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Construção psicopedagógica

versão impressa ISSN 1415-6954

Constr. psicopedag. vol.21 no.22 São Paulo  2013

 

Identificação dos estilos cognitivo-afetivos de heróis dos contos e de sujeitos, em situações de aprendizagem, sob o enfoque sob o enfoque psicopedagógico-arteterapêutico

 

Identification of affective-cognitive styles of hero tales and subjects in learning situations, with a psych pedagogical and art therapeutical focus

 

 

Eloisa Quadros FagaliI; Lidia LacavaII

IDoutora e Mestre em Psicologia da Educação (PUC-SP.); Pedagoga; Arte-terapeuta; Psicodramatista; Especialista em Grupos Operativos (Pichon Riviere); Psicopedagoga Clinica e Institucional. Email: eqfagali@uol.com.br Instituto Sedes Sapientiae
IIEducadora, Psicopedagoga Clínica e Institucional, Arteterapeuta. Mestre em Educação, Arte e História da Cultura. Professora em cursos de Pós-graduação em Psicopedagogia e Arteterapia. Atua em consultório particular com crianças, adolescentes e adultos. Email:lidialacava@gmail.com São Paulo, São Paulo, Brasil

 

 


RESUMO

O presente artigo destaca pesquisas e projetos sobre diagnóstico e intervenção psicopedagógica institucional e clínica em que se utilizam os diferentes perfis de heróis com os quais os aprendizes se identificam. Neste enfoque teórico para avaliação e intervenção psicopedagógica, os heróis dos contos e mitos são considerados como mediadores para o resgate da autoestima e da identidade de crianças e adolescentes. Estes estudos ganham maior aprofundamento sobre as integrações entre afeto e cognição, associadas às diferentes expressões e simbolizações dos aprendizes. As elaborações teóricas fundamentam-se originalmente na teoria analítica de Carl G. Jung sobre o arquétipo do herói e nos seus estudos sobre tipos psicológicos, com ampliações contemporâneas sobre diferenciações dos estilos cognitivo-afetivos que se revelam na situação de aprendizagem, tendo em vista os constructos teóricos da Psicopedagogia e da Arteterapia para as relações do ensinar e do aprender.

Palavras - chave: Identificação, Herói, Mito, Aprendizagem, Estilos cognitivo-afetivos.


ABSTRACT

This article highlights researches and projects in clinical and institutional psychopedagogical diagnosis and intervention that use different profiles of heroes with which learners are identified. In this theoretical approach to psychoeducational assessment and intervention, the heroes of the tales and myths are regarded as mediators to rescue children and teenagers self-esteem and identity. These studies gain deeper understanding about the integrations between affect and cognition, associated with different expressions and symbolizations of apprentices.The theories developed are based originally on Carl G. Jung`s analitical theory on the archetype of the hero and his studies on psychological types, with contemporary extensions on differentiation of cognitive-affective styles that reveal the learning situation, bearing in mind the theoretical constructs of Psychopedagogy and Art Therapy to the relationships of teaching and learning.

Keywords: Identification, Hero, Myth, Learning and cognitive-affective styles.


 

 

Introdução

A proposta deste trabalho é apresentar, em primeiro plano, o enfoque sobre a importância dos heróis dos contos que possibilitam as projeções dos indivíduos em relação ao seu desenvolvimento psíquico na superação dos seus limites e fragilidades. Merece destaque, portanto a compreensão do arquétipo do herói e de suas tarefas que se revelam em narrativas nos contos e mitos. Segundo as palavras de Henderson "o mito do herói tem a atribuição essencial de desenvolver, no sujeito, a consciência do ego - o conhecimento de suas próprias forças e fraquezas - de maneira a deixá-lo preparado para as difíceis tarefas que a vida irá lhe impor" (1964, p. 110).

Neste sentido, dialogar com as possibilidades e desafios dos heróis dos contos constitui-se recurso valioso para os aprendizes poderem se identificar em relação às próprias capacidades na superação de possíveis dificuldades rumo ao desenvolvimento psíquico facilitado pela autoconfiança, autoestima e a conquista de autonomia na aprendizagem e construção do conhecimento.

Mircea Eliade (1986) nos dá suporte, nesta proposta, ao dizer que "ao viver o mito (o conto), sai-se do tempo profano, cronológico, ingressando-se no tempo sagrado primordial e recuperável." Essa é a diferença, para este autor, entre o homem moderno e o primitivo: para aquele o tempo é irreversível, enquanto que para este, pode ser recuperado quantas vezes for necessário através de um ritual. Contar histórias, vivenciar as façanhas dos heróis/personagens através da arte contribuem de maneira ritualística e significativa para que os aprendizes, ao se identificarem com os heróis das histórias, exercitem a projeção e introjeção de atitudes e comportamentos que irão ajudá-los no resgate da autoestima e autoconceito fundamentais para o exercício de uma aprendizagem desafiadora, mas prazerosa e significativa.

Quando se analisa com mais profundidade e propriedade a literatura dos contos e mitos, constatam-se diferenças sutis entre os tipos de heróis, em função de suas identidades e das tarefas que podem desenvolver.

