Bock et. al. 1995, p.140).

O Teste Projetivo Ômega, (T.P.O.) criado pelo Departamento de Psicologia da Universidade do Rio de Janeiro em 1966, é um teste de apercepção temática baseado no T.A.T. de Murray especificamente para ser utilizado em Orientação Profissional podendo também ser usado na clínica. O T.P.O. é constituído de quatro cartões estímulos e permite uma aplicação coletiva, através das lâminas ou de slides, o que o transforma em recurso valioso para os processos de Orientação Profissional desenvolvidos na escola. Suas imagens são menos - estruturadas que as lâminas do T.A.T. de Murray, por serem esboçadas lembrando rabiscos, de forma a não condicionar - aspectos ligados a tempo, vestimenta, objetos e costumes, o que vem a facilitar a projeção por parte de adolescentes e adultos.

O conteúdo das lâminas foi elaborado visando a abordar conflitos básicos da dinâmica da escolha principalmente do adolescente, mas que também se aplicam ao adulto: a identificação pessoal e sexual, a identificação com o grupo familiar e de pares, a relação com a figura de autoridade e a perspectiva de futuro. As estórias desenvolvidas a partir de cada lâmina são analisadas do ponto de vista formal, onde se verificam os aspectos estruturais, a relação com o estímulo, desenvolvimento do tema, reação dos personagens frente aos obstáculos e desfecho que consegue dar à situação. Do ponto de vista dinâmico, a partir de um referencial psicanalítico baseado em Shentoub, procura-se estabelecer que conflitos foram suscitados pelos estímulos, como eles se relacionam com a situação de escolha, e de que forma o orientando enfrenta ou se defende deles.

Partindo de uma caracterização das lâminas, exemplificarei com respostas dadas por adolescentes de II Grau que ilustram os conflitos da forma mais típica. Tais exemplos não serão aprofundados em sua interpretação, uma vez que visam apenas facilitar a apreensão da problemática. Em seguida apresentarei dois casos objetivando demonstrar de que maneira o T.P.O. contribui para clarificar os aspectos dinâmicos da personalidade e fornece elementos para o diagnóstico da orientabilidade do indivíduo.

Os textos, em todos os exemplos serão transcritos na íntegra.

Lâmina 1: A figura sugere um homem e uma mulher e evoca a identificação pessoal e sexual que tem uma relação direta com a escolha de uma profissão. O adolescente busca quem ser através de um que fazer e, como o vestibular chega cada vez mais cedo, para uma grande maioria, o "quem sou eu?" ainda está muito difuso e os lutos básicos pelo corpo, pelos papéis é identidade infantis ainda estão em processo de elaboração. São freqüentes as estórias onde a identificação predominante é com crianças, como uma tentativa de voltar à segurança da dependência, ou estórias referindo-se ao primeiro amor nas quais se percebe aceitação da sexualidade. Podemos ver o contraste nos dois exemplos abaixo:

 

 

Exemplo 1: Sexo Feminino, 17 anos 2° ano II Grau, escola particular.

Título: "Meu primeiro amor"

O menino estava querendo fazer amizade com a menina para ser sua futura namorada, mas ela é muito criança ainda, e tem medo de namorar por causa do seu pai. O garoto lhe pediu em namoro, mas ela não aceitou e depois de uma semana, num feriado de 7 de setembro, ele pediu a ela para passear na praia porque eles moravam juntos quando iam veranear. Eles se sentaram, conversaram e sem querer ele roubou um beijo dela e começaram a namorar escondidos até que a menina tivesse coragem a falar ao seu pai que estava com namorado. Ela falou com seu pai, seu pai disse que, ela estava na idade, mas que tivesse muito cuidado com esse namoro.

Exemplo 2:Sexo masculino, 15 anos, 2° ano II grau, escola particular.

Título: João e Maria

João e Maria eram dois irmãos gêmeos, eles viviam normalmente como qualquer gêmeo. Tirando as diferenças de sexo, eram idênticos, só existia uma diferença entre eles: ele tinha uma mancha azul nas costas e ela uma mancha vermelha.

