SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.24 número25Sujeito como sintoma (TDAH) na sociedade, escola, família e a PsicopedagogiaO questionário SNAP-IV como auxiliar psicopedagógico no diagnóstico PRELIMINAR do Transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH) índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Construção psicopedagógica

versão impressa ISSN 1415-6954

Constr. psicopedag. vol.24 no.25 São Paulo  2016

 

Desenvolvendo habilidades sociais na escola: um relato de experiência

 

Developing social skills in the school: an experience report

 

 

Fabiana Ribas FerreiraI, 1; Maria Aparecida Gomes de CarvalhoII, 2; Cleiton José SenemIII, 3

IHRAC/USP
IIUniversidade Sagrado Coração
IIIUniversidade Sagrado Coração

 

 


RESUMO

O presente trabalho é um relato de experiência desenvolvido na área de psicologia escolar educacional, realizado em uma escola pública do interior de São Paulo. Seu objetivo é apresentar as experiências e ações desenvolvidas por meio de um projeto de intervenção cuja finalidade foi desenvolver habilidades sociais, com 30 alunos do 6º ano do ensino fundamental e seus professores. Foram realizados 10 encontros sistematizados, por meio de vivências e dinâmicas de grupo, acontecendo semanalmente, em dias e horários alternados, possuindo duração média de 50 minutos. Verificou-se que o desenvolvimento desse projeto possibilitou reflexões e mudanças de comportamento por parte dos participantes. Conclui-se que o desenvolvimento de habilidades sociais deve ocorrer durante todo processo de ensino, pois um repertório elaborado dessas habilidades é considerado indicador de ajustamento psicossocial, favorecendo o desenvolvimento saudável e contribuindo na competência acadêmica.

Palavras-chave: Habilidades sociais, Intervenção, Desenvolvimento saudável, Psicologia escolar educacional.


ABSTRACT

This study is an experience report developed in the area of Educational School Psychology. It was carried out in a public school located in the interior of São Paulo. Its objective is to present experiences and actions developed in an intervention project whose purpose was to develop social skills with 30 students from the 6th grade of the elementary school and their teachers. A number of ten systematized meetings were carried out by means of experiences and group dynamics that happened weekly on alternate days and hours with an average duration of 50 minutes. It was verified that the development of this project enabled the participants to reflect and change their behaviors. We concluded the development of social skills must occur during the whole learning process since an elaborate repertory of such skills is considered an indicator of psychosocial adjustment, which fosters the healthy development and contributes to the academic competence.

Keywords: Social skills, Intervention, Healthy development, Educational school psychology.


 

 

O fazer do psicólogo deve estar focado nas relações que se estabelecem no contexto escolar como também considerar o meio social em que elas acontecem, para que por meio de seus conhecimentos psicológicos possa ser um agente de mudanças (MARTINS, 2003).

A psicologia escolar educacional é um campo de produção científica e de atuação profissional do psicólogo que se caracteriza pela inserção da psicologia no contexto escolar e educacional, possuindo como objetivo contribuir para que ocorra a promoção do desenvolvimento, da aprendizagem e da relação entre ambos os processos (OLIVEIRA & MARINHO-ARAÚJO, 2009).

Tal ciência também permite a intensificação de reflexões na busca de maior criticidade à sua formação e atuação, diante de um cenário político-econômico que aguça, ainda que de forma cada vez mais sutil, o controle social e as graves desigualdades que se configuram no panorama histórico atual (MARINHO-ARAÚJO & ALMEIDA, 2005).

Segundo Martinez (2009), torna-se relevante o compromisso dos psicólogos com a transformação dos processos educativos, com a efetivação das mudanças necessárias que demanda a melhoria da qualidade da educação do país.

O psicólogo escolar educacional exerce um trabalho interdisciplinar com ênfase nas relações interpessoais, abrindo espaço para o desenvolvimento de ações junto à comunidade escolar e educacional, permitindo diálogos para que se possa discutir e compartilhar problemas, buscando soluções, estabelecendo, dessa forma, novas maneiras de compreender o aluno, evitando rótulos ou estereótipos (MEDEIROS & AQUINO, 2011).