O estudo dos recursos simbólicos que permeiam os contos, aliado à análise dos tipos de heróis que neles habitam, pode contribuir de maneira significativa para um trabalho psicopedagógico diferenciado que servirá de suporte para a ampliação da consciência e avanços positivos no processo de aprendizagem.

Carl Jung, Joseph Campbell e outros estudiosos dos contos e mitos colocam em destaque a força simbólica desse arquétipo no desenvolvimento psíquico:

Do ponto de vista psicológico a imagem do herói não deve ser considerada idêntica ao ego propriamente dito. Trata-se antes do meio simbólico pelo qual o ego se separa dos arquétipos evocados pelas imagens dos pais na sua primeira infância (...) cada ser humano possui originalmente um sentimento de totalidade, isto é, um sentido poderoso e completo do self e é do self (o si mesmo) - a totalidade da psique - que emerge a consciência individualizada do ego à medida que o indivíduo cresce (HENDERSON, 1964, p. 128).

Ampliando um pouco mais a ideia desse arquétipo, vamos ao encontro das diferentes figuras, dos diferentes personagens que nos mitos e contos vivenciam o papel do herói: o tipo bobo, o trapaceiro, o inocente, o feiticeiro que resolve seus desafios através da mágica e o que põe em prática sua astúcia, sabedoria e coragem para enfrentar os desafios que a jornada lhe impõe.

É através de estudos e pesquisas na área da Psicologia - infância e adolescência - que se sabe da importância de entrar em contato com esse arquétipo, uma vez que:

A principal tendência do inconsciente é construir um complexo de ego forte e que a maioria das dificuldades na juventude resulta de perturbações ocorridas nesse processo, seja pela influência negativa dos pais, seja pela experiência traumática ou qualquer outro distúrbio (VON FRANZ, 1990, p. 69).

Marie Louise Von Franz aprofunda na simbologia associada aos heróis dos contos de fada, mostrando como a dinâmica simbólica associa-se a essas diferenciações. Portanto, trabalhar os contos usando referenciais das pesquisas psicopedagógicas e recursos da Arteterapia abre uma possibilidade imensa para que a linguagem simbólica evocada através do arquétipo do herói se manifeste, permitindo um diálogo maior entre consciente e inconsciente, entre o mito e a realidade, favorecendo uma ampliação do ser-si-mesmo de maneira mais confiante e autônoma. É desta maneira que, ampliando o processo de autoconhecimento, o sujeito aprendiz se fortalece para entrar em contato com o erro e com os desafios inerentes a toda busca de novos conhecimentos, novas aprendizagens.

Quais seriam as funções cognitivas e suas diferenciações que configuram qualidades de aprendizagem que são também mobilizadas por essa dinâmica do desenvolvimento psíquico da criança e de sua aprendizagem? Atenção, memória, raciocínio lógico, interesse/motivação são exercitados quando se busca um entendimento maior de toda a linguagem simbólica que o conto ou mito apresenta.

Aliam-se a essas qualidades os diferentes estilos de pensar, sentir e aprender. O sujeito aprendiz apresenta sua singularidade: aquele mais racional-pensamento, que busca sempre a relação de causa-efeito do conteúdo que lhe é apresentado; o outro que busca avaliar de maneira bastante subjetiva esse mesmo conteúdo, valendo-se sempre de qualificativos como o justo, o belo, o valoroso, caracterizando a função sentimento; o aprendiz que se liga ao lado prático desse conteúdo, buscando uma práxis calcada no cotidiano, mostrando a função sensação-percepção mais aflorada; outro aprendiz que, a partir de determinado conteúdo apresentado, apoia-se no imaginário e nas metáforas, possibilitando a criação de projetos com características inovadoras, saindo da concretude do mundo em que se insere, trazendo toda a característica da função-intuição. Neste sentido, nossa proposta consiste em trazer contribuições que ajudem o profissional a responder a questões do tipo: Como ampliar essas diferenciações, com detalhamentos sobre os processos cognitivo-afetivos caracterizando tipos de linguagem diferenciados dos aprendizes? Como possibilitar, através dos contos, a criação de recursos projetivos positivos mobilizados pelo diálogo com os heróis e suas tarefas?

Em busca dessas conexões e ampliações, a equipe de pesquisadores do Setor de Pesquisa do Instituto Sedes Sapientiae desenvolve, com enfoque interdisciplinar, projetos acoplados a pesquisas que têm como meta aproximar os estilos cognitivo-afetivos do aprendiz às qualidades e características que os tipos de heróis permitem, favorecendo identificações, o mais próximas possível, com o perfil de personalidade de cada um. Dessa maneira, o educador/psicopedagogo tem condições de colocar maior intencionalidade em suas intervenções, adequando o conto preciso para poder dialogar terapeuticamente com seu sujeito/aprendiz/cliente.

A hipótese que se instaura como pano de fundo dessas pesquisas diz respeito à necessidade de se ter uma consciência maior sobre as características dos heróis e de suas tarefas, bem como dos diferentes estilos cognitivo-afetivos e de aprendizagem. Por meio das identificações com o herói, o aprendiz poderá ter facilitado o reconhecimento de suas capacidades, sendo possível desenvolver a autoestima e superar, dentro do possível, suas dificuldades, apoiando-se em suas habilidades mais inatas e desenvolvidas.

