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Psychê

versão impressa ISSN 1415-1138

Psyche (Sao Paulo) v.11 n.20 São Paulo jun. 2007

 

ARTIGOS

 

O sintoma e os impasses na análise

 

The symptom and the deadlocks of the psychoanalytic clinic

 

 

Silvia Venturini1

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A fim de considerar os impasses com os quais se defronta a psicanálise, este artigo aborda o conceito de sintoma tal como figura em parte das elaborações de Freud e Lacan. O trabalho se detém sobretudo no conceito lacaniano de objeto a, uma vez que sua elaboração permite pensar as dificuldades colocadas pela persistência do sintoma face ao trabalho de análise.

Palavras-chave: Psicanálise, Sintoma, Gozo, Significante, Objeto a.


ABSTRACT

In order to consider the deadlocks faced by psychoanalysis, this article discusses the concept of symptom as it appears in some elaborations of Freud and Lacan. The work concentrates especially on Lacan’s concept of object a, since its elaboration allows us to evaluate the difficulties found in the persistence of the symptom during the work of analysis.

Keywords: Psychoanalysis, Symptom, Enjoyment, Significant, Object a.


 

 

“Um dia descobriu-se que os sintomas patológicos de determinados pacientes neuróticos têm um sentido. Nessa descoberta fundamentou-se o método psicanalítico de tratamento” (Freud, 1916[1915-16], p. 89). A passagem não deixa dúvidas quanto ao lugar central ocupado pelo conceito de sintoma na fundação da psicanálise e na determinação de sua especificidade. Com efeito, foi por haver aceitado o desafio posto ao saber médico pelo sintoma histérico, acolhendo como portadora de sentido uma formação patológica cujas propriedades não podiam ser remontadas a determinantes orgânicos, que Freud abriu a via da psicanálise.

A distinção entre as paralisias histéricas e as paralisias orgânicas desempenhou aqui um papel fundamental. O sintoma histérico encontra seu determinante não em uma lesão orgânica, mas em uma representação: a lembrança de um trauma (Freud, 1893[1888-93]). Não se trata, pois, na abordagem do sintoma, de operar sobre o organismo. Será por meio da fala, do trabalho associativo ao qual dá lugar, que se buscará recuperar a lembrança patogênica, e desse modo dissolver o sintoma. O deslocamento então realizado confere ao sintoma um novo valor: alhures índice de um desarranjo orgânico, o sintoma porta aqui um sentido desconhecido, constitui um enigma a ser interrogado e decifrado.

O modo de conceber o sintoma assinala, assim, a singularidade da experiência freudiana e as rupturas que demarcam seu campo. Com efeito, Freud (1917a[1916-17]) não deixou de ressaltar que, diversamente da abordagem psiquiátrica – a qual se limitava então a classificar os sintomas e remontá-los, de modo impreciso, à existência de uma predisposição hereditária –, a psicanálise estabelece, em primeiro lugar, que os sintomas têm um sentido e uma relação com a vida daquele que o produz.

Encontramos aqui o que de fundamental se estabelece, em um primeiro momento da elaboração freudiana, a propósito do sintoma. Abandonada a hipótese de sua determinação pela lembrança de um acontecimento traumático, persiste a suposição nele de um sentido a ser decifrado. A conceituação do inconsciente e de suas operações permite reconhecer no sintoma um substituto deformado da realização de um desejo inconsciente (Freud, 1900). O sintoma é determinado por uma cadeia inconsciente de representações, as quais, por meio das operações de condensação e deslocamento, se combinam e se substituem para realizar um desejo, atendendo às exigências da defesa. Tratar-se-á, então, de decifrar o sintoma na análise, percorrendo as cadeias associativas nas quais se articula o desejo inconsciente de revelar seu sentido, e assim dissolvê-lo.

Disposto a resgatar o sentido da experiência freudiana e reconduzir a psicanálise a seus fundamentos – a saber, a fala e a linguagem –, também Lacan, em um primeiro momento de seu ensino, dará destaque à dimensão decifrável do sintoma.

O acento posto inicialmente sobre a função da fala repercute sobre a abordagem do sintoma: se a fala – único meio do qual dispõe a psicanálise em sua operação – pode dissolver o sintoma, não é possível abordá-lo sem levar em conta a função da primeira. O cerne da função da fala na análise reside, assinala Lacan (1953), em incluir a fala, em sua própria origem, o Outro como destinatário. Dessa propriedade resulta que a fala, em seu apelo ao Outro, já porta sua resposta: na fala em análise, o sujeito recebe do Outro sua própria mensagem sob forma invertida. Encontramos aqui aquilo que fundamenta a aposta lacaniana na dissolução do sintoma pela recuperação de seu sentido: como mensagem cifrada, apelo ao Outro pela revelação de seu sentido, o sintoma cede, e mesmo se destina à decifração. É porque o sintoma, como fala, passa necessariamente pelo Outro que a análise poderá implicar o sujeito em sua mensagem; recuperar para ele o sentido de seu sintoma.