Assim, a inserção do psicólogo escolar educacional em parceria com o docente e a equipe educativa traz um importante diferencial às ações desenvolvidas nas escolas, pois possibilita que os mesmos percebam-se como participantes ativos e colaboradores dos processos de sucesso escolar, à medida que se apropriam de sua função e responsabilidade profissional (OLIVEIRA & MARINHO-ARAÚJO, 2009).

Não é mais possível compreender a escola apenas como um grande número de pessoas reunidas ou segmentadas, mas como uma ampla rede de interações (CURONICI & MCCULLOCH, 1999) que precisa ser pensada de forma orgânica, sistêmica e integrada. A instituição escolar educacional, além de ser um local que possui como objetivo a formação acadêmica, é ainda, um complexo cenário de convivência humana, formado por diferentes sistemas que se organizam e se mantêm em funcionamento, por meio de relações entre adultos, entre adultos e alunos, e destes entre si (MAIA & BORTOLINI, 2012).

Dessa forma, por existirem distintas vivências e subjetividades no contexto escolar educacional, muitas vezes há conflitos que impossibilitam uma boa interação social, sendo necessário que cada instituição determine suas regras de convivência, proporcionando aos seus membros a minimização de conflitos e melhor competência social.

Deve-se reconhecer que a escola exerce uma influência significativa sobre o comportamento humano, contribuindo de diferentes maneiras para a formação do indivíduo por meio do desenvolvimento de comportamentos, habilidades e valores. Assim, "cabe às escolas a preocupação e consciência do seu papel na formação dos seus alunos, atentando para a literatura referente à promoção de saúde e de prevenção" (MAIA & BORTOLINI, 2012, p. 385).

A experiência relatada neste estudo deu-se a partir do desenvolvimento de um estágio supervisionado no âmbito escolar educacional, tendo em vista a preocupação em formar profissionais da Psicologia com visão crítica e competência teórica, ética e prática.

O projeto aqui relatado foi realizado nas dependências de uma escola estadual do interior paulista. A atuação ocorreu conforme o cronograma de um projeto de intervenção desenvolvido após realização do mapeamento institucional, a partir do qual se observou a necessidade de desenvolver habilidades sociais com alunos do 6º ano do ensino fundamental e com seus respectivos professores; tendo como objetivos específicos: facilitar o autoconhecimento e a autoestima dos mesmos; desenvolver valores sociais; fomentar o processo de comunicação e o trabalho em equipe, assim como criar técnicas de resolução de conflitos.

Deve-se considerar que a escola é um lugar oportuno para intervenções em habilidades sociais, uma vez que as crianças passam boa parte do seu tempo nesse local, estabelecem relações com pares e ampliam as relações sociais (CIA & BARHAM, 2009).

 

Habilidades Sociais

A infância é caracterizada como uma fase decisiva para a aprendizagem e o aprimoramento das habilidades sociais. Apesar da construção de um repertório socialmente habilidoso se dar por meio de interações entre familiares, amigos e com a comunidade, simultaneamente, ocorrem falhas nesse processo de aprendizagem, apresentando déficits nas habilidades sociais (GOMIDE, 2003).

Del Prette & Del Prette (1999) definem habilidades sociais como respostas comportamentais que devem ser aprendidas pelo indivíduo, possibilitando o agir de maneira adequada diante de diferentes situações. Assim, essas habilidades referem-se à capacidade de articular pensamentos, sentimentos e ações em função de consequências positivas para si e para os outros (DEL PRETTE & DEL PRETTE, 2005).

Existem várias classes de habilidades sociais, como: empatia, assertividade, fazer amizades, solução de problemas interpessoais, comunicação e civilidade (DEL PRETTE & DEL PRETTE, 2009).

Segundo Bolsoni-Silva & Carrara (2010) as habilidades sociais também podem ser compreendidas como conjunto de comportamentos emitidos frente às demandas de uma relação interpessoal, com a finalidade de maximizar ganhos e reduzir perdas. Sendo a aquisição de habilidades sociais um importante fator de proteção de problemas emocionais e comportamentais (MAIA & BORTOLINI, 2012).

