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Psychê

versão impressa ISSN 1415-1138

Psychê v.9 n.15 São Paulo jun. 2005

 

ARTIGOS

 

Perfil e saúde mental de psicanalistas1

 

Profile and mental health of psychoanalysts

 

 

Déborah Pimentel*I; Maria Jésia Vieira**II

*Círculo Psicanalítico de Sergipe
**Universidade Federal de Sergipe

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Trata-se de uma pesquisa exploratória descritiva, utilizando um questionário com 69 questões abrangendo: características sócio-econômicas; investimento profissional; condições de trabalho; sexualidade, vida familiar e social; uso abusivo de álcool e drogas; estado geral de saúde; stress e sofrimento psíquico. Verificou-se, entre outros dados, predominância de mulheres entre 41 a 50 anos, satisfeitas com suas conquistas pessoais e profissionais, e investindo em estudos. Entretanto, foi evidenciada sobrecarga de trabalho, com exaustão física e indícios de sofrimento psíquico, revelados por meio de expressões psicopatológicas, psicológicas e comportamentais. Infere-se que estes profissionais necessitam atentar para os problemas que afetam sua qualidade de vida, investindo mais no cuidado consigo, uma vez que a condição de psicanalistas não os protege da dor e sofrimento.

Unitermos: Psicanalistas, Saúde mental, Perfil, Stress, Cuidado.


ABSTRACT

A descriptive exploratory search is employed using the instrument of a questionnaire applied to 69 subjects, ranging over social and economic characteristics: professional investment and work conditions; sexuality, family and social life; abusive use of alcohol and drugs; general state of health; stress and psychic suffering. We verified, among other data, the women’s prevalence, among 41 to 50 years, satisfied with their personal and professional conquests, and investment in studies. However, overworking was evidenced, eliciting physical exhaustion and indications of psychic suffering manifested by psychological symptoms and behavior expressions. It is inferred that these professionals have to pay attention to the problems that affect their life quality, and to invest more in the care with themselves, since their condition of psychoanalysts doesn’t protect them of pain and suffering.

Keywords: Psychoanalysts, Mental health, Profile, Stress, Care.


 

 

Introdução

Estudando a saúde mental dos profissionais de saúde, em uma amostra composta aleatoriamente de 1020 sujeitos, este artigo faz um destaque para o grupo de psicanalistas, considerando-o diferenciado pela singularidade de sua prática.

Acredita-se que seja relevante, para isto, contextualizar o panorama mundial de extrema violência e insegurança, no qual a vida confunde-se com a morte, sem espaço para as crenças e em que predomina o hedonismo, promovendo novas formas de subjetivação. Diante da imensa proliferação de terapias alternativas, em um sistema “self-service”, que prometem, a curto prazo, a felicidade, em detrimento da velha psicanálise, o psicanalista da atualidade sente-se e é percebido como um profissional liberal decadente. Sua situação agrava-se ao se somar à condição de crescente desvantagem financeira com relação aos colegas médicos de outras especialidades, embora sofrendo das mesmas dificuldades de outros profissionais da área de saúde, e que como todos os outros, tem que se submeter às mesmas leis econômicas, dependendo, inclusive, dos questionáveis planos de saúde.

O objetivo deste artigo é revelar o perfil de saúde mental dos psicanalistas, reconhecendo-o como elemento exposto à engrenagem da vida moderna, ao capitalismo e ao consumo desenfreado, que cobra dos cidadãos um estilo de vida competitivo; pretende identificar as condições de trabalho capazes de influenciar sua saúde mental, e ainda verificar a existência de desconforto e mal-estar.

 

Método

Utilizou-se para esta pesquisa o método epidemiológico descritivo quantiqualitativo, a partir de variáveis preestabelecidas.

Foi apresentado o questionário SMPS (Pimentel, 2004), auto-explicativo, para esses profissionais de saúde, e entre eles destacamos, para a construção deste artigo, os 52 psicanalistas que espontaneamente colocaram-se como sujeitos da amostra.

Este instrumento é constituído por 69 questões fechadas, que garantiram o total anonimato do entrevistado, e que foi devidamente analisado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Universitário da UFS–CEP/ HU/UFS.

Trata-se de um instrumento simples, prático, auto-aplicável, de fácil e rápido preenchimento, capaz de apontar características que levam a conhecer os profissionais da área de saúde de acordo com as variáveis sócio-econômicas e as condições pertinentes a seu trabalho e rotinas ocupacionais, e ainda reconhecer as condições de trabalho, o estilo de vida e as formas de adoecimento e sofrimento psíquico.

