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Estilos da Clinica

versão impressa ISSN 1415-7128versão On-line ISSN 1981-1624

Estilos clin. v.9 n.16 São Paulo jun. 2004

 

DOSSIÊ

Método psicanalítico e a clínica do laço mãe bêbe

 

The psychoanalytical method and the clinical practice on mother-baby bond

 

 

Angela VorcaroI

Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Este trabalho apresenta impasses metodológicos implicados na prática clínica com bebês e propõe-se a discuti-los, a partir de um caso clínico em que o laço mãe-bebê encontra-se perturbado.

Palavras chave: Método psicanalítico, Laço mãe-bebê, Clínica psicanalítica.


ABSTRACT

This paper presents methodological impasses implicit in clinical practice with babies, and discusses them on the basis of a clinical case that showed unstable bonds between mother and baby.

Keywords: Psychoanalytical method, Clinical practice, Mother-baby bonds.


 

 

ADVERTÊNCIA

Circunscreve-se a clínica com bebês, no âmbito deste trabalho, à experiência clínica na qual o pedido de atendimento psicanalítico é feito por uma mulher – na condição de mãe, diante da perturbação causada pela presença de um bebê. Neste caso, o bebê é incluído nas entrevistas realizadas com a mãe.

Essa situação clínica, que transborda completamente o campo da clínica convencional, é alvo de problematização não apenas sobre o método clínico posto em jogo nessa circunstância, especialmente no que ele determina do estatuto dessa prática.

Não é difícil notar que a inclusão do bebê em entrevistas clínicas constitui um grande deslocamento da cena clínica na qual, normalmente, o método psicanalítico opera. Sobre este aspecto, cabe interrogar então se esta alteração da cena clínica incide também sobre os pressupostos psicanalíticos em que esta clínica se assenta, ou seja, a hipótese freudiana de haver inconsciente.

Problematizar o método clínico implica, portanto, o desencadeamento de rede de questões relativas ao estatuto desta prática. A começar pelo fato de o sujeito que demanda atendimento clínico trazer, concretamente, o foco de seu mal-estar para a entrevista com o psicanalista. Seria este um impedimento para a possibilidade de o sujeito tratar de seu mal-estar no campo simbólico? Neste caso a mãe estaria mantendo a criança no real e, portanto, operando a economia do posicionamento simbólico da criança em sua articulação discursiva com a anuência do psicanalista? As operações clínicas dirigidas à criança, sujeito ainda inconstituído, implicariam fazer incidir uma visão de mundo do psicanalista? Enfim, um ideal preventivista, alheio à psicanálise, poderia daí se depreender? Qual seria a incidência de sua intervenção? Ele interviria: diretamente no bebê, a partir da interpretação (mesmo que gestual) de manifestações observadas? No laço mãe-bebê? No bebê, para atingir a mãe? Na mãe, para atingir o bebê?

Todas essas questões depreendem-se da interrogação fundamental, a saber, o que regularia a intervenção do analista? Afinal, será necessário analisar em que medida o setting desta clínica permite configurar um campo propriamente simbólico, que seja, portanto, capaz de ultrapassar o peso de intuições psicologizantes e imaginárias. Afinal, se consideramos que o neonato é imaginarizado pelo agente materno, antecipando, por este meio, um sujeito ainda por vir, será possível distinguir o real do organismo, o imaginário materno e um campo propriamente simbólico que os articula?

Diante de todas essas questões, poderíamos supor que é razoável nem sequer considerar a possibilidade de haver aí uma clínica. Entretanto, uma urgência a promove, e talvez caiba mais escutá-la e torná-la audível do que desconsiderá-la e esquecê-la. Trata-se de que há uma impossibilidade atual da mãe, e o tempo de trabalho analítico que tal impossibilidade pode demandar talvez seja muito superior à urgência de acolhimento e posicionamento simbólico do bebê em seus primeiros meses de vida. Muitas são as circunstâncias de risco para a condição vital e simbólica. Nada do que justifica essa clínica, entretanto, diminui a necessidade de debater e problematizar a prática clínica, e será ela que permitirá nortear as sistematizações da teoria e sua circunscrição dentro ou fora do campo psicanalítico.