Ao deslocar o acento da fala para a linguagem, Lacan (1957) avança na consideração da determinação significante do sintoma. A abordagem do inconsciente segundo as leis da linguagem e a distinção, referida ao signo saussuriano, entre o significante e o significado, permitem a Lacan definir o sintoma como metáfora. O significante, por não formar com o significado uma unidade, não pode vir a significar senão por sua remissão a outro significante. Mais precisamente, o efeito de significação depende da substituição, em jogo na metáfora, de um significante por outro. Definido como metáfora, o sintoma pode ser decifrado porque seu sentido – efeito da combinatória significante – encontra no Outro a que se dirige sua determinação.

A suposição de um sentido a ser decifrado, e sua tradução no reconhecimento de uma dimensão significante própria ao sintoma, persistem nas respectivas elaborações de Freud e Lacan. Sabemos, no entanto, que a aposta psicanalítica na dissolução do sintoma por meio da decifração encontrou impasses. Mesmo depois de revelada a articulação significante que o determina, o sintoma persiste. Poderíamos supor que se trata aí de um obstáculo colocado pela própria natureza do significante. O significante do sintoma substitui não um significado, mas outro significante, o que implica, quanto à busca de sentido, uma remissão indefinida. É sempre possível que o significante substituído, por se tratar de um significante, seja colocado em questão, prolongando indefinidamente a decifração do sintoma. A impossibilidade de estabelecer um sentido último para o sintoma teria, então, como conseqüência sua conservação.

Mas o impasse colocado pela persistência do sintoma a despeito de sua decifração não tem esgotada sua justificativa na impossibilidade, instituída pelo significante, de capturar o sentido. Se o sujeito imputa ao Outro um sentido pelo qual é responsável – é sua própria mensagem que recebe do Outro sob forma invertida –, e se tal sentido não soluciona o sintoma – não o justifica integralmente nem o desfaz –, a responsabilidade do sujeito na manutenção do sintoma não se reduz a sua dimensão de sentido. É preciso agregar ao sentido do sintoma um não-sentido, considerar aquilo que escapa ao sentido quanto à posição subjetiva que sustenta o sintoma. A noção de satisfação pulsional vem responder precisamente a essa exigência: se há um hiato irredutível entre o sentido produzido como resposta ao “o que isso quer dizer?” do sintoma e o sintoma ele próprio em sua persistência, se não há sentido que possa responder integralmente pela determinação do sintoma, e ainda assim o sujeito o conserva, todo sentido alojado nesse lugar já está necessariamente comprometido com uma satisfação.

Tal comprometimento é assinalado por Freud (1917b[1916-17]), com especial clareza, em uma de suas conferências. Retoma aqui a tese, segundo a qual os sintomas têm um sentido e uma relação com as experiências do paciente. O paciente, assinala, ignora o sentido de seu sintoma. Embora evoque lembranças a ele relacionadas, não reconhece a conexão entre tais lembranças e o próprio sintoma. Tratar-se-ia, então, na busca por seu sentido, de estabelecer o elo entre a lembrança referida e o próprio sintoma. Mas Freud é levado a reconhecer que a evocação da lembrança não esgota o sentido do sintoma. A propósito da análise de uma de suas pacientes, afirma que o laço estabelecido entre o sintoma e a recordação não resultou em sua eliminação. Restava considerar ainda outro componente do sentido do sintoma – a saber, sua intenção: “foi necessárioAu: muito trabalho, antes que compreendesse e admitisse para mim que apenas tal motivo poderia ter sido a força determinante de seu ato obsessivo” (Freud, 1917b[1916-17], p. 285).

O sentido do sintoma inclui, assim, não apenas a lembrança – seu “de onde” –, mas também a intenção a que serve – seu “para quê”. Podemos reconhecer nessa intenção a satisfação com a qual está comprometido o sentido do sintoma. Ao fazer do sintoma um significante, a análise promove, com efeito, a produção de sentido. É possível estabelecer o “de onde” do sintoma. Mas é precisamente porque tal sentido não soluciona o sintoma, porque, apesar de estabelecido seu “de onde”, o sintoma persiste, que somos constrangidos a nele supor um “para quê”: o sintoma serve a uma satisfação não reconhecida como tal.

Aqui se justifica a advertência de Freud quanto à ineficácia de, visando a dissolução do sintoma, informar o paciente sobre seu sentido. É preciso, antes, que esse saber esteja baseado “em uma modificação interna”, a qual requer “uma parcela de trabalho” (Freud, 1917b[1916-17], p. 289). Não se trata, pois, na análise, de sanar uma ignorância pela oferta de sentido, mas de promover uma modificação no modo de satisfação constituído pelo sintoma, razão pela qual caberá ao sujeito “uma parcela de trabalho”. Como indica a advertência freudiana, o trabalho sobre o “de onde” do sintoma só se justifica se dirigido a atingir seu “para quê”.

