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Boletim - Academia Paulista de Psicologia

versão impressa ISSN 1415-711X

Bol. - Acad. Paul. Psicol. vol.30 no.1 São Paulo jun. 2010

 

TEORIAS, PESQUISAS E ESTUDOS DE CASOS

 

O Ser Interior em um modelo de unificação das perturbações psíquicas

 

The inner self in a model of unification of psychic disturbances

 

 

Walter Trinca (Cad. 40)1

Universidade de São Paulo

 

 


RESUMO

O ser interior é uma noção fenomenológica introduzida na Psicanálise para expressar a realidade primária relativa ao ser essencial da pessoa. Distingue-se do self, que é uma forma de organização globalizante, apresentando-se como um campo de forças em estado de conflito. O contato da pessoa com seu próprio ser constitui uma função primordial. Maior ou menor contato determinam graus de sanidade, como também de perturbação psíquica. O distanciamento de contato responde por fragilidade e por uso de sensorialidade, que se vêm instalar no self sob a forma de sistemas mentais determinantes. Nas perturbações psíquicas, o paciente tende a "escolher" entre a fragilidade ou a sensorialidade, sob o distanciamento de contato. Como os graus do distanciamento permanecem iguais, seja numa ou noutra modalidade de "escolha", é possível organizar a compreensão das perturbações psíquicas em conformidade com um eixo do contínuo de contato. Neste, os sistemas mentais determinantes são classificados por graus, sendo que diferentes perturbações psíquicas correspondem a diferentes graus do contínuo. Daqui se pode elaborar uma escala unificada de perturbações psíquicas, decorrentes da fragilidade do self e da sensorialidade. Além disso, o eixo do contínuo de contato permite compreender processos de abertura à experiência emocional, em que o contato com o ser interior se amplia em graus, determinando diferentes formas de expansão da consciência.

Palavras-chave: Psicanálise / metapsicologia; Teorias psicanalíticas; Instâncias psíquicas.


ABSTRACT

The Inner being is a phenomenological notion introduced into psychoanalysis to express the primary reality related to the essential being of each person. It distinguishes itself from the self, that is the globalizing organization form which presents itself as a field of forces in a state of conflict. The contact of the person with her own being constitutes a primordial function. Major or minor contact determines the degree of sanity as well as the one of psychic disturbance. The distancing of contact responds for the frailty and the use of sensoriality which are installed in the self under the form of determining mental systems. Within psychic disturbances the patient tends to "choose" between frailty and sensoriality under contact distancing occurrence. As the distancing degrees remain equal, either in one or the other modality of "choice", it is possible to organize the psychic disturbances in accordance with the continuous of contact axis. In this one, the determining mental systems are classified by degrees being so that different psychic disturbances correspond to different degrees of the continuous. From here one may elaborate a unified scale of psychic disturbances resulting from the self frailty and from sensoriality. Apart from that, the continuous of contact axis allows for the understanding of processes in the opening to the emotional experience in which contact with the inner being widens up in degrees, determining different ways of consciousness expansion.

Keywords: Psychoanalisis / metapsychology; Psychoanalitical theories; Psychic instances.


 

 

1. O ser interior e o self

É constituído como um sistema primário de equilíbrio e uma matriz de existência, cujas bases não são sensoriais. Ele se distingue do self, que é uma forma de suporte e de organização globalizante, apresentando-se como um campo de forças em estado de conflito (Trinca, 2001). O ser interior exerce influências sobre o self. Essas influências são exercidas em graus: se forem importantes, prepondera a tendência à integração; se não, emerge um self relativamente autônomo, repleto de conflitos e de turbulências. Podem ocorrer afastamentos, separações e rupturas entre essas duas instâncias psíquicas e, nesse caso, o indivíduo tenderá a se tornar estranho a si mesmo. A questão das influências sobre o self vai depender das condições de contato com o ser interior. O contato da pessoa com seu próprio ser constitui uma função primordial. Maior ou menor presença de contato é determinante sobre as condições do self, por implicar graus de sanidade, como também de perturbação psíquica. Como há graus de contato, em um sistema geral se pode falar de um contínuo de contato. No eixo do contínuo de contato há variações, desde um contato muito restringido até um muito ampliado com o ser interior. Esse eixo abrange três estados: oclusivo, inconsciente e consciente. Grosso modo, o estado oclusivo refere-se às psicoses; o inconsciente, às neuroses; e o consciente, à normalidade e aos processos de expansão de consciência. Então, é definido claramente um fator responsável por turbulências e perturbações psíquicas, que é o distanciamento de contato com o ser interior (Trinca, 1999).