É necessário analisar essa prática tendo como guia os operadores teóricos da psicanálise, pois, mesmo que constatemos que a modalidade de intervenção do analista escapa ao campo da psicanálise, distinguiremos a serviço do que esta prática se oferece e como ela trata o sujeito em nossa época.

Com esse intuito, trago à consideração um fragmento de caso, que pode ser denominado o traço do caso, ou seja, o sinthoma que vem orientando e fundamentando a realidade psíquica dessa criança. Cabe lembrar que o registro do caso que se faz aqui acolheu as contribuições de sua discussão com as psicanalistas Tânia Ferreira e Sílvia Bleichman.

 

O APELO MATERNO

Indicada por seu analista, uma mãe solicita atendimento por não estar conseguindo gostar da filha, um bebê de 3 meses. Transtornada pelo fato de a filha não estar crescendo, segundo informou a pediatra, com a filha em seu colo (de frente para mim e de costas para ela), Cátia diz que Lia chora sem parar: <<grita indefinidamente, até os vizinhos vêm saber o que se passa: nada a faz parar>>.

Coloco Lia em meu colo porque eu tinha a impressão de que a mãe estava me entregando a filha. Deixei-a tomar-me neste lugar de acolhimento para situar sua lógica.

Perguntei a Lia: <<é mesmo, você tem chorado muito? O que te faz sofrer tanto?>>

Olhando a filha fixamente, Cátia começa a demonstrar, representando avidamente, o choro da filha. Efetivamente este ato desencadeia o choro de Lia.

<<Ah, eu digo, sua mãe te faz chorar!>> Neste momento, por considerar o ato de Cátia uma provocação do choro na filha, passo a embalar Lia em meus braços, convicta de que era possível que Lia parasse de chorar. Ficara evidente que o agente de cuidados maternantes não podia conter a criança, mas, ao contrário, provocava-lhe mal-estar. Após um breve ninar, o bebê entrega-se ao sono e assim permanece o resto da sessão.

Com o bebê dormindo em meu colo, convoco Cátia a falar de sua angústia. Ela relata mais ou menos o que se segue:

Cátia supunha não poder ter filhos segundo sempre lhe havia sido dito pelos médicos, até que apareceu grávida. Constatouse que ela teria tido mononucleose na gravidez, e por isso havia um risco de graves problemas na criança. Muitos exames foram feitos até que esse risco ficasse afastado, já com mais de um mês após o nascimento. <<Tenho medo de que não gostem da Lia. Por isso não quero que ela seja mimada, não quero que faça birras na rua, porque isso afasta as pessoas dela. Eu não quero que ela fique só no colo, mas ela é muito exigente, só quer ficar no colo, e é preciso ficar em movimento, senão ela reclama. Não estou conseguindo gostar dela. Os filhos de meus amigos são calmos, dormem tranqüilos, e ninguém suporta a Lia. Minha mãe e minha sogra ainda reclamam que a culpa é minha, que ela é inocente, precisa de colo. Ontem ela me deixou tão nervosa, que até enfiei uma fralda na boca dela para abafar um pouco o choro. Eu estava do lado da minha mãe, que ficou muito brava comigo. Não fiz por mal, só que não agüentei.>>

Com uma sugestão interrogativa eu ensaiei dizer-lhe que ela contava com o choro da filha, como se estivesse sempre a prever e a esperálo: <<Por que esperar que ela chore? Seria melhor antecipar-se a este momento de angústia, brincando com ela até saturá-la por sono>>.

Cátia conta que o marido está trabalhando e estudando, mas que a ajuda nos finais de semana. Segundo ela, o marido tem sido muito acolhedor, mas fica muito cansado. As dificuldades com Lia têm impedido que o casal tenha seu próprio tempo.

Tentei, também, desestabilizar o lugar em que ela localizava as avós de Lia, esperando que Cátia pudesse deslocar seu mal-estar diante delas: <<Talvez também seja o caso de dividir um pouco mais seu querer com o saber das avós. Deixe a Lia um pouco com elas, para você mesma se preservar. Passeie um pouco com seu marido. Assim, ao estar com ela, talvez tenha mais prazer>>.