É o que testemunha, a propósito da afonia de Dora, em Fragmento da análise de um caso de histeria (1905[1901]). Dora apresenta-se a Freud como vítima de cruéis circunstâncias. Acusa o pai de tê-la oferecido ao Sr. K. em troca de sua condescendência diante da relação amorosa que mantinha com a Srª K. – não seria senão um objeto de barganha nas relações do pai com o casal de amigos. Freud intervém, como destaca Lacan (1951, p. 218), remetendo Dora à sua participação nas circunstâncias das quais se queixa: a jovem não apenas silencia, mas favorece a relação dos amantes. Denuncia-se, assim, a função que cumpre sua postura de vítima indefesa: precisamente a de “ocultar sua cumplicidade e conivência – o quadrilátero de intercâmbios intersubjetivos só pode se sustentar à medida que Dora assuma ativamente seu papel de vítima, de objeto de intercâmbio” (Zizek, 2004, p. 27).

A decifração do sintoma segue a direção estabelecida pela intervenção freudiana. As diversas significações que a afonia pôde abrigar não se pautam, com efeito, pela condição de vítima de terríveis ultrajes advogada pela jovem. Freud (1905[1901]) as enumera, advertindo que a análise incompleta não permitiu que se avançasse no esclarecimento do sintoma: por meio de sua afonia, Dora expressava sua compaixão pelo pai, o qual adoecera gravemente dos pulmões; o sintoma representava também auto-acusações por causa da masturbação, significação estabelecida a partir da insistência, em suas associações, do significante “catarro”; com sua afonia, Dora demonstrava ainda seu amor pelo Sr. K – estando o amado ausente, renunciava à fala então destituída de valor; finalmente, o sintoma representava, pela identificação de Dora com a Srª K., uma cena sexual com o pai impotente.

A produção de sentido é orientada para aquilo que, na queixa de Dora, lhe concerne e denuncia a função de sua postura vitimária. Mensagem invertida, os significados da afonia apontam para a posição subjetiva que sustenta o sintoma. No entanto, não podem esgotar aquilo que nela está em jogo. É o que atesta a passagem seguinte, na qual Freud, apesar do alegado inacabamento da análise, indica o limite posto pela manutenção do sintoma ao trabalho de decifração:

No decorrer dos anos, um sintoma pode alterar um de seus significados ou seu sentido principal, ou então o papel principal pode passar de um significado para outro. Há como que um traço conservador no caráter das neuroses: uma vez formado, se possível, o sintoma é preservado, mesmo que o pensamento inconsciente que nele encontrou expressão tenha perdido seu significado (1905[1901], p. 58).

A abordagem freudiana não deixa de reconhecer aquilo que, apesar das “reviravoltas no sentido”, se mantinha como elemento conservador do sintoma: uma irritação na garganta condicionada pela “intensa atividade dessa zona erógena” (Freud, 1905[1901], p. 57). Apesar da sucessão de significados encontrados para a afonia, a irritação na garganta, sede da satisfação, persistia, revelando o paradoxo de uma satisfação que, consumada no sofrimento, não pode ser reconhecida como tal.

A persistência do sintoma a despeito das variações no sentido leva Freud (1905[1901]) a distinguir, no sintoma histérico, uma “parte psíquica” – mais variável e mais facilmente substituível – e uma “parte somática” – menos plástica e mais difícil de substituir. Assinala-se, assim, uma dimensão do sintoma distinta de sua dimensão de sentido. Restava, contudo, determinar em que consiste a “parte somática” em questão. Freud recorre aqui à noção de “complacência somática”. No caso de Dora, tratar-se-ia de uma irritação organicamente condicionada na garganta. No entanto, aquilo que determinou a garganta como “parte somática” do sintoma foi sua condição de zona erógena: é por ter sido Dora uma “chupadora de dedo”, é porque a região oral se conservara como reduto de uma satisfação, que a garganta pôde se converter em sede do sintoma.

Trata-se aqui do paradoxo próprio ao sintoma, o qual, embora não deixe de figurar nos primeiros anos da elaboração freudiana – quando o sintoma é definido como satisfação sexual substitutiva –, só adquire todo seu peso nos últimos – quando a satisfação em jogo no sintoma já não serve ao princípio de prazer. Com efeito, é paradoxal – mesmo que se trate aí de desprazer para uma instância, mas satisfação para outra – que o sintoma, signo de desconforto e sofrimento, comporte ele próprio satisfação. Mas é apenas quando a satisfação de que se trata mostra-se indissociável do fracasso e do sofrimento, quando o sintoma se converte em ponto privilegiado de incidência da satisfação, que o paradoxo do sintoma é revelado como tal.

