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Psicologia: ciência e profissão

Print version ISSN 1414-9893

Psicol. cienc. prof. vol.28 no.1 Brasília Mar. 2008

 

EXPERIÊNCIAS

 

Expressão artística e teleatendimento: perspectivas para a melhoria de qualidade de vida no trabalho

 

Artistic expression and call center: perspectives to improve the quality of work life

 

 

Renata Marques Rego*

Pontifícia Universidade Católica de Campinas

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente trabalho relata uma experiência cujo objetivo é melhorar a qualidade de vida no trabalho de profissionais da área de atendimento telefônico utilizando práticas de arteterapia. A presença da arte nas organizações possibilita o resgate do lúdico e do abstrato em ambientes racionais, onde a emoção, a fala e os gestos são freqüentemente controlados e comedidos. O trabalho é desenvolvido em encontros semanais com grupos de aproximadamente oito pessoas, nos quais questões que permeiam a rotina dos funcionários são abordadas através de vivências com pinturas, desenhos, música, literatura, colagens, modelagens e criações a partir de sucatas. O autoconhecimento e a expressão proporcionados pelas vivências arteterapêuticas, além de melhorar a qualidade de vida e contribuir para a diminuição do estresse ocupacional, acaba por beneficiar os clientes que procuram o serviço de teleatendimento.

Palavras-chave: Arteterapia, Qualidade de vida no trabalho, Teleatendimento, Organizações.


ABSTRACT

This study relates an experience with the purpose of improving the telephone operator’s quality of work life through therapeutic art practices. The presence of art in organizations allows the recover of playful and abstract experiences in rational environments, where emotion, speech and gestures are frequently moderated and restrained. This work consists in weekly meetings with groups of about eight participants each, with the aim to discuss the work routine through experiences with paintings, drawings, music, literature, paste-up, modeling and creations with scraps. The self-knowledge and the expression provided through art therapy improves the quality of life, reduces the occupational stress and enhances the customer satisfaction.

Keywords: Art therapy, Quality of work life, Call center, Organizations.


 

 

“Toda instituição é o meio pelo qual os seres humanos podem se enriquecer ou se empobrecer e se esvaziar como seres humanos” (Bleger, 1989, p. 40).

É notável, nos dias atuais, a insatisfação dos trabalhadores com suas condições de trabalho. O descontentamento é gerado por diversas situações que passam pelas condições físicas de trabalho, remuneração e benefícios, sem falar nas condições psicológicas, que parecem se deteriorar, fato que pode ser observado frente ao crescente número de processos trabalhistas por assédio moral.

Os diferentes movimentos enfrentados pelo mercado de trabalho confrontam o trabalhador com uma série de paradoxos. Na década de noventa, os programas de qualidade, melhoria contínua, reengenharias e downsizing marcaram uma nova estruturação organizacional. Os avanços tecnológicos caminham a passos largos, e cada vez são colocados menos funcionários para executar as mesmas atividades de trabalho. Ao mesmo tempo, as pessoas dedicam cada vez mais tempo ao trabalho e queixam-se de não terem tempo para si próprias. O trabalho torna-se, assim, um fim em si mesmo.

A pressão pela produtividade e o fantasma do desemprego conduzem, pouco a pouco, à exclusão da expressão dos sentimentos, expectativas e projetos pessoais do ambiente de trabalho.

 

A arte entrou na empresa? Diálogos entre arteterapia e gestão de pessoas

Frente a esse panorama, os profissionais que atuam na área de saúde mental do trabalhador e de recursos humanos têm como desafio a recuperação do espaço do humano, com a reintegração das dimensões pessoal e profissional no trabalho. Recuperar o aspecto humano vai além da garantia de remuneração e de benefícios compatíveis com o mercado. É necessário dar oportunidade ao contato verdadeiro com o outro, consigo próprio, com a espontaneidade, com a arte e com a espiritualidade, inerentes ao viver.

Ciornai (2005) aponta o fato de a criatividade e as atividades artísticas poderem ser facilitadoras e catalizadoras do processo de resgate da qualidade de vida. A arteterapia seria um caminho para que o indivíduo descobrisse possibilidades de expressão, reconfigurando, através de técnicas e materiais artísticos, suas dificuldades de relacionamento com o outro e com o mundo.

A vantagem da utilização da arteterapia em organizações é a possibilidade do resgate do lúdico e do abstrato em ambientes estritamente racionais, onde a emoção é controlada e a fala e os gestos são comedidos. A expressão artística promove o relaxamento e a dedicação dos indivíduos a um momento para si próprio dentro do espaço de trabalho, sem cobranças ou julgamentos, e conduz ao contato consigo mesmo e com seus pares. A convivência grupal no ambiente organizacional tem se mostrado bastante benéfica, considerando não ser raro grupos de trabalho conviverem mais de oito horas por dia durante anos e desconhecerem suas histórias de vida.