Dado importante para o desenvolvimento dessa temática consiste em se analisar também o arquétipo do herói vivenciado pelo professor e/ou psicopedagogo. Deve-se olhar esse tema sob diversos ângulos, focando também o estudo e análise sobre o ser e fazer (- se) professor, pois o arquétipo do herói é também evocado por ele em sua jornada simbólica no caminho do ensinar e do aprender. Como evocar o mito pessoal que se manifesta de maneira significativa em sua prática diária? Exercitar o mito do herói trazendo ampliações para seus alunos e ao mesmo tempo ser (o próprio educador) o herói do mito?!... Desafios que a prática docente coloca diante do quadro-negro, do giz, da internet, do computador!

Furlanetto nos ensina que:

Percebi que existia um espaço na formação dos professores que era pouco conhecido e explorado. A maioria das práticas formativas pauta-se no fornecimento de recursos teóricos e técnicos aos professores, que por sua vez só se utilizam quando constroem um sentido pessoal para esses conteúdos. Os espaços de formação se constituem em espaços de elaboração e construção de sentidos. Fui percebendo que a formação do professor não acontece somente no nível cognitivo, lógico, mas no nível simbólico (2001, p.6).

É neste sentido que merece destaque a compreensão e a autopercepção do professor em relação aos sentidos e significados da sua própria trajetória de herói enquanto aprendiz-profissional-educador, levando em conta sua singularidade. Tudo isto advém da sensibilidade e conhecimento que o educador/psicopedagogo, com seu trabalho preventivo e de superação das dificuldades de aprendizagem, deverá ter em relação a essa dinâmica e diferenciações.

No presente artigo focalizam-se os perfis de heróis, com suas diferentes tarefas baseadas nos estilos cognitivo-afetivos, que poderão trazer outra qualidade para avaliação e ação-intervenção psicopedagógica, facilitando identificações positivas, mobilizando a confiança no poder de atuação e aprendizagem do sujeito aprendiz.

As indagações que orientaram estas pesquisas são as seguintes: que concepção é esta de herói? Quais suas características? Quais os diferenciais da dinâmica psíquica associada aos estilos cognitivo-afetivos?

 

Concepções sobre heróis e suas dinâmicas psíquicas

Jung considera o herói como um arquétipo, isto é, "uma força inconsciente coletiva que atrai projeções" (SAMUELS, 1988, p. 88).

Há aspectos comuns de todos os heróis, se considerarmos o mito presente na mitologia clássica, do oriente, das tribos primitivas e das culturas, mesmo as contemporâneas. Esses mitos, que se apresentam também em nossos sonhos, guardam uma forma universal, como: nascimento, prova de força, seu desafio, sua ascensão, sua falibilidade e conquistas. Segundo concepções de Jung, assinaladas no dicionário crítico de análise junguiana:

O herói é um ser transitório, numa visão intrapsíquica, que representa a vontade e capacidade de procurar e suportar repetidas transformações em busca de totalidade ou significado (...) a totalidade de um herói implica não somente a capacidade de resistir, mas também sustentar conscientemente a tremenda tensão dos opostos (SAMUELS, 1988, p. 88).

Como então apresentar essas narrativas de heróis de forma a possibilitar as projeções positivas do aprendiz rumo às superações de suas dificuldades? Supomos que usar as narrativas de heróis, como elementos de intervenção para o desenvolvimento da autoestima em relação aos seus poderes e à consciência de seus limites, levando a uma ação mais satisfatória em busca da possível autonomia, no percurso singular de aprender, é uma das metas principais destes projetos acoplados a pesquisas sobre diferentes estilos de aprendizagem e o processo de simbolização e criação.

Ressalta-se, também, o fato já comprovado por Lacava (2010) e outros estudiosos do tema, em suas pesquisas, que ao se refletir sobre a linguagem simbólica dos mitos e seu papel na educação e formação docente, amplia-se a consciência surgindo possibilidade de se contatar com a arqueologia da psique, recuperando vestígios da história do desenvolvimento da consciência, do papel do educador tendo, no mito, a função de desencadear um sentido mais criativo para a ação, atendendo a compromissos da essência do humano. Neste sentido, o diferencial dessa pesquisa é que o educador/psicopedagogo ao elaborar atividades lúdicas e arteterapêuticas para resgatar processos de criação em seus alunos/aprendizes, acaba desvelando e assumindo seus próprios processos de transformação!

Carl Jung (apud FURLANETTO, 2003) afirma que:

O verdadeiro adulto não se contenta em ser mero repetidor de cultura, mas deseja produzir cultura e faz isso a partir de seu próprio desenvolvimento. Ao expandir-se no contato com o outro, transforma-se e transforma o outro. Para que um adulto possa responsabilizar-se pela sua educação, é necessário que busque se conhecer. Todavia, esse não é um processo simples, exige a coragem de nos defrontarmos com nossos aspectos criativos e sombrios (FURLANETTO, 2003, p. 20-21).

Essa pesquisa busca agregar e atualizar aos tipos de personalidade de Carl Jung a Teoria das Múltiplas Inteligências apresentada por Howard Gardner (1985) psicólogo e neurologista que afirma que um sujeito pode ter um desempenho precoce em uma área específica de conhecimento (matemática ou música ou linguística) e estar na média ou abaixo dela em outra área de estudo. A neurobiologia vem desenvolvendo pesquisas e, por meio destas, chegou-se à conclusão de que há áreas no cérebro humano que correspondem, de maneira aproximada, a certos espaços de cognição e de competências específicas. Acrescenta, ainda, que o fator sociocultural é outro dado que agrega características para que essas inteligências se manifestem e sejam estimuladas.