 

2. Constelação do inimigo interno

Vários são os fatores responsáveis pelo distanciamento de contato, mas coloca-se em evidência o fator principal: a constelação do inimigo interno, relacionada à pulsão de morte (Freud, 1948). É um fator que pode ser considerado por intermédio dos estágios de sua atuação, sendo: 1) dúvidas e descréditos, 2) autodepreciações, 3) desqualificações amplificadas, 4) autoinvalidações, 5) alastramento do sistema, 6) bandeamento para o inimigo, 7) buraco negro, 8) dimensão de possibilidades infinitas e 9) anestesia, colapso e aniquilamento. Entre o fator constelação do inimigo interno e o fator distanciamento de contato, há correspondências, de sorte que os estágios do primeiro se correlacionam univocamente em graus com determinados graus do segundo. Quanto mais avançados forem os estágios de atuação da constelação, maior será o distanciamento de contato e mais grave tenderá a ser o comprometimento psíquico.

 

3. A sensorialidade e a fragilidade do self

Além do distanciamento de contato e da constelação do inimigo interno, pode-se trabalhar com outros dois fatores: a sensorialidade e a fragilidade do self. A sensorialidade diz respeito a elementos que são saturados de concretude ou que têm as qualidades, propriedades ou características desta, as quais já preexistem ou vêm-se introduzir no aparelho psíquico, determinando manifestações emocionais, cognitivas, imagéticas e outras. O distanciamento de contato responde pela sensorialidade e pela fragilidade do self. Com ele, as consequências sobre o self podem ser: a) aumento de sensorialidade ou b) aumento de fragilidade. Diferentes graus de distanciamento de contato determinam graus correspondentes de sensorialidade ou de fragilidade. A sensorialidade é um fator variável, assumindo formas que vão desde brandas até altamente saturadas de virulência; a fragilidade, idem. Cada um desses fatores tem ocorrências independentes um do outro. Uma imensa gama de patologias pode ser descrita em função tanto da sensorialidade quanto da fragilidade. Por esses fatores, o self torna-se repleto de conteúdos, produtos e modos de funcionamento que não representam essencialmente o ser interior. O distanciamento de contato é representado como uma variável que desencadeia outras tantas em inter-relação. Essencialmente, acham-se disponíveis quatro tipos de sensorialidade: a) básica, b) produzida por ataques, c) de preenchimento substitutivo e d) produzida por corte e exclusão. A sensorialidade básica é aquela que diz respeito particularmente ao indivíduo em condições normais. A sensorialidade produzida por ataques não se confunde com os ataques da própria constelação do inimigo interno; ela corresponde a determinados produtos que a constelação deposita no self sob a forma de objetos internos atacados, estragados, destruídos ou mortos. A sensorialidade de preenchimento substitutivo consiste na ocupação do self por produtos sensoriais para conter e evitar seu enfraquecimento ou esvaziamento; desse modo ela forma configurações patológicas. As principais características da sensorialidade produzida por corte e exclusão são descritas em termos de supressão, desligamento, eliminação e ruptura de partes do self, que tendem a desaparecer.

Se se vier a conhecer os princípios básicos que regem o distanciamento de contato com o ser interior, poder-se-á com facilidade conhecer o papel dos demais fatores. Com o distanciamento, o self tende a fragilizar-se. Em decorrência, há dois tipos de "escolhas" possíveis: a) a manutenção da fragilidade ou b) a utilização da sensorialidade para lidar com a fragilidade. Há um contínuo para a sensorialidade, assim como há contínuo para a fragilidade, indo de graus menos graves a graus mais graves. A sensorialidade instalada, qualquer que seja o tipo, consiste em fazer diminuir ou em eliminar as angústias que se referem à fragilidade, protegendo o self de desorganização. Dos quatro tipos de sensorialidade, um deles prevalece sobre os demais e é o grau em que ele se encontra em determinada pessoa que dá a conhecer a natureza da perturbação psíquica associada à sensorialidade. Ao se ter presente um contínuo geral da sensorialidade, sabe-se que é resultante da superposição ideal dos quatro contínuos relativos aos quatro tipos de sensorialidade.

