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Construção psicopedagógica

versão impressa ISSN 1415-6954

Constr. psicopedag. vol.18 no.17 São Paulo dez. 2010

 

EDITORIAL

 

 

Apresentamos o tema deste volume e as contribuições das publicações que seguem refletindo sobre os sentidos da esperança:

Que nome dar à esperança?... Mas se através de tudo corre a esperança, então a coisa é atingida. No entanto a esperança não é para amanhã. A esperança é este instante. Precisa-se dar outro nome a certo tipo de esperança porque esta palavra significa sobretudo espera. E a esperança é já... (LISPECTOR, 1999, p. 465)

O sentido de "esperança neste instante" se associa à temática do presente volume, pois ele se refere às buscas das integrações entre o que foi separado no homem e no conhecimento e das conexões entre artes e ciências, expressões criativas e movimentos corporais, com entrelaçamentos entre o emocional e o cognitivo, o pensamento e as expressões criativas, o desenvolvimento e a aprendizagem.

Esse é o desafio das ciências, filosofias e educações contemporâneas! Carl Jung (1993), um dos autores citados no primeiro artigo deste volume, nos fala da civilização em transição, na necessidade de aproximações entre as diferenças, com ênfase nas expressões simbólicas do homem e das culturas. As profundas elaborações analíticas de Jung sobre a dinâmica inconsciente e os mitos nos revelam os problemas das desintegrações psíquicas, individuais e culturais e a busca pela integração expressa nos símbolos e heróis míticos.

A psicopedagoga e mestra em educação, Lídia Lacava, apresenta em seu artigo reflexões e pesquisas desenvolvidas em sua Dissertação de Mestrado (Mackenzie, 2009). Nele, trata do diálogo com os mitos e as múltiplas formas de expressar, em situações de aprendizagem, com destaque nas vivências mediadas pelas expressões artísticas. A autora coloca em foco as elaborações e construções em torno do mito de Eros e Psiquê, desenvolvidas no curso de formação de professores de ensino fundamental. Como todos os mitos, esse revela um sentido de esperança nesta caminhada do herói educador a procura da integração.

A pedagoga, mestre em educação e membro do Departamento de Psicopedagogia do Instituto Sedes Sapientiae, Marlene Alessandroff, complementa as reflexões sobre o desenvolvimento da criança e a interação das múltiplas linguagens, em que se associam palavras, ações e expressões de afeto por meio do corpo, do desenho e da fala. A autora apresenta conexões entre abordagens teóricas em que as expressões criativas dos desenhos se conectam com a construção do pensamento (VYGOTSKY) e o desenvolvimento psicomotor (WALLON).

O mestre em psicomotricidade e grande educador, Professor Vitor da Fonseca, nos envia um artigo especial de Portugal (Lisboa), com suas atuais construções a respeito da psicomotricidade:

... um campo transdisciplinar que estuda e investiga as relações e as influências recíprocas e sistémicas, entre o psiquismo e o corpo, e, entre o psiquismo e a motricidade, emergentes da personalidade total ( citação do artigo)

Ressalta a singularidade do homem, sua complexidade e manifestações biopsicossociais, afetivo-emocionais e psico-sócio-cognitivas.

O professor Carol Koliniak Filho, doutor em psicologia da educação (PUC/SP), continua com o diálogo sobre a psicomotricidade, a educação, o ensino e a aprendizagem. Enfatiza a necessidade do dimensionamento do papel da educação física, da organização dos recursos materiais, da metodologia de ensino e da superação das dificuldades de aprendizagem na perspectiva da educação inclusiva. Segundo suas reflexões, o movimento e o corpo se apresentam em todas as situações cotidianas da criança e, portanto, não devem ser focados apenas nas aulas de educação física e artes.

A professora Helena Marieta Rath Kolyniak, doutora em psicologia social, psicomotricista e psicopedagoga (PUC/SP), apresenta novos enfoques sobre as conexões entre a psicomotricidade, a aprendizagem, o desejo e o desenvolvimento integral da criança.

