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Estilos da Clinica

versão impressa ISSN 1415-7128versão On-line ISSN 1981-1624

Estilos clin. v.10 n.19 São Paulo dez. 2005

 

EDITORIAL

 

Um dossiê sobre Acompanhamento Terapêutico (A.T.) na revista Estilos da Clínica... Importante ressaltar a pertinência dessa proposta, visto que essa clínica está em franca ascensão, pois o A.T. já não é uma novidade no campo das práticas psi, tampouco na história das políticas de saúde mental no Brasil e em outros países do mundo.

Sabe-se também da necessidade de produzir reflexões teóricas que possam incrementar o debate sobre toda e qualquer práxis do campo da clínica, o que então justifica ainda mais a execução desse dossiê, cujos textos testemunham o caráter de construção de seu campo científico*. Escrever é colocar à prova uma práxis, interrogar a sua ignorância e o que segue é uma tessitura entre um fazer clínico e suas articulações teóricas com autores como Jacques Lacan, Winnicott, Michel Foucault, Deleuze e Guatarri, Anzieu, entre outros.

Além disso, a oportunidade ofertada àqueles que trabalham no corpo-a-corpo com essa clínica para compor o presente dossiê é cara, e foi feito de modo cuidadoso, uma vez que a qualidade dos artigos presentes atesta o valor desse espaço cedido para a já citada constituição de seu campo científico.

O dossiê se inicia com o artigo de Gabriel Omar Pulice e Federico Manson. Os autores, de origem argentina, resgatam aspectos históricos do surgimento do A.T., para discutir a não inclusão da figura desse profissional nas leis de saúde pública e as conseqüências éticas, clínicas e políticas. Concluem afirmando que a formação acadêmica do acompanhante terapêutico de nível superior é um passo capital para as conquistas políticas de reconhecimento de sua atuação profissional no campo da saúde mental.

Analice de Lima Palombini, Károl Veiga Cabral e Márcio Mariath Belloc promovem urdidura, trama e poesia. Apontam algumas tendências de teorização do campo científico do acompanhamento terapêutico, desde o pensamento de Lacan, Winnicott, Foucault, Deleuze e Guatarri. Posteriormente, retratam a potência da cidade para discutir a possibilidade de superação do enquadre da transferência e assim atrelar o A.T. como analisador da clínica e de seus operadores conceituais.

Andréa Máris Campos Guerra e Andréa Franco Milagres pontuam questões históricas do A.T. e a sua inserção em Minas Gerais, ao localizá-lo como território entre a reforma psiquiátrica e a psicanálise. Incluem a dimensão simbólica no debate da inclusão social e por fim apresentam uma hipótese teórica oriunda do pensamento de Lacan para o acompanhante terapêutico manejar a transferência.

Há também o artigo de Fábio Araújo, em que o debate histórico acerca da mudança de nome de amigo qualificado para acompanhante terapêutico se faz presente. Não por acaso, uma vez que o autor, ao retomar essa discussão a partir de pensadores como Foucault, Deleuze e Guatarri, aponta para o seguinte fato: o argumento clínico que enfatiza o terapêutico relegou para o segundo plano o aspecto político do A.T. Para concluir, propõe o resgate político dessa clínica, ao sugerir a política da amizade como elo indissociável entre política e clínica.

Georgette Ribot relata uma experiência oriunda da França, ao retratar a ida de um grupo de adolescentes marcados pela vivência da delinqüência ao Deserto do Saara. Trata-se de um projeto educacional de Proteção Judiciária da Juventude do Departamento de Justiça da França. Calcada no pensamento de Anzieu, a autora aponta o percurso de adolescentes no deserto como uma possibilidade de resgate de uma subjetividade que fora marcada pelo rompimento dos laços sociais com os adultos.

Beatriz Helena Martins de Almeida coloca a teoria psicanalítica lacaniana a serviço da idealização de um projeto de tratamento em um caso de paranóia atendido em A.T. A hipótese teórica para esse caso consistiu em manejar a transferência no momento de crise, em direção à estabilização, ao sustentar a identificação às insígnias paternas como suporte para que a paciente se localize no laço social.

Por fim, Maurício Castejón Hermann articula a noção de olhar em rede com a clínica do A.T., ao propor que esse último permite a instalação do dispositivo clínico, a sustentação dos significantes na transferência e a construção do sinthome. Localiza estas dimensões do fazer clínico a partir da noção de real na psicose, trabalhada em momentos distintos do ensino de Lacan e propõe o eixo que o orienta em suas investigações, no caso, a hipótese de que a clínica do A.T. tem consigo algo de analítico.

E, em tempo, retoma-se a pertinência desse dossiê na Revista Estilos da Clínica para fomentar o debate desse fazer clínico inclusive porque, em setembro de 2006, ocorrerá o I Congresso Internacional, II Congresso Ibero-americano e I Congresso Brasileiro de Acompanhamento Terapêutico, na cidade de São Paulo.

Maurício Castejón Hermann

Responsável pela organização deste dossiê,
membro da equipe de A.T.s do Lugar de Vida.

 

 

* As atividades de AT no Lugar de Vida integram uma pesquisa financiada pela FAPESP e pelo CNPq.

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