Bolsoni-Silva & Carrara (2010) também corroboram com a ideia de que as habilidades sociais são de extrema importância enquanto adjetivação de categorias de repertórios comportamentais relevantes para o favorecimento de interações sociais satisfatórias. Pois, a ausência ou ineficiência de tais habilidades pode resultar em problemas comportamentais, emocionais e consequentemente, em transtornos psicológicos que se apresentam em problemas internalizantes e externalizantes (DEL PRETTE & DEL PRETTE, 2005). Os problemas externalizantes envolvem a ocorrência de irritabilidade, agressão física ou verbal, provocações, rebeldia, dentre outras. Já a preocupação excessiva, retraimento social, tristeza, insegurança e desinteresse por atividades acadêmicas, podem ser observados como sendo alguns dos problemas internalizantes (ACHENBACH & EDELBROCK, 1979).

Essas dificuldades ocorrem, geralmente, devido a um repertório de habilidades sociais pobre, principalmente em termos de empatia, expressão de sentimentos e resolução de problemas (MAIA & LOBO, 2013). Para se tornar socialmente competente, o indivíduo precisa saber fazer, querer fazer, e ser capaz de fazer, ou seja, buscar soluções para conflitos, acreditar em suas ações e ter autocontrole para lidar com suas emoções. Segundo Maia & Lobo (2013), estes três aspectos são considerados essenciais para uma convivência satisfatória.

 

Método

O projeto de intervenção aqui descrito ocorreu durante o segundo semestre de 2014. Inicialmente, as estagiárias executaram um mapeamento institucional com o objetivo de conhecer a instituição escolar educacional. Realizaram entrevistas semiestruturadas com alguns membros da equipe administrativa, professores, agentes de organização escolar, serventes, merendeiras e alunos. Efetuaram, também, observações não participantes com o objetivo de identificar as demandas da escola, dados estes imprescindíveis para a elaboração do projeto interventivo. Além dessas informações, o Projeto Político Pedagógico e o Plano de Gestão da escola ofereceram informações importantes para que as estagiárias compreendessem de forma mais ampla a instituição na qual o trabalho foi desenvolvido.

O primeiro contato com os professores foi realizado na reunião de Atividades de Trabalho Pedagógico Coletivo (ATPC), na qual as estagiárias apresentaram as ideias centrais do projeto que seria realizado na escola, a partir das demandas apresentadas pela equipe gestora. A participação das estagiárias nessa reunião foi importante para confirmar as informações identificadas no mapeamento institucional, assim como ouvir os professores, oportunizando espaço de escuta para suas vivências e experiências.

Segundo Andrade (2005), antes de agir, o psicólogo escolar educacional precisa escutar as demandas da escola e em seguida pensar manejos de lidar com situações que são cotidianas, criando formas de reflexão dentro da instituição escolar educacional.

Com a finalização do mapeamento institucional, as estagiárias elaboraram o projeto de intervenção a fim de promover habilidades sociais, o qual foi apresentado para a equipe gestora e professores, sendo aprovado por ambos.

O projeto foi organizado e desenvolvido em 10 encontros sistematizados: 7 encontros com alunos e 3 com os professores. Os encontros com os alunos foram realizados semanalmente em dias e horários alternados com duração de 50 minutos cada, acompanhado de vivências e reflexões.

Trabalhou-se com um total de 30 alunos, divididos em duas salas, em horários de uma hora/aula alternados e com os docentes durante as ATPCs. Tais encontros foram coordenados pelas estagiárias de psicologia sob orientação e supervisão de um professor responsável pelo estágio.

A avaliação do projeto foi realizada por meio da opinião dos alunos e professores bem como por meio das observações feitas pelas estagiárias durante todo o projeto interventivo. As respostas fornecidas pelos participantes foram analisadas pelas estagiárias de forma qualitativa, sendo os resultados apresentados à direção da instituição por meio de um relatório final.