Os aspectos pesquisados foram: dados gerais de identificação e renda; investimento profissional e condições de trabalho; vida familiar e social; condições gerais de saúde; drogas, tabagismo e álcool; sexualidade e relacionamentos afetivos; avaliação de variáveis de ordem psíquica. Estes dados ofereceram condições para a construção de um perfil dos profissionais e apontam para sua qualidade de vida.

 

Resultados e discussão Dados gerais de identificação e renda

Os psicanalistas pesquisados atuam em diferentes regiões do país, 8% na Região Sul, 4% na Centro-Oeste, 12% na Nordeste, 2% na Norte e a maioria, 74%, está na Sudeste.

Os resultados revelam a predominância das mulheres (83%) no exercício da psicanálise como profissão. Estas, historicamente, sempre estiveram atreladas às tarefas domésticas; atribuições como higienizar, alimentar, cuidar estão vinculadas, desde os primórdios, ao trabalho escravo e religioso, envolvendo a figura feminina. Ferreira-Santos diz que “cuidar dos doentes, preparar os mortos e assistir às mulheres na hora do parto” (1973, p. 3) são funções específicas das mulheres, independentemente de qualquer formação profissional.

Dentre os pesquisados, 49% dos psicanalistas atuantes estão na faixa etária de 41 a 50 anos, 31% de 51 a 60 anos, 10% com mais de 60 anos, e 8% têm menos de 40 anos – esse dado reflete o longo investimento que é feito em sua formação. Quanto ao estado civil, 69% são casados, sendo que 54% estão no primeiro casamento e 15% estão na segunda ou terceira união.

Pesquisou-se o perfil desses profissionais na participação do orçamento doméstico. Apenas 31% assumem de forma total as despesas da casa. Surpreendentemente 25% não participam desse orçamento, o que sugere dependência de terceiros. Esses dados sugerem fatores que refletem um padrão de uma sociedade paternalista e protecionista a que muitas mulheres, maioria desses profissionais, acomodam-se.

Do total de pesquisados, 44% dependem dos planos de saúde para atender sua clientela. Nota-se que 81% estão satisfeitos com seus honorários, sendo que 69% parcialmente e 12% totalmente. Dado o fato que muitos não são provedores de suas casas, seus vencimentos passam a ser satisfatórios para atender às necessidades pessoais.

Compreende-se que a renda seja um dos indicadores da distribuição da população em classes sociais, e caracterização dos padrões de consumo; portanto, aqueles que estão satisfeitos com seus honorários manifestam-se satisfeitos com sua posição social. Em pesquisa de Batista (2003) foi encontrado que 82% da população manifestou-se como insatisfeita com seus honorários diante da carga horária exaustiva e das responsabilidades assumidas, embora declare que esses honorários provêm as suas necessidades básicas. Na presente pesquisa, apenas 15% da amostra declarou insatisfação com honorários.

Nessa amostra, 90% possuem casa própria e 86% possuem automóvel. Apenas 56% desses psicanalistas são proprietários de seus consultórios, 23% têm consultório alugado, sendo que 17% são alugados em parceria com colegas.

 

Investimento profissional e condições de trabalho

Quanto ao tempo de graduação, 34% estão entre 16 e 25 anos de formados, e igual percentual com mais de 25 anos. A maioria (56%) sente-se realizada profissionalmente, e 38% afirmaram que a realização profissional era parcial. Um percentual de 88% disse que se sentia bastante orgulhoso de si e de suas conquistas pessoais e profissionais, revelando uma auto-estima elevadíssima. Um percentual de 10% revelou que só muito raramente sentiase orgulhoso de si mesmo.

Declarou-se participante de sociedades ou grupos de estudos 82% da amostra. O psicanalista obrigatoriamente é um sujeito que investe em seu próprio processo terapêutico, buscando um contato com seu inconsciente, e na descoberta de uma identidade. A identidade do psicanalista está comprometida com um alto grau de integridade na procura da verdade, bem como com o compromisso moral para sua aceitação, qualquer que seja sua natureza. A entrada e a participação em uma sociedade de psicanalistas são fatores que favorecem a construção dessa identidade.

Quanto à pós-graduação, 75% investem em seus estudos, sendo que 52% fizeram especializações, 15% mestrado, 4% doutorado e 4% pós-doutorado.

Com relação às condições de trabalho, 65% dos psicanalistas são autônomos, 25% têm um único emprego e 6% possuem dois ou mais vínculos empregatícios. Somente 4% dos psicanalistas trabalham em regime de plantão e 65% trabalham diariamente de oito a doze horas por dia, traduzindo-se em excesso de carga de trabalho e levando ao cansaço e ao stress.

