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Boletim - Academia Paulista de Psicologia

versão impressa ISSN 1415-711X

Bol. - Acad. Paul. Psicol. vol.35 no.88 São Paulo jan. 2015

 

HISTÓRIA DA PSICOLOGIA

 

 

Estudo histórico-bibliográfico sobre a evolução do comportamento verbal na obra de B.F. Skinner

 

A Historic-bibliographic study of verbal behavior evolution in B.F. Skinner's work

 

Un estudio histórico-bibliográfico sobre la evolución del comportamiento verbal en la obra de B.F. Skinner

 

 

Alex Andrade Mesquita1

Universidade Federal do Maranhão (UFMA)

 

 


RESUMO

Interpretações errôneas sobre a obra de Skinner têm dificultado o dialogo entre os estudiosos da linguagem e a análise de comportamento, por vezes o autor tem sido acusado de desconsiderar influência de fatores biológicos sobre o comportamento e por dar pouca ênfase ao estudo da linguagem. Este estudo de caráter bibliográfico e histórico tem como objetivos Identificar: o que, quando e como Skinner fala sobre evolução do comportamento verbal e sistematizar este conhecimento por etapas como realizado por Skinner (1984, 1975). São selecionadas 20 obras do autor, entre artigos e livros que tratam dos temas evolução e comportamento verbal. Realiza uma categorização dos estágios de evolução do comportamento verbal e um tópico especial para escrita. Na visão evolucionista do autor, a primeira forma de comportamento verbal foi o gestual, através da imitação, modelação e modelagem se desenvolve o comportamento verbal oral e posteriormente ocorre o desenvolvimento sintático. A escrita por seu caráter recente recebe pouca atenção, nos textos pesquisados, pois sobre ela age principalmente a seleção cultural. A rejeição de Skinner por outras áreas provoca certo isolamento do discurso analítico-comportamental. Espera-se que a partir de estudos como este, possa ocorrer redução de preconceitos e novas ideias e linhas de pesquisa possam surgir.

Palavras-chave: comportamento verbal, linguagem, Skinner.


ABSTRACT

Erroneous interpretations of Skinner's work have hampered the dialogue among scholars of language and behavioral analysis, the author has sometimes been accused of disregarding the influence of biological factors on behavior and of giving little emphasis to the study of language. This study has a bibliographical and historical character and the objective is to identify what, when and how Skinner talks about evolution of verbal behavior and systematizes this knowledge in stages as performed by Skinner (1984, 1975). We selected 20 works of the author among articles and books that refer to themes of evolution and verbal behavior. We performed a categorization in stages of evolution of the verbal behavior and a special topic for writing. In the evolutionary view of the author the first form of verbal behavior was the gesture, through imitation, modeling and shaping occurred the development of oral verbal behavior and then the syntactic development. The writing for its recent character receives little attention in the studied texts, because the cultural selection acts mainly over it. The rejection of other areas for Skinner causes a certain insulation of behavior analytic discourse. It is expected that, from studies such as this one, the reduction of prejudices may occur and new ideas and research lines may arise.

Keywords: verbal behavior, language, Skinner


RESUMEN

Interpretaciones erróneas sobre la obra de Skinner han obstaculizado el diálogo entre los estudiosos del lenguaje y del análisis de comportamiento; el autor a veces ha sido acusado de no considerar la influencia de factores biológicos sobre el comportamiento y por dar poco énfasis en el estudio del lenguaje. Este estudio, de carácter bibliográfico e histórico, tiene como objetivo identificar qué, cuándo y cómo Skinner habla sobre la evolución de la conducta verbal y sistematiza este conocimiento en etapas, (1984, 1975). Son seleccionadas 20 obras del autor entre artículos y libros que abordan los temas de evolución y comportamiento verbal. Se realiza una clasificación de las etapas de la evolución de la conducta verbal y un tópico especial para la escritura. Desde la perspectiva evolucionista del autor, la primera forma de conducta verbal es el gestual a través de la imitación, modelado y modelaje se desarrolla el comportamiento verbal oral y posteriormente es el desarrollo del sintáctico. La escritura, por su carácter más reciente, recibe poca atención en los textos estudiados, ya que actúa principalmente en la selección cultural. El rechazo de Skinner por otras áreas causa cierto aislamiento del discurso analítico-conductual. Se espera que a partir de estudios como éste, puedan disminuirse los prejuicios y la apertura de nuevas ideas y líneas de investigación.

Palabras clave: comportamiento verbal, lenguaje, Skinner.


 

 

I- Introdução

Alvo de críticas e de mal entendidos, B.F. Skinner muitas vezes foi acusado por minimizar ou negar a influencia do fator inato ou biológico sobre o comportamento. Alguns livros de introdução à psicologia (eg. Hockenbury & Hockenbury, 2003) o consideram adepto da "teoria do estímulo-resposta", e dizem que o mesmo acredita que todo comportamento é aprendido. Esta interpretação, equivocada por vezes, provoca afastamento de estudantes e profissionais da análise do comportamento

Para a surpresa de seus críticos, Skinner era um evolucionista e a teoria da evolução tem um papel de destaque na explicação de seu sistema teórico. O autor nunca negou a importância da genética ou da biologia, apenas considerava que as explicações sobre psicologia deviam ser feitas por meio de variáveis psicológicas, não reduzidas à biologia.

O contexto histórico no qual estava inserido Skinner desde sua formação, no inicio do século XX coincide com a disseminação das ideias evolucionistas por diversas disciplinas como: genética, fisiologia, sociologia, linguística e psicologia, por exemplo.