Interessa notar que nesse momento o efeito dessas duas intervenções sugestivas sobre a mãe me permitia constatar duas perspectivas distintas: (1) A constatação de que havia feito sugestões e a expectativa de que mesmo neste estatuto elas pudessem fazer função interventiva. Ainda que tivesse dúvidas sobre a eficácia das sugestões para deslocar a posição materna, parecia-me urgente apaziguar a mãe, o que não permitia aguardar por uma intervenção própria. (2) O efeito das intervenções sugestivas sobre Cátia evidenciou posteriormente uma função de deslocamento: ela não sabia o que era brincar com a filha, perguntando sobre onde eu havia conseguido aqueles brinquedos e mostrando-se aliviada por alguém lhe ter franqueado, novamente, o lugar de mulher.

 

O RETORNO

Cátia diz que a filha melhorou muito, diminuiu o choro e mudou a hora em que chorava. Queixa-se de que a filha está desconfiada dela, porque percebe na menina um olhar de desconfiança. Entretanto, num momento de choro intenso, no dia anterior, Cátia xingou-a de todos os nomes e chegou a ameaçá-la de darlhe um vidro inteiro de Novalgina. Os pais dela ficaram revoltados e ameaçaram tomar-lhe a filha.

Segue-se o diálogo: <<assim você está dando as razões aos seus pais para tomarem Lia>>. Cátia responde: <<eu só faço isso se minha mãe está do meu lado>>. E eu concluo: <<ah, o que você faz é dirigido a sua mãe, não a sua filha. Você ataca sua filha para que sua mãe te contenha>>.

Lia passa toda a sessão sentada no bebê-confort, aceitando os brinquedos que lhe são oferecidos. Cátia admira-se com o modo pelo qual é possível tornar os objetos interessantes para a filha, brincando com o ritmo e os movimentos deles em interação com Lia.

Apesar da inespecificidade dos objetos – fantoche de pano, boneco articulado de madeira –, Cátia pergunta sobre onde poderia obtê-los. Se assim ela evidencia não ter se dado conta de que trata-se do brincar, e não do brinquedo, ela deixa também efetivada a impressão de que algo barra a interação entre o seu corpo e o da filha. O olhar lateral da criança (o rosto muitas vezes virado para outra direção que não a materna, mas o olho a procura) denuncia um não oferecimento pleno do bebê para a mãe. Entretanto, Cátia é capaz de fazer a leitura de que há uma distância entre ela e a filha, ao dizer que Lia desconfia dela.

Digo a Cátia que sua vontade de educar tinha precipitado a idéia de que a filha teria condições de suportar e compreender tão precocemente esta intenção materna. Afirmo- lhe categoricamente: <<tente refazer esse laço de confiança com o bebê e adie um pouco o desejo de educar Lia! É preciso que Lia possa contar com você em vez de temer você!>>

O traço do caso: Não pode ter filhos, não pode chorar, chupar o dedo...

A demarcação do traço do caso parece ter sido configurada no terceiro encontro. A mãe relata que a filha está muito melhor, chorando muito menos e que ela resolveu cuidar- se mais como mulher. Lia aceita e se diverte com os brinquedos que, desta vez, são oferecidos a ela por meio de sua mãe, e sorri algumas vezes para a mãe. Cátia descobre futuros dentes que talvez justifiquem momentos de choro por meio de sorrisos que Lia lhe dedica. A filha voltou a crescer, lembra Cátia.

Um fantoche de pano é alvo da maior atenção de Lia. Apertando-o por dentro, uma língua desenrolase e chega a tocar o rosto da Lia.

A mãe antecipa: <<Lia está tentando colocar o dedo na boca toda hora. Não tenho deixado, eu li que não pode deixar, mas as tentativas de substituição por um bico não são muito positivas, pois ela retorna ao dedo>>.