Gardner ao apresentar as múltiplas inteligências (lógico-matemática; linguística; espacial; cinestésica; musical; inter e intrapessoal; naturalista e existencial) nos abriu a possibilidade de agregá-las ao estudo dos tipos de personalidade apresentados por Carl Jung e aos estilos de aprendizagem aqui analisados. Percebe-se, entretanto, que se apoiando em cada um dos estilos cognitivo-afetivos, mais de uma inteligência apregoada por Gardner se faz presente e, neste sentido, seu estudo vem enriquecer mais ainda a proposta de se trabalhar com o aluno tendo uma visão integral de ser humano, valorizando a diversidade da sala de aula, mas resgatando a individualidade e subjetividade de cada aluno/aprendiz. Cabe ressaltar que as múltiplas inteligências de Gardner focaliza apenas as aptidões mentais das pessoas, tendo em vista as habilidades associadas a diferentes linguagens e específicas áreas do conhecimento, não levando em consideração a dinâmica da personalidade como um todo e as articulações entre afeto e cognição, dados esses apoiados nos tipos psicológicos de Carl G. Jung.

Dessa maneira, o olhar e o fazer psicopedagógicos ganham suportes interventivos de grande valia ao buscar estimular, através dos contos todas as qualidades de aprendizagem necessárias, buscando resgatar não só o aspecto cognitivo, mas também o afetivo que o ato de aprender suscita.

 

Conceituações sobre estilos cognitivo-afetivos e indicadores dos diferentes heróis com suas respectivas tarefas

Apesar das diferenciações desses estilos terem sido inspiradas, inicialmente, nas referências sobre tipos psicológicos, segundo Carl Jung, os desdobramentos sobre as diferenças e conexões com os processos cognitivos e afetivos ampliam as elaborações e discriminações, sem uso de categorizações padronizadas, pois as diferentes características ao se cruzarem ou se combinarem, em função do momento existencial das pessoas e diferentes contextos culturais, ganham matizes específicas.

Os estilos de aprendizagem, aqui apresentados, são passíveis de alterações e integrações em uma perspectiva fenomenológica.

Do ponto de vista semântico, a palavra derivada do latim "stilus" se associa à feição especial ou ao caráter de uma produção escrita, ou à maneira especial de exprimir os pensamentos e de se expressar na escrita. Nos estudos que fundamentam esta pesquisa, o significado de estilo se amplia, associando-se a certa forma do sujeito se revelar no seu contato consigo próprio e com o outro (FAGALI, 2000, p. 10).

Portanto, quanto aos processos cognitivos e afetivos, o estilo dominante e persistente relaciona-se a uma forma de captar e processar a realidade, usando predominantemente um tipo de pensamento e inteligência; um jeito próprio de se expressar mediado por uma determinada linguagem, verbal ou não verbal; uma tendência a utilizar determinados padrões comportamentais e mecanismos de natureza afetiva, ao dialogar com as emoções. Dessa maneira, conceituam-se os estilos cognitivo-afetivos, com enfoque fenomenológico, sem deixar de se considerar a psicodinâmica e as diferentes construções do pensamento, habilidades mentais e expressões criativas.

Nesta concepção, o enfoque fenomenológico diz respeito à singularidade do sujeito de captar e processar a realidade, no contato consigo próprio e com o outro, usando um "jeito singular" de processar o conhecimento, sentir e expressar-se, mediado pela linguagem verbal e/ou não verbal, tudo isto associando-se às diferentes características que envolvem os requisitos para uma boa aprendizagem como: atenção, memória, percepções, construção do pensamento, relação afetiva, defesa, interesses e expressões criativas.

 

Metodologia

Para avaliação dos estilos de aprendizagem acima elencados e das personagens heróicas e suas tarefas, foram usados os indicadores apresentados neste tópico. A meta para esses estudos é o aprofundamento, aprimoramento e criação de instrumentais de avaliação e intervenções psico-sócio-educacionais, com enfoque nos diferentes tipos de aprendizagem que emergem na dinâmica do ensinar e do aprender.

As pesquisas acumuladas desenvolveram-se de 2000 a 2011, com auxiliares psicopedagogos e professores, analisando-se ao todo duzentas crianças que se envolveram positivamente com os contos e que puderam ser acompanhadas durante todo o processo da pesquisa. Foram 65% do sexo masculino e os demais do sexo feminino, com idades que oscilavam entre 8 e 12 anos. Todos apresentavam problemas de aprendizagem relacionados à alfabetização e desenvolvimento da linguagem. Foram aplicadas avaliações segundo os indicadores dos estilos cognitivo-afetivos, conforme assinalado abaixo, com enfoque metodológico de estudo de caso, desenvolvido em supervisão psicopedagógica.