Outro mal entendido é a afirmação de que Skinner negava os eventos internos e que seu sistema teórico não abrangia a linguagem. Ele apenas os considerava como mais um tipo de comportamento a ser explicado e não como causa do comportamento observável ou como entidades imateriais ou abstratas. O estudo da linguagem ou do comportamento verbal, como a autor prefere está presente em vários momentos de sua obra, em artigos e um livro apenas sobre o assunto.

Estes mal entendidos dificultam o dialogo entre as disciplinas que estudam a linguagem com a análise do comportamento. A apresentação da visão de Skinner sobre a linguagem e sua evolução pode promover a troca de ideias, a redução de preconceitos e o aparecimento de outras novas ideias e linhas de pesquisa sobre o tema.

I.1 Evolução

Desde a Grécia antiga já se pensava em evolução dos seres vivos, de alguma maneira, porém, teorias com maior rigor científico passaram a surgir apenas a partir do final do sec. XVIII, Lamarck escreveu em 1809, "Filosofia Fisiológica", onde apresenta os argumentos de sua teoria: as mudanças ambientais geram novas necessidades, estas determinam uso e desuso de certos órgãos, estes se atrofiam ou desenvolvem-se dependendo do uso ou desuso, os caracteres assim adquiridos são hereditários. (Molina, 2013). Um sério problema é o da transmissão das características adquiridas a futura geração, um fisiculturista, não irá transmitir seus músculos geneticamente ao filho. Apesar de não ter oferecido uma explicação convincente sobre a transmissão dos caráteres hereditários, a teoria apresenta a ideia da adaptação das espécies a seu ambiente. Fato que contribui para o desenvolvimento de outras teorias evolucionarias, futuramente.

Posteriormente, Darwin propôs a seleção natural como responsável pelo processo de evolução: ocorrem variações nas populações de indivíduos, os recursos para sua sobrevivência são escassos ou em menor quantidade do que o necessário para manter toda a população, os indivíduos que apresentam variações vantajosas ou adaptativas têm maior probabilidade de sobreviver e deixar descendentes (Molina, 2013). Adaptação é a propriedade dos seres vivos que os torna capazes de sobreviver e de se reproduzirem (Ridley, 2006).

Evolução significa mudança na forma e no comportamento dos organismos ao longo de gerações. Atua em todos os níveis: desde sequências de DNA, passando por mudanças morfológicas macroscópicas até o comportamento social. As mudanças dependem do ambiente onde as populações vivem e das variantes genéticas que surgem naquela população. (Ridley, 2006).

Algumas ideias de Darwin não foram aceitas, como a transmissão das características hereditárias que o mesmo acreditava serem fruto de miscigenação, a prole tinha a mistura de caracteres do pai e da mãe, por exemplo, se um macho vermelho cruzasse com uma fêmea branca, o filho seria cor de rosa. A moderna teoria da evolução ou neodarwinismo foi elaborada em 1930 por Fisher, Haldame e Wright que unificaram a genética mendeliana e a seleção natural mostrando que a transmissão das características hereditárias se devia por meio de herança genética (Ridley, 2006).

Uma das preocupações centrais de Darwin era com o comportamento, em 1872 ele publicou "A expressão das emoções nos homens e nos animais", formulando três princípios que seriam responsáveis pelas ações e gestos involuntários: 1º) Ações úteis tornam-se habituais associadas com certos estados de espírito, e se repetem mesmo em situações em que não tem utilidade. Certas ações tem como resultado alterar o estado de espirito como aliviar ou gratificar, há uma tendência, pela força do hábito e associação de os mesmos movimentos se repetirem, ainda que não tenham a menor utilidade. 2º) Antítese, quando um estado de espirito oposto é induzido, há uma tendência forte e involuntária à realização de movimentos de natureza contrária, ainda que não tenham utilidade. 3º) O princípio das ações devido à constituição do sistema nervoso, totalmente independentes da vontade e do hábito. Quando o sensório é intensamente estimulado, gerasse força nervosa em excesso, esta é transmitida em certas direções, dependendo da conexão entre as células nervosas e parcialmente do hábito; ou o fornecimento de força nervosa pode ser aparentemente interrompido (Darwin, 1872/2000).

Apesar de parecer estranha a linguagem utilizada, devemos lembrar que estes princípios foram escritos há mais de 143 anos, os termos utilizados eram comuns na época e devem ser interpretados com base neste momento histórico e não baseados no conhecimento atual. O que Darwin queria dizer é que inicialmente todo o comportamento era voluntário e pela força do hábito (repetição de movimentos) e das associações, o mesmo tornou-se reflexo. Na presença do estimulo apropriado, às ações seriam executadas de forma inconsciente pela ação das células nervosas que excitariam as células motoras (Castillo & Martins, 2012). Darwin creditava que no futuro a psicologia seria fortemente afetada pela teoria da evolução (Feitosa, 1999).

Segundo Morris, Lazo e Smith (2004), Skinner fez menção à biologia em 97 publicações, 34% do total de sua obra, e sobre evolução em oito publicações. Skinner (1984, 1975, 1966) faz uma proposição sobre como o comportamento do mais simples ao mais complexo desenvolveu-se ao longo da história. Fiel à teoria evolucionista, tenta explicar como as mudanças comportamentais ocorrem em função das mudanças ambientais de forma adaptativa.