Nesse momento, Lia consegue a preensão do tecido do fantoche e o traz até sua boca. Gesticulando a mão negativamente, Cátia diz carinhosamente: <<não vai pôr o dedo na boca, não, viu, sua espertinha!?>>

Lia vira seu rosto, mantém seguro o tecido do boneco e o conduz até a boca. Desvia a boca do tecido e chupa seu polegar. A mãe diz: <<acha que eu não estou vendo, né? você está escondendo de mim para chupar o dedo né?>>

Eu acrescento que é natural a criança buscar seu dedo, mas que seria interessante substituir o dedo por algo que faça uma mediação entre a mão e a boca: um brinquedo, uma chupeta, um pano, um mordedor. Cátia relata estar seguindo um livro que é um manual de procedimentos que já existe para mães. Nele haveria todas as informações sobre o que as mães devem fazer com os bebês. Eu digo: <<se primeiro conhecer mais sua filha, cada vez menos precisará de um manual, pois as crianças são diferentes>>.

Toda a conversa relativa a esse assunto conta com a repetição de uma série de movimentos da criança, sempre alternados aos movimentos e palavras da mãe: Cátia oferece um objeto a Lia descrevendo alguma característica dele. Lia pega o objeto que a mãe lhe oferece. Lia movimenta o braço mantendo o objeto preso. Cátia lembra-lhe com expressões variadas: <<vê se não coloca ele na boca, viu; ah, não, outra vez na boca?; na boca num pode; cê qué ficá dentuça?>> Lia aproxima o objeto de sua boca. Cátia continua falando e modificando a expressão de seu rosto, de um modo menos carinhoso: <<não, filha, não é de colocar na boca, será que cê vai fazer outra vez?>> Lia vira o rosto, afastando- se do olhar da mãe, e enfia o dedo na boca, ainda com o objeto preso a sua mão. Podemos chamar este movimento de: desviar-se do olhar da mãe para chupar o dedo.

 

MÃE-NÃO! FILHA-PODE!

Há articulações nas quais é possível verificar que a criança situa-se no campo da linguagem. Numa delas, a criança efetua um transitivismo: a mãe representa o choro, e Lia desencadeia o choro. Neste caso, a criança demonstra que o choro faz interface entre o registro materno e seu próprio registro, que o choro faz a continuidade entre as duas. Em outra oportunidade, a criança também demonstra poder afetar-se pelos efeitos da presença do outro: a analista a embala para que durma, e ela responde, dormindo.

A hipótese é que o movimento pulsional de Lia foi estabelecido pelo fato de sua mãe, a despeito de recusar-se, ter suposto ali um sujeito, no caso, mimado. E, pelo fato de haver uma rede simbólica já em jogo, pode-se supor que o bebê é ativo em seu gesto.

Chupar o dedo tem a mesma função simbólica do choro: Lia manifesta-se onde, para a mãe, não pode, e, ao mesmo tempo, o choro e o chupar o dedo têm função de convocar a mãe. O que não-pode é o lugar de apelo à mãe.

Entre filha e mãe, Cátia esclarece que havia uma prescrição do saber médico que ela tomava como verdade: não pode ter filhos. Sobre esta negação, a filha Cátia opôs-se à prescrição, operando uma pontuação: não, pode ter filhos! ou pode ser mãe. Cátia põe-se como mãe a partir da denegação.

Interessa notar que Lia também comparece no lugar daquilo que não pode. E neste movimento repete-se algo mais: o laço de Cátia com sua própria mãe. Cátia queixa-se de ter sido muito mimada, de não ter tido limites e de ter sofrido muito por causa disso.

Mas ela continua sem limite e sem saber os limites de sua pedagogia materna com sua filha. Não pode evitar que alguém lhe mostre o limite que não sabe localizar. Não pode evitar a presença da mãe para evitar a passagem ao ato, a prescrição do manual de procedimentos ou a sugestão do saber especializado. Há uma reverberação sistemática sobre o que faz, que era tido como impossível. Mas não sem patologia.