A avaliação dos dados foi feita por juízes que passaram por um processo de capacitação nessa teoria (coordenados por Eloisa Fagali) e que puderam fazer uma pesquisa que demonstrasse como as características dos tipos de personalidade se manifestavam nas questões da aprendizagem. A fundamentação teórica se norteou por levantamento de pesquisadores envolvidos com o tema, apresentados na relação bibliográfica no final desse artigo.

Tais estudos estão tendo continuidade até o presente momento, sob a coordenação de Eloisa Fagali e Lídia Lacava, autores do presente artigo, em busca de novas criações de contos e heróis, adaptados à nossa realidade, e das características diferenciadas dos estilos cognitivo-afetivos, visando a compreensão e utilização dos contos mediados por recursos arteterapêuticos, musicais, atividades lúdicas que facilitam a identificação e ampliação de cada um desses estilos.

Os indicadores para a análise dos heróis e identificações das crianças e adolescentes com os referidos heróis, segundo a característica dos estilos foram os seguintes:

  • Estilo cinestésico-ativo-sensório-perceptivo: bom desempenho na organização, no controle da situação, com base na observação, objetividade das respostas e ação concreta. Maior valorização das referências e modelos externos e da funcionalidade das coisas; interesse maior nas realizações concretas e com o que é utilitário e mais imediato. Busca objetividade, sistematização e imediata realização das tarefas. Maior incidência da atenção focada, da memória perceptiva e do raciocínio indutivo (processa a partir das partes e do concreto para chegar à abstração, ao teórico) com predominância da inteligência prática, cinestésica e psicomotora. Bom desempenho na função executiva associada ao plano de ação (planejar, esquematizar). As defesas se associam ao controle e à exigência de ações e presença do outro. A linguagem verbal ou leituras de interesse se atém às descrições, com foco nas observações do ambiente ou nas ações de personagens. Pouca presença de subjetividade e criatividade imaginativa.
  • Estilo cinestésico-passivo-sensório-perceptivo: bom desempenho nas elaborações ou trabalhos que requerem explorações das sensações e uso do corpo. Maior incidência das expressões não verbais corporais e cinestésicas devido à predominância do movimento psíquico que se volta para si próprio e menos para o outro ou o externo. Maior incidência da observação silenciosa, com poucas expressões verbais. Reage positivamente às situações vivenciais em que são utilizadas as sensações, manipulação de material, as artes visuais e o corpo. Maior valorização das referências e modelos externos, mas com o apoio de situações que possibilitam a espera e paciência no seu processo silencioso de exploração do material. Necessita de referências e de modelos externos para se situar de maneira mais confiante e segura. Os mecanismos defensivos ocorrem por meio das reações corporais como: paralisações, sensações de ausência e de "dar um branco" ou somatizações.
  • Estilo ativo-imaginativo-criativo: bom desempenho para criar com apoio na imaginação em que ocorrem improvisações, busca do novo, do inédito. Boa incidência de respostas que requerem transformações e não as repetições do percebido e aprendido. O pensamento e linguagem se constroem com apoio nas metáforas, na ficção e no poético com predominância de figuras de linguagem. Pensa por analogias em que se buscam as relações livres e espontâneas por semelhanças e aproximações. Incidência de evocações de imagens, sonhos que possibilitam olhar o invisível, buscar outros ângulos da realidade ou caminhos ainda não percorridos. Em relação às funções executivas apresentam dificuldades de organização, sistematização, mas processam com bom desempenho as associações simultâneas, associadas ao tempo e ao espaço, em busca de uma nova e criativa organização de si próprio e do outro, gerando transformações. Uso da intuição como sendo uma forma de percepção que se dá no nível inconsciente, captando o que está além do observado, utilizando as metáforas e os símbolos oníricos. Pensamento indutivo concreto e organização e sistematização com apoio maior na atenção alternada e panorâmica-global, pouco focada O imaginário, a ficção e o novo são os temas que geram interesse. Apoio na memória associativa e dificuldades na memória mecânica perceptiva. As defesas se associam ao uso excessivo da fantasia para se distanciar de algum impacto ou conflito da realidade. As atividades não diretivas, criativas simbólicas despertam grande interesse, principalmente se mediadas pela arte. As relações que não aprisionam, não enfatizam em excesso o pragmatismo e a concretização imediata são mais propiciadoras para o sujeito que se manifesta no aprender com essas características.
  • Estilo passivo-imaginativo-fantasioso: apresenta um movimento psíquico voltado para si próprio e afastado do externo. Maior incidência da imaginação, que se fixa em fantasias, metáforas e símbolos que se distanciam do que se apresentam no contexto presente. Pouca incidência de realizações criativas de natureza prática, com vistas a adaptações do momento, em função das solicitações do meio. Atenção alternada e panorâmica com ausências de foco e sustentação. Pouco contato com a memória associada aos fatos que ocorrem, mantendo a memória associativa apoiada na fantasia. Os aspectos afetivos se processam com muita influência da fantasia, tendendo a mobilizar defesas que levam a pessoa a distanciar-se da realidade, criando outra. A intuição é muito desenvolvida e apresenta muitas características semelhantes ao estilo anterior, mas com pouca efetivação das realizações voltadas para as solicitações do momento, devido à carga intensa de energia associada à idealização e fantasias. Dificuldades para desenvolver ou manter o raciocínio linear lógico e para obter bom desempenho nos planejamentos, sistematizações e realizações relacionadas aos planos de ação (função executiva).
  • Estilo empático-afetivo-comunicador: Maior incidência no uso da inteligência interpessoal: função de se comunicar com o outro, mobilizado pelas relações que envolvem afetividade, troca, contato subjetivo. Tende a manifestar seus interesses mais voltados para as questões pessoais que envolvem a relação eu-outro: alguns atentos aos valores éticos, morais e relações vinculares; outros utilizando sua competência ao lidar com o outro em busca de persuasão, sedução, envolvimento. Pode-se dizer que as aptidões das pessoas que possuem predominantemente este estilo se relacionam com a compreensão pela "lógica da emoção" utilizando a compreensão dos motivos subjetivos das ações humanas, projetando as emoções e desejos no e sobre o outro, com facilidade. São pessoas que tendem a pensar a partir da compreensão das particularidades dos fatos para, posteriormente, fazer generalizações mais abstratas e teóricas. A atenção é alternada e tenta buscar apoio na atenção focada. A memória associa-se a situações experienciadas. Não apresentam muita propensão a bons desempenhos na função executiva em relação ao planejamento que requer lógica na operacionalidade. Esses indivíduos estariam mais propensos a utilizar com maior eficiência a inteligência emocional (GOLLEMAN, 1995). Suas defesas ocorrem pela sedução e persuasão sobre o outro.
  • Estilo autocrítico-afetivo: maior incidência no movimento de autoconhecimento, de colocar-se no lugar do outro, privilegiando a relação empática. Tais sujeitos apresentam traços muito semelhantes ao estilo empático-comunicativo, com um diferencial no movimento que se volta para si próprio. A comunicação com o outro é mais silenciosa e cautelosa, apesar do poder de escuta e acolhimento. Atenção alternada e focada em si próprio. Memória associativa relacionada ao já vivido e experienciado, funções executivas mais voltadas para a sistematização, elaboração de planos e execução de tarefas quando se referem a questões subjetivas e de autoanálise. Apresentam defesas com tendência a recolherem-se e buscar autorreflexão e autoanálise, com poucas tendências a projetar no outro ou no meio as causas dos problemas, tendendo a responsabilizarem-se, muitas vezes, com excessos de culpa. Autocrítica é acirrada tendo que lidar com o obstáculo do ambiente que não depende da pessoa, tendem a se defender com postura onipotente em relação às responsabilidades ou a regredir, buscando uma condição de conforto anterior ao que estão vivendo. Segundo as referências de Gardner (1995), essas características poderiam ser associadas ao que o autor denomina de inteligência intrapessoal.
  • Estilo racional lógico: essas pessoas se manifestam com alguns diferenciais, devendo, assim, situá-las em duas dimensões: prática-teórica e analítica-sintética. Carl Jung, ao se referir aos tipos que ele denomina de pensamento lógico - introvertido ou extrovertido - fala-nos da dinâmica relacional e dos processos defensivos utilizados com mais frequência e intensidade pelas pessoas que tendem a manter um contato com o mundo utilizando esses recursos cognitivo-afetivos. Tendem a buscar distanciamento do subjetivo e do emocional, apoiando-se mais no mental, na utilização de mecanismos de racionalização, justificativas e explicações lógicas diante das situações-problemas e mesmo daquelas carregadas de emoção.