O reflexo o mais simples dos comportamentos, poderia ter se iniciado, por exemplo, pela aproximação de uma ameba à comida e seu recuo diante de substâncias nocivas. Posteriormente, a seleção natural propiciou a integração das estruturas sensitivas e motoras da ameba e esta integração foi a base para o desenvolvimento do reflexo (Skinner, 1984, 1975).

A explicação do padrão fixo de ação poderia residir em mudanças geológicas, por exemplo, a tartaruga brasileira que migra até as ilhas Ascenção para se reproduzir a mais de mil milhas de distancia, num primeiro momento poderia se dirigir para ilhas mais próximas, mas como estas ilhas foram sumindo, a mesma teve que migrar para cada vez mais longe. A imitação teria, assim, valor de sobrevivência, por exemplo, indivíduos que correm ao ver outros correndo tem maior chance de fugir de um ataque, mesmo não vendo o predador, com a variação da resposta de imitar, o comportamento de imitar pode futuramente tomar controle de várias classes de respostas. No condicionamento respondente aspectos ligados ao predador que inicialmente eram neutros, como a cor, som, cheiro ficam condicionados e quando um destes sinais é percebido pode ocorrer, por exemplo, o aumento da pressão arterial, redirecionamento do sangue das extremidades para o centro do corpo, dilatação das pupilas. No condicionamento operante a redução da estimulação aversiva no reforçamento negativo e aproximação do estímulo apetitivo no reforço positivo tem claro valor de sobrevivência. A seleção natural aumenta a susceptibilidade a certos reforçadores, por exemplo, a susceptibilidade humana de ser reforçados por alimentos doces, pois tem alto valor calórico. Contingências de reforço podem se parecer com as contingencias de sobrevivência (inatas), por exemplo: o comportamento agressivo pode ser inato, mas certas contingencias de reforço geram agressão também. O operante, em um primeiro momento, pode ser uma duplicata do comportamento filogenético, e em outro momento ir se diferenciando (Skinner, 1984, 1975).

Nos seres humanos boa parte do seu comportamento é verbal e este também é uma importante fonte de aprendizado, sua evolução passou por etapas como nos demais tipos de comportamento, porém ele apresenta certas características que o diferenciam dos demais tipos.

I.2 Comportamento verbal

Pode-se entender comportamento verbal como um comportamento onde o reforço não pode ser obtido diretamente, isto é, ele não tem efeito no mundo físico, portanto necessita de mediação. Esta mediação pode ser feita por outro individuo ou pelo próprio sujeito (Skinner, 1957). No primeiro caso posso pedir a alguém que acenda a luz e outra pessoa o faz, no segundo, digo a mim que devo acender a luz e eu o faço. A consequência seria a luz acesa que poderia facilitar a visão. Barros (2003) completa dizendo que o mediador deve ser treinado por uma comunidade verbal para poder funcionar como tal. Comunidade verbal é o grupo de pessoas que podem funcionar como mediadoras fornecendo o reforço, por exemplo, um grupo de pessoas que fala japonês não pode fornecer reforço às vocalizações de alguém que fala apenas português.

Passos (2003) afirma que a função do comportamento verbal relaciona-se à vida do homem em sociedade. Mais do que vantajoso para o indivíduo, ele o é para a comunidade como um todo e, por isto, esta dispõe de práticas específicas para sua modelagem.

O comportamento verbal não deve ser confundido com o vocal, as modalidades escrita e de sinais também se incluem na categoria. Os operantes verbais também devem ser analisados em sua funcionalidade e não apenas em sua forma (Borloti, 2004).

A interação entre falante e ouvinte (que pode ser a própria pessoa), é chamada de episódio verbal. O ouvinte tem um importante papel na aquisição e manutenção do comportamento verbal, pois deve reforçar precisamente a resposta do falante. Os repertórios que caracterizam cada um deles são adquiridos de maneira independente, isto é ser ouvinte não garante que a pessoa se torne falante automaticamente, pode-se verificar a independência destes repertórios em pessoas que estão aprendendo uma nova língua, onde algumas entendem o que lhes é dito, mas pouco falam na nova língua ou ao contrário. Falante e ouvinte devem pertencer a uma mesma comunidade verbal, isto é, devem ser capazes de trocar de lugar, fornecendo reforçamento quando necessário um ao outro (Borloti, 2004).

Skinner (1957) delineou conceitualmente classes de respostas verbais classificadas segundo seus eventos antecedentes e consequentes. Em alguns operantes se observa uma correspondência ponto a ponto entre estímulo e reposta e se tem como consequência um reforçador generalizado, nesta categoria se encaixam o ecoar, o copiar, o ditar e o ler textual, quando estímulo e reposta são da mesma modalidade (eg. escrito-escrito, falado-falado) como no caso do ecoar e copiar se diz ainda que existe similaridade formal. Outras classes têm como consequência o reforço generalizado, no intraverbal se tem um estímulo discriminativo verbal, por exemplo, alguém diz "quente" e outra pessoa responde "concordo", no tato se tem um estímulo discriminativo não verbal, por exemplo, dizer sapato na presença de um sapato. No mando se tem uma operação motivacional como antecedente e uma consequência específica, como pedir água quando privado por muito tempo da mesma. O comportamento verbal de segunda ordem é composto pelos autoclíticos que podem ser entendidos como comportamento verbal sob controle de outro comportamento verbal do falante, podendo ser caracterizado principalmente pelos seus efeitos sobre o ouvinte ao descrever, qualificar, quantificar ou relacionar as relações de controle da emissão do comportamento verbal de primeira ordem. Por exemplo, "água" pode ser um mando no contexto de uma pessoa privada de água e vendo uma garrafa com água na casa de outra, se digo "água, por favor", o por favor altera a função do primeiro operante verbal, pois aumenta a chance de conseguir a água, por ser "mais educado". A gramática e a sintaxe podem ser compreendidas como processos autoclíticos (Souza, Micconi & Assis, 2009).