Para isso, Cátia funciona sobre o ou exclusivo da lógica. Ou mãe, ou filha. Ao atacar sua filha diante de sua mãe, reduz-se à filha que é. É como aplicadora do saber do livro, ou seja, como aluna, que pode fazer o papel de mãe. Foi, talvez, na transferência que se deu a incidência sugestiva da analista, que compareceu ao sugerir que as avós fizessem função materna e enquanto isso ela poderia ser mulher: se isso lhe permitiu a possibilidade de ser por vezes mãe, por vezes filha, mãe e filha também comparecem sob instrução.

Afinal, é Cátia quem recusa por meio da filha aquilo que ela considera como a via da orientação das avós, que sempre circulam na posição denegativa, apontando a todo momento a incompetência materna. Sim, Cátia é todo o tempo remetida ao fato de ser filha e de não ser mãe.

 

ALGUMAS CONSIDERAÇÕES PARCIAIS

A necessidade de escrever este trabalho surgiu a propósito do equívoco de uma suposta certeza da observação da analista. A despeito de seus 3 meses de vida, uma criança teria se mostrado capaz de trapacear com sua mãe. Tratava-se do fato de que, diante da imposição materna, repetida, de que não chupasse o dedo, a criança buscava um fantoche com a mão e servia-se de seu tecido para esconder sua mão e assim sugar seu polegar. Esta cena parecia permitir testemunhar a intencionalidade da criança, configurando assim a trapaça. A cena que propiciava esta certeza era tão nítida, que, ainda, permitia reafirmar a convicção freudiana de que a observação de crianças nos conduz a equívocos e mal-entendidos. Afinal, neste caso, a cena produz um trompe- l’oeil suficiente para que possamos edificar sobre ele uma verdade: a convicção da vidente produziu o visto. No caso, talvez o que tenha sido flagrado foi a convicção materna, tão intensa, que foi suficiente para produzir uma filha fora da lei materna: ao não pode chupar o dedo, Lia responderia com o dedo sendo sugado, escondido sob o véu de um tecido. Desviar-se do olhar da mãe para sugar o polegar foi, na medida em que havia uma articulação de dois jogos (o do fantoche e o do sugar), lido como o uso de um tecido pela criança para escon der o jogo de sugar o polegar. Mas, mais ainda, esta convicção pôde ser até mesmo testemunhada por um terceiro!

Mas por que essa cena foi capaz de produzir tamanha convicção? Talvez seja por ter sido o que houve de mais propriamente subjetivo no caso: o sujeito do inconsciente de Cátia visto em Lia. O traço da mãe, explicitado por ela, em sua filha.

Enfim, a escrita do caso mostrou sua pertinência para permitir retomar o equívoco e ainda mapear outras questões.

É necessário que o bebê compareça quando ele ou não é significado, ou é significado fixamente pela mãe a ponto de que sua presença seja necessária. O bebê é um signo material que precisa que a linguagem incida nele, circule em torno dele, dando- lhe posições e vizinhanças diversas até que daí se destaque um sujeito.

No caso em questão, trata-se de perturbar a certeza de Cátia de que a filha a recusa, operando uma retificação subjetiva por meio da qual ser mãe seja possível. Por isso, a perturbação das supostas certezas de Cátia tem lugar privilegiado. Há que se destacar outra vertente na qual Lia comparece.

Para que essa operação clínica seja possível, é necessário, ainda, situar a medida certa da sugestão (da qual, agora Cátia não pode prescindir), sem se limitar a ela. Isto porque, caso o analista mantenha-se na prática da sugestão, além de reproduzir a prescrição que tanto impede Cátia de ser a mãe, ele mantém uma mestria que configura uma resistência à clínica, e, mais ainda, produz e reproduz a angústia, pois diante da norma os sujeitos (mãe ou filha) só se manifestam por oposição e, portanto, por resistência.

Cabe ainda dizer das dificuldades que ainda vêm sendo formuladas sobre o método nessa clínica. Este trabalho é uma tentativa de manter as interrogações e o mapeamento diferencial do que nela se configura.

 

 

Endereço para correspondência
Angela Vorcaro
angelavorcaro@uol.com.br

Recebido em março/2004
Aceito em junho/2004

 

 

NOTA

I Psicanalista e professora da PUC-MG

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