Neste trabalho, a utilização da arte não tem como foco a formação de artistas plásticos, e sim, a prática de um conjunto de atividades artísticas que têm como objetivo a promoção do bem-estar e o controle do estresse ocupacional.

 

Qualidade de vida

A Organização Mundial da Saúde define qualidade de vida como a percepção que o indivíduo tem sobre a sua posição na vida no contexto da cultura e dos sistemas de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações (WHOQUOL Group, 1995). A partir dessa definição, Lino (2004) conclui que qualidade de vida é um conceito amplo, e é influenciado pela saúde física, pelo estado psicológico, pelas relações sociais, por características do ambiente e por crenças e valores individuais.

Para Zahn (1992), a qualidade de vida pode ser definida em termos da percepção do indivíduo sobre a satisfação com as suas experiências de vida. A autora afirma, ainda, que a cultura, juntamente à história pessoal, à situação social e à idade, interferem na percepção do significado da qualidade de vida. Com essas contribuições, ela acrescenta a percepção subjetiva e individual na definição do conceito, além dos já reconhecidos indicadores objetivos, como a saúde física e o estado socioeconômico, entre outros. Ferrans e Powers (1985) afirmam que os indicadores objetivos têm como função medir recursos ou estados que influenciam a qualidade de vida, enquanto os indicadores subjetivos avaliam a experiência de vida.

 

Qualidade de vida no trabalho

A diversidade de definições para qualidade de vida no trabalho (QVT) levou Guimarães et al. (2004) a afirmar que é como se existissem várias qualidades de vida no trabalho, algumas possivelmente complementares e não excludentes, outras, muitas vezes inconciliáveis e contraditórias. Neste trabalho, QVT é entendida como a experiência de bem-estar que é secundária à percepção de equilíbrio entre as demandas ou cargas de trabalho e os recursos (psicológicos, organizacionais e reacionais) disponíveis para enfrentá-las.

Walton (1973) propôs uma das mais completas definições para QVT ao introduzir a noção de equilíbrio entre os objetivos organizacionais e os do trabalhador. Nessa teoria, são detalhadas oito categorias necessárias para contemplar a QVT, a saber:

• remuneração justa e adequada;

• condições de trabalho;

• desenvolvimento de capacidades;

• oportunidade de crescimento;

• integração social;

• constitucionalismo (salvaguarda dos direitos trabalhistas);

• equilíbrio entre vida e trabalho;

• relevância social do trabalho.

 

Condições psicológicas do trabalho de atendimento telefônico

Os serviços de teleatendimento ou call center conquistaram, nos últimos anos, seu espaço nos organogramas das empresas como o seu “cartão de visitas”, por se tratar do primeiro e, muitas vezes, único canal de comunicação do cliente com a empresa. À medida que esses serviços crescem, cresce também a demanda por atendimento. Em contrapartida, a pressão por produtividade, isto é, pelo aumento do número de atendimentos, reduz a qualidade de vida de seus trabalhadores, considerando as condições a que usualmente esses profissionais estão submetidos. Não é incomum a existência de “fraseologias”, isto é, discursos-padrão que devem ser utilizados para responder às demandas do cliente, controle do tempo e gravação das chamadas, o que conduz à redução da autonomia, à padronização do agir e à limitação do pensar. O treinamento preparatório para exercer as atividades de atendimento freqüentemente é composto por estratégias que estimulam a impessoalidade e a omissão, e, finalmente, quando esses profissionais iniciam a prática do atendimento, a relação com o cliente é marcada por impotência do lado do primeiro e descrédito, do segundo, uma vez que o papel do atendente é registrar e, em alguns casos, orientar ou encaminhar. Raras são as situações de resolução de problemas nesse primeiro contato.

 

Objetivos do trabalho

• Promover a melhoria da qualidade de vida oferecendo aos profissionais oportunidades de crescimento pessoal e profissional;

• Desenvolver estratégias de enfrentamento do estresse decorrente do trabalho;

• Melhorar o relacionamento da equipe;

• Prevenir ausências e afastamentos por doenças originadas no trabalho.