Trabalhadores pleiteiam, no mundo inteiro, uma carga horária de 35 horas semanais, conquista dos franceses há cinco anos (Veja, 2003). Entretanto, profissionais de saúde, em especial o médico, têm uma jornada média de 60h e não se vêem em condições de reduzi-la, sob pena de não cumprir o orçamento doméstico e suprir as necessidades familiares. O agravante é que por serem profissionais liberais, como os psicanalistas, na maioria das vezes sentem-se impossibilitados de se reconhecerem passíveis de adoecer, o que significaria deixar de produzir e que em sua percepção seria uma vergonha e sinal de fraqueza (Pitta, 1999).

Um total de 2% revelou que já sofreu denúncia nos seus conselhos regionais de classe, não existindo informações sobre os desdobramentos do fato e das causas que o promoveram; igual número preferiu deixar essa resposta em branco. Outro percentual que chama a atenção é o de 8% que disseram sentir-se freqüentemente obsoletos, ultrapassados e com dificuldades de se atualizarem; 48% relatou ter a mesma sensação, ainda que raramente.

 

Vida familiar e social

Do total da amostra, 73% têm filhos, o que implica em uma sobrecarga de trabalho e aumento de responsabilidades (67% têm dois ou mais filhos e 6% têm filho único). Entre aqueles que têm filhos, entretanto, apenas 60% envolvem-se efetiva e profundamente com eles, conhecendo seus amigos e acompanhando-os nas atividades escolares.

Em relação às férias, 58% sempre as planeja; entretanto, 13% não conseguiram planejar ou sequer gozá-las nos últimos dois anos, possivelmente pelo fato de serem autônomos e terem dificuldades de honrar compromissos financeiros, ou ainda por dificuldades de administrar os múltiplos vínculos e os sistemas de plantões.

Uma parcela de 21% raramente consegue sair e encontrar-se com os amigos. Apenas 15% se permitem dançar semanalmente, entendendo-se esta como uma atividade importante para avaliar a disponibilidade do sujeito em investir em lazer e em uma prática, que sendo prazerosa, eleva a auto-estima e aponta também para um bom nível de socialização.

 

Condições gerais de saúde

Inúmeras pesquisas apontam que os danos à saúde dos trabalhadores da saúde são decorrentes das características pertinentes às suas atividades e dos riscos ocupacionais a que estão expostos, e à forma da organização e das relações de trabalho.

No tocante a exames de saúde, 98% realizaram-nos nos últimos 12 meses; apenas um percentual de 29% não se preocupa em manter a saúde por meio de atividade física sistemática. Nesta pesquisa encontrou-se que 22% dos psicanalistas têm alterações da pressão arterial e apenas 19% fazem o seu controle medicamentoso. Um percentual bem alto sente dores de cabeça com freqüência (29%) e 58% fazem uso regular de medicação (analgésicos, principalmente).

 

Drogas, tabagismo e álcool

O Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas (CEBRID), da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP), fez um levantamento do consumo de drogas na população geral, com dados compatíveis com a incidência mundial de 1993: 6% a 10% têm problemas relacionados ao álcool e 25% ao uso do tabaco (Marques e Alves, 2002). Nenhum dos psicanalistas declarou fazer uso de drogas ilícitas, entretanto, 12% já trabalharam sob efeito de psicofármacos e 4% relataram o uso de analgésicos poderosos. Declararam-se fumantes 12%, informando o desejo de largar o cigarro.

Quanto ao uso de bebidas alcoólicas, 13% não bebem, 60% fazem-no raramente e em ocasiões especiais, e 12% formam uma fatia que aponta para o uso abusivo do álcool, sugerindo dependência alcoólica. Entre os que bebem, 42% consomem de duas a três doses e 6% mais de três; 18% confessaram que se embriagaram no último ano e 4% relataram ter trabalhado sob efeito do álcool.

 

Sexualidade e relacionamentos afetivos

Os relacionamentos afetivos e a sexualidade do ser humano, ao lado do enigma da morte, são os elementos que mais geram angústia, frustrações e sofrimento.Tornam-se fontes que oscilam rápida e freqüentemente do prazer à dor e sofrimento, provocando mecanismos de defesa e incitando a formação de sintomas.

A maioria dos psicanalistas, 98%, declarou-se heterossexual e 2% preferiu não responder à pergunta. Quando questionados sobre conflitos sexuais, 81% responderam que não os tinham e 19% deixaram de responder a questão o que coloca à mostra uma dificuldade de lidar com o tema, mesmo tratando-se de psicanalistas e sendo um questionário anônimo. Com relação à satisfação sexual, 96% sentem-se satisfeitos (sempre ou quase sempre) e apenas 4% raramente se realizam.