O sintoma se define, pois, não apenas por sua articulação significante, mas também, e sobretudo, pelo gozo que encerra. Mas ao distinguirmos duas dimensões do sintoma – sua dimensão significante e sua dimensão de gozo – não devemos desconsiderar a articulação que as constitui como tais. Com efeito, aquilo que se apresenta do sintoma como irredutível à decifração não o faz senão como produto da própria decifração. Foi a impossibilidade, instituída pelo significante, de estabelecer um sentido último para o sintoma – um saber que o justificasse integralmente e o dissolvesse – que colocou a exigência de considerar aquilo que, quanto à posição subjetiva que o sustenta, escapa ao sentido – a saber, a satisfação que encerra. O fracasso em estabelecer o sentido derradeiro dessa formação denuncia, assim, seu comprometimento com uma satisfação. Trata-se, pois, na persistência do sintoma, de uma tensão entre o sentido a ser decifrado e a satisfação pulsional, que circunscrita pelo trabalho de decifração, impõe-se como seu limite.

O reconhecimento desse obstáculo como produto da própria experiência analítica o conduzirá progressivamente ao centro das elaborações de Freud e Lacan: o sintoma não é apenas uma formação significante, mas também, e sobretudo um modo de gozo. A fim de considerarmos de que modo se articulam as duas dimensões constituintes do sintoma, recorreremos aqui à elaboração lacaniana do conceito de objeto a. Com efeito, a promoção desse conceito por Lacan, por representar um esforço de articulação entre o registro do significante e o domínio do gozo, revela-se indispensável na abordagem do sintoma.

Este esforço está presente na abordagem da constituição do sujeito por meio das operações de alienação e separação (Lacan, 1964). Trata-se de situar a causação do sujeito, não apenas em relação ao campo da linguagem – é no campo do Outro que o sujeito se constitui –, mas também em relação ao gozo, o qual vem responder ao efeito de perda próprio à incidência do significante.

Como assinala Soler (1997a), a operação de alienação retoma algo que já vinha sendo desenvolvido no ensino lacaniano. Trata-se de considerar a relação do sujeito ao Outro – campo que o precede e no qual se constitui – e aquilo que essa relação implica:

Que o sujeito está na incerteza em razão de ser dividido pelo efeito de linguagem, é o que lhes ensino, eu enquanto Lacan, seguindo os passos da escavação freudiana. Pelo efeito de fala, o sujeito se realiza sempre no Outro, mas ele aí já não persegue mais que uma metade de si mesmo (Lacan, 1964, p. 178).

A operação de alienação designa a divisão à qual está condenado o sujeito por se fundar na linguagem. Encontramos na própria definição lacaniana de significante – um significante representa um sujeito para outro significante – a impossibilidade que condiciona o advento do sujeito no campo do Outro à sua divisão. Ao se fazer representar por um significante (S1), o qual o representa para outro significante (S1 ’ S2), o sujeito não se encontra aí integralmente representado. Pois se o significante convocado (S2), tal como o significante que representa o sujeito (S1), não significa nada de antemão, é sempre possível que o sentido que resulta da articulação assim promovida seja posto em questão, o sujeito permanecendo aí carente de identidade.

A operação de alienação assinala Lacan (1964), implica uma escolha paradoxal, posto que forçada. Tal paradoxo é ilustrado pelo imperativo “a bolsa ou a vida?”. O que figura aqui como possibilidade de escolha – escolher entre a bolsa ou a vida – admite, na verdade, apenas uma resposta. Caso se escolha a bolsa, perde-se a vida, e com ela, a própria bolsa. E na escolha da vida, trata-se de uma vida sem a bolsa. Na alienação, os termos em jogo na articulação do campo do sujeito ao campo do Outro são o ser e o sentido. Escolhendo o ser, não se ingressa no sentido, e na escolha do sentido, há sempre uma perda de ser.

O preço a ser pago para que o ser ainda não introduzido na linguagem surja como sujeito no campo do Outro é a perda de ser. Se o sujeito designa aquilo que é representado por um significante para outro significante, ao se identificar a um significante, só pode surgir como cristalizado pelo significante que o representa; cristalização que encobre sua verdade de vazio. Por se fundar na linguagem, “por esse fato mesmo, isto – que antes não era nada senão sujeito por vir – se coagula em significante” (Lacan, 1964, p. 187). Na verdade, trata-se aqui do impasse próprio ao sujeito da alienação significante, o qual se vê condenado a uma vacilação entre o significante que o representa sem lhe oferecer uma identidade, e o deslizamento infinito no sentido, que o faz permanecer em sua indeterminação fundamental (Soler, 1993).

A operação de alienação tem então como resultado o sujeito do significante, sujeito cuja representação no campo do Outro não é exaustiva – há sempre uma parte não integrada, um resto irrepresentável. Dito de outro modo, o sujeito que resulta da alienação não é senão a própria impossibilidade de ser representado por um significante – “o efeito retroativo do fracasso de sua representação significante” (Zizek, 1991, p. 70), o lugar vazio estabelecido por esse mesmo fracasso.

Como veremos a propósito da operação de separação, em resposta à falta resultante da impossibilidade de uma representação plena do sujeito no Outro, e no lugar mesmo dessa falta, virá se instalar o objeto a. Dito de outro modo, o objeto a designa precisamente esse resto irredutível à operação significante que funda o sujeito, razão pela qual essa mesma operação não resulta em uma representação integral.