Quando eles chegaram na adolescência eles começaram a sofrer transformações: Maria começou a se transformar num homem e João começou a se transformar numa mulher. A mancha de João ficou vermelha e a mancha de Maria ficou azul.

No exemplo 1, apesar da faixa etária, verificamos uma certa imaturidade, um desejo de sair da dependência da relação com o pai embora ainda apresente medo em elaborar este luto, mas a aceitação da sexualidade adulta já se manifesta. No Exemplo 2, entretanto, percebemos uma dificuldade em elaborar o luto pela bissexualidade o que nos fala de uma imaturidade que precisa ser trabalhada antes que se possa facilitar o acesso a uma identidade profissional.

Lâmina II: Os rabiscos lembram quatro pessoas num grupo, onde duas são mais altas, podendo remeter às figuras parentais e uma outra figura isolada. O relacionamento com o grupo, seja o grupo familiar ou o grupo de pares, constitui base fundamental para a formação da identidade. Através do grupo o adolescente se reconhece no momento em que perde seus referenciais infantis. Sentimentos de rivalidade, rejeição, submissão, dependência, liderança, reivindicação social e rebeldia que aparecem frequentemente nas estórias encontradas nesta lâmina falam da auto estima e da atitude do orientando frente aos obstáculos da escolha.

Ex.: sexo feminino, 16 anos, 2° ano II grau, escola particular

Título: O Patinho feio

"Pedro era um menino muito triste, pobre e humilde, foi abandonado pelos pais e cresceu na rua.

Um belo dia andando por uma praça encontrou uma família se divertindo num bonito pique-nique.

Ficou encantado e, diante da cena, parou para observar tamanha deslumbração. Havia ficado encantado com o que nunca vira antes. Então tentou se aproximar. Logo que a família notou a presença do "estranho no ninho"; recolheu seus equipamentos e foram embora. Enquanto para o menino sobrou a tristeza."

No exemplo podemos perceber através do desfecho negativo os sentimentos de solidão e tristeza, entremeados pelo desejo de pertencer a um grupo de referência. A preocupação pelo social, parte do idealismo da adolescência, também já aparece pela referência ao menor abandonado.

Lâmina III: Uma figura sentada, desenhada com traços fortes e uma outra em pé, elaborada com linhas bem leves. A relação com a figura de autoridade no momento da busca de identidade que o adolescente vive, faz desta lâmina a que inspira sentimentos mais intensos. A estrutura das figuras remete ao Édipo no momento em que ele está sendo revivido pela crise da adolescência de forma mais ameaçadora pela possibilidade da atualização das fantasias. São frequentes as estórias com deslocamentos temporais e espaciais onde aparecem sempre reis ou similares como tiranos que castigam ou que são magicamente idealizados; a culpa, a agressividade, a sexualidade e a relação familiar positiva ou negativa são sentimentos que aparecem com muita freqüência. A atitude frente às figuras de autoridade fala do processo de identificação e da forma como se manifesta a influência da família na escolha profissional.

Ex.: Sexo masculino, 18 anos, 2° ano II grau, escola particular

Título: O rei chato

"Em algum lugar existia um rei que era chato e por isso não ria nunca. Se chamava bobos, palhaços, domadores, mas o rei não ria nunca.

Até que um dia a rainha apareceu grávida de 5 meses dizendo que se apaixonou pelo chefe da cavalaria. Então o rei começou a rir muito, passou dias, meses, anos rindo até que morreu de falta de ar. E o filho do chefe da cavalaria foi aclamado o novo rei chato só que era mais conhecido como o rei sorriso."

Vemos aqui claramente os elementos da triangulação Edipiana, onde a relação com a figura de autoridade é de competição, aparecendo o desejo de destruir o rei para ficar no seu lugar. O deslocamento temporal e espacial remetem a uma outra época nos sentimentos, como se defendendo da atualização de tais sentimentos na adolescência.