Essas pessoas que adotam um estilo cognitivo-afetivo valorizando e usando esses mecanismos racionais e defensivos geralmente são consideradas como "pessoas cabeças".

Pode-se desdobrar, com base nas atitudes introvertida e extrovertida, nos seguintes estilos:

  • estilo lógico prático: esses são geralmente extrovertidos, e buscam as explicações visando aplicações, acomodando as solicitações do mundo às necessidades do meio. Sua comunicação com o outro, na construção do conhecimento coletivo é preservada, desde que as mediações sejam as ideias, o diálogo com os princípios teóricos e as suas aplicabilidades, as argumentações.

A inteligência verbal de Gardner pode ser uma capacidade bem utilizada por essas pessoas que tendem mais a esse estilo, mas prendem-se a uma capacidade verbal mais explicativa, conceitual e não poética e subjetiva;

  • estilo lógico teórico: esses são geralmente introvertidos e se envolvem mais nas especulações teóricas, nos desafios dos cálculos e das teorias, nas investigações e pesquisas em busca do conhecimento explicativo. Apresentam mais dificuldades na comunicação e se fixam nas especulações abstratas sem muita preocupação com a aplicabilidade. Se considerarmos a inteligência matemática de Gardner, esses estilos lidam bem com ela. Apresentam maiores dificuldades de contato. Os aprendizes com esse estilo enfrentam muitos desafios quanto às relações afetivas presentes no processo do aprender.

Em ambos os casos, há uma tendência em buscar o foco, a análise dos detalhes e nem sempre usam a exploração do todo, gerando as especialidades ou a fragmentação do conhecimento.

A partir de estudos e pesquisas junto a crianças e adolescentes, foram diferenciados parâmetros de avaliação para identificar os estilos de aprendizagem segundo os perfis de heróis.