Essas reflexões sobre a integração entre o corpo, cognição e emoções não excluem as expressões artísticas e criativas. Merleau Ponty reflete: "Não é ao objeto físico que o corpo pode ser comparado, mas antes à obra de arte." A percepção é "a operação expressiva do corpo, iniciada pela menor percepção que se amplifica em pintura e arte" (PONTY, 1994, p.208).

Como lidar psicopedagogicamente com as disfunções do cérebro, expressos no corpo, e com as inibições do corpo psíquico e social, considerando as conexões entre percepção, cognição e expressão artística?

A psicopedagoga e psicóloga Juliana B. Stroh, com foco nas contribuições da psicopedagogia, reflete sobre o corpo afetado por disfunções neurológicas (TDAH) e as facilitações de aprendizagem pelas mediações arteterapêuticas. A autora apresenta uma pesquisa teórica sobre TDAH (monografia, PUC, 2010) e complementa suas reflexões pelas experiências com a arteterapia, desenvolvidas no contexto clínico psicopedagógico.

A psicopedagoga Fernanda do V. Silveira continua a refletir sobre o valor da arte de contar e expressar histórias para abrir as possibilidades da manifestação dos gestos criativos e desenvolvimento da autoestima e da linguagem na criança. A autora apresenta pesquisas teóricas e um estudo de caso clínico psicopedagógico.

A psicóloga, psicopedagoga e mestre em psicologia, Anita Abed, apresenta suas pesquisas teóricas e reflexões que merecem destaque como fechamento deste volume. Reflexões inspiradas em Monografias, Dissertações de Mestrado e experiências sobre ensino e aprendizagem, realizadas por ela, e que levaram em conta a complexidade do homem, em suas diferentes faces, e do conhecimento, por meio da utilização da perspectiva teórica de Edgar Morin. Destaca a importância e a necessidade da dialógica entre artes e ciências, pensamento metafórico e pensamento empírico lógico e o valor da metáfora, das artes e dos jogos:

As construções teóricas da Psicopedagogia, ancoradas na noção de complexidade, oferecem sustentação para o planejamento e a concretização de práticas pedagógicas que objetivem a (re)integração das cisões nas pessoas, no conhecimento, na aprendizagem(...) resgate das diversas facetas do humano que haviam ficado do lado de fora da Escola: a afetividade, o corpo, as artes, o lúdico, a criatividade (citação do artigo.)

Diante das reflexões apresentadas nestas publicações, retornamos ao pensamento inicial de Clarice Lispector sobre o "sentido da esperança no instante" (LISPECTOR, 1999, p. 465). Esperança que não se espera, mas que se apresenta na concretização de pesquisas e práticas sobre as reintegrações das diferentes faces do homem e do conhecimento, aproximando a arte da ciência.

Agradecemos aos autores pelas suas significativas contribuições e convidamos aos leitores para o mergulho nas reflexões que se seguem, mobilizados pela seguinte indagação, enriquecida pela poesia de Clarice Lispector: quais os diferentes sentidos e direções a tomar na aprendizagem que visem à integração, em busca de conexões e cuidados com a engrenagem?

Minha alma humana é a única forma possível de eu não me chocar desastrosamente com a minha organização física, tão máquina perfeita esta é. Minha alma humana é, aliás, também o único modo como me é dado aceitar sem desatino a alma geral do mundo. A engrenagem não pode nem por um segundo falhar. (LISPECTOR, 1999, p. 205.)

 

Referências

LISPECTOR, Clarice. A descoberta do mundo. Rio de Janeiro: Rocco, 1999.         [ Links ]

PONTY, Merleau. Fenomenologia da percepção. São Paulo: Martins Fontes, 1994.         [ Links ]

 

Eloísa Fagali (editora científica) e Comissão Editorial

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