Quando foram questionados sobre a presença de distúrbios sexuais, 71% não responderam, reforçando a idéia do tabu em relação ao tema sexualidade; 16% apontaram para algum tipo de dificuldade. Entre estes, 2% informaram que sentem dor nas relações sexuais, 8% não conseguem atingir o orgasmo, 2% referiram impotência e 2% revelaram ter ejaculação precoce.

No tocante ao relacionamento afetivo, 29% admitiram infidelidade, mesmo tendo relacionamentos estáveis; 67% têm um relacionamento afetivo estável; 6% disseram ter uma relação afetiva insatisfatória; 4% têm uma relação aberta, sem compromisso de fidelidade; 6% revelaram pensar em separação e 17% afirmaram não ter relacionamento afetivo estável.

Quanto à freqüência das relações sexuais, 46% as mantêm uma vez por semana, 31%, têm relações duas a três vezes por semana, 17% admitiram ter uma vez no mês e 2% relataram como algo raro.

Em caso de sexo casual ou relacionamentos extra-conjugais, apenas 27% fizeram uso sistemático de preservativos, 10% usam algumas vezes, 4% raramente usam e 8% nunca fazem uso. Ainda com relação a esta pergunta, 49% deixaram de respondê-la e 2% afirmaram não ter este tipo de experiência, ou seja, 22% da amostra revelou ter comportamento de risco. Em relação à masturbação, 13% informaram que o fazem com freqüência, 23% afirmaram nunca fazê-lo e 62% que o fazem raramente.

 

Avaliação de variáveis de ordem psíquica

Em relação ao distúrbio do sono, 12% referiram-se a ele e 4% citaram ter pesadelos freqüentemente. Para lembrar tarefas e compromissos, 71% revelaram a necessidade do uso de agenda. No tocante à capacidade de concentração e realização de pequenos cálculos, 6% referiram-na comprometida discretamente.

Entre os pesquisados, 15% já tiveram algum distúrbio de percepção, e entre estes 2% relataram ter tido delírios, 10% já apresentaram sintomas da síndrome do pânico e uma parcela não negligente, de 6%, tem fobias. Um percentual de 42% destes profissionais sente-se ansioso ou estressado com freqüência.

Nesta pesquisa, 19% dos psicanalistas relataram ter constantes alterações de humor. Por outro lado, 79% dos pesquisados já apresentaram alguma vez sintomas de depressão, sendo que destes, 10% têm episódios freqüentes e 12% dos sujeitos da pesquisa alguma vez, ao menos, pensaram em suicídio.

Freud disse, em seu trabalho Análise terminável e interminável (1937), que toda pessoa normal é só aproximadamente normal. O conhecimento e a compreensão de si mesmo existem no psiquismo inconsciente de cada um, e no entanto, acham-se obstruídos pelas defesas neuróticas criadas a cada dia no nosso ego. Contra essas defesas internas um bom trabalho psicanalítico deve ser buscado constantemente, para dar instrumentos para este profissional conhecer-se e exercer sua prática sem contaminar ou deixar-se contaminar por seus analisandos.

Para exercer a função de psicanalista é fundamental que o sujeito saiba de si mesmo, submetendo-se a uma análise. A via privilegiada da formação é o divã, e só depois vem a formação teórico-prática. O trabalho de formação diz respeito a cada um, uma vez que a psicanálise só pode ser vivida na própria pele via ato analítico, que permite um encontro com o saber que escapa sempre na procura permanente do objeto causa do desejo.

Freud, no texto A questão da análise leiga, afirma que:

(...) todo aquele que quiser praticar a análise em outras pessoas se submeta ele próprio a uma análise. É somente no curso desta, quando ele realmente tem a experiência de que sua própria pessoa é afetada pelos processos afirmados pela análise, que adquire as convicções pelas quais é ulteriormente orientado como analista (1926, p. 226).

Neste mesmo texto, mais adiante, diz que “só um homem que realmente sabe, é modesto, pois ele sabe o quão insuficiente é o seu conhecimento” (p. 263).

No que tange à psicanálise e a especificidade de seu trabalho, a análise do psicanalista e a sua ligação com uma instituição é o que dará uma espécie de suporte para o sujeito, uma espécie de balizamento, haja vista a solidão do exercício profissional.

Quando questionados sobre tratamento psicanalítico, 86% responderam que fizeram ou estão fazendo por mais de 6 anos e 10% já estiveram em tratamento psiquiátrico, sendo que 2% ainda o mantêm.

 

Considerações finais

Segundo dados quantificados nesta pesquisa, foi possível traçar o perfil dos psicanalistas: sexo feminino, casamento estável, realizado sexualmente, entre 41 e 50 anos de idade, com dois filhos, provedor parcial das despesas domésticas, com casa, automóvel e consultório quitados, com mais de 16 anos de graduação, trabalhando de 8 a 9 horas por dia, na condição de autônomo.

Apesar da sobrecarga de trabalho e do cansaço, os psicanalistas têm disposição para investir na participação em grupos de estudos, a maioria tem especialização e raramente sentem-se obsoletos e ultrapassados.

Entre eles, 22% mantêm comportamento sexual de risco, sem uso de preservativos em relações sexuais casuais; a maioria apresenta instabilidade afetiva e muitos são infiéis.

A maioria mantém o hábito saudável das práticas de atividades físicas sistemáticas; sofre de dores de cabeça e tem alterações da pressão arterial.

Na análise dos resultados percebe-se que em alguns casos a sobrecarga de trabalho com exaustão física, as cefaléias, insônia, alterações de humor, aliados a determinada expressões psicopatológicas, psicológicas e comportamentais – tais como o uso abusivo do álcool, estados depressivos, fobias, ideações suicidas – podem estar associados a um sofrimento mental. Este, muitas vezes, é promovido pelo grande desconforto diante da desagradável sensação de desamparo que as frustrações, a dor e o sofrimento imprimem no seu cotidiano (Freud, 1929).

A psicanálise favorece uma compreensão sobre a conduta humana e seus inter-relacionamentos. Trabalha-se no campo das singularidades mesmo quando os sujeitos são confrontados com questões universais. Trata-se de um ofício que visa atingir o inconsciente. A análise de um psicanalista continua infinitamente com cada analisando, uma vez que a manutenção do desejo de saber o remete permanentemente à sua própria história e à sua condição de singular. O lugar ocupado pelo psicanalista não o protege do efeito das mazelas do cotidiano e do social ou daquilo que é dito pelo analisando, e muitas vezes atinge sua própria história edípica, reativando conflitos residuais, angústias e defesas. O exercício profissional de um psicanalista se registra na continuação de sua própria análise, que é essencialmente interminável.

Faz-se necessário lembrar que a análise não tem o objetivo de fazer com que o psicanalista não tenha pontos cegos ou que não faça sintomas. Não se pode pensar que com a análise as resistências desapareçam, que ele não sofra e não adoeça.

O psicanalista reconhece o lugar da falta como essencial a constituição do sujeito. O analista reconhece esse elemento, exatamente quando sua análise foi “bem feita”. Reconhece e se assujeita a esse irredutível. O analista continua resistindo, só que agora sabe que está resistindo e administra melhor sua vida e seus sintomas.

Esta pesquisa é só um alerta: psicanalistas são demasiadamente humanos2.

 

Referências Bibliográficas

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NIETZSCHE, Friedrich. Ecce Homo: como alguém se torna o que é. São Paulo : Companhia das Letras, 1995.        [ Links ]

PIMENTEL, D. Saúde mental dos profissionais de saúde. Dissertação (Mestrado em Ciências da Saúde). Universidade Federal de Sergipe. Aracaju, 2004.        [ Links ]

PITTA, Ana Maria F. Hospital: dor e morte como ofício. 3. ed. São Paulo : Hucitec, 1999.        [ Links ]

VEJA. Vidão em perigo. São Paulo : Abril. 42(1825): 63, 22/10/2003.        [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Déborah Pimentel
Praça Tobias Barreto, 510 / 1212–49015-130 – Bairro S. José
Aracaju/SE
tel: (79) 214-1948
e-mail:deborah@infonet.com.br

Maria Jésia Vieira
Rua A, 111 / Ed. Ibiza / 404–49025-000 – Jardins
Aracaju/SE
tel: (79) 217-0280
e-mail: mjvieira@infonet.com.br

recebido em 06/04/04
versão revisada recebida em 03/07/04
aprovado em 03/08/04

 

 

Notas

I Médica; Psicanalista; Membro Fundador do Círculo Psicanalítico de Sergipe (Unidade Federada do Círculo Brasileiro de Psicanálise).
II Enfermeira; Professora Adjunta Doutora da UFS; Orientadora.
1. Este trabalho faz parte da dissertação de mestrado de Déborah Pimentel no Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde da Universidade Federal de Sergipe (UFS).
2. Expressão cunhada pelo filósofo Nietzsche, e título de uma de suas obras, publicada em 1878: Humano, demasiadamente humano.