 

4. Fatores básicos e sistemas mentais determinantes

Cada um dos fatores apontados (constelação do inimigo interno, distanciamento de contato, sensorialidade e fragilidade do self ) pode ser estudado em relacionamento com os demais. As influências que uns exercem sobre outros são estabelecidas em determinada ordem e hierarquia. Para a compreensão das perturbações psíquicas, é necessário conhecer os processos de "influência contida" de uns fatores sobre outros. Para isso, pensa-se que em vez de se falar diretamente de perturbações psíquicas, melhor será falar-se de sistemas mentais determinantes. Esses sistemas são padrões emocionais que se organizam ao redor de um núcleo, exercendo ação central e nodal na caracterização dos problemas psíquicos. Eles são estabelecidos por certas constantes que tendem à repetição e à fixação de características básicas. Então, para a formação de sistemas mentais determinantes concorrem os mesmos fatores básicos: constelação do inimigo interno, distanciamento de contato, sensorialidade e fragilidade do self. Se a constelação é tomada em sentido decrescente de gravidade patológica, as correspondências que ela apresenta com o distanciamento são diretas, produzindo graus de distanciamento que guardam relações de equivalência termo a termo com os estágios dos ataques por ela desencadeados. Trabalhando-se com a hipótese de que a "escolha" patológica se pauta por sensorialidade ou por fragilidade, os sistemas mentais determinantes são formados com a predominância de uma ou de outra destas variáveis. Portanto, cada uma delas dá separadamente as características básicas dos sistemas e, em última análise, das perturbações psíquicas que lhe dizem respeito.

 

5. Correspondências entre fatores

Verifica-se que há correspondências em graus, não só entre a constelação do inimigo interno e o distanciamento de contato, como também entre este e a fragilidade do self. Quanto mais elevados forem os graus distanciamento de contato, mais elevados serão, correspondentemente, os graus de fragilidade do self. As correspondências são unívocas, ou seja, o distanciamento de contato não sofre as consequências da fragilidade do self. Se preponderar a "escolha" pela sensorialidade, as correspondências dar-se-ão entre os graus de distanciamento de contato e os graus de sensorialidade. Quanto mais elevados forem os graus daquele, mais elevados serão, correspondentemente, os graus desta. Nas relações termo a termo com o distanciamento de contato, a sensorialidade existente é, também, correspondente à fragilidade que poderia existir caso ela não fosse a orientação predominante. Qualquer que seja o tipo de sensorialidade que se apresente, os graus de presença desta correspondem univocamente aos graus de distanciamento de contato. É nítida a predominância de um dos tipos de sensorialidade (dentre os quatro tipos apontados) sobre os demais.

 

6. Eixo do contínuo de contato

Assim, é possível estabelecer um eixo de contínuo de contato com o serinterior, que vai de infinito negativo a infinito positivo. Sobre esse eixo, entre infinito negativo e zero, incide o distanciamento e dão-se os graus correspondentes de sensorialidade ou de fragilidade, com seus igualmente correspondentes sistemas mentais determinantes. O ponto zero fica na linha divisória entre o estado consciente e o estado inconsciente de contato com o ser interior (um ponto que corresponde à experiência de inteireza). Tomando-se, agora, os quatro fatores (constelação do inimigo interno, distanciamento de contato, fragilidade do self e sensorialidade), sabe-se que para a instalação dos sistemas mentais determinantes há uma hierarquia na ordem de influência do primeiro sobre o segundo e do segundo sobre os dois últimos. A hierarquização é inspirada na concepção de que cada um dos fatores representa uma variável contínua que tem distribuição entre infinito negativo e zero. Então, quando se tomam esses fatores como variáveis, verifica-se que, para a formação e a manutenção dos sistemas mentais determinantes, cada estágio da constelação se relaciona correspondentemente a um quantum de distanciamento de contato, que equivale, por sua vez, a um quantum similar de fragilidade do self ou de sensorialidade. Ou seja, os graus de cada uma das variáveis tendem a ser semelhantes entre si. Nesse sentido, considerando-se a qualidade unívoca das correspondências entre as variáveis, pode-se dizer que elas são homotéticas (Sangiorgi, 1967). Os graus de afastamento da primeira variável em relação ao ponto zero determina o afastamento em graus das demais variáveis, respeitando-se as respectivas "escolhas".

