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Construção psicopedagógica

versão impressa ISSN 1415-6954

Constr. psicopedag. vol.21 no.22 São Paulo  2013

 

O vocábulario do criador os seis elementos das artes plásticas como ferramentas para terapeutas e educadores: qualidades e aplicações

 

The creator´s vocabulary the six art elements as tools for therapists and educators: qualities and applications

 

 

Luciana Betti de Oliveira e Souza

Licenciada em Artes Plásticas pela Universidade São Paulo, Especialista em Arteterapia pela UNIP São Paulo. Endereço eletrônico: luciana@ouvirativo.com.br São José dos Campos, São Paulo, Brasil

 

 


RESUMO

Ponto, linha, superfície, luz e sombra, cor e volume, são os elementos plásticos que formam tudo aquilo que tocamos ou vemos. Eles formam o vocabulário básico do artista e conhecê-los é poder aguçar a percepção e compreensão da obra criada. Uma vez que a criação é também o espelho daquele que cria, podemos usar esses elementos básicos como chaves para abrir as portas para dentro da alma e dos processos internos do ser que se expressa, seja ele paciente ou aluno. Entender e conhecer mais a fundo estes seis elementos plásticos pode ampliar os recursos profissionais de terapeutas e professores.

Palavras-chave: Ponto, Linha, Luz, Cor, Volume, Arteterapia, Técnicas, Aplicação pedagógica e terapêutica


ABSTRACT

Point, line, surface, light and shadow, color and volume are the basic art elements that form everything that we see or touch. They form the artist's vocabulary and to know them allow us to perceive and comprehend in a deeper way what was created. As the artistic work is also the portrait of the creator, we can use these basic elements as keys to open the doors to the soul and the internal landscape of a person, who might be a patient or a pupil. To know and understand these six art elements can enlarge teachers and therapists' resources.

Keywords: Point, Line, Light, Color, Volume, Art Therapy, Technique Application in Pedagogy and therapeutic.


 

 

1. Introdução

Conforme você aprende os elementos das artes, um por um, através de estudo, observação e desenho, você passa por um processo natural de crescimento. Você expande a lógica da natureza para dentro de você mesmo. Conforme você desenvolve a maestria sobre estes elementos, você se torna uma personalidade mais profunda, mais rica, com uma habilidade de ver além da superfície das coisas (HALE,1993, p.13 ).

Nos seus tratados "Do Espiritual na Arte" e "Ponto, Linha e Plano", Wassily Kandinsky (1977 e 1970) apresenta quatro elementos visuais básicos: o ponto, a linha, a superfície e a cor. Já Fayga Ostrower (1983), no seu livro Universos da Arte, apresenta cinco elementos visuais: a linha, a superfície, o volume, a luz e a cor. Deixou de fora o ponto, tão valorizado por Kandinsky. Da união das ideias destes dois grandes artistas chegamos a seis elementos das artes plásticas: o ponto, a linha, a superfície, a cor, a luz/sombra e o volume.

Todo o nosso universo plástico pode ser entendido como sendo formado por um ou uma combinação destes elementos. Eles são o abecedário do criador, seu vocabulário básico, com o qual ele pode criar e observar tudo o que desejar. Conforme aprofundamos nosso olhar sobre eles, podemos usá-los com maior propriedade em trabalhos pedagógicos e terapêuticos, pois o produto artístico revela aquele que o criou e afinal, na criação artística, perceber e lidar com a relação de formas, linhas, cores são aspectos vitais do trabalho. No depoimento de Selma Ciornai temos a confirmação desta colocação:

Entre os fundamentos do trabalho e do pensar fenomenológico que adquiri ao longo dos anos, primeiro foi aprender a realmente ver e reconhecer categorias visuais e relações estruturais independentemente dos conteúdos implícitos ou explícitos que eventualmente representassem. Inúmeras vezes ouvia nas aulas do prof. Hesse: "O que você vê? Não, isso é sua interpretação, descreva o que você vê." Linhas, formas, cores, composição, movimento, léxico e sintaxe da linguagem visual, razão pela qual o terapeuta que utiliza recursos artísticos no trabalho terapêutico precisa ter familiaridade e intensa vivência pessoal com a linguagem plástica para desenvolver um olhar mais apurado para a linguagem da arte (CIORNAI, 2000, p. 43).

Nathan Cabot Hale coloca que "os elementos das artes são um entendimento e uma reflexão refinados dos caminhos criativos da natureza. Eles são a chave para os segredos e expressões da natureza" (HALE, 2000, p.13). Podemos dizer então, que o entendimento destes seis elementos nos leva para o cerne das artes, para a sua linguagem mais essencial e nos coloca em conexão com as ideias mais básicas da natureza. Ao mesmo tempo nos leva para o cerne do indivíduo que produziu a obra. Os elementos abstratos das artes plásticas nos permitem ir além do mundo material e nos colocam dentro das ideias do Criador e da natureza. O artista criador e o Grande Criador se encontram.

 

2. O universo plástico: os seis elementos, seus qualificadores, materiais, técnicas e atividades expressivas.

No início, Deus, numa decisão sem disputas, escolheu a reta e a curva para imprimir sobre o mundo a divindade do criador. Assim Deus, o que tudo sabe, concebeu um mundo físico cuja natureza toda está contida dentro das polaridades de linhas curvas e retas (KEPLER, apud JAMES, 2006, v.8, n.2).

Poderíamos ampliar essas colocações de Kepler dizendo que na gênese das formas temos a linha, o ponto, a superfície, a luz e sombra, a cor e o volume. É sempre admirável constatar que todo o nosso mundo plástico é construído e percebido a partir destes seis elementos apenas, ou seja, tudo o que vemos e tocamos, é formado por um ou por uma combinação destes elementos. Eles podem ser modificados segundo seus qualificadores, se expressam através de materiais e técnicas e podem ser usados em vários tipos de atividades ou recursos expressivos.

Os qualificadores são aqueles que trazem alguma qualidade diferenciada para o elemento, permitindo que ele tenha diferentes expressões. São eles: textura, intensidade, ritmo, movimento, direção, velocidade, fluxo/interrupção, dimensão, forma, repetição, localização no espaço, peso, cheio/vazio, tamanho, etc.. A mesma linha pode, por exemplo, ter expressões diferentes se sua intensidade for mais forte ou mais fraca, se for produzida rápida ou lentamente, se sofrer algum tipo de texturização ou de acordo com seu lugar no plano.

Os materiais são a matéria, a substância física que se oferece para permitir que os elementos possam aparecer e se expressar: papel, argila, pigmento, carvão, grafite, nanquim, pedra, metal, fios, giz, lã, pigmentos, terra, etc. Eles possuem qualidades diversas e portanto permitem vivências diferentes. Na lã, por exemplo, temos o calor e o fator da sua origem animal, no algodão temos mais frescor e a origem vegetal. A argila nos traz o frio, o endurecer no processo de secagem e muitas vezes o rachar, sua origem é mineral; já a cera de abelha para modelagem é cheia de calor, transparência e tem origem animal: a abelha, que tem grande ligação com a luz e com o ar. A argila aterra, a cera de abelha torna mais leve.

As técnicas nos dão o como trabalhar o material: a matéria pigmento, por exemplo, pode ser trabalhada através da técnica da aquarela, da tinta a óleo, da têmpera, do pastel, do giz de cera, entre outras. Cada uma destas técnicas pede uma maneira e postura diferentes de trabalho. Por exemplo, a aquarela pede que se trabalhe cuidadosamente do leve para o intenso, pois é mais difícil corrigir eventuais erros, a tinta a óleo permite sobreposições e correções mais ousadas, mas não permite a transparência da aquarela. A técnica de trabalho com argila, no torno, pede uma postura e proporciona um tipo de desafio completamente diferente da modelagem manual.

Entre outras técnicas temos: colagem, xilogravura, gravura em metal, aquarela, têmpera, giz de cera, lápis de cor, pastel seco e oleoso, modelagem, torno, técnicas de desenho, escultura em pedra e em madeira, lapidação de pedras, joalheria, trabalho em metal, marcenaria, tecelagem, cestaria, técnicas de trabalhos com fios: tricô, crochê, bordado, costura e encadernação.

Os tipos de atividade ou exercícios, ou seja, os recursos expressivos nos dão "o quê" fazer, proporcionando vivências e experiências variadas, acessando camadas internas daquele que cria: criação de tigelas e vasos, desenho de observação, desenho dinâmico, desenho de imaginação, construção de lanternas, panôs, tecelagem, olho de deus, mandalas, criação e transformação de imagens, meu mundo numa caixa e inúmeros outros recursos.

Assim, temos no recurso expressivo olho de deus (Figura 1), o trabalho com o elemento linha (movimento), com o elemento ponto (cerne ao redor do qual tudo gira) e com o elemento cor. A matéria utilizada é lã (calor, animal) e madeira (firmeza, vegetal) e a técnica é um tipo de tecelagem.

 

 

3. Qualidades essenciais e qualidades simbólicas dos elementos

Podemos olhar para os elementos a partir de dois níveis:

3.1 Nível da essência - onde o elemento se expressa na sua essência básica, onde não há preocupação em representar nenhum objeto ou forma figurativa. Kandinsky (1970) chama este nível de abstrato. O significado da palavra abstração (abs: para fora + tração: tirar, puxar, arrancar) é o ato de trazer para fora a qualidade essencial de algo. O trabalho com a essência básica da linha acontece, então, quando retas e curvas e suas infinitas combinações podem se expressar livremente, sem o compromisso da figuração, enriquecidas pelos qualificadores (intensidade, velocidade, ritmo, etc.). Temos nas artes dos povos chamados primitivos, na arte megalítica e na conquista da arte abstrata no séc. XX, exemplos de trabalhos com a essência dos elementos.

3.2 Nível simbólico - onde o elemento é usado no seu caráter simbólico, permitindo acesso desde as camadas conscientes até as mais inconscientes do ser. Por exemplo, usa-se a linha na sua dimensão simbólica, quando se trabalha a linha da vida, a linha de pensamento, a linha de fluxo de movimento, a linha do andar de uma pessoa, a linha da entonação da fala, entre outras.

 

4. Ponto

4.1 Essência

"O ponto geométrico é um ser invisível" (KANDINSKY, 1970, p. 35). Não possui dimensão e, portanto é imaterial. Ele é a forma mais concisa, concentrada e absoluta possível, de onde tudo se origina. É o alfa e o ômega, o início e o fim, o silêncio e a palavra. É o grande UM de onde tudo nasce. É indivisível, não conhece a polaridade, é a unidade, o todo. Coloca-se no plano ou no espaço sem indicar movimento, ao contrário, marca uma localização estática com precisão absoluta. Sua tensão concêntrica enfatiza sua estabilidade e o estar fechado em si mesmo. Não revela nenhuma tendência e é como um mundo isolado do seu em redor.

"É assim, interiormente, a afirmação mais concisa e permanente que se produz breve, firme e rapidamente" (KANDINSKY, 1970, p. 41), quase que eliminando o fator tempo de sua execução e percepção. Ele é imediato. O ponto é o centro de onde tudo irradia. É o cerne. É a referência máxima sem nenhuma ambiguidade.

Palavra-chave: CENTRO

4.2 Nível simbólico

O ponto representa o líder, o centro. Pela sua qualidade de unidade absoluta, de união dos opostos, do seu poder de concisão e contração, que é ao mesmo tempo mínimo e máximo, o ponto pode ser associado à figura de Deus Pai, Aquele do qual tudo nasceu. Temos nas mitologias: Odin, Zeus, Tupã, etc. Pode também ser associado ao centro da personalidade, o Self, ou o centro da consciência: o Ego. Está relacionado com tudo que é central e essencial.

Histórias: Gênesis e mitos da criação.

4.3 Qualificadores, materiais, técnicas, recursos expressivos

Os principais qualificadores que podem atuar sobre o ponto são: localização no espaço, intensidade, tamanho, densidade. Qualificadores que se relacionam com movimento não podem se aplicados a ele. Qualquer material que se preste a deixar uma marca pode ser usado para representar o ponto. Técnicas e recursos expressivos que lidem com a questão do centro são apropriados para se trabalhar com este elemento. A confecção de mandalas, por exemplo, é feita se tendo o centro como referência. Bernardo (2008, p. 15) nos conta que para Jung, a mandala é "um caminho de conexão com a totalidade psíquica, facilitando uma maior integração de aspectos conscientes e inconscientes". Moldar peças de argila no torno é outro exemplo, pois requer que as peças sejam centradas, ou seja, girem perfeitamente equilibradas em relação ao seu ponto central.

4.4 Aplicação pedagógica e terapêutica

Trabalhar o elemento do ponto leva a: centrar, focar, unir, integrar, estabilizar, auto-valorização, espiritualização, trabalho sobre o Self/Eu, conexão, integração do consciente com o inconsciente, totalidade.

Pode-se vivenciar bem a qualidade do ponto nos trabalhos circulares e de mandalas, onde o centro é a tônica, e nos desenhos de perspectiva linear onde os pontos de fuga são a referência da construção da imagem e, onde a consciência do ponto de vista do observador (Eu-Self) é potencializada ao máximo. Também nos estudos da composição, o ponto tem papel de importância como centro (ou centros) de convergência da composição, nem sempre aparecendo no centro geométrico do plano ou do volume, mas sim no lugar para onde o nosso olhar é dirigido e onde, este mesmo olhar, pode encontrar repouso ou um local de parada dentro da construção da obra.

 

5. Linha

5.1 Essência

As origens dinâmicas da linha ficam ressaltadas nas colocações de Phillipe Sers, na introdução do livro de Kandinsky, "Ponto, linha e plano", de como a linha é "uma força exterior (que) pode forçar o ponto numa direção, destruindo a sua tensão concêntrica, fazendo dele um ser novo, submetido a novas leis" e de como ela possui como "característica essencial a intervenção de uma ou de várias forças exteriores que permitem a passagem do estático ao dinâmico" (KANDINSKY, 1970, p. 11).

O próprio Kandinsky nos ajuda a perceber isso quando diz que:

A linha geométrica é invisível. É o rasto do ponto em movimento, portanto, é o seu produto. Nasceu do movimento, e isto pelo aniquilamento da imobilidade suprema do ponto. Aqui se dá o salto do estático para o dinâmico. A linha é portanto, o maior contraste do elemento originário da pintura que é o ponto (KANDINSKY, 1970, p.61).

As colocações acima contam muito da personalidade da linha. A linha é dinâmica, interessada no seu em redor e em relação ativa com ele, bem diferente do ponto que se "fecha em si" e mantém a tensão e a força do seu centro. A força da linha está no seu movimento, e também, na relação que cria com o seu entorno. Poderíamos até mesmo dizer que linha é puro movimento e que, no seu movimento, nos aponta uma direção. São como setas nos dirigindo para um ou outro lado (OSTROWER, 1983).

As linhas abstratas representam as forças por detrás do nosso mundo aparente, expressam o movimento destas forças ou energias: vórtex, ondas, movimento radial e axial, serpentear, junção, cruzamentos, crescimento, formação de estruturas, espiral, grades, laços, loopings, simetrias, etc.. Na sua essência, a linha possui apenas duas formas de se expressar: como reta ou como curva. A linha reta é rápida, focada na sua direção, no seu lugar de chegada, nada a desvia da sua meta. A curva é tortuosa, e seus meandros são mais importantes do que a meta, o caminho é mais importante do que o destino final. Kandinsky (1970) diz que ela é dramática.

Palavra-chave: MOVIMENTO.

5.2 Nível simbólico

A linha tem o caráter de movimento, direção e relacionamento (quando une dois pontos, quando estabelece enlace, laços ou vínculos entre pessoas). A linha aponta e direciona. A linha pode também separar quando estabelece limites. Podemos trabalhar com ela os símbolos do amarrar e do libertar, do soltar as amarras para poder seguir para algo novo. Podemos associá-la ao Deus Mercúrio, o mensageiro dos deuses gregos em constante movimento. Ela pode ser também um guia, como o fio de Ariadne que salvou Teseu no labirinto do Minotauro. Podemos confiar na linha, ela sabe o caminho, como o rastro que ajudou João e Maria a achar o caminho para casa no conto dos irmãos Grimm. "Confiar significa fiar com, tecer junto" (BERNARDO, 2008, p.25). "A capacidade de atar e de desatar, utilizada na tecelagem e na costura é considerada mágica e um atributo dos Deuses em quase todas as culturas" (BERNARDO, 2008, p.26). As três Moiras da mitologia Grega, por exemplo, tecem o destino, o fio da vida, a biografia. Clotho fia, Lachesis tece e Atropos corta o fio (CLAYTON, 1990).

Outro atributo da linha é o de nos ajudar a estruturar, organizar, dar ordem ao caos, embora possa também expressar todo esse caos.

Das funções apresentadas por Carl Jung, a linha está ligada à função pensamento e ao elemento ar, "que nos remete ao intelecto, à estratégia, mas também aos nossos devaneios e às histórias. Além disso, esse elemento relaciona-se com a comunicação e com nossas relações: às tramas que compõem a nossa existência" (BERNARDO, 2008, p.110).

No nosso corpo podemos ver a linha na estrutura óssea, mas também nos fluxos dos fluídos e principalmente do sangue, que faz a ligação e a comunicação entre os diferentes órgãos. Ele é o transportador de substâncias e informações. Quando confiamos no nosso sangue e no nosso coração, podemos seguir pela linha da vida com confiança. Talvez possamos fazer o paralelo simbólico do coração como o ponto, que quando pulsa coloca a linha/sangue em movimento.

Histórias: O Fio de Ariadne, João e Maria, O Alfaiatezinho Valente (linha=pensar, esperteza)

5.3 Qualificadores, materiais, técnicas, recursos expressivos

A linha pode se expressar de maneiras muito diferentes se submetidas a qualificadores como: direção (ascendente, descendente, diagonal, vertical, horizontal etc.), intensidade, quebra ou interrupção da linha, ritmo, espessura, velocidade, posição espacial, tamanho. Os materiais que nos permitem trabalhar com a linha, ou a ideia da linha, são todos aqueles capazes de fazer um traço numa superfície qualquer: lápis, caneta, giz, pincel e tinta, buril, bico de pena etc., e aqueles que lembram a linha pelo seu caráter de fio: arame, linhas de costura, bordado, lã, barbante, fios de metal, dentre outros. Os recursos expressivos ou atividades podem ser: desenho, gravura em: metal, pedra (litogravura), madeira (xilogravura); olho de deus, desenho de mandalas, tecelagem, costura, bordado, fiação, cestaria, macramê, encadernação, trabalho com histórias, tricô, crochê, caminho do herói, representação da linha da vida, etc.

5.4 Aplicação pedagógica e terapêutica

Criar vínculos, ligação, amarração; desenvolvimento do movimento, pensar, raciocínio, comunicação, ordenação e organização. Trabalhar com a linha desenvolve o movimento e, portanto, a fala, o andar, o escrever, o pensar, o raciocínio, a comunicação. Facilita a criação de vínculos, em trabalhos como tecelagem ou qualquer atividade que envolva o entrelaçar de fios (se feito em duplas ou em conjunto, mais forte se torna essa ação). Possibilita o olhar para a linha da vida, a biografia, a partir de, por exemplo, desenhos, histórias, ou da confecção de um panô (BERNARDO, 2008). Pode ajudar o processo de ordenação em trabalhos como macramê, tecelagem, encadernação e caligrafia.

Dentro da pedagogia Waldorf, criada na Alemanha por Rudolf Steiner no começo do século XX, a atividade do Desenho de Formas ou Desenho Dinâmico (figuras 2 e 3) pretende justamente trabalhar com a linha como força e movimento, ainda livre do compromisso com a figuração. Steiner, na sua proposta pedagógica, quis proporcionar às crianças um encontro com a personalidade da linha, enquanto movimento, energia e expressão das forças criadoras da natureza, antes que ela se prenda ao compromisso com a figuração.

 

 

 

 

6. Superfície

6.1 Essência

A superfície é o suporte, a base, onde os outros elementos podem se manifestar. A superfície é extremamente generosa e se doa para que os outros elementos da arte possam se expressar e normalmente "desaparece" para a nossa consciência. Ela é o primeiro elemento a ter uma realidade concreta, na sequência ponto, linha e plano. A linha e o ponto são imateriais enquanto que a superfície pode ser tocada (OSTROWER, 1983).

Num certo sentido ela é tão absoluta quanto o ponto. O ponto na sua contração máxima representa a unicidade e o todo. A superfície é o avesso do ponto: na sua expansão máxima, também representa o todo. O todo expandido, o universo inteiro. A superfície e o ponto se encontram na sua polaridade máxima: o infinitamente pequeno e o infinitamente grande.

A superfície é bidimensional, possue as duas dimensões da altura e largura. Quando tem suas bordas delimitadas, podemos dizer que a superfície é fechada. Mas pode ter também suas bordas abertas, tendendo, portanto a se unir com a superfície do fundo.

Palavra-chave: BASE.

6.2 Nível simbólico

Pelo seu caráter de generosidade, de doação de si para que os outros elementos das arte possam se mostrar, podemos relacionar a superfície com a Grande Mãe, aquela que nutre, protege e conforta; a Mãe Terra, Deméter, que nos nutre quando sua superfície é arada, superfície onde acontece o encontro da luz e da sombra, do em cima e do em baixo. A Mãe protetora e curadora, que nos envolve no seu manto/superfície quando precisamos de proteção e aconchego. Enquanto a linha nos leva a algum lugar, a superfície é o lugar do encontro. Ela une e separa, demarca e protege.

A superfície pode ser também relacionada com a nossa pele, que é o órgão que tem a maior superfície no nosso corpo e onde temos o sentido do tato. "Nossa pele humana é uma roupa sem costura que vestimos durante toda a vida" (MELLON, 2009, p. 208) e nossas roupas cotidianas, que tanto nos protegem, são grandes superfícies que envolvem o nosso corpo. A pele/superfície está ligada ao toque, às texturas. Sentimos o mundo com a nossa pele, nosso tato e, o que o mundo nos oferece para ser percebido com o tato e com a visão, é a superfície das coisas, (a interioridade pede que usemos outros sentidos, como, por exemplo, o da audição). A superfície, assim como a nossa pele, é a fronteira "é o ponto de encontro flexível para as impressões internas e externas" (MELLON, 2009, p. 208). Simbolicamente a superfície/pele pode aparecer como escudos, vestimentas mágicas ou armaduras. Animais que trocam de pele tem grande importância simbólica, como a cobra, cigarra e a lagarta, implicando aqui uma transformação de um estado para outro mais elevado.

A superfície é também onde o mundo pode se espelhar; é numa superfície que o nosso reflexo acontece. O elemento água neste sentido tem grande relação com o plano. A água busca o repouso e a superfície primordial na natureza é a superfície da água, que também é o espelho arquetípico. A superfície da água também funciona como uma pele, que possui sua própria tensão superficial. A superfície enquanto espelho/pele/contorno pode ser associada à autoimagem e autoestima. Também é a superfície que nos envolve e que nos une a tudo, "sendo o universo concebido como uma grande teia que interliga todos os seres, criando o tecido cósmico do qual fazemos parte" (BERNARDO, 2008, p. 34).

Histórias: Todas as Peles (capa feita da pele de todos os animais), Os cisnes selvagens (camisas de urtiga), Cinderela (3 vestidos- como as 3 camadas da Pele), Pele de Asno, Mãe Maria, Pele de Foca, A Tecelã, etc.

6.3 Qualificadores, materiais, técnicas, recursos expressivos

O maior qualificador da superfície é a textura, que ela, superfície, generosamente empresta aos outros elementos. Podemos ter superfícies texturizadas coloridas, em preto e branco, nas esculturas e na arquitetura. A textura dá todo um novo significado ao plano, podendo expressar sensações muito diferentes, como maciez, aspereza, peludo, liso, cortante, pedregoso, aerado, espelhado, etc. Outros qualificadores são: contornos ou bordas (superfícies abertas ou fechadas), repetição, lugar, movimento, interrupção, etc.. Materiais: todos os que oferecem superfícies para serem trabalhadas: papel, tecido, madeira, pedra, metal, linóleo, argila e que se prestam para diferentes técnicas como: aquarela, giz, luz e sombra, xilogravura, nanquim, tecelagem, etc.. Recursos expressivos ou atividades em que trabalhamos com a superfície são colagem, pintura, desenho, confecção de espelho, confecção de roupas, trabalho com tear, pintura corporal, dentre outros.

6.4 Aplicação pedagógica e terapêutica

As atividades com o elemento da superfície permitem trabalhar: proteção, cuidado, amparo, autoestima. Colagem, mosaico e colcha de retalhos, irão trabalhar a integração e reunificação de algo que foi fragmentado. Pintura corporal, pintura em camadas ou veladura, possibilitam um respirar dentro/fora ou a construção de camadas de proteção. Confecção de espelhos e confecção de roupas bem como rituais de proteção com pintura corporal permitem trabalhar a autoimagem, autoestima e o cuidado consigo mesmo.

 

7. Luz e sombra

7.1 Essência

Quando falamos de luz e sombra, falamos também de polaridade. Luz/branco, sombra/preto, são opostos extremos, que sempre caminham juntos, pois precisam um do outro para se mostrar. O branco irradia e se expande, o preto recua e contrai. Isto pode ser facilmente confirmado quando olhamos para dois círculos do mesmo tamanho, um preto e outro branco (figura 4). O poder de expansão do branco faz com que o círculo branco pareça maior. Também se sabe que quando se quer parecer mais magro deve-se usar roupas pretas.

 

 

Luz e sombra são vivências primordiais e básicas da nossa existência: o acordar e o adormecer, o dia e a noite. A alternância e harmonia entre eles garantem nossa saúde e bem estar. Como Nathan Cabot Hale tão bem expressa:

Estar acordado e estar dormindo são funções vitais das quais derivamos nosso entendimento básico de luz e sombra. Quando vamos dormir, mudamos nossa relação com o mundo totalmente e retornamos a um estado primitivo de ser, o estado a que chamamos de inconsciente. No sono, nossa relação com a gravidade e levitação é alterada, ao invés de lutar contra a força da gravidade, nós nos entregamos a ela e descansamos na escuridão. Quando o dia chega nós nos levantamos novamente e procuramos pela luz. Nossa vida se alterna entre luz e escuridão. Nenhum organismo vivo pode sobreviver a uma quebra da alternância natural entre luz e sombra, acordar e adormecer. Luz e sombra fazem parte da nossa estrutura e do nosso ser (HALE, 1993, p.227).

Na harmonização das polaridades de preto e branco existem as inúmeras gradações de cinzas que fazem a ponte entre os extremos.

Palavra-chave: POLARIDADE.

7.2 Nível simbólico

Luz e sombra têm uma grande relação com estados de consciência (desperto/dormindo, consciente/inconsciente). À luz associamos tudo o que é bom, relacionado com a vida, com o espírito, com amor e com a alegria. À sombra associamos aquilo que não conhecemos e que nos causa medo, o mal, a morte, o terreno.

Hale (1993) caracteriza muito bem as diferentes qualidades e fontes de luz e sombra. Ele aponta como a luz do sol, do dia, é "objetiva" e nos coloca em posição de abertura e atenção, enquanto que a luz da noite nos remete ao misterioso e a algo que nos transcende. Normalmente não focamos nossa atenção na escuridão, pois somos seres orientados para a luz. Além disso, a escuridão carrega em si o medo do desconhecido. A luz do fogo proporciona uma vivência totalmente diversa, pois é uma luz que vem do chão, enquanto temos por referência a luz que vem do alto. Esta luz que vem de baixo causa outra percepção dos objetos, causando muitas vezes distorções e estranhamentos. Por vir do chão "a luz do fogo sempre foi associada com a terra e com as emoções terrenas" (HALE, 1993, p. 229). Já a luz artificial é uma luz "mecânica", ela "não tem hora do dia nem estação do ano e tem pouco efeito no processo de vida e crescimento. A luz artificial não está conectada com os céus, nem com os grandes movimentos das estrelas, planetas e galáxias" (HALE, 1993, p. 231). Para o olho humano ela é uma luz mais "morta" com poucas qualidades e significados, ao contrário da luz natural, que nos conecta com "muitas da funções profundas da natureza" (HALE, 1993, p.213).

Jung trabalhou profundamente com o significado simbólico da luz (consciente) e da sombra (inconsciente). Ele, inclusive, chama de sombra aquilo que não queremos e/ou que não aguentamos enxergar e que pode ser facilmente projetada no outro. É aquilo que não conhecemos, dentro e fora de nós. "A sombra coincide com o inconsciente pessoal. A figura da sombra personifica tudo o que o sujeito não reconhece em si e sempre o importuna, direta ou indiretamente, como por exemplo traços inferiores de caráter e outras tendências incompatíveis" (JUNG, 2000, p. 227). A função transcendente, que para Jung representa a junção do consciente com o inconsciente, poderia ser representada nas artes plásticas por um trabalho harmônico de branco e preto.

Também ligado ao simbolismo de luz e sombra podemos falar da persona, que consiste numa máscara, não apenas no sentido de esconder alguma coisa, mas também no sentido de revelar alguma coisa, por exemplo, um papel social ou cultural. Vivemos os diferentes papéis de profissional, amigo, pai... Se bem usada, a persona pode servir ao Ego, mas se usada para esconder um Ego mal trabalhado, pode desenvolver estados patológicos (BERNARDO, 2008).

Histórias: Parsival, Jonas e a Baleia, Chapeuzinho Vermelho, Dionísio, Ártemis, Vasalisa, Gênesis, Perséfone.

7.3 - Qualificadores, materiais, técnicas, recursos expressivos

Luz e sombra podem ser trabalhadas com os qualificadores: textura, intensidade, contraste, tamanho, forma, positivo/negativo, ritmo, lugar no plano, peso/leveza, densidade, degrades. Material: carvão, nanquim, tinta preta e branca, giz preto e branco, papel preto e branco, grafite, óxido de manganês, óxido de estanho, argila branca e preta, etc.. Técnicas: desenho, aguada, gravuras (metal, madeira, pedra), bico de pena, etc.. Recursos expressivos: confecção de máscaras e criação de personagens, desenhos com carvão, nanquim e materiais afins, trabalho com histórias e mitos como o de Dionísio, trabalho com luminárias e velas, mandalas de velas, confecção de uma lanterna, teatro de sombras etc.

7.4 Aplicação pedagógica e terapêutica

O trabalho com luz e sombra pode ajudar a: equilibrar polaridades, trabalhar com o medo, trabalhar com a sombra, trazer à luz, à consciência. Degrades podem ser aplicado em trabalhos que visem: a harmonização das polaridades (boa indicação para jovens na puberdade, que vivem extremos nas suas alma). Desenho de projeção de sombras permite lidar com causa e consequência. No trabalho de redução de preto/branco pode-se ganhar consciência sobre os extremos. Confecção de máscaras e a criação de personagens permitem trabalhar a sombra e a persona.

Lidamos também com a luz e sombra quando trabalhamos a morte e o nascimento, a perda, a dor, a separação, a transformação pelo ganho dolorido de consciência.

 

8. Cor

8.1 Essência

Quando entramos em contato com o mundo das cores na sua qualidade arquetípica, deparamo-nos com beleza e harmonia. Penetramos um mundo insubstancial, flutuante, fugaz e, no entanto, sempre o mesmo: azul é sempre azul (embora possa ter diferentes tonalidades). A cor não tem existência material. Quando se liga ao mundo natural, "presa" a um objeto, é que a cor pode mostrar seu caráter cambiante, pode permanecer inalterada por muito tempo (como no reino mineral), ou mudar rapidamente (como no reino vegetal). "Cor na natureza não é apenas uma expressão da superfície mas é relacionada com os processos internos das coisas, uma folha que se tornou amarelada, nos conta da sua idade e do seu envelhecimento" (HALE, 1993, p. 260).

O poeta e filósofo J. W. Goethe desenvolveu uma rica teoria das cores e nos mostrou como as cores têm características e personalidades próprias. Todos nós tendemos a sentir o azul como calmo, pacífico, frio, acolhedor; o vermelho como ativo, agressivo, poderoso, caloroso, vivo, corajoso; o amarelo como ágil, brilhante, fugaz, luminoso, irradiante (MAYER, 1972).

É fácil entrar com as cores num movimento de gostar ou desgostar. Relacionamo-nos com a cor de maneira bastante pessoal, cada um tem sua cor favorita. Cada pessoa tem o que poderia ser chamado de seu próprio conjunto de cores harmônicas, que refletem a personalidade do indivíduo, seus humores e até mesmo seu tipo de coloração física: o conjunto de cores de seus cabelos, olhos e pele. Johannes Itten (1997) elaborou um estudo interessante que mostra, justamente, a relação do tipo físico com a escolha de cores pessoais de um indivíduo. Esse estudo foi posteriormente usado por empresas de consultoria de beleza, como a Collor Me Beautiful, com excelentes resultados (JACKSON,1985). Isto nos mostra como com a cor entramos no mundo dos sentimentos e da vida da alma. Rudolf Steiner (apud MAYER, 1972, p.3) coloca que a cor "é o sopro de vida para a alma". "Com Goethe aprendemos que a beleza da cor é uma projeção da beleza interior do ser humano" (PEDROSA, 2002, p. 64).

A "temperatura" das cores age na sensação espacial das mesmas: cores quentes tendem a vir para frente, as frias para trás. Isto cria uma vibração e uma sensação de profundidade que chamamos de perspectiva de cores. Das primárias, amarelo e vermelho são consideradas cores quentes e o azul, fria (OSTROWER, 1983).

A cor apresenta uma característica social muito grande, isto fica claro quando atentamos para sua tendência de se deixar afetar pelas cores vizinhas. Uma cor muda de qualidade dependendo da cor que está ao seu lado. Um roxo pode se tornar mais quente se comparado com um azul, ou mais frio se comparado com um vermelho.

Palavra-chave: SENTIMENTO.

8.2 Nível simbólico

Segundo Itten (1997), as cores podem ser vistas de três pontos de vista: impressão sensorial (visual), expressão de sentimentos e emoções, e construção simbólica.

Os pintores impressionistas usaram a cor para objetivamente falar de como a luz incide sobre os objetos. Os pintores expressionistas usaram a cor para mostrar sentimentos e emoções, enquanto que outros artistas e culturas usaram e usam a cor de maneira simbólica. Para eles não é a consideração estética da cor que é importante, mas o valor simbólico associado a ela, e às vezes, até mesmo um caráter mágico.

O vermelho, cor do fogo e do sangue, é a cor mais importante para muitas culturas pela sua ligação com a vida. Para os alquimistas existe um vermelho diurno, masculino, centrífugo e um vermelho noturno, feminino, centrípeto. O vermelho noturno está ligado ao fogo central que anima o se humano e a terra, à digestão, amadurecimento e regeneração do ser, cor da alma, da libido e do coração e da iniciação oculta. O vermelho diurno simboliza juventude, saúde, riqueza e amor.

É a cor do deus Marte, dos guerreiros e conquistadores, do deus Dionísio, da nobreza e dos imperadores romanos e para os cristãos a cor do Amor Divino. No Japão é o símbolo da sinceridade e da felicidade. O comunismo e a revolução proletária elegeram o vermelho como sua cor e passamos a associá-lo também às tendências políticas de esquerda. Por penetrar mais profundamente a neblina e a escuridão o vermelho é usado como luz de alarme, em torres, edifícios, barcos, carros de bombeiro e de polícia. Podendo também significar perigo, é usado nos semáforos em todos os países do mundo.

O amarelo em todas as épocas foi associado ao sol, ao fruto maduro, ao ouro. Para os cristãos o amarelo é a cor da eternidade e da fé e aparece unido à pureza do branco na bandeira do Vaticano. No trânsito é usado como sinal de espera e sanitariamente é usado para indicar áreas contaminadas por doenças contagiosas.

O azul é a cor do infinito e dos mistérios da alma, da fantasia e dos sonhos. Pode simbolizar a abóbada celeste, que por sua vez pode se tornar um manto protetor que cobre e protege as divindades. A roupa com que Maria é pintada é vermelha coberta por um manto azul. Indica também nobreza e é usada na expressão sangue azul. "A terra é azul", foi a frase dita pelo astronauta que viu pela primeira vez a Terra de longe (PEDROSA, 2002).

Em nossa cultura é fácil percebermos como associamos simbolicamente o azul com o mar, o céu, o inconsciente, a espiritualidade, proteção. Associamos o vermelho com sangue, a vida, a agressividade, a força, a coragem, o amor, a paixão e a obstinação. O amarelo é associado com o sol, a luz, o ouro e riqueza.

8.3 Qualificadores, materiais, técnicas, recursos expressivos

Os qualificadores usados nas cores são: intensidade, tamanho, posição na superfície, ritmo, repetição, alternância, contraste, complementaridade, forma, fluxo, velocidade, densidade, peso/leveza, texturas. Materiais: pigmentos, tintas, óxidos, corantes. Técnicas: aquarela, giz de cera, giz pastel, giz de lousa, tinta à óleo, guache, lápis de cor, têmpera, mosaico, afresco, acrílica, tingimento, batik, entre outras.

Recursos expressivos ou atividades: pintura ou desenho colorido sobre papel ou outro suporte como pedra, tecido, tela, madeira, etc. Trabalhos com fios coloridos: tricot, crochê, olho de deus, tecelagem, colagem com papéis ou materiais coloridos, mandalas coloridas, tingimento, gravuras coloridas, cenários, vitral.

8.4 Aplicação pedagógica e terapêutica

A cor é usada par a: harmonizar e acessar sentimentos, harmonizar a respiração e facilitar a socialização e a integração. O trabalho com cores atua sobre nossos sentimentos e nos sistemas a eles ligados: circulação e respiração. Permitem a harmonização saudável do ser. Se a técnica empregada usar água como meio para a cor, será mais enfatizada a atuação sobre os sentimentos, já que a água é o elemento ligado às emoções. Terapeuticamente, o trabalho com pintura pode ajudar a lavar mágoas do passado, expressar e equilibrar os sentimentos. Pelo seu caráter social, as cores podem ser usadas em atividades com grupos, que visem a harmonização e cooperação entre pessoas.

 

9. Volume

9.1 Essência

Quando trabalhamos com volume entramos no âmbito tridimensional, que pode ser vivenciado tanto no espaço vazio quanto pelas massas. Com o elemento volume, além da altura e largura, temos também a profundidade. O espaço tridimensional é aquele que habitamos, no qual nos movimentamos e com o qual nos relacionamos de maneira íntima. Tocamos os objetos, sentamos, deitamos sobre eles, comemos neles, nos protegemos em nossas casas, viajamos em nossos carros. Os reinos que compõem o nosso mundo: mineral, vegetal, animal e humano, são volumes à nossa volta. Volume é o elemento mais concreto, mais aterrado, físico, fortemente ligado ao tato e aos nossos sentidos de movimento e equilíbrio.

O elemento volume possui duas características básicas: ou ele é côncavo ou é convexo. Côncavo: vazio, espaço, buraco, vãos, cavidades, valetas. Convexo: cheio, massas, saliências, protuberâncias, lombadas. Observando-se atentamente a palma da nossa mão, vemos o jogo harmônico entre essas duas qualidades. Quando estas duas tendências básicas se anulam, aparece a superfície plana. Nossa autopercepção trabalha em primeira instância com o elemento volume, pois o nosso próprio corpo também é uma estrutura de volume: massas e espaços. A partir do volume, que é o nosso corpo, nos relacionamos e interagimos com os volumes e espaços à nossa volta. "Nosso entendimento da forma não é dado apenas pelo olho, mas é um produto do corpo todo" (HALE, 1993, p. 59).

O elemento volume trabalha com a questão do espaço: o dentro e o fora, espaço interno e externo, mas também com o tempo. Enquanto uma imagem bi-dimensional pode ser apreendida quase que instantaneamente, o volume pede que se ande ao redor dele, que ele seja olhado de vários lados, e isto requer um tempo maior para a sua observação.

Palavra-chave: INTERIORIDADE.

9.2 Nível simbólico

No nível simbólico o volume pode representar nossos espaços de alma: apertado, expandido, cheio, vazio, entulhado/confuso, livre/desimpedido, profundo/superficial; assim como também representa as questões relativas ao dentro/fora, relação entre espaços internos e externos. Refere-se à nossa interioridade. O ventre, a tigela, o caldeirão representam um espaço sagrado onde a vida, a transformação podem acontecer. Estão relacionados com o mundo interno e com o feminino arquetípico, aquele que recebe a semente e pode transformá-la em alimento para o desenvolvimento da consciência (BERNARDO, 2008). O ninho é nosso espaço sagrado de proteção e aconchego, onde somos nutridos. O trabalho com a argila/terra nos coloca em contato com a mãe arquetípica e também com o solo (inconsciente) que nutre as raízes da nossa consciência em forma de energia psíquica (BERNARDO, 2008). Podemos relacionar então o volume com a Mãe Terra, Deméter.

Histórias: (aquelas que nos ajudam a vivenciar diferentes tipos de espaços e massas) Mtoto Baboo, Alice no País das Maravilhas, O Pote Vazio, O Labirinto do Fauno.

9.3 Qualificadores, materiais, técnicas, recursos expressivos

Qualificadores: texturas, movimento, repetição, dimensão, forma, redondo/plano, lugar no espaço, peso/leveza, densidade, obstáculos/fluxo, ondulação, apertado/espaçoso. Materiais: argila, pedra, madeira, plástico, metal, fibras, tijolos, cera. Técnicas: modelagem, torno (madeira, pedra, argila), escultura, marcenaria, cestaria, potes em metal, ourivesaria, maquete. Recursos Expressivos: meu mundo numa caixa; criação de um jardim; criação de uma tigela ou vaso; trabalhos corporais, massagem; confecção de um ninho; confecção de caixas, malas, armários; modelagem de um corpo em argila; confecção de bonecas, marionetes, fantoches; jardinagem; desenho de perspectiva linear; arquitetura e projetos arquitetônicos.

9.5 Aplicação pedagógica e terapêutica

Trabalho com espaços internos e externos, físicos e anímicos. Para que um trabalho terapêutico ou pedagógico possa acontecer da melhor maneira possível temos que cuidar, em primeiro lugar, para que o espaço tanto físico como anímico seja acolhedor e de confiança. A criança pequena que começa a descobrir o mundo, se depara, em primeiro lugar, com os volumes e espaços que a cercam e tem de aprender a se relacionar com ele. Mover-se no espaço e ao redor dos volumes é uma experiência primordial para ela. Além disso, espaços aconchegantes, protetores e calorosos são fundamentais para a criança pequena e a vivência do colo é muito importante, crianças que não são tocadas e não vivenciaram o colo, terão grandes dificuldades depois. Terapeuticamente, o trabalho da construção de um ninho pode ajudar na criação deste espaço de proteção e aconchego,

Pode facilitar o trabalho com questões relativas às primeiras relações mãe-bebê: se a pessoa não encontrou esse acolhimento por parte de sua mãe, se não se sentiu amada e bem-vinda ao mundo em seu início de vida, essa vivência ajudará na restauração da confiança no mundo como um lugar que a receba com carinho, respeito e aceitação (BERNARDO, 2008, p. 24).

Certas atividades nos permitem estar mais em contato com o espaço vazio, como a criação de tigelas, vasos, cestas, onde trabalhamos as massas mas com o interesse voltado para o espaço criado por elas. Outras atividades focam mais o trabalho sobre as massas, como a escultura. Recursos terapêuticos como a criação de um jardim numa caixa (ou numa grande tigela/vaso), assim como a criação do meu mundo numa caixa, permitem o contato com e a expressão do mundo e dos sentimentos internos. Para desenvolver o amor próprio e o cuidado consigo mesmo podemos modelar um corpo em argila ou confeccionar um boneco e vesti-lo. Com o volume estamos na função que Jung chamou de sensação e que pode ser relacionada com o elemento terra.

Ao se trabalhar com recursos expressivos associados a esse elemento (terra), pode-se favorecer a elaboração de questões relativas ao nosso corpo e a como nos posicionamos frente a algumas situações, a como tomamos posse de algo e nos apropriamos do que é nosso marcando o nosso território. Podemos trabalhar arterapeuticamente com essas questões através de expressões tridimensionais como, por ex., modelagem em argila, massa de modelar ou papel machê, escultura, confecção de caixas, jardinagem, confecção de bonecos, trabalhos corporais (BERNARDO, 2008, p. 99).

 

10. Aplicações práticas dos elementos das artes plásticas

10.1 Tabela de estudo para o trabalho arteterapêutico

Para ajudar a se conhecer melhor os recursos usados numa proposta pedagógica ou arteterapêutica, é de grande valia utilizar uma tabela (tabela 1) onde se relacionam as atividades, os elementos plásticos empregados, seus principais qualificadores, a técnica e o material.

 

 

Pode-se começar inserindo na tabela qualquer um dos itens (atividade, elemento, material ou técnica) e, a partir dele, preencher os demais campos de acordo, aprofundando o olhar sobre as qualidades e os níveis simbólicos. Muitas descobertas podem ser feitas desta maneira. Debruçar-se sobre estes aspectos nos permite descobrir camadas mais profundas de alcance da proposta e nos tornarmos capazes de pensar, avaliar e criar atividades que correspondam às necessidades de nossos alunos, pacientes e clientes.

Neste exemplo partiu-se da atividade "criação de uma tigela" e se buscou preencher os demais campos de acordo. Poderia ter se partido também da técnica "torno" ou da história "Pote Vazio" e assim por diante. Obviamente uma tabela assim não esgota todos os aspectos possíveis, mas pode ajudar a jogar luz e desvelar possibilidades destes diferentes âmbitos, como permite que sempre acrescentemos novas descobertas de acordo com o ganho de experiência ao longo da nossa prática.

 

10.2 Observação do mundo sob a lente dos elementos plásticos

Podem-se utilizar os elementos das artes plásticas como ferramenta de observação ao se perguntar de que forma um objeto ou uma pessoa se caracteriza de acordo com estes elementos. Por exemplo, como podemos conhecer as pessoas através dos elementos? Se tomamos como características humanas básicas de cada elemento o seguinte quadro:

Ponto: centro das atenções, líder nato, poder de concentrar, dominador, dono da verdade...

Superfície: doador, apoiador, aparece pouco mas permite que os outros se destaquem, protetor, superficial, básico...

Linha: dinâmico, faz pontes, ligações, não pára quieto...

Luz e sombra: misterioso, claro/consciente, nebuloso/inconsciente.

Volume: acolhedor, pesado, vazio, concreto, leve, com grande interioridade.

Cor: colorido, cheio de sentimentos, cheio de diferentes humores.

Podemos olhar como alunos, pacientes ou pessoas da nossa convivência apresentam qualidades ou se caracterizam como um destes elementos. Este tipo de observação pode se expandir para: um jeito de falar, um jeito de andar, um ambiente, uma história, roupas, objetos, comida, um texto, uma produção artística, natureza, um trabalho terapêutico, uma aula, etc.

 

11. Conclusão

Ao se apropriar da linguagem artística através dos elementos plásticos, o profissional da arte se vale de um vocabulário arquetípico, básico, que o prepara para:

Montar suas aulas ou atividades terapêuticas com mais propriedade. Por exemplo: a necessidade de trabalhar, com alunos ou pacientes, formação de eixo e centro, ou ainda concentração e atenção, pedirá exercícios que foquem no elemento ponto (no transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) pode-se trabalhar com o torno de argila, onde tudo gira em volta de um centro enquanto que o material argila, a terra); quando da necessidade de se desenvolver autoestima, pode-se empregar exercícios que lidem com a superfície; a necessidade de se desenvolver o intelecto e sua mobilidade, pedirá exercícios com linha (o desenho de formas desenvolve o pensar através do movimento); trabalhar organização espacial e domínio corporal levam a exercícios com o volume (neste caso pode-se trabalhar o desenvolvimento da motricidade grossa e fina em trabalhos com argila, madeira etc.); trabalho sobre emoções e relações sociais pede exercícios com cores.

Apreender de maneira significativa a produção de seus pacientes ou alunos, o que permite ao profissional atuar de forma mais profunda e coerente. A criação artística tem muito a contar sobre quem a produziu. O pensamento gestáltico aponta que fenômenos psíquicos e físicos são isomórficos, ou seja, têm estruturas semelhantes, pois a forma criada e o comportamento do criador se espelham. Compreender a forma criada é uma ponte para compreender aquele que a produziu (RHYNE, 2000).

Como Ostrower nos diz:

Acima de tudo, de tudo mesmo, está o viver, a própria vida vivida. É nela que temos a nossa referência máxima- ela constitui ao mesmo tempo, a referência e o contexto para os nossos valores. Assim é em função da vida que surgem as formas expressivas da arte (OSTROWER, 1998, p. 4).

Portanto, se a arte surge da vida, ao se entrar em contato com a criação artística, acessamos o processo de vida daquele que a criou. A arte tem uma linguagem própria e seus termos específicos, seus elementos básicos, são a chave para sua compreensão. Quando compreendemos a linguagem artística, abrimos a porta para a compreensão da alma do criador, sejam eles, os nossos pacientes ou alunos. Além disso, a arte e seus elementos ampliam e refinam nossa capacidade de percepção e permitem também a integração das observações externas com as internas, do mundo interno com o mundo externo, num trabalho verdadeiramente arteterapêutico a serviço da saúde e da educação.

 

12 Referências

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BUHLER, E. O desenho de formas. São Paulo: Ed. Três Fontes, sd.         [ Links ]

CIORNAI, S. Percursos em arteterapia - arteterapia gestáltica. São Paulo: Summus Editorial, 2004.         [ Links ]

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HALE, N. C. Abstraction in art and nature. New York: Dover Publications, 1993.         [ Links ]

ITTEN, J. The art of color. New York: John Wiley & Sons, 1997.         [ Links ]

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JUNG, C. G. Os arquétipos e o inconsciente coletivo. Petrópolis: Editora Vozes, 2000.         [ Links ]

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PEDROSA, I. Da cor à cor inexistente. Rio de Janeiro: Léo Christiano Editorial, 2002.         [ Links ]

RHYNE, J. Arte e gestalt - padrões que convergem. São Paulo: Summus Editorial, 2000.         [ Links ]

 

 

RELAÇÃO DAS IMAGENS

Figura 1: olho de deus http://miriart-miriart.blogspot.com/2011/02/mandala-olho-de-deus.html 17/01/2012
Figura 2: Desenho dinâmico Foto da autora
Figura 3: Desenho dinâmico Foto da autora
Figura 4: Círculos http://www.sitepoint.com/create-a-studio-style-backdrop-in-photoshop/