Lâmina IV: Uma figura diante de várias portas sugerindo a necessidade de escolher entre elas. Perspectivas do futuro, sentimentos frente a uma situação de escolha trazem as projeções para o momento mais atual que o adolescente vivencia. As estórias passam a ser mais reais, retratando sentimentos de medo, de ansiedade e freqüentemente fugindo para reflexões intelectuais como forma de se defender do desconhecido. Os desfechos dados a estas estórias nos falam da capacidade do orientando lidar com tal problemática.

Ex.: sexo feminino, 16 anos, 2° ano li grau, escola particular

Título: Difícil escolha

"Esta sou eu, diante da minha escolha profissional. E como se eu estivesse no programa de Sérgio Malandro, participando de um quadro que se chama "porta dos desesperados". Em todas as portas há um monstro. Em apenas uma ao abrir vê-se um prêmio: a escolha certa, a realização pessoal e profissional.

Parece fácil mas é muito mais difícil do que se pensa. Escolher a porta errada e abri-la significa que o monstro vai te pegar.

Você terá perdido tempo. Tudo terá sido em vão.

Abrirei uma porta. Se sairá um monstro ou um prêmio só o tempo dirá."

A estória traz a situação real, os sentimentos com que a adolescente se defronta frente ao futuro: medo de escolher errado, de perder tempo e a coragem de abrir aporta e arriscar.

 

Relato de Casos

Caso I - Sexo masculino, 18 anos, final do 2º ano do II Grau de escola particular Pai engenheiro e mãe assistente social, o aluno ainda está em dúvida quanto ao que deseja cursar; desde a 7a. série desejava cursar Medicina mas atualmente tem, pensado em Computação e gostaria de ter certeza. É o caçula de uma família de 3 irmãos e refere admirar muito o irmão mais velho que cursa Medicina. O aluno foi sujeito numa pesquisa na qual o T.P.O. foi um dos recursos utilizados.

Lâmina 1: Titulo: Na hora de escolher

João, a pessoa da direita, sente-se muito mal e nota-se pela posição que ele está nervoso e que está tremendo. Todavia chega Maria, uma pessoa calma, e vê que João está muito nervoso. Ele estava nervoso com a decisão profissional, pois não sabia que carreira seguir. Maria tenta acalmar João mas ele continua nervoso. Na hora da escolha, João acaba errando...

No final do curso de Computação, João vai fazer Medicina...

No final do curso de Medicina, João vai fazer Computação...

Lâmina II: Título: Obrigado amigos por não ajudarem!!!

Eduardo era um rapaz estudioso, inteligente, mas que não sabia o que queria fazer: Medicina ou Computação? Tentou procurar ajuda com seus amigos mas eles não o ajudaram. Os amigos de Eduardo só queriam saber deles mesmos enquanto Eduardo pensava, pensava e pensava. Sem ajuda, o que será de Eduardo?

Eduardo sentiu-se numa solidão imensa, mas foi bom para ele. Assim ele pode pensar melhor e escolher uma profissão sem a ajuda dos amigos.

Lâmina III: Esqueça a família

Thiago estava indeciso na escolha profissional. Procurou sua família, mas sua farnilia o influenciou muito. Ele agora vivia dois problemas: a decisão profissional e a influência da família. Agora vivia em plena angustia e solidão. Achou melhor isolar-se. Esqueceu de tudo: a influência da família, a cobrança dos amigos; e só pensou no que queria fazer. Hoje ele faz Computação.

Lâmina IV: O funil

Carlos ia fazer vestibular e viu o tempo ficar ruim. Sentiu-se numa sala grande, cheia de pessoas, mas só havia uma pequena porta e que só passaria um. Mas ele sabia que se fosse realmente bom, conseguiria passar por ela. Carlos não tinha medo de não passar, Carlos tinha medo de não tentar o suficiente para passar.