 

7. Outros fatores

Uma vez feita a "escolha" pelo indivíduo, o sistema tende a se fixar em estruturações relativamente constantes, nas quais o padrão tende à estabilidade e à repetição. As perturbações psíquicas, sendo um assunto relativamente complexo, vão além dos sistemas mentais determinantes. Elas compreendem, também, a influência de outros dois fatores: a angústia de dissipação do self e a estruturação inconsciente. Estes fatores não exercem influências significativas sobre aqueles quatro para a formação e a manutenção dos sistemas mentais determinantes, mas eles têm função decisiva na intensidade e na extensão das perturbações psíquicas.

 

8. Unificação das perturbações psíquicas

Como, nessas perturbações, o paciente tende a "escolher" entre a fragilidade e a sensorialidade, e como os graus do distanciamento de contato permanecem iguais, seja numa ou noutra modalidade de "escolha", é possível organizar a compreensão das perturbações em conformidade com o eixo de contínuo de contato. Para essa organização, o que primeiro se coloca no eixo são justamente os sistemas mentais determinantes, em que estão representadas as variáveis que têm correspondências homotéticas unívocas e que, por isso, ligam-se de forma estruturalmente simples. As perturbações diversificam-se em conformidade com essas bases elementares. Por causa dessas correspondências, é possível se construir uma única distribuição representativa de todas as demais. Como o distanciamento de contato é a variável que melhor representa o conjunto, pode-se tomá-la para essa finalidade e, assim, simplificar o processo. Independentemente de qual seja a "escolha" realizada, o sistema permite a redução a uma única variável: o distanciamento de contato, que se torna a variável-referência. Ao se conhecer qual é o grau de distanciamento, define-se um ponto que se refere ao próprio sistema mental determinante. Sendo o distanciamento de contato uma variável contínua, seus diferentes graus formam um campo que se refere ao eixo do contínuo de contato com o ser interior. Diferentes posições dos sistemas nesse eixo correspondem a diferentes graus de distanciamento. Desse modo, os sistemas mentais determinantes encontram um lugar no eixo do contínuo de contato e ajudam a construir um modelo unificado das perturbações psíquicas.

De início, observa-se a existência do sistema mental determinante, procurando-se caracterizá-lo em função dos fatores presentes que se destacam; em especial, da sensorialidade (um dos tipos) ou da fragilidade do self (uma das espécies). Se for, por exemplo, a sensorialidade e se ela se apresentar como sensorialidade de preenchimento substitutivo, será avaliada segundo critérios clínicos de gravidade e será representada numericamente numa distribuição de valores em escala decrescente, na qual cada sistema assumiria diferente valor em conformidade com sua natureza e com a gravidade da sensorialidade nele envolvida. Após uma avaliação clínica, será possível inserir-se em escala decrescente de gravidade vários sistemas mentais determinantes que são conhecidos e estudados em Psicanálise. Cada um dos demais tipos de sensorialidade será tratado igualmente sob o mesmo processo. A "escolha" por determinado tipo de sensorialidade, qualquer que seja ele, não modificará a gravidade da doença, que em tese seria a mesma se a "escolha" fosse outra. O que se modificaria, sim, seria a natureza da doença. Isso torna possível a construção de uma escala única para todas as variáveis relativas à sensorialidade. Isto porque o distanciamento de contato vem-se colocar na linha imaginária do eixo de contínuo de contato, em que as quatro variáveis relativas à sensorialidade assumem posições com que se pode operar. Os respectivos valores atribuídos a cada uma dessas variáveis não só são comparáveis e ordenáveis entre si, como ainda em relação às posições que ocupam no eixo do contínuo de contato. Nesse caso, a distribuição dos sistemas mentais determinantes será condicionada à posição do distanciamento de contato, mas também será relativa ao lugar que os graus deste ocupam, uns em relação aos outros, no conjunto geral do eixo. Desse modo, todos os sistemas relativos a todas as variáveis referentes aos quatro tipos de sensorialidade podem ser ordenados no eixo do contínuo de contato, em uma escala única de gravidade decrescente, cujas posições obedecem à relatividade do contexto do contínuo em que se inscrevem.

Em linhas gerais, os princípios que se referem à sensorialidade são os mesmos que se aplicam à fragilidade do self. Quando a "escolha" recai sobre esta, podem-se definir variáveis como fragilidade 1, fragilidade 2, ... fragilidade n. Nesse caso, também se estabelecem relações com o distanciamento de contato. Cada uma dessas variáveis comporta valores que se correspondem em graus com o distanciamento. Em cada ponto do eixo do contínuo de contato, pode-se expressar uma perturbação psíquica relativa a cada valor de cada uma dessas variáveis. Além disso, pode-se reuni-las em uma escala, como se faz com a sensorialidade.

