SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.3 issue2Expectativa do professor: implicações psicológicas e sociaisA formação dos conceitos de fração e de proporcionalidade a partir da Teoria Piagetiana author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Psicologia: ciência e profissão

Print version ISSN 1414-9893

Psicol. cienc. prof. vol.3 no.2 Brasília  1983

 

Aconselhamento psicológico e psicoterapia: auto-afirmação como determinante básico do comportamento humano

 

 

Oswaldo De Barros Santos

 

 

O autor relata suas experiências como Psicólogo Clínico, após ter trabalhado muitos anos no campo da Psicologia Industrial e na Orientação Vocacional. O livro ora publicado e esta comunicação refere-se a seu trabalho na Psicologia Clínica iniciado nos anos 60, depois de concluído seu curso de pós-graduação na Universidade de Columbia, nos Estados Unidos e após sua tese de doutoramento na Universidade de São Paulo.

Primeiramente, o autor comenta o longo caminho do diagnóstico para a ajuda psicológica e propõe a classificação dos métodos de aconselhamento e de psicoterapia em três categorias principais: 1) Métodos centrados no contexto sócio-cultural; 2) Métodos centrados no contexto pessoal; 3) Métodos mixtos e centrados no problema. Um capítulo especial é dedicado às idéias e técnicas rogerianas e um neo-rogerianismo é sugerido.

Partindo inicialmente da terapia centrada na pessoa, de acordo com as proposições de Rogers, o autor relata suas observações durante cerca de 20 anos. Tais observações o levaram a explorar um importante fato que ocorria durante a terapia: a maioria dos clientes atendidos para aconselhamento psicológico ou terapia, caminhava no sentido de um melhor bem-estar e produtividade na medida em que atribuíam a si mesmos e não a fontes externas ás causas de seus problemas e dificuldades. Nesse momento, uma questão importante foi levantada pelo autor: haveria algum fenômeno psicológico relacionado com o auto-conceito que poderia ser responsável pela redução de tensões e melhor ajustamento às condições de vida? Nesta faixa referencial foi observado, através dos anos, com todos os tipos de clientes, independentemente de seu status social ou econômico, que a melhora havida estava fortemente associada a alterações na sua auto-imagem, auto-estima, auto-conceito e auto-afirmação.

É óbvio que a conclusão não é nova. Todos os sistemas e teorias psicológicas a têm mostrado, inclusive Freud, Adler, Yung, Sartre, May, Rogers e muitos outros. Contudo, o ponto importante — que pode ser considerado como uma nova contribuição — é o papel da auto-afirmação no comportamento humano.

Para esclarecer essas idéias foi necessário rever alguns conceitos básicos sobre motivação. Seguindo essa linha, o autor chega a uma hipótese de que a auto-afirmação é um dos mais significantes determinantes do comportamento humano; talvez o fator preponderante, não considerado o campo biológico (necessidades naturais para sobrevivência).

A auto-afirmação é um fenômeno complexo; pode ser entendida como uma grande e variada revisão do Ego, tanto cognitiva como emocional, seguida pelo julgamento feito pela pessoa sobre si mesma (Eu Pessoal) e sobre sua adaptabilidade às expectativas externas (Eu Social). As bases do comportamento humano, isto é, as necessidades e os motivos que conscientemente ou inconscientemente estabelecem os alvos da atividade, excluídos os fatores puramente orgânicos, estariam concentradas nos conceitos sobre si mesmo e sobre seu papel na vida. Ser alguém reconhecido como pessoa seria um importante alvo, mesmo com limitações e falhas. Os exemplos podem ser encontrados diariamente em todas as formas do comportamento humano: crianças que desejam fazer coisas por elas próprias; adolescentes que tentam mostrar que já são crescidos; adultos que lutam pelo status e pelo poder. De outro lado, a experiência mais traumática parece ser o sentimento de ser ignorado, de não ter valor, esquecido ou colocado em lugar inferior em qualquer aspecto da vida; significa, também, o sentimento de ser incapaz diante dos valores e das expectativas sociais.

As conseqüências de tais observações durante anos podem parecer triviais: uma espécie de conclusão já conhecida e sem importância! Não obstante, o sucesso da terapia foi sempre associado à revisão do Eu (self) e à obtenção de um sentimento mais forte de auto-afirmação. O livro sobre o assunto e esta comunicação visa chamar a atenção para esse foco da vida emocional e indicar a possibilidade de se dar essa direção para uma nova compreensão do comportamento humano. Essa direção significaria, também, novos caminhos no processo terapêutico, tanto quanto em atitudes profiláticas em outros campos.

Muitas escolas filosóficas, especialmente os chamados movimentos humanísticos, o existencialismo e a anti-psiquiatria tem chegado por diferentes caminhos a conclusões similares. Muitas outras teorias e técnicas terapêuticas têm sugerido que o sentimento de valor pessoal, a auto-imagem e o auto-conceito tem significativa influência na terapia. Essa posição é mais sensível em Adler e Rogers. Mesmo o reforço, na teoria de Skinner, é de alguma forma ligado à idéia: o efeito de se ter completado uma tarefa pode ser em si mesmo uma forma de auto-afirmação. Embora muitas teorias tenham postulado algum efeito derivado do sentimento de auto-estima e auto-valor, não há teoria ou técnica que enfatize a auto-afirmação como o mais significante fator na existência humana e, como conseqüência, na terapia psicológica.

A principal contribuição do livro e desta comunicação a um congresso científico é esquematizada no seguinte: 1) A motivação humana é altamente influenciada pela auto-afirmação; esta concepção levanta a hipótese de ser a auto-afirmação o mais significativo determinante do comportamento; 2) Os melhores resultados com teorias e técnicas rogerianas e similares, têm sido encontrados, na experiência do autor, quando há ênfase na auto-afirmação, isto é, quando o Terapeuta e o cliente atuam na área cognitiva e emocional examinando, em conjunto, os sucessos e os fracassos através da vida, sem medos e ansiedades; quando ambos são capazes de conciliar o Eu pessoal (características e necessidades pessoais) com o Eu Social (características e necessidades grupais e sociais). 3) A estrutura psicológica torna-se mais forte na medida em que a pessoa se reconhece como um ser vivo bastante real, com características que lhe são próprias; quando é capaz de apreciar seu próprio território; quando se sente como alguém com suas próprias idéias e maneira de ser, aberta ao mundo, capaz db sentir, pensar, e agir em função de suas capacidades e limitações, sem sentimentos permanentes de perda ou de inferioridade.

Por enquanto somente há dados clínicos que suportam a hipótese. A contribuição agora apresentada provem da observação de centenas de casos atendidos durante cerca de 20 anos. Há grande necessidade de pesquisas nesse campo; tenta o autor, apenas, abrir um novo caminho, com uma fundamentação empírica, para expandir nossa compreensão da motivação humana. As conseqüências poderão ser de grande valor para o aperfeiçoamento dos processos terapêuticos tanto quanto para outros aspectos da vida. O autor dá vários exemplos relacionados com a família, a vida escolar, o trabalho e pessoas idosas.

 

 

O trabalho acima, apresentado ao XX Congresso Internacional de Psicologia Aplicada, realizado em Edimburgo, Escócia, de 25 a 31 de julho de 1982, representa, também, um resumo do livro recentemente publicado pelo autor e intitulado "Aconselhamento Psicológico & Psicoterapia — Auto-afirmação um determinante básico do comportamento humano" — (São Paulo, Livraria Pioneira, Editora, 1982).