 

A Escola

No período de realização do projeto, a escola possuía 689 alunos matriculados, divididos nos períodos matutino, vespertino e noturno. Assim como, possuía 06 pessoas na equipe administrativa, 10 membros na equipe técnica, e 68 professores (27 do sexo masculino e 41 do sexo feminino), totalizando, portanto, 84 pessoas.

A instituição escolar educacional já possuía alguns projetos em desenvolvimento, como: jornada cultural, semana literária e projeto contra bullyng, assim como, os programas da Secretaria da Educação: recuperação contínua e intensiva com professores auxiliares, escola da família, com funcionamento aos sábados e domingos das 9h às 17h, oferecendo atividades de complementação cultural. A escola não possuía projetos de pesquisa.

Conforme consulta realizada por meio do Projeto Político Pedagógico vigente, a escola apresenta como proposta pedagógica, assegurar a aprendizagem efetiva de todos os alunos, atendendo as metas do Plano Político Educacional do Guia de Orientação aos Especialistas de Educação (GOE SP). Assim como, visa aproximar as vivências dos alunos ao conteúdo escolar; aproximação dos pais à escola; procura manter diálogo constante com os alunos buscando compreender os problemas e, desenvolver o exercício de cidadania levando os discentes a imbuírem-se da importância ética, moral, civismo e valores humanos.

Todo o ensino oferecido na instituição escolar educacional é fundamentado na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que consequentemente, tem como competência para o Ensino Fundamental prover a formação básica do cidadão, desenvolvendo a capacidade de aprender, tendo como meios básicos o pleno domínio da leitura, escrita e cálculo. Além disso, compreender o ambiente natural e social do sistema político, da tecnologia, das artes e valores que fundamentam a sociedade. Ao mesmo tempo, o Ensino Médio é responsável pela consolidação e aprofundamento do conhecimento adquirido no Ensino Fundamental, possibilitando o prosseguimento nos estudos e, buscando, o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética (LDB, 2010).

De acordo com o Projeto Político Pedagógico, a escola está inserida em uma comunidade em que há pouquíssimas oportunidades culturais. Assim, a escola e as igrejas passaram a serem os polos de cultura existentes.

 

Encontros com os Alunos

Foram realizados sete encontros com os alunos por meio de vivências seguidas de discussões e reflexões.

O primeiro contato com os discentes participantes teve como objetivo estabelecer regras e normas que seriam adotadas durante o processo de intervenção, o rapport, a apresentação dos participantes, assim como, promover a integração, o trabalho em equipe e o autoconhecimento.

No segundo encontro, foi possível ressaltar aspectos positivos do grupo e promover a identificação pessoal, possibilitando, de forma descontraída, a abertura para a alteridade, elemento tão importante nas relações sociais. Em um terceiro momento, trabalhou-se a comunicação verbal, conflitos, assim como, a crítica e a autocrítica.

O tema do quarto encontro teve referência à consciência grupal, lealdade, cooperação, resolução de problemas e solidariedade. Já no encontro de número cinco foi possível a promoção de empatia, percepção do outro, sensibilização, confiança, lealdade e exercício da comunicação não verbal.

No sexto encontro trabalhou-se a percepção do outro, consciência grupal, comunicação verbal, tomada de decisões, resolução de conflitos, relações de poder, planejamento e negociação. E no sétimo encontro, proporcionou-se um momento de reflexão a respeito das experiências vivenciadas durante os encontros anteriores, assim como foi desenvolvida uma dinâmica de grupo cujo objetivo foi receber o feedback dos participantes tendo em vista a obtenção de indicativos dos resultados da intervenção.

 

Encontros com os Professores

Com os professores, em todos os encontros, foram utilizados vídeos, dinâmicas e apresentações em multimídia a fim de possibilitar momentos de reflexão e discussão. Foram realizados três encontros: no primeiro trabalhou-se a importância da empatia, da percepção do outro, da comunicação verbal e da sensibilização; no segundo encontro, foi oportunizado uma dinâmica no intuito de desenvolver a autoconfiança e a autoestima dos docentes; e no terceiro e último encontro, foram realizados trabalhos direcionados à motivação, à perseverança e a realização de uma dinâmica para obter o feedback dos participantes tendo em vista a obtenção de resultados.