Skinner (1957) ainda chamou a atenção para a multi-causação do comportamento verbal, onde diferentes variáveis de controle podem atuar sobre a reposta verbal, exemplos deste tipo podem ser observados na extensão dos operantes verbais como na extensão genérica, metafórica, metonímica e soliloquia do tato e dos operantes verbais disfarçados como no mando com função de tato.

I.3 Evolução do comportamento verbal

Pinker (1999) afirma que a linguagem humana é resultado de uma complexa adaptação biológica promovida pela seleção natural.

Segundo Fitch (2005) os estudos sobre evolução da linguagem aumentaram exponencialmente desde a década de 90, novos estudos surgiram da biologia e etologia comparadas, biologia molecular, neurociência e de modelos matemáticos e computacionais de linguagem.

Skinner rechaça o uso do termo linguagem por remeter ao "mentalismo", e por não enfatizar o papel do comportamento, pois a fala não pode existir sem um falante. Muitas disciplinas têm estudado a linguagem e sua evolução, cada qual com seus objetivos e métodos próprios e apresentando vantagens e desvantagens. A análise do comportamento tem sido uma destas disciplinas. Muitas criticas foram tecidas a análise do comportamento e a Skinner, por considerar o homem como uma "tabula rasa", ou um ser passivo onde a experiência é impressa, ou ainda que tal disciplina não é capaz de dar conta explicar a linguagem por seu caráter "flexível ou criativo" (eg. Finger & Quadros, 2007; Chomsky, 1959). Parte destas críticas vem do desconhecimento e parte da má interpretação da obra de Skinner, que não é de fácil entendimento.

Quando e como Skinner fala sobre evolução do comportamento verbal? Que explicações ele fornece sobre a origem do mesmo? Este estudo tem caráter histórico e bibliográfico por apresentar quando e como Skinner trata do tema e por se ocupar da busca por sistematizar um conjunto explicativo com o qual uma ciência busca dar conta do conjunto de fenômenos que dizem respeito a seu objeto de estudo (Tourinho, 1999). Seus objetivos são: Identificar o que, quando e como Skinner fala sobre evolução do comportamento verbal, sistematizar este conhecimento por etapas como realizado por Skinner (1984, 1975) e complementar e os resultados com o que dizem autores da análise do comportamento e de outras áreas que estudam a linguagem.

 

II- Método

O trabalho foi composto pelas seguintes etapas:

1 Etapa: bibliografia

Foi realizada uma seleção dos artigos de Skinner sobre comportamento verbal e sobre evolução a partir da bibliografia do autor disponível no site da fundação B.F. Skinner, do artigo de Andery, Michelleto e Sério (2004) e Morris, Lazo e Smith. (2004).

2 Etapa: palavras-chave

Foi efetuada a leitura dos textos à procura das expressões "evolução do comportamento verbal", "origens do comportamento verbal" e "comportamento verbal em animais", está última expressão deveria se referir à aspectos voltados a evolução apenas. Além das expressões foram procuradas as palavras-chave separadamente: evolução, seleção natural, evolucionismo e animais, nos textos sobre comportamento verbal. Nos textos sobre evolução buscou-se: comportamento verbal, verbal, linguagem e comunicação. Como todo o material estava em pdf se utilizou a ferramenta "procurar" do Adobe Reader 9.0 como recurso auxiliar além da leitura.

3 Etapa: categorização e discussão

Foram criadas quatro categorias de evolução do comportamento verbal para melhor especificação dos resultados e um tópico especial para escrita. Relato semelhante foi feito em Skinner (1984/1975). Foi efetuada a discussão dos resultados encontrados com autores da biologia, linguística e análise do comportamento sobre o tema, com objetivo de aprofundar o debate.

 

III- Resultados e Discussão

Etapa 1

Segundo Morris e outros (2004), Skinner trata do assunto evolução em oito publicações, e com título "evolução" em sete; obteve-se acesso a todos os oito artigos sobre o tema. Já sobre comportamento verbal, existem seis publicações com título de "verbal". Todas foram acessadas, além destas foram pesquisadas mais seis publicações que tratam do assunto, num total de 12, entre livros e artigos. A Tabela 1 apresenta os resultados e no total foram pesquisadas 20 publicações.

 

 

Etapas 2 e 3

Skinner faz referencia à evolução do comportamento verbal em poucas passagens e quando o faz, de maneira resumida ou repete parte do exposto em um texto em outro. Existem textos onde o tema cultura é abordado, o papel do desenvolvimento do comportamento verbal é até discutido, mas não há referencia a sua evolução. Skinner atribui alta importância à evolução em seu sistema teórico, e como grande parte do comportamento nos seres humanos é verbal, o tema recebe um tratamento não condizente com tal importância. Desta maneira, podese responder a pergunta sobre como o autor escreve sobre o assunto.