 

Análise dos resultados

As avaliações de natureza qualitativa foram feitas com base nos indicadores dos estilos cognitivo-afetivos e suas identificações com os heróis dos contos apresentados, após as primeiras análises feitas pelos juízes sobre os estilos nos heróis. Os contos foram aplicados em crianças como estudo de caso, considerando a escolha e identidade das mesmas em relação aos estilos cognitivo-afetivos, trabalhados em supervisões e também apresentados em monografias na PUC/SP e no Instituto Sedes Sapientiae/SP. Foram selecionados 10 juízes para análise dos dados. Vale destacar que muitos dos juízes (70%) foram professores e psicopedagogos que trabalharam clinicamente com essas crianças e continuaram suas pesquisas. Suas análises, no entanto, não diferenciaram significativamente dos outros pesquisadores (30%) professores, psicopedagogos e arteterapeutas que não lidaram diretamente com as crianças, mas que orientaram as práticas e colaboraram na análise dos heróis em relação aos estilos aqui apresentados.

As histórias e contos escolhidos, buscando identificar o tipo de herói dentro dessa proposta, seguem abaixo, apresentando-se um recorte da referida pesquisa:

1- Os Três Porquinhos - o herói prático e sua tarefa se associaram às características do estilo concreto-ativo-sensório-perceptivo, pelo seu senso prático, objetivo e eficiente de construir casas de tijolos resistentes às ameaças de sopros do lobo.

2- O Gato de Botas - apresenta grande capacidade de elaboração, argumentação e de lidar com estratégias de negociação a serviço de seu dono. Um herói que demonstra capacidade e desempenho de uma tarefa que se associa às características do estilo racional-lógico-prático, mas também com traços de estilo empático-afetivo-comunicador, no uso das artimanhas para efetivar uma boa negociação.

3- João e Maria - duas crianças que se complementam mobilizadas pelo arquétipo masculino e feminino (Jung), apresentando capacidades diversificadas e até opostas que possibilitam tarefas diferentes. A heroína Maria apresenta características e tarefas associadas ao estilo empático-afetivo-comunicador, com grande poder de persuasão e de jogo das emoções, quando, por exemplo, lida com a bruxa até sua morte e salvação dela e de seu irmão. Por outro lado, o herói João se apresenta com estilo concreto-ativo-sensório-perceptivo, ao buscar pistas para se situar no caminho de volta da floresta, com demarcações na estrada apesar dos recursos frágeis usados como marcas no caminho.

4. A Cigarra e a Formiga - a cigarra, com o encanto poético musical se mostra com as qualidades intuitivas apoiando-se na fantasia de viver, com características do estilo passivo-imaginativo-fantasioso. Por outro lado, a formiga, com traços concreto-ativo-sensório-perceptivo em busca de ação e controle da situação de sobrevivência para se alimentar no inverno em que as dificuldades se apresentam.

5. O Flautista Mágico - com encanto e magia, com muita habilidade para tocar sua flauta com melodias mágicas, salva a cidade das invasões dos ratos, utilizando sua grande capacidade criativa e artística, em busca de soluções mágicas diante dos olhos do leitor. O herói apresenta qualidades que se associam ao estilo ativo-imaginativo-criativo que tem o poder de criar e transformar o que já existe.

6. João e o Pé de Feijão - com a magia e a busca do que está além das condições concretas, o garoto dessa história demonstra a saída do perceptivo-concreto em busca da qualidade intuitiva, enfrentando os gigantes que estão acima do real, do concreto e trazendo para a terra o encanto da galinha dos ovos de ouro que transforma a realidade contribuindo para a sobrevivência dele e de sua mãe.

7. A Galinha que descobre ser Águia e O Patinho Feio que descobre ser Cisne - trazem características próprias da capacidade e tarefas associadas à busca de identidade e autodescoberta que requerem as qualidades do estilo autocrítico-afetivo que atravessa o sentimento do abandono em busca da descoberta de sua identidade, revelando sua força, beleza e capacidade.

8. O Joelho Juvenal / Pelegrino e Petrônio / Os dez amigos - contos de Ziraldo que falam e apoiam-se nas próprias sensações e possibilidades corporais, características dos recursos utilizados pelo estilo concreto-passivo-sensório-perceptivo.

9. Mágico de Oz - sua heroína busca o desenvolvimento de sua identidade em relação ao self (busca da totalidade) e encontra partes do seu ego através de heróis de diferentes estilos (outros personagens da história, com destaque para o herói coração, onde são associadas as qualidades do estilo empático-afetivo-comunicativo).

 

Discussão das análises

Constataram-se as hipóteses de que as características dos diferentes estilos levantados nas análises dos juízes coincidiam com as escolhas das crianças ou por desejarem alcançar uma característica que ainda é desafiadora (eu ideal), ou por se identificarem com o estilo do herói da história ou conto (eu real). As escolhas e explicações das crianças sobre os heróis e como elas se viam, ao entrar na história e comentarem sobre si próprias confirmaram hipóteses e forneceram pistas para o diálogo com aceitação do seu estilo e desenvolvimento de outras características que possam ampliar suas capacidades, sem se perder de vista o resgate da autoestima que, naquele momento, as colocavam em situações desafiadoras na aprendizagem. Outros contos e heróis analisados e apresentados não foram considerados por se manter ainda ambíguos nas análises e identificações, carecendo de maiores detalhamentos nos estudos.