Ora, enquanto o sujeito supuser que cabe ao Outro significante (S2) a tarefa de lhe fornecer um ser, ou seja, à medida que o sujeito insistir em convocar um segundo significante que possa garantir um estofo para sua identidade, permanecerá no impasse da alienação, condição à qual Lacan (1964) se refere em termos de assujeitamento, condenação, escravidão. Mas se o ingresso na linguagem implica uma perda de ser, sem que no lugar dessa perda venha figurar a garantia de uma identidade simbólica, somos levados a colocar a questão: seria impossível ao sujeito encontrar algum esteio para seu ser? Estaria ele condenado ao impasse da alienação?

A resposta que encontramos na elaboração lacaniana é que a alienação não é a única promessa para o sujeito da linguagem. Reside aí a importância da noção de separação. O significante, precisamente por não preencher inteiramente o vazio do sujeito, deixa espaço para que, nos intervalos entre um significante e outro, o sujeito possa colocar a questão: “o que, afinal de contas, o Outro quer de mim?”.

O sujeito da alienação supõe que o Outro detém um saber sobre seu ser. Tal saber jamais comparecendo integralmente, o sujeito toma a seu cargo a falta, preservando intacto o lugar do Outro. A separação, por sua vez, fará incidir a barra não apenas sobre o sujeito, mas também sobre o Outro. Desse modo, em lugar de se assujeitar ao domínio de um Outro supostamente completo, que poderia lhe oferecer uma representação adequada quanto a qual seria seu lugar no mundo, o sujeito passa a se indagar quanto ao desejo desse Outro. O Outro figura aí como faltoso, como incompleto, como parte interessada no jogo, e não como um árbitro que poderia emitir um julgamento sobre o ser do sujeito de uma distância objetiva, imparcial e isenta.

Encontrar no Outro o equivalente de sua própria falta abre ao sujeito, portanto, a possibilidade de colocar a questão do que o Outro quer para além do que ele diz. É porque há um furo no discurso do Outro, é porque é própria à fala a impossibilidade de dizer o que se quer, que o sujeito pode chegar à questão que o traz ao ponto da separação – a saber, a questão do que ele é no desejo do Outro. Como assinala Soler:

Na interseção entre o sujeito e o Outro há uma falta, uma lacuna. O que é esta falta no Outro? É o que Lacan chama de desejo. Mas por que o desejo tem que necessariamente aparecer na fala? Porque há uma impossibilidade na fala: a impossibilidade de dizer o que se quer. Por exemplo, fala-se a uma pessoa amada, e a pessoa que escuta compreende as palavras e frases, e pode-se repeti- las. Pode-se mesmo explicá-las. Quando falamos, podemos desenvolver sentido na medida em que o sentido é sempre produzido entre dois significantes. Podemos comunicar esse sentido e explicá-lo, mas a pergunta constante para o ouvinte é: aonde ele quer chegar? O que ele quer, realmente? (1997b, p. 63).

Ora, é precisamente o encontro da falta no Outro que permite ao sujeito se constituir como desejante. Se, como estabeleceu Lacan (1960), o desejo do homem é o desejo do Outro, o sujeito só poderia aparecer como faltoso ao se deparar com a falta no Outro, ponto em que o sujeito não supõe que o Outro possa preencher sua própria falta.

Trata-se aí do recobrimento de duas faltas. O objeto que falta a ambos é nomeado por Lacan objeto a. Esse objeto não é do Outro nem do sujeito, mas se situa em um “entre-dois” (Rabinovich, 2005). Nessa vertente, o objeto a aparece na função de causa do desejo. Entretanto, tal função não exaure tudo o que é do objeto. Como estabelecerá Lacan (1969-70), ao mesmo tempo em que o objeto desempenha o papel de motor que aciona a máquina do desejo – designando portanto um gozo faltoso, um “menos de gozo” –, ele dá lugar também a um “a mais” de gozo – a saber, precisamente a satisfação que o sujeito obtém no repetido fracasso em tentar minorar o déficit de gozo.

No vazio constituído pelo recobrimento das duas faltas em jogo – a falta própria ao sujeito, que por se fundar na linguagem, não é aí integralmente representado, e a falta própria ao desejo do Outro – vem se alojar o objeto a, objeto cuja articulação com o gozo é assim indicada por Rabinovich: “esta operação de divisão do sujeito com esse resto que é o objeto a, fará do objeto – e este é o ponto fundamental – um lugar privilegiado de recuperação, de captura de gozo” (2004, p. 13).