 

Justificativa

A necessidade de intervenção foi identificada e solicitada pelos gestores da área frente aos casos de afastamento e da alta rotatividade de funcionários, aliado ao crescente número de trabalhadores que apresentavam sinais de estresse ocupacional e falta de motivação para o trabalho. Além disso, a equipe de atendimento argumentava necessitar de um espaço para trabalhar as dificuldades da rotina de atendimento telefônico frente a demandas tão diversificadas e para trocar experiências com os colegas de trabalho.

Caracterização da empresa e da área de trabalho

O serviço de atendimento contava, no início deste trabalho, com 40 profissionais, divididos nas funções de atendimento direto aos cidadãos por telefone ou pessoalmente, funções de apoio para o monitoramento das chamadas, digitação, encaminhamento de demandas e abastecimento de informações e funções de supervisão do atendimento. Os clientes atendidos pelo serviço são os cidadãos da cidade em que foi desenvolvido o programa de qualidade de vida. O papel do atendente é ouvir as solicitações, sugestões e reclamações, registrá-las e, quando possível, efetuar orientações e encaminhamentos sobre recursos de utilidade pública da cidade.

 

 

Procedimentos para o desenvolvimento do trabalho

Para a identificação das necessidades de trabalho, foram realizados os seguintes procedimentos diagnósticos:

• Entrevistas semi-estruturadas em grupo e individuais com todos os funcionários da área, inclusive com os gestores;

• Questionário de qualidade de vida profissional - QVP – 35 (Cabezas, 1998): validado e utilizado amplamente, possibilita uma avaliação multidimensional da percepção que o trabalhador tem das condições do seu trabalho (apoio organizacional, motivação intrínseca, carga de trabalho e autopercepção sobre a qualidade de vida no trabalho). É composto por 35 perguntas fechadas, que devem ser respondidas em uma escala de um a dez (Martín et al., 2004).

Resultados do questionário de qualidade de vida profissional - QVP-35

 

 

 

 

Discussão

Os resultados revelam um alto número de funcionários que afirmam sentir estresse no trabalho e que se sentem pouco apoiados pela organização e pelos supervisores. Em contrapartida, ao continuar a análise dos resultados, encontraremos um alto número de funcionários que se dizem motivados, com qualidade de vida e habilidade para administrar sua carga de trabalho, além de satisfeitos e orgulhosos do mesmo. Portanto, parte considerável dos funcionários se sente, ao mesmo tempo, sem o apoio esperado do ponto de vista da gestão organizacional e com qualidade de vida no trabalho.

Ao confrontarmos esses dados, podemos levantar como hipótese explicativa para essa aparente contradição o fato de que, além da satisfação com aspectos como a remuneração superior ao mercado de trabalho e com a carga horária de seis horas por dia, o reconhecimento da importância do próprio trabalho para a vida de outras pessoas, isto é, a relevância social do trabalho parece atuar nesse caso como um fator de proteção da saúde mental desses trabalhadores.

 

Desenvolvimento do programa de qualidade de vida

O programa de qualidade de vida consistiu na realização de grupos semanais, com uma hora de duração e com aproximadamente oito participantes por grupo, não sendo obrigatória a participação dos funcionários. A partir dos temas identificados na fase de levantamento de necessidades, foram realizadas propostas de práticas arteterapêuticas. Assim, através de técnicas de expressão artística como pinturas, desenhos, música, literatura, colagens, modelagens e criações a partir de sucatas, foram exploradas as vivências dos participantes com questões como relações humanas na equipe de trabalho e com os clientes, auto e heteropercepção, paradigmas e pré-conceitos, limites individuais e organizacionais, expectativas sobre o comportamento profissional e mudanças no contexto organizacional, conflito e negociação, comunicação e feedback, perspectivas de crescimento profissional, projeto de vida e atualizações sobre o mercado de trabalho.

As vivências propostas foram trabalhadas a partir da atribuição de significados e sentidos pelo próprio autor das criações artísticas, e, quando autorizado por este, os trabalhos puderam ser ressignificados pelo grupo, sob a mediação do facilitador.

O papel do facilitador foi desempenhado pela psicóloga responsável pelo Programa de Qualidade de Vida, e foi concretizado pelas seguintes ações:

• Planejar e executar propostas de práticas arteterapêuticas;

• Estimular a criação espontânea sem a preocupação com julgamentos estéticos;

• Estimular e acolher a expressão dos sentimentos vivenciados durante a criação;

• Facilitar e mediar as relações interpessoais no grupo.

A título de ilustração, serão descritas apenas algumas das vivências propostas no desenvolvimento do Programa de Qualidade de Vida.

 

Vivência os motivos do lobo:

O que foi proposto?