Há necessidade de se criar novos contos e heróis inspirados nessas diferenças de estilos e tarefas, com foco nos valores contemporâneos, atividades que os pesquisadores estão desenvolvendo neste momento, com apoio nos escritos literários infanto-juvenil.

 

Considerações finais

Pensando na trajetória desses heróis, eles não se bastam e precisam se desenvolver mais, para além do seu estilo predominante, em busca da integração e complementação das outras forças, próprias dos outros estilos. Mas sua tarefa predominante se inicia com as qualidades próprias do seu estilo, no começo da trajetória. No entanto, seu percurso de herói é mobilizado pela busca da integração, ampliando suas capacidades, no seu processo de individuação, conforme conceitua Carl Jung.

Consideramos que o trabalho com o conto e com os heróis que neles habitam necessitam da escuta do outro e do mergulho no imaginário para poder fazer associações possíveis e não rígidas sobre as qualidades desses personagens e sobre a natureza de suas tarefas, levando em conta as forças do inconsciente e suas constituições de identidade. Busca-se, assim, ampliar as formas de ser, aprender e executar tarefas apoiadas em vivências arteterapêuticas que as histórias propiciam.

Se o educador tiver essa consciência poderá selecionar e usar as histórias como meios que poderão possibilitar aos aprendizes identificações com os heróis em função da própria identidade relacionada aos estilos cognitivo-afetivos. Ampliam-se, dessa maneira, essas condições de integração que ocorrem no processo de individuação, para além da rigidez ou da fixação em apenas uma dessas características associadas a um estilo específico. Há necessidade, no entanto, de se abrirem espaços para a formação do profissional, mobilizando o diálogo com o simbólico que, neste caso, seria o herói dos contos e dos mitos, em busca das elaborações e identificações da dinâmica psíquica de cada um, no desempenho de suas tarefas.

Se elaborarmos, com mais profundidade, a trajetória de todo herói, verificaremos essa ampliação e busca de integração das diferentes qualidades associadas aos diferentes estilos cognitivo-afetivos. É muito significativo levar em conta a forma de contar a história, com paradas que mobilizem os processos de projeções e identificações, por meio de perguntas e sugestões.

O trabalho com os contos, sob esta perspectiva, traz outra qualidade para a ação do psicopedagogo, pois através da linguagem simbólica dos contos abre-se um espaço terapêutico para o aprendiz entrar em contato com seus monstros e, através de experimentos arteterapêuticos, aflora-se a possibilidade de simbolicamente destruí-los e, em seu lugar, surgir a "espada mágica" - o "brasão da força" que irão fortalecê-lo e protegê-lo durante seu percurso acadêmico.

Esta atividade, usada como intervenção no setting psicopedagógico fazendo-se uso de experimentos da Arteterapia, possibilita ao sujeito aprendiz não só entrar em contato com suas habilidades no processo de aprendizagem, mas principalmente, aumentar sua autopercepção. Esta forma de contar história se caracteriza como outro jeito de se lidar com a simbologia dos contos; é o caráter dialógico que toda relação terapêutica/psicopedagógica deverá ter.

Concluímos essas reflexões em torno das análises preliminares do estudo, convidando educadores e pesquisadores a dar continuidade a esse trabalho, mobilizando as identificações e ampliações de identidade dos aprendizes que escutam e interferem nos contos, de forma participativa e criativa.

Esse estudo, como afirmado anteriormente, busca não só o resgate da autoestima do aprendiz, mas também é um exercício de ampliação da consciência do ser e fazer (-se) do professor, pois ao facilitar ao seu aprendiz novas possibilidades de vivenciar o arquétipo do herói nos contos, poderá visualizar novas reorganizações e ressignificações pessoais que, certamente, refletirão no profissional. Lacava (2010) corrobora essa ideia ao afirmar que:

A ação impulsionadora e motivadora do educador/psicopedagogo deve estar calcada em dois movimentos que funcionam como linhas/guias conduzindo-o por duas vias: uma da afetividade, outra da cognição; uma do sentimento, outra da razão permeando suas ideias, pois são esses movimentos aliados à sensibilidade e criatividade que ajudarão na configuração de um profissional que poderá trazer outra qualidade para sua atuação, refletindo de maneira ímpar em seu aprendiz.

Tendo em vista o diagnóstico e intervenção psicopedagógica, com apoio arteterapêutico e literário, as investigações continuam ampliando e explorando cada vez mais os diferentes ângulos do sujeito, do conhecer e do aprender. Consideramos fundamental dar continuidade a esse estudo que requer do pesquisador outro jeito de vivenciar e olhar a relação consigo próprio e com o outro, em busca da integração possível e sempre aberta de si próprio, do outro e do conhecimento, conscientes do que Morin enfatiza:

Não podemos perder de vista de que fazemos "pequenas incisões" no microssistema ao lidarmos com um diagnóstico e intervenções, com efervescência, pois [...] é necessário que a nova ideia beneficie a partida de uma microefervescência... Depois as fervuras multiplicam e os fermentos multiplicam as fervuras (MORIN, apud FAGALI, 2001, p.326).

Efervescências que nos mobilizam emocionalmente para continuarmos nessa descoberta do outro com a intenção de ajudá-lo a se integrar mais e a alcançar condições dignamente humanas...

 

Referências

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