As palavras-chave foram encontradas em cinco publicações: Verbal behavior (1957), The design of cultures (1959a), The phylogeny and ontogeny of behavior (1966), Evolution of Behavior (1984) e em Evolution of verbal behavior (1987). Neste momento é possível responder a pergunta sobre quando Skinner publica, a primeira publicação ocorre cerca de 17 anos após seu primeiro artigo, e o último três anos antes de sua morte. Skinner em sua formação de linguista tinha um interesse especial no estudo da linguagem e foi fortemente influenciado pelas ideias evolucionistas de sua época, porém apenas quando atinge a maturidade intelectual é que a temática da evolução do comportamento verbal é abordada, num momento onde as críticas começavam a ser mais fortes sobre seu sistema teórico pela pouca consideração dada até aquele momento à linguagem.

Um fato verificado é que em nenhum momento é conceituado "evolução do comportamento" ou "evolução do comportamento verbal" de forma direta, existem muitas formulações, exemplos e teorias sobre o assunto, parece que autor pressupõe que o leitor já saiba do que se trata, pois em diversas publicações (Skinner, 1966, 1975, 1983, 1984, 1987) o texto é iniciado com algum aspecto específico ou crítica à teoria evolucionista, sem uma definição. Sobre evolução do comportamento, Skinner (1966) diz ".... o ambiente pode mudar demandando que o comportamento que contribuiu para sobrevivência por uma dada razão se torne mais complexo. Pequenas vantagens podem ser responsáveis por diferentes estágios." (p.1206). Sobre evolução do comportamento verbal Skinner (1987) afirma: "Falando estritamente, o comportamento verbal não evoluiu. Ele é o produto de um ambiente verbal, ou o que os linguistas chamam de linguagem, e é o ambiente verbal que evolui" (p.115).

Outra marca registrada em vários trechos é o combate ao "mentalismo", na forma da cognição animal, etologia cognitiva ou similar. Exemplificando, em Skinner (1966) após falar da evolução gestual do comportamento verbal, como produto das contingências ontogênicas e filogênicas relata: "A teoria da informação oferece uma elaborada versão: o organismo comunicador seleciona a mensagem do ambiente, lê a informação necessária, a codifica para armazenagem e a transmite, o organismo receptor decodifica a mensagem e a armazena para atuar eficazmente". (p.1213). Ao comentar a dança das abelhas que indicam o local do alimento, Skinner (1987) comenta: "A dança conduz informação, e assim por diante. Tais expressões, bastante úteis no discurso casual, nada acrescentam para uma explicação em termos de seleção natural e podem obscurecer os processos em questão" (p.117). Como em textos sobre outros assuntos Skinner coloca veementemente sua posição contrária ao uso de variáveis imateriais ou de ficções explanatórias que não ocorrem apenas no âmbito da psicologia, mas também da biologia.

III.1 Estágio da evolução pré-verbal

O comportamento verbal teria surgido de forma abrupta ou lentamente? É mais provável que a segunda opção tenha ocorrido (Skinner, 1987). Como outras atividades do organismo, tais como a respiração, digestão ou reprodução o comportamento verbal é adquirido por seleção natural por causa de sua consequência para sobrevivência da espécie (Skinner, 1957). Segundo Corballis (2009, 1999) o mais provável é que a linguagem humana tenha evoluído de gestos inicialmente, isto cerca de 6 a 7 milhões de anos atrás, a cerca de 4 a 5 milhões de anos gestos mais sofisticados começaram ser usados, cerca de 1 a 2 milhões de anos a linguagem passa a simbólica e a cerca de 100.000 anos se torna a forma atual. O autor oferece os seguintes argumentos para confirmar suas afirmações sobre origem da linguagem: em macacos a linguagem gestual é mais utilizada que a vocal, existe uma plataforma neural para o desenvolvimento da linguagem em macacos, lateralidade e assimetria cerebral para a linguagem são correlacionados, sugerindo influência comum, assim o desenvolvimento da fala está ligado ao gestual. Porém, apesar de responder em parte a pergunta de Skinner, uma nova questão pode ser levantada, na explicação do autor falta dizer como a linguagem instintiva passou a ser simbólica. As mudanças fisiológicas citadas são consequências das mudanças e não causa.

Skinner (1987) faz uma exposição sobre a origem do comportamento verbal, chamando a atenção para a sinalização filogenética, como por exemplo, o rosnar de um cão que sinaliza o perigo, e complementa dizendo que o rosnar foi selecionado, pois os animais que o faziam tinham mais chance de sobreviver. Porém, Skinner (1957, 1959a, 1966 e 1987) em vários momentos contesta a versão da teoria na qual o comportamento verbal tenha se originado de gritos instintivos, pois estes são repostas reflexas quase impossíveis de serem modificadas por reforço operante. Por exemplo, pode-se ensinar um gato a mover as patas, manipular coisas e fazer truques por modelagem, mas não há como fazê-lo miar usando mesmo processo. O miado é uma reposta emocional a uma situação frustradora.

Skinner (1957) diz que animais poderiam apresentar comportamento verbal, com suficiente exposição às variáveis relevantes, poder-se-ia construir um repertório verbal vocal. Mas os gritos instintivos são liberados ou evocados, seria mais provável surgir comportamento verbal de movimentos indiferenciados, nãoorganizados previamente como o balbuciar do bebê.

O sistema de sinais instintivos e o comportamento verbal são diferentes, o primeiro é uma versão antiga do segundo. Os primeiros são restritos a situações liberadoras ou eliciadoras, e dificilmente são modelados, já o segundo exibe grande flexibilidade (Skinner, 1966).