 

Orientações aos Pais e Alunos

Mesmo não fazendo parte do que foi proposto no projeto de intervenção, mas ainda sendo esta uma das funções do psicólogo escolar educacional, e a pedido dos professores e da equipe gestora, foram realizadas orientações psicológicas a 5 alunos de 6º ano e a 7 alunos de 7º ao 9º ano, totalizando 32 atendimentos, haja vista alguns alunos necessitarem de mais de um atendimento de orientação. Destes, 2 alunos do 6º ano e 5 alunos dos outros anos, foram encaminhados ao Centro de Apoio Psicossocial (CAPS) ou a procurarem por atendimentos clínico. Além disso, 5 pais/responsáveis foram chamados pelas estagiárias, entretanto, apenas 3 compareceram.

 

Resultados e Discussões

Inicialmente, as atividades com os professores permitiram as estagiárias a percepção de que os mesmos compreendiam de forma equivocada a práxis do psicólogo escolar educacional, especialmente, identificando-a como uma intervenção clínica. Nesse sentido, conforme aponta Correia (2004), o pouco conhecimento ou o não conhecimento da profissão do psicólogo pela comunidade escolar é considerado um grande desafio para sua atuação.

A experiência das estagiárias confirmou o estereótipo apontado por Medeiros & Aquino (2011), segundo os quais, o papel do psicólogo ainda é percebido como restrito ao atendimento do aluno, especialmente ao "aluno problema". No intuito de ampliar a percepção dos docentes, as estagiárias apresentaram as funções do psicólogo escolar educacional segundo a perspectiva de Martinez (2009), a qual descreve como devendo ser uma atuação ampla, envolvendo todo o contexto escolar, e não apenas como uma atuação individual compreendida pelo modelo clínico, e nesse sentido, potencialmente mais efetivas para promover transformações nos processos educativos, desconstruindo possíveis equívocos e apresentando as contribuições que elas poderiam desenvolver conjuntamente com a equipe docente e de gestão escolar. Esse momento promoveu a quebra de possíveis resistências por parte dos docentes, favorecendo um vínculo positivo e colaborativo entre professores e estagiárias.

No entanto, as estagiárias observaram ainda que alguns professores indicavam resistências iniciais ao projeto interventivo. Porém, com o desenvolvimento do mesmo, as resistências foram sendo desconstruídas oportunizando momentos de diálogo e troca de experiências entre docentes e estagiárias. Esses docentes além de solicitarem orientações a respeito do comportamento de alguns alunos também buscaram orientações pessoais, demonstrando assim proximidade e empatia com as ações desenvolvidas.

Com relação aos alunos, os dados obtidos por meio da avaliação da professora mediadora e da coordenação pedagógica indicou que os mesmos demonstraram-se mais calmos, assim como, foi possível identificar a diminuição de registros da ficha de ocorrência da escola.

As estagiárias observaram ainda que os discentes procuraram colocar em prática o que aprenderam durante os encontros. Alguns comportamentos começaram a se generalizar como: respeito, empatia, cooperação e saber ouvir o outro, porém, ainda com certa dificuldade.

É importante novamente destacar que um repertório elaborado de Habilidades Sociais é considerado como fator de proteção, pois é um indicador de ajustamento psicossocial, de desenvolvimento saudável e de qualidade de vida, além de ser preditor significativo de competência acadêmica (ELLIOT, DIPERNA, MROCH & LANG, 2004 apud FUMO, MANOLIO, BELLO & HAYASHI, 2009).

As estagiárias observaram que embora no início da intervenção houvesse alguns alunos que apresentavam comportamentos inibidos e distantes das atividades propostas, com o desenvolvimento dos encontros houve a promoção da integração dos mesmos ao grupo, facilitando sua integração e participação efetiva. Também foi possível perceber que os discentes participantes da intervenção chamavam a atenção do colega quando esse tinha uma atuação contrária ao que foi proposto no contrato inicial realizado por todos os membros do grupo. Este dado indica o processo de assimilação das regras construídas coletivamente para o bom relacionamento do grupo, assim como, uma mudança de comportamento com relação ao início das atividades, significando o maior comprometimento dos participantes com o trabalho desenvolvido.

A habilidade de se colocar no lugar do outro, no intuito de compreendê-lo ou de reconhecer a própria existência de comportamentos inadequados quando somos chamados à atenção por outras pessoas, é chamada de empatia. Segundo Del Prette & Del Prette (2005), esta é essencial para que aconteça o estabelecimento de vínculos interpessoais associadas ao desenvolvimento de atitudes altruístas, compondo, dessa forma, uma classe de comportamentos voltados para o benefício do outro.

Foi observado ainda, que em algumas situações, os alunos apresentaram comportamentos de hiperatividade e euforia, comprometendo o desenvolvimento das atividades. Tal situação correspondeu à realização de um encontro no horário de uma aula vaga na qual os discentes tinham a oportunidade de utilizar a quadra poliesportiva ou a sala de informática. Tal experiência confirmou a ideia de que o planejamento e o acordo prévio com os participantes é fundamental para o desenvolvimento efetivo das atividades.

Com relação à direção da escola e à equipe administrativa, ao observarem que o projeto estava sendo realizado com responsabilidade e eficiência, demonstraram maior abertura e disponibilidade para com as estagiárias, passando a contribuir de forma efetiva com o desenvolvimento da intervenção. Infelizmente, muitas escolas veem o estágio nas áreas da licenciatura e neste caso especificamente, da psicologia escolar educacional, com descrédito. Tal realidade é frequente e tem sua razão de ser sustentada tanto a postura inadequada de alguns estagiários, assim como, na desconfiança de alguns profissionais da educação. Todavia, deve-se reconhecer e ressaltar, que o estágio é um momento privilegiado de desenvolvimento de habilidades e competências do aluno, mas não é por isto que a sua ação é menos eficiente e descompromissada. Cabe especialmente, ao supervisor e orientador do estágio, o desenvolvimento desta consciência profissional e ética dos seus alunos, garantindo desta forma, desde já, a atuação digna deste profissional em processo de formação. Afinal, como destaca Martinez (2009), a participação consciente, ativa e compromissada na promoção e efetivação de transformações decorrentes na atuação do psicólogo é essencial para que haja mudanças na educação.

Por fim, identificou-se ainda, a ausência do envolvimento dos pais/responsáveis perante a escola, dado este confirmado a partir de informações da administração escolar, a qual tentou, por meio de várias atividades, envolver os pais/responsáveis, porém sem êxito.

Comer & Haynes (1991) relatam que a participação dos pais na educação é essencial para o desenvolvimento escolar de seus filhos, tendo em vista o fato de a família ser a provedora de suporte social, cultural e emocional das crianças. Sendo assim, as escolas devem criar condições e oportunidades para que os alunos tenham interações positivas com os adultos que os criam de forma a melhorar suas experiências em casa, beneficiando, assim, as atividades realizadas na escola.

O distanciamento entre escola e família foi identificado devido aos relatos e queixas da administração escolar bem como pelas ausências dos familiares quando solicitada a presença dos mesmos pelas estagiárias. Os diversos motivos geralmente explicitados pelos pais são as dificuldades com relação ao horário de trabalho, o receio por parte dos mesmos em comparecer à escola e serem de alguma forma contestados em relação aos comportamentos dos filhos, ou mesmo, a falta de preocupação e comprometimento com a educação. Todavia, conforme aponta Scalzo (1995 apud FRAIMAN, 1997), por falta de tempo para estar com os filhos, por medo de errar ou por mero descaso, muitas vezes os pais não conseguem estabelecer com os filhos as regras básicas de convivência e acabam utilizando a regra do "faça o que digo, mas não faça o que faço", delegando a escola o papel de educar.

Constata-se na atualidade um momento de "privatização" da educação. Ao mesmo tempo em que os pais delegam à escola a função de educar, a escola, em contrapartida, atribui a causalidade de alguns comportamentos e dificuldades à família. Entretanto, é fundamental que haja um trabalho conjunto entre essas duas instituições, pois, "a escola sozinha não educa e a família sem a escola não é capaz de proporcionar aos seus membros uma educação que os qualifique como cidadãos capazes de conquistar seu espaço na sociedade globalizada em que vivemos" (RODRIGUES, 2011, p. 2).

A psicologia escolar educacional neste contexto tem a função de ser a mediadora destes processos complexos que não podem ser fragmentados ou privatizados, mas vistos na sua totalidade.

 

Considerações Finais

A experiência relatada neste trabalho foi muito importante para a formação acadêmica das estagiárias, pois permitiu colocar em prática todo o conhecimento teórico, favorecendo, assim, a aquisição de maior aprendizado, além de ter possibilitado que atuassem para a melhoria da realidade escolar. Os resultados obtidos indicam que, mesmo com o breve tempo de intervenção, os trabalhos das estagiárias trouxeram contribuições importantes para a Unidade Escolar.

Pode-se considerar que o desenvolvimento das habilidades sociais no contexto escolar educacional forneceu ferramentas e oportunidades para que os participantes pudessem aprender sobre suas responsabilidades e potencialidades na gestão da convivência (MAIA & LOBO, 2013).

Desta forma, acredita-se que as pequenas conquistas alcançadas pelos participantes sinalizam a construção de novos caminhos e de diferentes formas de convivência e de interação social, tão necessárias na contemporaneidade.

Atividades como essa aqui descrita, deveriam estar presentes no dia-a-dia do contexto escolar educacional, entretanto, por se tratar de um estágio curricular, o período de realização não favoreceu a continuidade do processo. Neste sentido, faz-se necessário destacar a importância da presença ativa do psicólogo escolar educacional nas instituições de ensino, pois por meio de seus conhecimentos, habilidades e competências, é possível a construção e a transformação da realidade escolar e de seus membros, exercendo suas funções de forma eficiente e contínua, contando sempre com a colaboração de toda a instituição escolar educacional.

 

Referências

ACHENBACH, Thomas M. & EDELBROCK, Craig. The child behavior profile: II. Boys aged 12-16 and girls aged 6-11 and 12-16. Journal of Consulting and Clinical Psychology, v. 47, n. 2, p. 223-233, 1979.         [ Links ]

ANDRADE, Antonio dos Santos. Sociodrama Educacional: uma estratégia de pesquisa-ação em Psicologia Escolar Institucional. In: FLEURY, Heloisa Junqueira; MARRA, Marlene Magnabosco (orgs.). Intervenções grupais na educação. São Paulo: Agora, p. 49-66, 2005.         [ Links ]

BOLSONI-SILVA, Alessandra Turini & CARRARA, Kester. Habilidades sociais e análise do comportamento: compatibilidades e dissensões conceitual-metodológicas. Psicologia em Revista, Belo Horizonte, v. 16, n. 2, p. 330-350, 2010.         [ Links ]

CIA, Fabiana & BARHAM, Elizabeth Joan. Repertório de habilidades sociais, problemas de comportamento, autoconceito e desempenho acadêmico de crianças no início da escolarização. Estudos de Psicologia, Campinas, v. 26, n. 1, p. 45-55, 2009.         [ Links ]

COMER, James Pierpont & HAYNES, Norris M. Parent involvement in schools: An ecological approach. The Elementary School Journal, v. 91, n. 3, p. 271-277, 1991.         [ Links ]

CORREIA, Mônica de Fátima Batista. O desafio do cenário escolar para o profissional da psicologia: Por onde começar? In: CORREIA, Mônica de Fátima Batista (Org.). Psicologia e escola: uma parceria necessária. Campinas: Alínea, p. 61-82, 2004.         [ Links ]

CURONICI, Chiara & MCCULLOCH, Patricia. Psicólogos e professores: um ponto de vista sistêmico sobre as dificuldades escolares. São Paulo: EDUSC, 1999.         [ Links ]

DEL PRETTE, Zilda Aparecida Pereira & DEL PRETTE, Almir. Psicologia das habilidades sociais: terapia e educação. Petrópolis: Vozes, 1999.         [ Links ]

DEL PRETTE, Zilda Aparecida Pereira & DEL PRETTE, Almir. Psicologia das habilidades sociais na infância: teoria e prática. Petrópolis: Vozes, 2005.         [ Links ]

DEL PRETTE, Zilda Aparecida Pereira & DEL PRETTE, Almir. Psicologia das habilidades sociais na infância: teoria e prática. Petrópolis: Vozes, 2009.         [ Links ]

FRAIMAN, Leonardo de Perwin. A importância da participação dos pais na educação escolar. 1997. 134 f. Dissertação (mestrado) - Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997.         [ Links ]

FUMO, Vivian Maria Stabile; MANOLIO, Carina Luiza; BELLO, Suzelei; HAYASHI, Maria Cristina Piumbato Innocentini. Produção científica em habilidades sociais: estudo bibliométrico. Revista Brasileira de Terapia Comportamental Cognitiva, Campinas, v. 11, n. 2, p. 246-266, 2009.         [ Links ]

GOMIDE, Paula Inez Cunha. Estilos parentais e comportamento antissocial. In: DEL PRETTE, Almir & DEL PRETTE, Zilda Aparecida Pereira (orgs.). Habilidades sociais, desenvolvimento e aprendizagem: questões conceituais, avaliação e intervenção. Campinas: Alínea, p. 21-60, 2003.         [ Links ]

LDB - Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. 5 ed., Brasília: Câmara dos Deputados, Coordenação Edições Câmara, 2010.         [ Links ]

MAIA, Denise da Silva & BORTOLINI, Marcela. O desenvolvimento da habilidade de assertividade e a convivência na escola: relato de experiência. Psicologia em Revista, Belo Horizonte, v. 18, n. 3, p. 373-388, 2012.         [ Links ]

MAIA, Denise da Silva & LOBO, Beatriz de Oliveira Meneguelo. O desenvolvimento de habilidade de solução de problemas interpessoais e a convivência na escola. Psicologia em Revista, Belo Horizonte, v. 19, n. 1, p. 17-29, 2013.         [ Links ]

MARINHO-ARAÚJO, Claisy Maria & ALMEIDA, Sandra Francesca Conte. Psicologia escolar: construção e consolidação da identidade profissional. Campinas: Alínea, 2005.         [ Links ]

MARTINEZ, Albertina Mitjáns. Psicologia Escolar e Educacional: compromissos com a educação brasileira. Revista Semestral da Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional, v. 3, n. 1, p. 169-177, 2009.         [ Links ]

MARTINS, João Batista. A atuação do psicólogo escolar: multirreferencialidade, implicando a escuta clínica. Psicologia em Estudo, Maringá, v. 8, n. 2, p. 39-45, 2003.         [ Links ]

MEDEIROS, Lucilaide Galdino & AQUINO, Fabíola de Sousa Braz. Atuação do psicólogo escolar na rede pública de ensino: concepções e práticas. Psicologia Argumento, Curitiba, v. 29, n. 65, p. 227-236, 2011.         [ Links ]

OLIVEIRA, Cynthia Bisinoto Evangelista & MARINHO-ARAÚJO, Claisy Maria. Psicologia escolar: cenários atuais. Estudos e Pesquisas em Psicologia, Rio de Janeiro, v. 9, n. 3, p. 648-663, 2009.         [ Links ]

RODRIGUES, Vanuza Maria Costa. Participação dos pais no cotidiano da escola estadual Manoel Alves Grande. 2011. 15 f. Monografia para título de especialista - Programa de Pós-graduação em Pedagogia, Universidade Federal do Tocantins, Campos Lindos, 2011.         [ Links ]

 

 

1 Psicóloga pela Universidade Sagrado Coração, Bauru-SP e mestranda em Ciências da Reabilitação pelo HRAC/USP, Bauru-SP.
2 Psicóloga e pós-graduanda em Psicologia do Trânsito pela Universidade Sagrado Coração, Bauru-SP.
3 Mestre em Psicologia do Desenvolvimento e Aprendizagem pela UNESP-Bauru-SP, docente do curso de Psicologia da Universidade Sagrado Coração, Bauru-SP, professor orientador do estágio supervisionado em Psicologia Escolar Educacional

Creative Commons License