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Boletim - Academia Paulista de Psicologia

Print version ISSN 1415-711X

Bol. - Acad. Paul. Psicol. vol.27 no.2 São Paulo Dec. 2007

 

HISTÓRIA DA PSICOLOGIA

 

A pesquisa e a clínica sobre o stress no Brasil

 

Research and the clinic on stress in Brazil

 

 

Geraldina Porto Witter

UNICASTELO

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Apresenta contribuições significativas da entrevistada para o desenvolvimento da pesquisa e da clínica na área do stress em nosso país. Sua formação acadêmica é realizada em importantes universidades americanas, inclusive o seu pós-doutorado em Stress Social sob orientação de vários cientistas dos U.S.A., Inglaterra e Rússia, centralizada esta na pessoa do eminente pesquisador Prof. Dr. David Anderson. Convidada como docente e pesquisadora pela Universidade Católica de Campinas, vem realizando valiosas investigações no Brasil, no que respeita ao stress; formando pesquisadores nesse campo, bem como divulgando e discutindo conhecimentos nessa área através dos eventos específicos que tem organizado. O centro de suas contribuições profissionais advém do Laboratório de Estudos Psicofisiológicos do Stress, por ela criado há 15 anos, na maior parte com apoio das agências de fomento do Brasil. Ultimamente, suas aportações têm sido dirigidas na área médica, com efetiva participação nas Forças Tarefas sobre hipertensão e prevenção da arterioesclerose. Conta com significativas publicações que refletem suas inovadoras contribuições na ciência psicológica, em especial na área do stress emocional.

Palavras-chave: Stress, Pesquisa, Clínica.


ABSTRACT

It presents the interviewee's significant contributions for the development of the research and clinical applications in the area of stress in our country. Her academic training was accomplished in important American universities, including pos-doctorate training in Social Stress under the orientation of several scientists of U.S.A , England and Russia, headed by the eminent researcher Dr. David Anderson. Invited to teach and research at the Catholic University of Campinas, she has been conducting valuable investigations in Brazil about stress. She contributes to the training of researchers in that field, publishes and discusses knowledge in stress in the scientific conventions she chairs. The center for her professional contributions is the Laboratory for Psychophysiological Studies on Stress, created by her 15 years ago, with financing from federal and state agencies in Brazil. Lately, her contributions have been directed to the medical area, with effective participation in the Joint Committee for Guidelines development in hypertension and prevention of the arteriosclerosis. She has published significant papers that reflect her innovative contributions in the psychological science, especially in the area of emotional stress.

Keywords: Stress, Research, Clinic.


 

 

Entrevista concedida por Marilda Emmanuel Novaes Lipp, recém-empossada na Cadeira nº 7, "Oscar Freire", desta Academia, a Geraldina Porto

 

 

Geraldina - Marilda, você poderia fazer uma síntese de sua formação acadêmica?

Marilda - Fiz o então colegial, setor do clássico, no Imperial Colégio Dom Pedro II no Rio de Janeiro. Fui para o exterior em 1965 e lá realizei todo o meu percurso acadêmico universitário, tendo feito graduação em Psicologia na América University. Essa universidade é extremamente orientada para pesquisa. Na época, recebi um prêmio de "jovem pesquisador" outorgado pela Sociedade de Ciências dos EUA. O Mestrado e Doutorado, eu os realizei na George Washington University, onde tive a honra de ser orientanda do famoso inventor do visual cliff, Dr. Richard Walk, com quem aprendi a importância dos estudos da percepção. Nada, no entanto, comparou-se com a satisfação de ter feito pós-doutorado em Stress Social no National Institute of Health, com vários cientistas dos EUA, Inglaterra e Rússia, sob a orientação do Dr. David Anderson.

Geraldina - Que motivos levaram-na a escolher a Psicologia Clínica e a área de stress para pesquisa na sua atuação profissional?

Marilda - Na American University, tive a sorte de estudar com luminares como Skinner, Charles Ferster e Stanley Weiss. Pesquisadores esses que satisfizeram o meu interesse pelas leis do comportamento no behaviorismo e nos esquemas de reforço que determinam o aprendizado do normal e do patológico. Na George Washington University, aperfeiçoei meu conhecimento em Psicologia Clínica, mas meu interesse principal sempre foi a pesquisa. O interesse pelo trabalho clínico foi um prolongamento da investigação.

Minha motivação pelo stress ocorreu de modo peculiar. Trabalhava em uma instituição - Great Oaks Center - com pessoas com deficiência mental de nível profundo. Observava o desespero dos pais e familiares frente às dificuldades decorrentes desse nível de comprometimento. Via o stress em suas vidas, só que não sabia que se tratava de stress. Na mesma época, fiz um curso com Charles Spielberger, autor dos testes de Ansiedade e de Raiva, que me indicou o caminho para o estudo do stress emocional. Nos livros sobre este tema, de autoria do Dr. Spielberger, reconheci que o que aqueles pais apresentavam era em grande parte stress. Foi aí que comecei a estudar esse fenômeno. Hoje tenho 13 livros e dezenas de artigos científicos publicados ou organizados sobre este tema, o qual passou a ser o principal foco de minhas pesquisas.

Geraldina - Sei que sua vida universitária, especialmente como pesquisadora, é muito rica e variada. O que nela é mais reforçador para você? Por quê?