O passo seguinte consiste em reunir as variáveis referentes à sensorialidade e à fragilidade do self em uma única escala decrescente de distanciamento de contato. Como as variáveis são igualmente contínuas e apresentam correspondências, pode-se seguramente reunir as distribuições e ordená-las em conformidade com o eixo do contínuo de contato. O que dá sustentação à operação é, inicialmente, a avaliação clínica, pela qual se atribuem valores às variáveis e se as relacionam entre si. Como os sistemas se relacionam, nos graus de suas respectivas variáveis, com graus equivalentes de distanciamento de contato, é admissível a reunião dos valores de todos os sistemas em uma só escala de distanciamento de contato, tendo por base o eixo do contínuo de contato. Assim, os sistemas, quaisquer que sejam, podem ser colocados no eixo do contínuo por meio dos graus de distanciamento. Como esse eixo é composto por três estados (oclusivo, inconsciente e consciente), a avaliação clínica é soberana para a determinação do lugar que cada sistema ocupa no contexto.

Conclui-se, pois, que as perturbações psíquicas podem ser inseridas no eixo do contínuo de contato por meio dos sistemas mentais determinantes que lhe dizem respeito. Seu aspecto estrutural coincide com esses sistemas, referidos aos conteúdos essenciais básicos. Torna-se possível usar os sistemas com a finalidade de construção de uma escala na qual elas se manifestam. Como o distanciamento de contato está em relação com o eixo, as perturbações psíquicas, que por intermédio dos sistemas são decorrentes do distanciamento, estão também em relação com o eixo. Assim como há relações entre os sistemas e o contínuo de contato e entre os sistemas e as perturbações psíquicas, forçosamente há relações entre estas e o eixo. Dessa forma, as perturbações psíquicas são referidas ao eixo por intermédio de seus constituintes básicos, que são os sistemas mentais determinantes. Fica simplificada a tarefa de reunir em um conjunto as perturbações psíquicas, em função de seus respectivos sistemas, numa única escala abrangente. Tratando-se de escala decrescente, derivada do eixo, não é contínua, mas guarda com ele relações de grandeza, de proporcionalidade e de sequenciação. Abre-se, assim, a possibilidade operativa de as perturbações psíquicas participarem, como totalidade organizada, de um campo unificado.

 

9. Expansão de consciência

Finalizando, resta pensar no eixo do contínuo de contato entre zero e infinito positivo, que no modelo do autor desta contribuição corresponde ao estado consciente. Aqui, introduz-se nova variável (a partir da experiência de inteireza), denominada expansão de consciência. Nesse estado, os sistemas mentais determinantes são substituídos ou sucedidos por padrões característicos da pessoa singular. A variável expansão de consciência diz respeito aos graus de proximidade de contato com o ser interior no estado consciente, sendo tratada por processos semelhantes àqueles referentes ao distanciamento de contato. Uma exposição detalhada dos assuntos aqui tratados pode ser encontrada no livro "O ser interior na psicanálise: fundamentos, modelos e processos" (2007) do mesmo autor deste trabalho.

 

Referências

• Freud, S. (1948) Más allá del principio del placer. In Freud, S. Obras completas. Vol. 1. Trad. L. López Ballesteros y de Torres, Madri, Ed. Bibl. Nueva: 1111- 1139.         [ Links ]

• Sangiorgi, O. (1967) Matemática: curso moderno. Vol. 4. São Paulo, Companhia Editora Nacional.         [ Links ]

• Trinca, W. (1999) Psicanálise e expansão de consciência: apontamentos para o novo milênio. São Paulo (SP), Vetor, 1999.         [ Links ]

• Trinca, W. (2001) Dreams, psychic mobility and inner being. Free Associations. London (UK), 8 Part 4 (48): 562-571.         [ Links ]

• Trinca, W. (2007) O ser interior na psicanálise: fundamentos, modelos eprocessos. São Paulo (SP), Vetor Editora Psico-Pedagógica.         [ Links ]

 

 

Recebido em: 10/12/2009
Aceito em: 11/01/2010

 

 

1 Professor Titular pelo Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo e Psicanalista (Membro Efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo). Contato: Rua João Moura 627, cj.61 - São Paulo, SP. - Brasil - CEP 05412-911. Tel.: (11) 3085-9176. E-mail: wtrinca@usp.br