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Psicologia: ciência e profissão

Print version ISSN 1414-9893

Psicol. cienc. prof. vol.7 no.2 Brasília  1987

 

ERRATA

 

 

Na edição n° 1/87, o artigo A Constituição como metacontingência, de João Cláudio Todorov, saiu publicado com parte do seu conteúdo "truncado", comprometendo a leitura e a compreensão do mesmo, devido a falhas técnicas na arte-final. Reproduzimos a versão correta que se refere à parte final (os seis últimos parágrafos) do artigo:

Este não é um trabalho sobre metacontingências e utopias, entretanto. Aos interessados, os trabalhos de Skinner sobre o assunto e disponíveis no Brasil estão no final deste texto7. Esperando ter esclarecido o que são metacontingências, vejamos agora a Constituição como metacontingência. A Constituição escrita de qualquer país traz, bem ou mal formuladas, metacontingências, algumas cerimonais, outras tecnológicas. A Constituição outorgada pela Junta Militar em 1969 tem metacontingências relacionadas principalmente ao processo cultural cerimonial, algumas já tradicionais em Constituições anteriores, como a que define a República como Federação de Estados, a que especifica o âmbito de ação das Forças Armadas etc. Mas mesmo a Constituição de 1969 prevê a possibilidade de metacontingências relacionadas ao processo cultural tecnológico, ao prever emendas, desde que aprovadas por dois terços do Congresso.

Neste momento histórico em que nós, como Nação, temos a oportunidade de rever a Constituição, redigir claramente as regras do jogo, convém refletir um pouco sobre quais são as metacontingências cerimoniais que queremos e quais são as mudanças de que necessitamos, a serem especificadas em metacontingências tecnológicas. Como deve organizar-se o Estado para evitarmos o abuso do controle cerimonial? Uma vez especificadas as metacontingências, como garantir a especificação das novas regras a serem aprendidas por todos, pois que afetarão o comportamento de cada um? Essas regras estarão contidas em leis, decretos, portarias, atos, resoluções, etc. Como orientar as diversas autoridades que assinarão essas regras? Respostas a essas questões são cruciais, pois de nada adiantará uma Constituição com objetivos nacionais bem formulados, consensualmente aceitos pela Nação, sem que a lacuna entre esses objetivos gerais e o comportamento individual de cada cidadão não for preenchida por um sistema de regras de relações sociais e interpessoais que privilegie o trabalho em detrimento da escamoteação, a produção e não a especulação, a saúde de todos por ser um direito de cada um, a educação crítica porque a Nação precisa de cidadãos pensantes, e assim por diante.

A oportunidade de redigir uma nova Constituição é também a oportunidade que o País tem de conscientizar o cidadão sobre a importância dessas questões e o papel de cada um no fornecimento de respostas. E, nesse ponto, a campanha eleitoral que resultou na composição do Congresso Constituinte pouco esclareceu o eleitorado. O papel a ser reservado às Forças Armadas, por exemplo, foi assunto de discussões nas antecâmaras do poder e recebeu alguma atenção da imprensa no primeiro semestre de 1986. A discussão parou, porém, após o 25 de agosto, com o pronunciamento firme do Ministro do Exército; a questão certamente não foi tema de campanha eleitoral; sobre a reforma agrária, como outro exemplo, não foram esclarecidas questões como: onde, quando, como, por quê ? Outro exemplo: qual o papel a ser reservado à iniciativa privada nas áreas de educação, saúde, transportes? Diferentes caminhos em cada uma dessas encruzilhadas levam a contingências incompatíveis e ao estabelecimento de metacontingências que englobam objetivos a longo prazo muito diferentes. Perdidas as oportunidades oferecidas pela campanha eleitoral, resta à sociedade civil, que de fato elegeu Tancredo e Sarney, acompanhar os trabalhos do Congresso Constituinte, reavivando a memória de nossos representantes.

A nova Constituição poderá ser sintética, à moda americana, ou detalhista, como o projeto da Comissão Afonso Arinos. Em uma Constituição de poucos artigos, os objetivos colocados são necessariamente gerais e abstratamente formulados. O projeto Arinos, por outro lado, exemplifica uma redação que pode especificar melhor esses objetivos. Os dois exemplos, é claro, representam apenas casos extremos. Para o que nos interessa neste artigo, uma Constituição muito sintética tem a desvantagem de ser tão abstrata que não possibilita a explicitação das metacontingências que abriga. Já uma Constituição quilométrica certamente descerá ao nível de especificar contigências que seriam mais propriamente matéria de lei ordinária.

Num caso ou no outro, as meta-contigências poderão ser predominantemente cerimoniais, e estaremos frustrando as expectativas da população e esfacelando o amplo acordo político que sustenta a transição para a democracia. Ou serão predominantemente tecnológicas, definindo as transformações sociais possíveis, sem a ruptura da vida social organizada. Neste segundo caso, de uma Constituição que especifique metacontigências tecnológicas, convém que a redação não se faça em termos puramente abstratos, do tipo "a educação é um direito de todos e um dever do Estado". Por mais amplo que seja o consenso sobre um objetivo tão geral, é exatamente por ser tão geral que se ficarmos nesse nível de abstração não estaremos apontando os caminhos para a educação brasileira.

A tarefa dos constituintes será das mais difíceis. Se não houver outro esforço nacional dirigido para garantir a democracia, definindo objetivos e os caminhos para atingi-los, corremos o risco de termos uma Constituição que resultará das pressões dos diferentes "lobbies" já articulados. Teremos então uma colcha de retalhos, certamente de curta duração.