Foi realizada junto aos grupos a leitura da sinopse da adaptação do poema Os motivos do lobo, de Rubem Dário (ANEXO 1), e foi proposta a continuidade da história pelos participantes através de desenho ou pintura a dedo com guache em papel A3. Em seguida, os participantes foram convidados a compartilhar com o grupo a continuidade das histórias através de suas produções.

O que foi criado?

Parte dos participantes continuaram a história sem delimitar um fim, e outros a finalizaram. Na maior parte das histórias, São Francisco aparece como “ponte” que personifica o esforço de integração entre o que os participantes denominaram de lado “humano” e lado “animal” ou “instintivo” da história. A maioria dos desenhos ou pinturas traz imagens que separam a história em três partes - povoado, lobo e São Francisco – as quais não necessariamente se interligam nos relatos dos participantes sobre a atribuição de sentido às suas imagens. Poucos participantes atribuíram continuidade ou final às histórias em que o povoado, o lobo e São Francisco convivem pacifica ou harmoniosamente.

O que foi explorado?

Foram relatadas vivências de medo, desilusão, fé e esperança sobre questões como natureza humana, dualidade bem x mal e certo x errado, convenções culturais que influenciam julgamentos, diferenças entre as escolhas e identidades assumidas individualmente e em grupo, violência e livre arbítrio. Alguns grupos abordaram, ainda, a forma como as questões discutidas afetam suas relações cotidianas com os clientes e com a equipe.

 

Vivência reciclagem:

O que foi proposto?

Os participantes foram convidados a se lembrar de um cliente que tivesse marcado sua experiência profissional, e, em seguida, a confeccionar com sucatas (embalagens de papel, plástico e materiais reutilizáveis) um presente para o mesmo. Após as produções, os participantes compartilharam com o grupo suas criações e experiências com o cliente.

O que foi criado?

Alguns dos participantes elegeram clientes que lhes proporcionaram algum ensinamento para a vida pessoal ou profissional, e confeccionaram para eles presentes que simbolizavam agradecimento e confraternização. Outros participantes pensaram em clientes que lhes trouxeram sentimentos de impotência, raiva ou medo, e, nesses casos, foram confeccionados objetos que para alguns simbolizavam a catarse de sentimentos negativos e a possibilidade de revanche. Outros, ainda, confeccionaram presentes como forma de agradecer o crescimento proporcionado por experiências negativas junto ao cliente.

O que foi explorado?

Os participantes foram convidados a relatar o que diriam aos clientes caso pudessem entregar-lhes pessoalmente o material confeccionado. Foram trocadas experiências sobre situações de descontrole emocional e expressão de afetos (positivos e negativos) pelos participantes, além de dificuldades em lidar com a vivência emocional do outro e com os próprios sentimentos despertados na relação entre cliente e profissional. Alguns grupos relacionaram a experiência da reciclagem de materiais com o que denominaram de “reciclagem de sentimentos”.

 

Vivência monstros:

O que foi proposto?

Cada participante foi convidado a criar um monstro através de colagens, desenho ou pintura, e, em seguida, apresentar seu monstro ao grupo.

O que foi criado?

Foram criados monstros de diferentes tamanhos, cores, materiais, em diferentes posições e com diferentes significações.

O que foi explorado?

Todos os grupos abordaram as diferenças interpessoais no que diz respeito aos medos, estratégias de enfrentamento e resolução de problemas. Alguns participantes enfocaram a influência dessas diferenças sobre questões profissionais, como o contato com os clientes, a maneira como os atendimentos são efetuados e como as orientações e regras são seguidas pelos membros da equipe individualmente. Outros participantes enfocaram as diferenças interpessoais para lidar com questões familiares e de relacionamento fora do ambiente de trabalho.

 

Vivência confecção de um mural coletivo - adaptação do mural grupal (Liebmann, 2000, p. 92):

O que foi proposto?

Foi solicitado aos participantes que trouxessem fotos ou objetos que tivessem significados importantes em sua história pessoal. Após uma breve retrospectiva da história do grupo durante o ano, que foi marcada por grande rotatividade de funcionários e por diversas mudanças organizacionais, os participantes foram convidados a montar um mural e/ou uma exposição com as fotos e os objetos trazidos.

O que foi criado?

Todos os grupos optaram por realizar uma exposição de fotos e de objetos. As pessoas que haviam se esquecido de trazer os materiais solicitados de suas casas escolheram objetos disponíveis em seus pertences (nas bolsas ou nas estações de trabalho) que possuíssem significados pessoais. Alguns grupos juntaram o material trazido para a montagem da exposição. Outros dispuseram as fotos e os objetos sobre uma mesa, escreveram comentários e desenharam ao redor dos mesmos.