Comentário: As estórias estão adequadas aos estímulos e tema é o mesmo em todas: as dúvidas referentes à escolha profissional e o conflito entre a dependência e a independência que é tão específico da adolescência. A linguagem é simples, verbos no presente, indicando sentimentos atuais. Na primeira lâmina identifica-se com a figura masculina, demonstrando já se encaminhar para o desenvolvimento sexual adequado. Predominam os sentimentos de indecisão, nervosismo e dependência da figura feminina que é projetada como mais forte. Desfecho negativo pela escolha errada mas com o final onipotente de fazer os dois cursos, o que remete à dificuldade de elaborar o luto pelo não escolhido. Os mesmos sentimentos persistem nas demais lâminas onde a dependência aparece forte mas já na segunda estória, identifica-se com o grupo, quer que escolham por ele, embora, logo no título, perceba-se sua possibilidade de enfrentar a solidão e encontrar o polo da independência, buscando uma escolha sem influências. A relação com a figura de autoridade na terceira lâmina não está centrada numa figura masculina ou feminina no sentido Edipiano do conflito mas aparece reconhecida por ele como fator de identificação, de influência tão forte que é polarizada como novo problema, mas, que consegue enfrentar discriminando o que quer do quer esperam dele.

Ao dizer no final que "Carlos não tinha medo de não passar, mas tinha medo de não tentar o suficiente para passar", demonstra capacidade de enfrentar os obstáculos realísticamente.

Considerando os dados projetados no T.P.O. o - aluno apresenta um bom prognóstico de orientabilidade, com um nível de maturidade adequado pois percebemos que busca libertar-se dos vínculos de dependência, já discrimina o Eu do Não eu ao aceitar a solidão de uma escolha sem influências, necessitando ainda integrar os opostos numa síntese pessoal e elaborar os lutos pelo que terá que deixar, aspectos que poderão ser trabalhados no processo de O.P. Sua forma de enfrentar os conflitos reconhecendo as dificuldades, buscando ajuda e aceitando a solidão da tarefa de resolve-las nos dá bons indícios quanto à estrutura de sua personalidade e às suas possibilidades de chegar a uma escolha por identidade ao final de um processo de orientação.

Caso 2: Sexo masculino, 17 anos, final do 2º ano do II Grau de uma escola particular. Refere já estar decidido quanto ao que vai fazer no vestibular: Arquitetura e Urbanismo, mas solicita "fazer os testes para ter certeza se é para isto mesmo que ele dá". E filho único, o pai é comerciante e a mãe não trabalha. Segundo ele os pais não têm qualquer interferência em sua escolha. O T.P.O foi aplicado como parte de um processo de Orientação Profissional iniciado no colégio e a partir de sua análise sugerimos, em atendimento individual onde complementamos os dados para o diagnóstico de orientabilidade, o encaminhamento para uma psicoterapia.

Lâmina I: Título: Um homem e uma mulher

Ana encontrou Paulo em um parque. Paulo era aleijado e Ana queria saber sobre seu problema, ele contou: disse que havia sofrido um acidente e que amputou parte da perna, ela riu da historia zombando dele e foi embora.

Lâmina II: A rejeição

Carlos não está sendo bem aceito pelo grupo, como ele sofre com isto. Ele é hemofílico e está com aids. Ele luta para viver e para que os outros o aceitem, mas antes que isto aconteça, Carlos morre.

Lâmina III: O Julgamento

André, um flagelado da seca, saqueou um supermercado na cidade de Cabrobó, e foi preso, sendo levado para a delegacia e julgado. Ele alegou ao juiz que o motivo da sua atitude foi apenas a fome mas mesmo assim ele foi condenado a 3 meses de prisão.

Lâmina IV: Devemos abrir nossos horizontes

Carla, em toda sua vida, não se preocupou com ninguém, não ajudou ninguém. Com isto as pessoas fizeram o mesmo e todas as portas estão se fechando para ela, mas apenas uma ainda está aberta: a indiferença das pessoas com Carla.

Comentário: Todas as estórias estão adequadas ao estímulo com linguagem correta e embora com diferentes temas, todas têm em comum os desfechos negativos e os sentimentos de rejeição e descriminação, indicando grande dificuldade em enfrentar os problemas.

Na primeira lâmina a identificação sexual não fica estabelecida claramente, mas a figura masculina aparece mutilada e a figura feminina é mais forte e zomba dele. Na segunda estória, a rejeição aparece por conta da Aids, doença que culturalmente é relacionada à sexualidade perversa, e a impotência aparece quando o personagem morre antes de poder lutar para ser aceito. Novamente a impotência do flagelado, que também é descriminado culturalmente, condenado pelo juiz, que não considerou seus motivos, o que remete à relação do sujeito com a figura de autoridade, vista como juiz que acusa, incapaz de escutar, irredutível na sua intenção de castigar. Questionamos se a necessidade que o aluno teve de afirmar que os pais não influenciavam em sua decisão não seria uma negação de tal percepção das figuras de poder. Na última lâmina vemos a incoerência entre o título "Devemos abrir nossos horizontes" e o conteúdo da estória onde todas as portas estão fechadas restando apenas a indiferença das pessoas, o que demonstra uma incapacidade de se ver no futuro. Novamente a identificação sexual está trocada, pois o personagem principal é feminino.

A partir dos dados projetados no T.P.O., consideramos que o aluno apresenta alguns problemas que vão além dos limites propostos pelos objetivos de um processo de orientação profissional. As ansiedades predominantes são referentes à auto imagem e o sentimento de impotência é tão intenso, " todas as portas estão fechadas" que não deixa espaço para uma escolha autônoma. Suas estórias sugerem dificuldades quanto à identificação sexual, com a castração evidenciada já na primeira lâmina tanto pela mutilação como pela atitude da figura feminina. Enquanto o luto pela bissexualidade não puder ser elaborado, nenhuma escolha profissional pode ser definida. Daí talvez o conteúdo das estórias abordar sempre a rejeição, a discriminação e a impotência. A própria escolha por Arquitetura que o aluno diz já ter feito mas que necessita de testes para ter certeza, pode ser uma tentativa de conciliação entre o lado técnico (associado ao masculino) e o artístico (culturalmente associado ao feminino).

Considerando os dados colhidos pelo T.P.O., o trabalho a ser desenvolvido com este aluno teria que ter um foco clínico, a nível de identidade pessoal e auto estima que só seria possível no âmbito da psicoterapia.

 

Conclusões

Os casos relatados contribuem para demonstrar de que forma o Teste Projetivo Ômega pode facilitar no diagnóstico em orientação profissional. Não podemos, entretanto, deixar de enfatizar o fato de que ele tem apenas um valor instrumental que possibilita o levantamento de hipóteses que precisam ser verificadas através da entrevista e outros recursos.

Nos processos de Orientação Profissional desenvolvidos em escolas de II Grau, o T.P.O., aplicado coletivamente em grupos de 12 a 15 alunos, mostrou-se um excelente instrumento de triagem, pontuando elementos que precisavam ser clarificados, através de encontros individuais antes de iniciarmos o processo de O.P. A análise formal nos fornece pistas quanto à organização do pensamento em seus aspectos cognitivos enquanto o tema escolhido, o conteúdo da estória, o desfecho e os sentimentos predominantes nos referem à dinâmica da personalidade do indivíduo.

Tenho utilizado o T.P.O. em diversas ocasiões na prática clínica com adolescentes como uma via de acesso a elementos inconscientes e obtido dados significativos para o andamento dos processos psicoterápicos.

Recentemente, junto com Luci de Hollanda, Chefe da Clínica Psicológica da Faculdade de Filosofia do Recife, desenvolvemos uma pesquisa qualitativa com alunos de 2º e 3º anos do II Grau de escolas particulares e públicas da Região Metropolitana do Recife, buscando identificar fatores que interferem na escolha, e o T.P.O., um dos instrumentos utilizados, tem contribuído para demonstrar, além dos aspectos acima citados, a influência dos fatores sócio econômicos nos diferentes tipos de instituição pesquisados.

As expêriências positivas que temos tido sempre que, utilizamos o Teste Projetivo Ômega ao longo de todos estes anos leva-nos a questionar por que esse recurso é tão pouco citado na literatura de Orientação Profissional

 

Bibliografia

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BOHOSLAVSKY, Rodolfo (1971). Orientação Vocacional — a estratégia clínica, São Paulo, Martins Fontes

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LUCCHIARI, Dulce H. (1992). Pensando e Vivendo a Orientação Profissional-  São Paulo, Summus Editorial.         [ Links ]

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