Vemos articularem-se, assim, o sujeito e o funcionamento da pulsão. Com efeito, se o sujeito, por se fundar na linguagem, é marcado por uma perda, não é senão em torno de um vazio que a pulsão realiza seu circuito. O objeto a, tal como o situa Lacan (1964) no circuito da pulsão, não é senão a presença de um vazio, de uma ausência em relação à qual todos os objetos que vêm aí ocupar este lugar fazem-no como equivalentes, figurações, representantes. Assim, cabe aqui distinguir, como sugere Miller (1998b), o objeto em sua dimensão de furo, de perda própria à operação da linguagem, do objeto como suplência, como representante. Feita a distinção, podemos – procurando avançar na consideração do modo como se articulam o sujeito e o funcionamento da pulsão – identificar o vazio designado pelo objeto a à perda resultante das operações de alienação e separação, perda a ser contornada pela pulsão e recoberta, tal como o exige o movimento pulsional, pelo objeto, agora como representante, como equivalente.

Se nos voltarmos para o funcionamento da pulsão, reconheceremos que a referência fundamental para abordá-lo permanece sendo o auto-erotismo freudiano. Ao conceber como circular o percurso da pulsão, Lacan (1964) coloca em evidência que a zona erógena da pulsão parcial é não apenas a fonte da pulsão, mas também o lugar em que se realiza a satisfação. No entanto, a satisfação auto-erótica da pulsão não pode prescindir do objeto. A definição oferecida por Freud (1915) do objeto pulsional – aquilo por meio do qual a pulsão pode atingir a satisfação – não deixa dúvidas quanto a isto: embora falte à pulsão um objeto específico e adequado, embora o objeto pulsional tenha um valor instrumental no funcionamento da pulsão – sua natureza é indiferente –, não é possível descartá-lo. O paradoxo do movimento circular da pulsão é que para realizar seu trajeto auto-erótico, a pulsão deve contornar o objeto a. Mais ainda, é por esse contorno que o sujeito alcança o campo do Outro, o objeto a figurando, como algo no Outro trazido ao campo do sujeito pela trajetória da pulsão (Miller, 1998b). É o que indica Lacan na passagem seguinte:

Tudo o que Freud soletra das pulsões parciais nos mostra (...) esse movimento circular do impulso que sai através da borda erógena para a ela retornar como sendo seu alvo, depois de ter feito o contorno de algo que chamo de objeto a. Ponho que (...) é por aí que o sujeito tem que atingir aquilo que é, propriamente falando, a dimensão do Outro (1964, p. 183).

A concepção do movimento pulsional como circular já implica a impossibilidade de que o tomemos como um movimento de reversão imaginária. Se consideramos a pulsão escópica, trata-se não de ver e ser visto, mas de se fazer ver. Lacan (1964) substitui o ser visto da oposição freudiana pelo fazer-se ver, indicando não apenas que a pulsão é sempre ativa, mas também, como assinala Miller (1998b), que é o grande Outro, e não o outro imaginário, o convocado para servir às finalidades da pulsão. Ora, se é pela pulsão, em sua parcialidade fundamental, que o sujeito atinge o campo do Outro, o suporte da relação do sujeito com o Outro não é senão o objeto a, parte de seu gozo.

Neste ponto, cabe avaliar, a propósito da tarefa que nos impusemos aqui – considerar a articulação entre o domínio do gozo e o registro do significante resultante da conceituação do objeto a, a fim de abordarmos o sintoma – o quanto pudemos avançar.

Já podemos estabelecer aqui uma primeira articulação. Vimos que a psicanálise, ao adotar o dispositivo da decifração como meio de atingir o sintoma, encontrou aí um ponto de impossibilidade radical. O sintoma, apesar da revelação do encadeamento significante que o rege, não se desfaz. Como assinalamos, Freud (1905[1901]) cedo é confrontado com esse limite. A propósito da afonia de Dora, é levado a distinguir no sintoma histérico uma “parte psíquica” e uma “parte somática”, a primeira mais variável e mais facilmente substituível, e a segunda mais resistente e difícil de substituir. A despeito das variações no plano do sentido – diversos significados podem aí se expressar simultânea e sucessivamente –, o sintoma persiste. O elemento conservador do sintoma – na construção freudiana, a “complacência somática” – não deixa de ser designado no caso de Dora: está em jogo uma irritação na garganta. No entanto, não se trata aí somente de uma afecção somática, mas de uma irritação cuja condição repousa sobre uma satisfação:

Na camada mais inferior da estratificação devemos presumir a presença de uma irritação real e organicamente condicionada da garganta, ou seja, o grão de areia em torno do qual a ostra forma a pérola. Esse estímulo era passível de fixação por dizer respeito a uma região do corpo que, na menina, conservava em alto grau a significação de uma zona erógena. Por conseguinte, estava apto a dar expressão à libido excitada (Freud, 1905[1901], p. 83).

Aquilo que determinou a escolha da garganta como sede do sintoma foi precisamente sua condição de zona erógena, reduto de gozo resistente aos deslocamentos do sentido. No sintoma distinguem-se e se articulam, por um lado, a mobilidade do sentido, e por outro, a persistência, referida em última instância a seu núcleo de gozo. O que a resistência do sintoma denuncia é que ele não é feito apenas de significantes, que há nele algo heterogêneo que determina o limite da decifração.