Marilda - O que é mais reforçador para mim é estudar os fenômenos psicológicos do ponto de vista experimental. A mente humana me fascina. Desde a época do Mestrado, eu já entendia que, para ter boa atuação clínica, eu precisaria aprender a realizar pesquisas; precisava mais do que simplesmente ser uma usuária dos conhecimentos, tinha que entender as leis do comportamento do ponto de vista experimental. Tanto que não utilizo ainda hoje nenhum procedimento em clínica que não tenha sido cientificamente testado. Gosto de descobrir, criar e testar os métodos e princípios que possam ajudar o ser humano na gama fantástica dos problemas do viver.

Geraldina - Você tem contribuído muito para a formação de pesquisadores na área. Que aspectos da orientação considera mais importantes? E os mais difíceis?

Marilda - O que mais gosto é ver a mente do orientando abrindo-se para o questionamento de idéias e de métodos. É um prazer ver um jovem pesquisador refletir e indagar. O que me angustia é a dificuldade de escrita que observo em alguns deles. É difícil transmitir idéias e conclusões quando não se sabe escrever.

Geraldina - Na vida acadêmica, você também se envolveu em atividades administrativas. Como sente tais vivências?

Marilda - Sei que é a obrigação de todos os professores colaborarem nos aspectos administrativos de uma universidade, porém não tenho gosto por essa linha de trabalho. Fui coordenadora da Pós-Graduação em Psicologia por sete anos seguidos e depois por mais um ano, mas sempre porque achava que poderia ajudar os demais. Nunca foi meu objetivo exercer atividades administrativas e não tenho esse tipo de ambição. É difícil manter o foco em pesquisa quando se tem muita responsabilidade administrativa. Além disso, para administrar bem, torna-se necessário desenvolver estratégias políticas, o que nunca foi um ponto forte em minha personalidade.

Geraldina - Sua experiência em participar e em organizar eventos também é um aspecto louvável em seu curriculum vitae. Como avalia essa sua atividade? Como estão os preparativos para o próximo encontro sobre stress?

Marilda - Tenho de fato organizado vários eventos científicos e disso gosto muito, pois é uma chance especial de estar em contacto com pessoas que comungam dos mesmos interesses e de aprender mais com elas. Cada evento que organizo é para mim uma fonte de conhecimento e sempre espero que o seja para os que o assistem. O III Congresso Brasileiro de Stress ocorreu nos dias 26 e 27 de outubro de 2006, em São Paulo. Contamos com umas 400 pessoas e com os maiores especialistas em stress, trazendo suas idéias e dados de pesquisa. Em geral participam pessoas de todos os Estados e de todos os níveis de sofisticação científica, desde o aluno de graduação até os grandes pesquisadores.

Geraldina - E o laboratório de stress, poderia dar ao nosso leitor uma síntese do que ele representa?

Marilda - O Laboratório de Estudos Psicofisiológicos do Stress (LEPS), que tive a alegria de fundar em 1992, destina-se ao desenvolvimento de pesquisas de ponta sobre os efeitos do stress no organismo humano e sobre tratamentos psicológicos do stress emocional. Pertence à PUC Campinas e tem contado com bastante apoio de suas autoridades administrativas. Tenho tido auxílio financeiro do CNPq e da FAPESP para as pesquisas que desenvolvo e o LEPS recebe muita atenção da mídia. Vários programas de renome, como o Jornal Nacional da TV Globo e o Fantástico já divulgaram dados de pesquisas desenvolvidas no LEPS.

Geraldina - Evidentemente, em uma entrevista é impossível cobrir os múltiplos aspectos do que você já realizou como pesquisadora, formadora de recursos humanos, como desbravadora na Psicologia. Antes de encerrarmos, há algo que considera relevante acrescentar?

Marilda - Devo dizer que me considero uma pessoa privilegiada profissionalmente, pois minha história como pesquisadora tem sido pautada pelo auxílio à investigação tanto no Brasil como nos EUA. O que sinto compensa o esforço que tenho despendido na pesquisa durante toda a minha vida. A FAPESP e o CNPq sempre disponibilizaram recursos para esses trabalhos e ser bolsista de produtividade do CNPq desde 1986 é uma honra para mim. Outro ponto que também interpreto como válido nas atividades que tenho realizado é o fato de a área médica envolver-me em várias ações e projetos de importância como, por exemplo, receber o Certificado de Especialista em Hipertensão Arterial e ter sido convidada para participar da Força Tarefa que elaborou as III, IV e V Diretrizes de Hipertensão Arterial e as I Diretrizes de Prevenção da Arteriosclerose na Infância e na Adolescência. Um terceiro fator que me alegrou e fez sentir-me honrada foi ter sido indicada e eleita para integrar a Academia Paulista de Psicologia, junto a Acadêmicos tão brilhantes. Agradeço muito aos membros da Academia por esta honra recebida.

Geraldina - Marilda, é uma grande alegria contar com você na Academia, em nome da qual agradeço a disponibilidade para a presente entrevista. Seja bem-vinda!

 

 

Endereço para correspondência
Geraldina Porto Witter
Av. Pedroso de Moraes, 144/302 &– Pinheiros
CEP 05420-000 &– São Paulo &– SP
Tel.: 3032-1968
E-mail: witter@uol.com.br

Enviado em: 05/06/2007
Aceito em: 12/07/2007

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