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Psicologia: ciência e profissão

versão impressa ISSN 1414-9893

Psicol. cienc. prof. v.9 n.3 Brasília  1989

 

EDITORIAL

 

 

A presente edição da revista Psicologia-Ciência e Profissão é dedicada à área da Educação, apresentando trabalhos produzidos por psicólogos e educadores brasileiros. As razões parecem óbvias: a Psicologia enquanto ciência tem produzido conhecimentos de indiscutível importância para a Educação; além disto, muitos profissionais têm atuado tradicionalmente como psicólogos escolares ou, como defendem alguns, como psicólogos que atuam na área da Educação, ou, mais modernamente, como trabalhadores da Educação.

Neste sentido, é esclarecedor analisar os dados apresentados no livro Quem é o Psicólogo Brasileiro, produzido pela CFP, para se entender a situação dos profissionais que atuam na área. Na pesquisa retratada pelo livro, a área é denominada como Psicologia Escolar.

No Brasil, 14,7% da categoria inseriram-se no mercado de trabalho como psicólogos escolares (1º emprego). No entanto, 32,6% de todos os psicólogos já passaram pela área, atuando profissionalmente nela. Examinando o quadro atual da atuação profissional dos psicólogos, cerca de 16,5% da categoria exerce alguma atividade na área, dos quais 11,7% consideram a psicologia escolar como área de atuação principal. Na distribuição geral, é a terceira área de atuação, superada pela clínica (55,3%) e organização (19,2%) e seguida, em quarto lugar, pela docência (6,6%).

Observando-se apenas estes dados, tem-se a impressão de que a Educação já seria um campo bem estabelecido de atuação para os psicólogos brasileiros. No entanto, a realidade não é bem assim. Analisando-se a trajetória dos profissionais na área, observa-se que dos que aí iniciam (lº emprego), 50,2% saem, buscando melhor emprego (26,2%), melhores condições de trabalho (24,1%), melhores salários (21,3%) ou simplesmente buscando outra área (10,6%). Dirigem-se para a clínica (56,7%), docência (20%) ou organização (12,7%).

Ainda tomando-se como base o 1º emprego, apenas 38,5% continuam exercendo alguma atividade como psicólogos escolares, dos quais 60% terminam realizando a famosa "dobradinha" com outras áreas. Ressalte-se ainda que 30% dos que atuam na Educação declararam-se insatisfeitos.

Em outras palavras, os s dados demonstram que a Psicologia Escolar tem sido muito mais uma área de passagem para a maioria dos profissionais que se inserem no mercado, ou seja, tem se caracterizado como um "trampolim para áreas mais nobres".

Resta finalmente analisar o que fazem os psicólogos escolares. A pesquisa identificou 16 diferentes atividades, descritas em seguida numa ordem de freqüência decrescente: 1) orientação psicopedagógica, 2) orientação de pais (ambas em torno de 40%), 3) atendimento a distúrbios de aprendizagem (em torno de 30%), 4) aconselhamento psicológico, 5) aplicação de testes, 6) psicodiagnóstico (todas citadas por 20 a 30% dos profissionais), 7) reeducação psicomotora, 8) acompanhamento de pessoal, 9) planejamentos de projetos, 10) avaliação curricular, 11)  orientação sexual, 12) orientação vocacional, 13) treinamento de paraprofissional, 14) psicoterapia individual, 15) treinamento e 16) assistência materno-infantil (todas citadas por 10 a 20% dos psicólogos escolares).

Observe-se que, das 16 atividades citadas, 10 são também desenvolvidas pelos psicólogos clínicos. Poder-se-ia afirmar que do rol acima, as sete atividades mais freqüentemente citadas seriam típicas do exercício profissional dos psicólogos clínicos. Além disto, as atividades exclusivas, citadas somente pelos psicólogos escolares, são avaliação curricular, assistência materno-infantil e, provavelmente, planejamento de projetos educacionais, citada cada uma por 15% dos psicólogos.

Se, de um lado, poder-se-ia justificar este quadro dizendo que há atividades que pela sua natureza podem ser úteis para os psicólogos nas diferentes áreas de atuação, pode-se também concluir que há poucas atividades específicas que caracterizam o exercício da psicologia escolar. Isto sem discutir se tais atividades seriam de caráter efetivamente educacional.

Não cabe aqui aprofundar tal análise. No entanto, algumas conclusões gerais podem ser tiradas deste conjunto de informações apresentadas pela pesquisa realizada pelo CFP. A principal delas é que a Educação, por várias razões, ainda não se firmou como uma área de atuação profissional efetiva para os psicólogos e a maior parte do trabalho aí realizado, é desenvolvido à luz e sob a influência da psicologia clínica.

Eis, portanto, um dos desafios que ainda se colocam para a Psicologia, enquanto profissão, no Brasil: a construção de modelos de atuação efetivamente educacionais, que possibilitem aos educadores e usuários do sistema escolar usufruírem das contribuições inegáveis que o conhecimento científico acumulado pela Psicologia pode oferecer".