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Psicologia: ciência e profissão

versão impressa ISSN 1414-9893

Psicol. cienc. prof. v.8 n.1 Brasília  1988

 

Autogoverno: uma alternativa educacional

 

 

Sérgio Antonio da Silva Leite

 

 

Quando jovens e adultos, vivendo em instituições sociais corretivas ou educacionais, não têm oportunidade de participar na elaboração das normas que regerão suas próprias relações, observa-se freqüentemente, como conseqüência, o desenvolvimento de todo um código informal de normas, paralelamente ao "código oficial" imposto. Esse código informal é que efetivamente controlará as relações da população institucionalizada, visto que foi elaborado com a participação efetiva de seus membros, sendo fruto, portanto, de suas necessidades reais. Vide o exemplo do que ocorre nas penitenciárias e antigos reformatórios.

A análise da literatura demonstra várias experiências educacionais, a maioria com jovens considerados "pré-delinqüentes ou delinqüentes", planejadas e desenvolvidas de acordo com o princípio acima exposto, as quais podem ser agrupadas sob o título de autogoverno. Neill planejou Summerhill com essas características; Empey relata resultados animadores no trabalho com "delinqüentes"; Phillips e Phillips desenvolveram em Kansas City (USA) procedimentos de autogoverno nos lares, conhecidos como Achievement Place.

Mas, sem dúvida, foi Makarenko, o grande educador russo, que melhor desenvolveu e refletiu sobre os fundamentos do auto-governo, a partir do seu trabalho com delinqüentes, na Colônia Gorky, no período pós-revolução; os seus Poemas Pedagógicos são leitura obrigatória para os atuais educadores que atuam com menores e adolescentes institucionalizados.

Em linhas gerais, o autogoverno é um procedimento institucional em que os jovens devem discutir e estabelecer todas as normas que regerão seus comportamentos e suas relações dentro e fora da instituição. Todas as experiências têm em comum a existência de uma instância (assembléia, conselho, reunião geral etc.) decisória, que se reúne sistematicamente, onde todos decidem sobre tudo. Contam com a participação de educadores muito bem preparados, que participam fundamentalmente como instigadores e animadores do grupo. No entanto, sua opinião vale apenas um voto.

Esses autores relatam entusiasticamente os resultados: a situação de auto governo tem-se mostrado como uma grande alternativa no sentido de representar um processo eficiente que garante a aprendizagem dos princípios sociais básicos para as relações humanas, como a questão dos direitos e deveres, o respeito às necessidades coletivas e aos direitos individuais, desenvolvimento da noção de justiça e a própria questão da necessidade da organização grupal para o enfrentamento dos problemas comuns. Neste sentido, é fundamental a questão do tempo para o desenvolvimento do processo.

Pode-se perceber, no entanto, que uma das condições fundamentais para o sucesso da proposta é que os educadores estejam plenamente convictos dos seus pressupostos filosóficos subjacentes, os quais implicam não só a proposta educacional, mas principalmente uma determinada concepção de Homem e de Mundo coerente com a mesma. No autogoverno, a questão central é a idéia de que a solução para os problemas humanos não está a nível individual, mas sim a nível do coletivo, e neste sentido é uma proposta educacional concreta, que não fica só no discurso.

Outra condição fundamental é que o autogoverno implica uma outra maneira de se pensar a instituição, pois coloca efetivamente o educando como centro do processo e, de novo, concretiza a idéia indo muito além do nível do discurso.

Em suma, o autogoverno representa uma condição educacional muito rica não só para os jovens e adolescentes, mas também para os educadores que a desenvolvem.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

MAKARENKO, A. S. The road to life. Moscow, Foreing Language Publishing House, 1953.        [ Links ]

MAKARENKO, A. S. Poema Pedagógico V 1/2. São Paulo, Brasiliense, 1985.        [ Links ]

EMPEY L. T. The provo experiment: a brief review, California, Youth Studies Center, University of Southern, 1966.        [ Links ]

PHILLIPS, E. L. Achievement Place: token reinforcement procedures in a homesryle rehabilitation setting for "pre-delinquent" boys. Journal of Applied Behavior Analysis 1968, 1, 213-223        [ Links ]

NEILL, A. S. Summerhill. New York, Hart Publishing, 1960        [ Links ]