O que foi explorado?

Os participantes contemplaram a exposição produzida, compartilharam as histórias e os significados das fotos e objetos trazidos. Alguns grupos foram além da coleção de histórias individuais e integraram os fragmentos com a história do próprio grupo.

Foi possível observar que, ao propor as vivências, alguns dos participantes expres savam, inicialmente, alguma resistência, com o argumento de não possuírem talentos artísticos, especialmente quando eram convidados a desenhar. Tal resistência foi manifestada pelos mesmos integrantes em diferentes situações, os quais, freqüentemente, propunham a livre reflexão sobre o tema, sem a mediação das técnicas de expressão artística.

Em geral, após o facilitador estimular a expressão espontânea sem a preocupação estética, os participantes iniciavam a sua criação, porém eram respeitados quando não desejavam participar das vivências.

Além das já conhecidas resistências que conduzem à tendência à intelectualização da experiência e das dinâmicas psicológicas inerentes a qualquer tipo de trabalho com grupos, é importante considerar que as pessoas possuem diferentes habilidades e interesses, o que influenciará a sua disponibilidade para o trabalho com práticas arteterapêuticas.

 

Resultado do Programa de Qualidade de Vida

Após o primeiro ciclo de seis meses de trabalho, foram realizadas avaliações quantitativas e qualitativas em relação à percepção dos participantes e dos gestores sobre a eficácia do trabalho para a melhoria da qualidade de vida profissional. Segue abaixo a transcrição de comentários da avaliação:

Aplicabilidade do conteúdo das reuniões ao trabalho:

(as reuniões do Programa de Qualidade de Vida) “fazem você se conhecer melhor e ajudam a desenvolver seus dons, talentos”. Tudo o que é discutido nas reuniões tem a ver com as relações do ser humano em sociedade, e é exatamente isso o que fazemos o dia todo: nos relacionamos com a sociedade em que vivemos”.

(As vivências do Programa de Qualidade de Vida) “melhoram a forma de se expressar, melhoram relacionamentos, ajudam na exposição de problemas para encontrar soluções”.

Importância da continuidade do trabalho:

“Problemas simples (relacionados às relações e às rotinas de trabalho) ficavam sem resolução, pois sequer tínhamos a consciência de que existiam. É uma forma de desabafar todos os problemas que acontecem com a gente e procurar maneiras de enfrentar esses problemas sem se desgastar tanto”.

“O programa ajuda na auto-estima”.

“Muito importante, pois é um momento de rever as atitudes, melhorar como pessoa e funcionário, e por isso se reflete no trabalho”.

Objetivos do programa

100% dos participantes consideram que os objetivos do programa foram atingidos totalmente.

Estratégias utilizadas

80% dos participantes consideram as estratégias muito boas, e 20% as consideram boas.

Avaliação do gestor e supervisores da área: Consideram fundamental a continuidade do trabalho. Após o início do desenvolvimento do Programa de Qualidade de Vida, identificaram a ampliação das habilidades de enfrentamento do estresse da rotina de atendimento.

Na avaliação qualitativa realizada com os gestores após um ano de trabalho, foi solicitada a ampliação do Programa de Qualidade de Vida a outros serviços de atendimento e a implantação de reuniões mensais para a realização de sugestões de melhoria para o trabalho e feedback sobre o desempenho dos gestores.

 

Considerações Finais

A arteterapia e a atuação na área de saúde mental do trabalhador têm em comum necessidades de crescimento e de conquista de espaços. Este trabalho possibilitou a verificação dos frutos desse casamento ainda pouco usual. Abre-se, portanto, uma nova possibilidade de atuação para ambos, arteterapeutas e profissionais que trabalham na promoção da saúde mental do trabalhador, e uma nova alternativa de prevenção contra o sofrimento no trabalho.

Dejours (1992), um dos principais teóricos que discutem a psicopatologia do trabalho, fala sobre a importância da reconstituição dos “espaços de palavra” para a sublimação do sofrimento humano nas organizações. A experiência de trabalho aqui apresentada permite ampliar a noção de “espaços de palavra” para a importância da criação de espaços de expressão e de contato humano dentro das organizações.

 

Referências

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Dario, R. (1949). Obras completas (p. 249). Buenos Aires: Edições Anaconda.        [ Links ]

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Endereço para correspondência
R. Major Sólon, 648,
13024-091, Campinas, SP, Brasil.
E-mail: renatamarquesrego@yahoo.com.br

Recebido 20/12/06
Reformulado 23/04/07
Aprovado 26/05/07

 

 

* Psicóloga, mestranda em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas.