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Boletim - Academia Paulista de Psicologia

Print version ISSN 1415-711X

Bol. - Acad. Paul. Psicol. vol.40 no.98 São Paulo Jan./June 2020

 

II. RESENHAS DE LIVROS

 

Trinca, Walter. (2019). Uma imagem pelo mundo. São Paulo: Editora Edgard Blucher Ltda

 

 

Aracê Maria Magenta MagalhãesI

IPsicóloga Clínica. Contato: Rua Antonio Alves, 28-21 – Jd. Aeroporto – CEP 17012-431 – Bauru, SP. E-mail: aracemagalhaes@hotmail.com

 

 

"Belo é o que é interiormente belo" ~ Kandinsky (1986, p.117)

O autor desta obra é o psicanalista Walter Trinca, membro Efetivo da Sociedade Brasileira de Psicanálise de São Paulo, da International Psychoanalytical Association, e Titular da Academia Paulista de Psicologia, ocupando a Cadeira nº 40, "Walther Barioni". É graduado em Psicologia pela Universidade de São Paulo, onde foi docente, supervisor, orientador e coordenador do programa de pós-graduação em Psicologia Clínica. Como pesquisador galgou os títulos de Mestre, Doutor, Professor Livre-docente e Professor Titular. Toda esta carreira de estudo e pesquisa contribuiu para a construção de muitas obras literárias, tanto como escritor, como poeta, sendo esta, a sua mais nova contribuição editada. Já na introdução deste livro e no primeiro capítulo, o autor apresenta o que denomina experiência de imaterialidade. Esta experiência é o foco que o autor vai desenvolver nesta obra, discutindo aspectos importantes e fornecendo exemplos extraídos de suas referências e de sua grande cultura. Por experiências de imaterialidade o autor esclarece, aqui relatado sucintamente, que estas consistem em vivências experimentadas de leveza, mobilidade, silêncio, dentre outras, que levam a amplidão e abertura da visão de mundo, propiciando contatos e descobertas surpreendentes. Estando a mente livre, receptiva, solta, móvel, esta, então, é capaz de criar uma dimensão, um espaço, para as manifestações do espírito e da experiência de imaterialidade. Nos capítulos 2 e 3, o autor oferece exemplos de experiência de imaterialidade, e discorre sobre estes: A realidade como sonho (desconhecida, absurda, inusitada); A presença de vida (o sopro vital que anima cada ser); A radiância do mundo (quando estamos presentes em nós mesmos); As imagens artísticas espontâneas (quando a interioridade é envolvida por formas, cores, luzes, movimentos que trazem suavidade, amplidão, entre outros); O alargamento mental ( a expansão da consciência); A luz interior (móvel e flúida, introduzindo liberdade, tranqüilidade e vivificação) e A memória espiritual da humanidade (obras legadas por um tempo remoto). No capítulo 4, Trinca (2019) discorre sobre a importância da experiência de imaterialidade, que nasce do relacionamento com o mundo externo. Então, o autor demarca a segunda parte desta obra: Imaterialidade e universalidade. Esta começa no capítulo 5, onde o autor nos fala de um legado imaterial pertencente à humanidade e que corresponde às representações das expressões dessa imaterialidade nos diversos campos do conhecimento, por todas as épocas e lugares. A seguir, retira do contexto histórico alguns significativos exemplos, efetuando belas e intrigantes descrições, junto a comentários pertinentes a psicologia e psicanálise. O capítulo 6 apresenta o exemplo das cavernas pré-históricas de Chauvet e Lascaux cujas paredes apresentam preservadas pinturas efetuadas por nossos antepassados, representando predominantemente animais vivos, motivos abstratos e raramente o ser humano. No capítulo 7, o autor traz primeiramente as expressões de vida na Ilha de Creta, especialmente entre os anos de 1700 a.C. e 1500 a.C, possíveis de serem conhecidas devido ao estudo dos achados arqueológicos de vasos, afrescos, túmulos, palácios abertos e iluminados, em vez de fortalezas, o que representa a vida pacífica, tranqüila, com uma arte sem regras repleta de espontaneidade e alegria. Também destaca no Egito, dos faraós, o templo de Akhnaton, onde reaparece o mesmo espírito vivificador. O capítulo 8 leva o leitor à Grécia antiga, a cidade de Atenas, com a sua arte clássica, arquitetura e esculturas sofisticadas sustentados pelos princípios de mobilidade, individualidade e ordem harmônica, esta emanada da própria existência do cosmo. No capítulo 9, o autor busca nas dinastias chinesas, a poesia Tang e a pintura Song. Traz a poesia de Li Tai Po para evidenciar sua capacidade de tocar com as palavras a profundidade do mundo, seus encantos e mistérios. Assim também se apresenta a pintura paisagística Song, que exprime o encontro da harmonia interior com a exterior. O capítulo 10 leva o leitor à era medieval, ao ocidente e às catedrais góticas com seus vitrais translúcidos e coloridos que filtravam a luz em tons de azul, vermelho, dourado e prateado junto à grandiosa arquitetura de linhas verticais, sustentada pelo cruzamento de arcos ogivais. Também vai à Itália, Florença, para destacar a arte renascentista do italiano Rafael Sanzio, que trabalhou especialmente na pintura de Virgens. O autor destaca a Virgem de Alba como a presença da infinitude na própria finitude. Em seus traços, Rafael imprimia leveza, jovialidade e doçura. No capítulo 11, aborda o Romantismo do século XVIII, cujo movimento insurgiu contra a rigidez das regras clássicas e inflexíveis, privilegiando o sentimento, a imaginação, o personalismo, o misticismo, enfim, a liberação do self, levada muitas vezes ao excesso e à excentricidade, num movimento dialético entre luz e trevas, vida e morte, tédio e renovação, horror e esperança. O capítulo 12 traz o movimento impressionista, originado em 1874, em Paris, com a exposição de trinta artistas franceses recusados pelo Salão Oficial. Tal movimento privilegia as impressões, sensações e sentimentos provocados no artista pelos objetos, situações, cores e luzes. O autor destaca e faz considerações da vida e obra de dois ícones impressionistas: Claude Monet e Paul Cézanne. No capítulo 13, o autor destaca dois nomes da literatura moderna que ocupam posição de vanguarda: Hermann Hesse e Henry David Thoreau. Além de fazer sonhar, despertar e estimular, sua arte posicionou-se contra toda forma de constrangimento, destrutividade e cerceamento da liberdade. O capítulo 14 traz o pensamento contemporâneo do indiano Krishnamurti (1895-1986), que recebeu educação esmerada e se tornou chefe espiritual da Ordem da Estrela do Oriente. Com o tempo, passou a ter id&eacut e;ias próprias, dissolveu a organização, contrário a tradições obsoletas e crenças estéreis, e passou a incentivar a libertação, à transformação interior e o autoconhecimento. No capítulo 15, o autor discorre sobre os esboços anteriormente apresentados onde é possível verificar a existência de uma realidade imaterial. Conclui pontuando que as experiências de imaterialidade não se limitam aos domínios apresentados e podem manifestar-se na dança, na escultura, na religião, na filosofia, na arquitetura, dentre outros. A parte III, denominada Imaterialidade e psicanálise está dividida em dois capítulos. No capítulo 16, A mente: dinâmica dos fatores,Trinca (2019), busca os conceitos da Psicanálise Compreensiva para estudar a experiência da imaterialidade.Cita que tais delineamentos foram expostos em trabalhos anteriores (Trinca, 2011;2014; 2016). Destaca e discorre sobre: O ser interior e o self; A questão do contato; A fragilidade e a sensorialidade e A interação dos fatores. O capítulo 17, A expansão da Consciência, o autor discorre sobre duas posições antagônicas, a de um universo imaterial e libertador e outro sensorial, condicionado e limitado. Neste contexto, a Psicanálise pode proporcionar conhecimentos da estrutura e dinâmica psíquicas, podendo oferecer auxílio rumo à expansão da consciência. A parte IV, denominada Imaterialidade e imagem do mundo, abrange três capítulos. No primeiro deles, o capítulo 18 (Um modelo geral), o autor sintetiza os princípios e idéias apresentadas anteriormente. No capítulo 19, denominado Determinantes de uma imagem do mundo I, o autor apresenta alguns elementos determinantes de aproximação à realidade imaterial. São eles: Sonhos, Vida, Radiância, Imagens Mentais, Abrangência e Harmonia. No capítulo 20, denominado Determinantes de uma imagem do mundo II, o autor oferece novos determinantes. São eles: Transfiguração, Primordialidade, Atemporalidade, Infinitude, Totalidade e Mistério.A parte V, Imaterialidade e realidade compreende dois capítulos do livro. O capítulo 21, A realidade mais profunda, o autor aborda a realidade em sua dualidade de forças: organização e desorganização, construção e destruição, criação e decomposição, vida e morte, bem como suas decorrências: evolução, adaptação, extinção. No capítulo 22, A penetração da realidade, elegi uma frase do próprio autor que expressa com arte poética, o essencial:

"Se o contato da pessoa consigo própria permite, em graus, estar presente, perceber, sentir, compreender e participar da realidade, conduz, também, à expansão de consciência, na qual o self apresenta condições particulares de receber a luz do ser profundo e de integrar-se com ele".

Trinca (2019, p.320)

No Epílogo, o autor lança algumas discussões e conclui o trabalho pontuando que as experiências de imaterialidade não cessam de se manifestar e de não se manifestar, deixando o espaço aberto a novas surpresas.

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