Ora, não se trata aí, nesse núcleo irredutível do sintoma, precisamente do furo, que na operação significante da qual o sujeito é efeito, designa a impossibilidade de que essa mesma operação resulte em uma representação integral? Não se trata, nesse elemento de gozo do sintoma – “grão de areia em torno do qual a ostra forma a pérola” (Freud, 1905[1901], p. 83) – justamente do objeto que encontramos, como resultado das operações de alienação e separação, na interseção entre o campo do sujeito e o campo do Outro?

Se admitirmos que sim, somos levados a concluir que o sintoma, ao situar o objeto a, é o fundamento da articulação do sujeito ao campo do Outro. Dito de outro modo, é sempre o sintoma, o modo singular como o sujeito organiza seu gozo, que define sua posição junto ao Outro, que, como assinala Miller (2000a), medeia, na falta de uma orientação natural, a relação do sujeito como o Outro.

Talvez possamos ser mais precisos se articularmos o que acabamos de formular a respeito do sintoma à distinção que estabelecemos entre aquelas que seriam as duas faces do objeto: o objeto como falta e como suplência, como representante.

Vimos que a pulsão só realiza seu circuito depois de contornar no Outro seu objeto. Assim, em seu trajeto auto-erótico, deve buscar no campo do Outro esse objeto que é, ao mesmo tempo, vazio a ser contornado e suplência àquilo que esse mesmo vazio designa – a saber, a ausência irremediável de um objeto que possa preenchê-lo. Dessa perspectiva, podemos dizer que o sintoma não é senão a expressão do fracasso da tentativa subjetiva de recorrendo aos representantes que encontra no Outro, realizar a sutura dessa perda própria à operação da linguagem.

Entretanto, se considerarmos agora o que pudemos estabelecer a respeito do sujeito, seremos levados a dar relevo ao valor de solução que adquire o sintoma. Com efeito, se o sujeito, em sua desorientação, não encontra no Outro um significante que lhe garanta uma identidade inequívoca, se por isso mesmo é o objeto a que aparece como suporte de sua relação com o Outro, podemos dizer que o sintoma – como aparato que permite situar pelos representantes o vazio designado pelo objeto a (Miller, 1998a) –, funciona menos como fracasso e mais como um recurso, um instrumento do sujeito como tal.

Se nas operações de alienação e separação o gozo se articula ao significante como resposta ao efeito de perda próprio à incidência da linguagem, com a formalização da noção de discurso (Lacan, 1969-70), esta articulação torna-se ainda mais estreita. O discurso vem revelar que a relação do significante com o gozo é uma relação originária: o gozo é não apenas resposta ao efeito da intervenção da linguagem, mas também aquilo que faz trabalhar a própria cadeia significante.

Encontramos conjugadas no discurso as operações de alienação e separação. No discurso do mestre, forma primeira do discurso, um determinado significante (S1) representa o sujeito para todos os outros significantes (S2). Operação sempre incompleta, a representação significante faz surgir o sujeito em sua divisão (S) e implica uma perda de gozo (a) (Lacan, 1969-70). Ora, é precisamente esse efeito de perda que dá lugar à recuperação do gozo sob a forma do mais-gozar. O objeto a, como mais-gozar, intervém como suplemento da perda de gozo.

Assim, o discurso supõe que a incidência do significante ao mesmo tempo em que introduz uma perda de gozo – a linguagem é incompatível com o gozo pleno – tem por efeito a produção de um suplemento de gozo, o objeto a figurando aí como mais-gozar, como suplemento de gozo, como resposta à perda significante. Isso explica o recurso ao termo entropia para tratar da relação do significante com o gozo. Como indica Lacan, “essa entropia, esse ponto de perda, é o único ponto, o único ponto regular por onde temos acesso ao que está em jogo no gozo. Nisto se traduz, se arremata e se motiva o que pertence à incidência do significante no destino do ser falante” (1969-70, p. 48).

A passagem é esclarecedora quanto àquilo que, com o discurso, se introduz a respeito da relação entre o significante e o gozo. A incidência do significante não apenas se traduz em gozo, em mais-gozar a ser recuperado, mas é também motivada por essa recuperação. Temos, então, uma espécie de circularidade envolvendo o gozo e o significante, movimento que denuncia, de modo ainda mais radical, o quanto esses domínios são indissociáveis, embora distintos.

Como assinala Miller (2000a), a repetição significante, antes unicamente referida à impossibilidade de uma representação integral do sujeito pelo significante, revela-se aqui condicionada pelo gozo. Com efeito, é a propósito da repetição que Freud (1920) introduz a pulsão de morte. Há uma satisfação na repetição – satisfação que por se consumar na repetição do fracasso, é independente do princípio de prazer. Ora, se o que se repete é repetido como perda de gozo, há um gozo na própria perda, na própria falta de gozo, no próprio fracasso.