III.2 Estágio de evolução: comportamento gestual

A versão de Skinner para o aparecimento do comportamento verbal parece ser a sobreposição de contingências ontogenéticas às de sobrevivência, o comportamento verbal não evoluiu de padrões instintivos, mas de contingências de reforço que eram análogas às contingencias de sobrevivência, ambas tem função adaptativa, mas a primeira é refratária à modificação. Há um paralelo entre seleção natural e condicionamento operante, ambas têm efeito na promoção da sobrevivência, porém guardam enorme diferença na escala do tempo (Skinner, 1957, 1959, 1966, 1987).

Como se desenvolveram os gestos, provavelmente a primeira forma de comportamento verbal? Como alguém teria aprendido a responder a um gesto, antes que ele viesse a existir como gesto? Um exemplo comum é o guarda de trânsito que coloca a mão para cima e isto indica que se deve parar, a razão da mão para cima remete a uma época onde para parar uma pessoa a outra colocava a mão em seu peito, este movimento obriga a pessoa a parar para evitar bater na mão. O gesto de "venha cá", pode ter se originado do ato de puxar a outra pessoa. Tais gestos resultam da imitação das contingências filogenéticas que são semelhantes às ontogenéticas (Skinner, 1987).

Sobre o processo de imitação, pode-se dizer: "Os organismos devem ter se beneficiado do comportamento de outro organismo em um estágio muito inicial através da imitação" (Skinner, 1987 p.115). A evolução do processo pode estar orientada para consequências seletivas plausíveis: as contingências responsáveis pelo comportamento imitado podem afetar outro organismo quando ele se comporta da mesma maneira. Assim, se um de dois animais pastando vê um predador e corre, o outro é mais provável de escapar se também correr, ainda que ele não tenha visto o predador. Correr sempre que outro organismo corre geralmente tem valor de sobrevivência (Skinner, 1987, 1957). Sobre a imitação ontogenética o autor completa:

"Animais aprendem a imitar quando, ao fazer o que outros estão fazendo, eles são afetados pelas mesmas contingências - de reforçamento ao invés de sobrevivência" Se, por exemplo, uma porta pode ser aberta apenas sendo deslizada por um lado, ao invés de empurrada ou puxada, uma pessoa a deslizará após ver que uma outra pessoa fez assim, embora a outra pessoa não esteja necessariamente modelando o comportamento. Em tal exemplo, ambas as partes podem exibir indícios de imitação filogenética ou modelação, mas contingências operantes seriam suficientes". (Skinner, 1987, p.113).

Baum (1999) diz que se pode identificar dois tipos de imitação, uma nãoaprendida que é vista comumente em pombos, macacos e crianças, tem origem genética e não necessita de experiência prévia e uma aprendida que seria um tipo de comportamento controlado por regras.

Desta forma, através de imitação e modelação hipotetiza-se que o comportamento verbal gestual foi implantado e mantido.

III.3 Estágio de evolução: comportamento vocal

A espécie humana deu um passo crucial para adiante quando sua musculatura vocal ficou sob controle operante na produção dos sons da fala. É deveras possível que todas as conquistas próprias da espécie possam ter se seguido a esta alteração genética Skinner (1987, p. 120). Como este processo ocorreu? Por exemplo, um bebê exibe choro inato, diante de fome, este choro afeta o comportamento da mãe de forma punitiva, se mãe está com o peito cheio, ela levará o bebê ao peito para se livrar da estimulação aversiva (Skinner, 1957). O choro pode ficar sob controle das duas contingências e posteriormente apenas sob controle operante. O bebê pode passar a chorar sob controle operante em virtude da atenção fornecida pela mãe (Skinner, 1987).

Uma possível contradição na explicação skinneriana talvez pudesse ser levantada: Se as respostas reflexas e padrões fixos de ação são quase impossíveis de ficar sob controle operante, por que Skinner (1987) fornece o exemplo do choro do bebê em vários momentos? O choro não seria um reflexo que posteriormente, também, ficaria sob o controle operante? Na verdade, o que ocorre é novamente a sobreposição das contingencias filogenéticas e ontogenéticas, a topografia do choro é semelhante, mas o choro operante é uma imitação do choro reflexo, o segundo é difícil de ser modificado, mas o primeiro não.

Outro exemplo fornecido seria o de dois pescadores que estão com uma rede em um rio, um observa os peixes e quando algum passa pela rede ele faz um barulho, um "uhh" que funciona como sinal para o outro puxar a rede, caso o sinal seja feito antes ou depois da passagem do peixe o ouvinte irá ficar irritado, caso seja feito no momento exato, o peixe será pego e o ouvinte ficará excitado ou feliz (Skinner, 1987). Nesta situação o "uhh" não se trata de um padrão reflexo, portanto seria mais fácil ficar sob controle operante. Skinner (1957) em outra passagem afirma que o balbuciar do bebê que não é uma reposta reflexa, seria a matéria na qual a modelagem poderia ser desenvolvida.

Em um estágio mais avançado, o comportamento verbal vocal continuaria sendo desenvolvido por modelação e imitação de padrões, se no caso do pescador uma outra pessoa estivesse vendo a pescaria, poderia fazer o mesmo "uhh" substituindo um dos parceiros envolvidos, pois foram observadas as consequências da ação dos primeiros pescadores. Crianças aprendem inicialmente desta forma, seguindo os exemplos das pessoas com quem convivem (Skinner, 1957; 1987)

Se várias pessoas observassem e aprendessem o "uhh" haveria variações de entonação, forma e velocidade, alguns padrões vocais seriam mais aptos, talvez os mais altos e demorados, mas se fossem altos demais ou demorados demais poderiam espantar os peixes ou assustar a outra pessoa, desta forma dentro de uma população de repostas verbais, algumas seriam selecionadas e outras extintas por meio de reforço e punição. De maneira semelhante outros padrões vocais foram sendo formados, mantidos e extintos.

III.4 Estágio de evolução: comportamento autocrítico - gramática e sintaxe

Uma das críticas à explicação skinneriana é como seria possível aprender todas as palavras e sentenças apenas por imitação? Como uma pessoa diz algo que nunca disse antes? Chomsky (1959) afirma que existe componente gerativo na linguagem e este é universal e de origem genética. A proposição chomskiana está pautada no inatismo e na ideia de que existe um dispositivo independente para a linguagem, exclusivo da espécie humana, de caráter altamente criativo e que este dispositivo nada tem a ver com o condicionamento. O ser humano possui uma capacidade criativa para a partir de alguns elementos restritos, expressar e compreender cadeias de forma irrestrita. A partir daí, surge à proposta da existência de uma capacidade "gerativa" da linguagem. O ser humano, além disto, possui um conhecimento sobre o sistema linguístico, chamado de competência. O autor não diz quais são os genes responsáveis por este caráter inato, apenas afirma que a neurobiologia avançará e poderá fornecer tais respostas (Chomsky, 1959; Finger & Quadros, 2007).

Apesar do problema do uso da genética, de maneira especulativa, pois os geneticistas teriam que encontrar o gene responsável pela criatividade da fala, para justificar a proposição da aquisição da linguagem, o questionamento é relevante.

Considerando o exemplo da pescaria, os peixes são manuseados, transportados, cozinhados, carregados, comidos. As situações mudam, mas é emitido o tato "peixe" em todas elas. Um tato emerge, como a probabilidade de dizer "peixe" na presença de um peixe, quando diferentes ocorrências são seguidas por diferentes consequências reforçadoras, totalmente à parte de qualquer outra característica de uma situação particular. A consequência para o tato deve ser generalizada, a generalização necessária presumivelmente veio aproximadamente quando havia muitas atividades cooperativas nas quais um único objeto, como um peixe ou uma única ação, como puxar, tomaram parte (Skinner, 1987, 1957).

Os mandos podem ter evoluído dos gestos, como puxar uma pessoa para perto, do ato de puxar, passando ao gesto de "venha", até a vocalização. A variável de controle é uma operação motivacional (Skinner, 1987, 1957).

No sistema skinneriano gramatica e sintaxe podem ser entendidas como processos autoclíticos, que são operantes verbais de segunda ordem e que modificam os operantes verbais primários. Estes podem ser caracterizados principalmente pelos seus efeitos sobre o ouvinte ao descrever, qualificar, quantificar ou relacionar para este as relações de controle da emissão do comportamento verbal de primeira ordem (Skinner, 1957; Souza, Micone & Assis, 2009).

Souza, Micone e Assis (2009) dizem que a gramática nada mais é do que a descrição das regularidades verbais observadas em uma comunidade verbal. Já a sintaxe seria o estudo das variáveis de controle da relação de ordem no comportamento verbal de uma comunidade linguística, sendo essa ordem controlada e selecionada pelas contingências sociais arbitrárias e não por uma propriedade formal intrínseca (inata) do cérebro humano.

O modo como a estrutura das sentenças é constituída, processos de composição, ordenação, agrupamento, edição são respostas autoclíticas (Souza e outros, 2009). O controle de tais repostas advém das contingências de reforço, as pessoas não aprendem a falar porque conhecem previamente as regras gramaticais, mas por imitação e modelagem proporcionadas pela comunidade verbal. As regras gramaticais e sintáticas nada mais são do que descrições da língua falada e escrita e podem funcionar como balizadores para o falar e escrever "correto", mas não como entidades causais.

Autoclíticos evoluíram como instruções ao ouvinte que o ajudam a comportar-se de modos mais prováveis de ter consequências reforçadoras e, por conseguinte, mais prováveis de promover reciprocamente consequências reforçadoras para o falante (Skinner, 1987, p. 123). Por exemplo, se duas pessoas estão caminhando juntas e uma delas sente alguns pingos de chuva, pode dizer "chuva". O ouvinte presente ou outros como ele reagem a esta resposta de maneiras reforçadoras. Ele ou outros reagem também de outras maneiras a outros aspectos da situação quando, por exemplo, o falante evidencia surpresa ou desapontamento. Nesta ocasião, o falante pode então dizer "chuva" com um tom de voz de surpresa ou desapontamento. Algo foi acrescentado ao tato. Algo que foi acrescentado a outras respostas no passado com consequências reforçadoras, mas nunca antes à "chuva". A possibilidade de recombinar os elementos de respostas vocais deste modo esclarece muito da extensão e do poder do comportamento verbal (Skinner, 1987).

O comportamento novo ocorre em novas ocasiões, e uma ocasião é nova no sentido de que suas características não apareceram juntas antes num mesmo arranjo. O que é aprendido em uma situação é recombinado e usado em outra (Skinner, 1987, 1957). Num alfabeto a recombinação de letras, formam sílabas que formam palavras, que formam sentenças que podem ser recombinadas (Skinner, 1957). Por mais criativa que a natureza humana seja, não haveria como dizer ou compreender novas sentenças sem ter aprendidos suas unidades mínimas, uma pessoa fala ou "entende" algo que nunca disse ou escutou antes, porque já disse ou escutou os elementos que formam a nova palavra ou sentença em uma outra ordem em um momento prévio.

O comportamento novo também em especial das relações verbais foi alvo de muita pesquisa e debate por autores pós-skinnerianos, as duas principais teorias que tentam explicar o comportamento novo são: a da equivalência de estímulos e a de quadros relacionais. A primeira postula que após o ensino entre três pares de estímulos, por exemplo, A e B e B e C emerge uma relação nova não ensinada entre o estímulo A e o estímulo C, por exemplo é ensinado a criança a falar bolsa diante de uma bolsa, e escrever bolsa na presença da bolsa, num segundo momento emerge uma relação sem ensino direto, diante da palavra escrita bolsa a criança dirá bolsa, e ao contrário ao falar bolsa ela poderá escrever bolsa, sem ensino direto (Sidman, 1971, 1982, 1994).

A teoria de quadros relacionais diz que as contingências que geram a equivalência advém do reforçamento de vários exemplares do tipo de responder relacional arbitrariamente aplicado, nos quais os quadros relacionais permanecem os mesmos. A sintaxe, por exemplo, a relação sujeito-verbo-objeto, constitui-se uma moldura ou quadro, construída a partir do reforço a exposição de múltiplos exemplares semelhantes, onde os novos elementos aprendidos são apenas inseridos neste quadro (Hayes & Barnes, 1997; Moreira, Todorov & Nalini, 2006). Dale (2004) diz que a relação entre respostas, como por exemplo, as palavras em uma frase emergem através do ensino de múltiplos exemplares". A relação entre os elementos da frase são os mesmos apesar das palavras serem diferentes, quaisquer novas palavras podem ser inseridas na moldura sujeito-verbo-objeto, isto é sem ensino prévio destas palavras (Wright, 2006).

III.5 Escrita

A evolução da escrita é pouco citada nos textos analisados, exceção de Skinner (1957), talvez por seu caráter mais recente, com menos de 10 mil anos de existência. Agindo sobre ela estaria principalmente a seleção cultural. Os mecanismos físicos dos primeiros escritores são muito semelhantes aos dos atuais escritores. Skinner (1957) considera que a escrita é um comportamento da mesma natureza que o vocal e o gestual, porém ela requer: instrumentos e materiais especiais, fazer marcas de maneira diferenciada e transmitir tais marcas ao leitor. De Rose (2005) considera leitura e escrita como rede de relações entre estímulos e respostas. Talvez se possa dizer que as primeiras formas hierográficas ou pictográficas mantinham uma relação de equivalência física com o que representavam, um cavalo era escrito na forma de cavalo e com passar do tempo as relações passaram a ser arbitrárias, isto é, por exemplo, na língua portuguesa atual a palavra escrita cavalo não guarda semelhança física com um cavalo real. Também a escrita evoluiu de forma a representar um objeto ou evento fixo, um animal, por exemplo, para ações em diferentes tempos, ou eventos compostos, a figura de um cavalo, não poderia descrever adequadamente o fato de uma que pessoa andará a cavalo amanhã ou andou a cavalo ontem enquanto um carro se acidentava. Talvez por isto a inclusão de marcas arbitrárias ocorreu, marcas que devem ser compartilhadas por uma comunidade verbal para terem efeito.

 

IV- Considerações finais

Foi verificado que apesar de Skinner ter dado grande importância ao estudo da teoria da evolução e do comportamento verbal em sua obra, o mesmo não se pode dizer sobre a evolução do comportamento verbal. Poucas publicações se referem ao assunto, e se observa pouca sistematização também.

Buscou-se identificar quando e como o autor trata do tema e organizar os resultados por estágios de evolução do comportamento como em Skinner (1984/ 1975). Hipóteses plausíveis tendo como base as mudanças ambientais e a adaptação comportamental são fornecidas para explicação da origem e da evolução do comportamento verbal, inclusive do comportamento verbal "novo". As explicações não se baseiam num nível fisiológico, onde desenvolvimento do cérebro, boca, laringe, pulmões etc são tidos como causa das mudanças comportamentais, eles são os mecanismos subjacentes ao mesmo. O mecanismo causal é a seleção natural.

Skinner se mantém fiel às ideias evolucionistas e expande o trabalho na identificação dos processos evolutivos do comportamento verbal e não verbal. Apesar disto, o discurso behaviorista ainda está distante do discurso utilizado pela maioria dos linguistas, biólogos, sociólogos e demais psicólogos que estudam a evolução da linguagem. A rejeição e até mesmo o desconhecimento de Skinner por outras áreas provocou certo isolamento do discurso analítico-comportamental. Este isolamento prejudica a disseminação das ideias behavioristas ou aumenta a rejeição às mesmas. A fundamentação empírica da ciência do comportamento pode contribuir com outros campos do saber da área de linguagem, tanto teoricamente como na prática, existe uma vasta e crescente bibliografia sobre métodos de ensino de leitura na análise do comportamento, pouco acessada por profissionais de outras disciplinas, em parte por desconhecimento e em parte por preconceito. Como o contrário, novas ideias podem surgir no âmbito da análise do comportamento no contato com tais áreas.

 

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Recebido: 15/01/2015 / Corrigido: 26/01/2015 / Aceito: 02/04/2015.

 

 

1 Professor Assistente UFMA. Doutorando em Teoria e Pesquisa do Comportamento Universidade Federal Pará (UFPA). Contato: Rua Laerte Santos. Cond. Pacífico II, Bl. 11, Ap. 102 São Luiz, Maranhão, Brasil. Tel: (98) 3272-8335. Email: alexmesquita@gmail.com

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