A repetição significante, ao introduzir uma perda de gozo, promove a recuperação do gozo perdido, razão pela qual Lacan pôde dizer que a repetição visa o gozo; que o discurso toca sem cessar o gozo, “posto que é dali que ele se origina. E o agita de novo desde que tenta retornar a essa origem” (1969-70, p. 66). Uma circularidade, como vimos, se estabelece aí, uma vez que é a defasagem entre o gozo perdido – efeito da repetição significante – e o que se coloca como seu suplemento que engendra a repetição ela mesma. Trata-se de uma circularidade, mas também, de algum modo, de um curto-circuito, já que se acaba por gozar da própria falta de gozo. Talvez por isso seja possível a Lacan (1969-70) afirmar que na repetição há desperdício de gozo. Está em jogo aí um excesso – o gozo transborda o princípio de prazer – inútil e incômodo.

Podemos pensar, no entanto, que a consideração de que a repetição serve ao gozo não é incompatível com a hipótese de que a repetição é condicionada pela impossibilidade de uma representação integral do sujeito pelo significante. Se a repetição se faz necessária, é porque o significante fracassa em representar o gozo do sujeito. Incluindo o gozo no que há de irrepresentável no sujeito, podemos entender porque Miller, ao considerar o discurso, propõe que se substitua o sujeito pelo gozo na definição lacaniana do significante, de modo que se possa dizer que o significante representa o gozo para outro significante. Com efeito, o significante veicula o gozo no discurso por não ter sucesso em representá-lo. A representação do gozo pelo significante “não é exaustiva, ela é malograda, e é precisamente isso que condiciona a repetição” (Miller, 2000a, p. 99).

Encontramos aqui o sintoma em sua face de repetição. Se há gozo na repetição, se, por isso mesmo, o que se repete é o fracasso, o déficit de gozo, não podemos deixar de situar aí o sintoma. O gozo como mais-gozar, gozo sustentado pela falta de gozo, é precisamente aquilo que o sintoma conserva e circunscreve.

Ao ligar o gozo a uma certa formação significante, o sintoma funciona como aparelho de gozo. Como indica Miller, “os sintomas são aparelhos para envolver e situar o mais-de-gozar” (2000b, p. 182). Não sendo possível uma representação integral do sujeito pelo significante, é sempre o sintoma, em sua singularidade, que permite ao sujeito se haver com seu gozo. É porque a representação significante só pode liberar um sujeito dividido, é porque jamais se realiza sem produzir uma perda de gozo, que o mais-gozar, aparelhado pelo sintoma, vem funcionar como solução.

Circunscrevendo o mais-gozar, o sintoma conserva o gozo extraído da própria falta de gozo, do repetido fracasso em minorar o “menos de gozo” que impõe sua constituição na linguagem Ao mesmo tempo, ao situar o objeto a, o sintoma será para o sujeito ao qual falta a garantia de uma identidade o fundamento de sua articulação junto ao Outro. Será sempre o sintoma, o modo singular pelo qual o sujeito organiza seu gozo, que definirá, na ausência de uma representação exaustiva, sua posição junto ao Outro (Miller, 2000b). Ao ligar o gozo a uma certa formação significante, o sintoma figura não apenas como disfunção – gozo extraído da repetição do fracasso – mas também como funcionamento, constituindo um aparato singular que permite ao sujeito organizar o gozo.

Assim definido, o sintoma suscita a questão de seu destino na análise. O valor de solução que adquire o sintoma leva-nos a supor que a análise não adotará a direção de sua eliminação. Reconhecido no sintoma um gozo irredutível à decifração, tal horizonte seria mesmo marcado por uma impossibilidade. Contudo, se podemos supor outro destino que não a dissolução para o sintoma, este não será certamente sua manutenção como aparelho de um mais-gozar extraído da repetição do fracasso. Se admitirmos a manutenção como destino possível do sintoma na análise, devemos supor que se tratará de um sintoma transformado. Resta saber que sorte de transformação estaria aí em jogo. Mais ainda, resta considerar como poderia a decifração, o trabalho sobre a dimensão significante do sintoma, alcançar e modificar aquilo que como gozo figura precisamente como seu limite. Se a psicanálise visa uma fala que modifique o próprio lugar a partir do qual o sujeito fala, será preciso considerar a direção a ser tomada pelo trabalho de decifração para que a modificação pretendida não se reduza ao efeito semântico que tal trabalho implica – o deslocamento indefinido do sentido –, mas transforme o modo de satisfação constituído pelo sintoma.

 

Referências Bibliográficas

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Endereço para correspondência
Silvia Venturini
Rua Correa Dutra, 53 / 404 – 22210-050 – Flamengo – Rio de Janeiro/RJ
Tel.: (21) 2225-6621
E-mail: sventurinicosta@yahoo.com.br

Recebido em 28/01/05
Versão revisada recebida em 26/02/07
Aprovado em 06/03/07

 

 

1Mestre em Teoria Psicanalítica (Programa de Pós-graduação em Teoria Psicanalítica/UFRJ).