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Estilos da Clinica

versão impressa ISSN 1415-7128versão On-line ISSN 1981-1624

Estilos clin. v.12 n.22 São Paulo jun. 2007

 

DOSSIÊ

 

A adolescência e a "metabolização" sonhada do saber

 

Adolescence and knowledge metabolisation

 

Adolescencia y metabolización del saber

 

 

Nicole ClerkI,II, *; Viviane Veras (Trad.)

I Institut Universitaire de Formation des Maîtres (IUFM de Versalhes)
II Equipe Savoirs et rapport au savoir da Universidade de Paris 10, Nanterre, França.

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Como o eu íntimo de um adolescente se estrutura para acolher o saber? A partir da análise clínica das reações e posturas de jovens em dificuldades com a aprendizagem, podemos mostrar que, para alguns deles, os problemas emocionais causados pela aprendizagem levam-nos a um retorno inconsciente a um “si físico”, que comprova sua capacidade de “aprender por meio do corpo” e de situar-se no mundo. Retomamos, em seguida, as fontes antropológicas e freudianas dos conceitos de “incorpora- ção” e de “introjeção”, para melhor compreender o esquecimento e a perda sugerida pela “incontinência” dos saberes. Enfim, estudamos a relação entre sua incapacidade de “digerir” o saber e seu profundo desejo de que os adultos “mastiguem” esse saber por eles; relação que nomeio “metabolização sonhada ”, para fazer eco aos trabalhos de Bion.

Palavras-chave: Incorporação, Relação ao saber, Relação ao corpo.


ABSTRACT

A clinical research explores the relation to knowledge and learning of low ability teenagers and their images and conception of academic learning. How is their intimate ego structured to apprehend knowledge and learning? The analysis of the behaviour of these young people when confronted to learning, shows that -for some of them-, learning causes emotional troubles that lead them to a form of unconscious withdrawal into a “physical” form of ego, showing their capacity to “learn through their bodies”. We then discuss the anthropological and Freudian views of the concept of “incorporation” and “introjection”. We then study the relationship between their incapability to “digest” knowledge and their deep expectation from the adults to “predigest ” knowledge for them; to describe this, referring to Bion, I use the expression “dreamed metabolisation ”.

Keywords: Incorporation, Relation to knowledge, Relation to the body.


RESUMEN

¿Como el yo íntimo de un adolescente estructurase para acoger el saber? A partir de una investigación clínica de las reacciones y posturas de jóvenes en dificultad con el aprender, podemos mostrar que los problemas emocionales causados por el aprendizaje conducen a los jóvenes a un retorno inconsciente hacia el “si físico” que posibilita aprender y situarse en el mundo gracias al cuerpo. Retomamos las fuentes antropológicas y freudianas de los conceptos de incorporación y de introyección, para comprender mejor el olvido y la pérdida propia de la incontinencia de los saberes. Finalmente, estudiamos la relación entre la incapacidad de digerir el saber y el profundo deseo de que los adultos mastiquen el saber para los jóvenes; relación que llamamos, parafraseando Bion, de metabolización soñada.

Palabras clave: Incorporación, Relación con el saber, Relación con el cuerpo.


 

 

O que acontece a cada um de nós quando se trata de aprender? O que acontece, mais especificamente, quando se trata de um adolescente? E quando somos educadores, docentes ou pais, somos suficientemente sensíveis às seduções e aos riscos subjetivamente percebidos pelo sujeito em situação de aprendiz?

Quero retornar à idéia fundamental de que, para cada um de nós, aprender é uma “aventura íntima” de cujo jogo nem sempre nos damos conta completamente. E quando se questionam os adolescentes que encontraram dificuldades pessoais, a necessidade de levar em conta essa problemática torna-se ainda mais evidente. Foi a partir de uma pesquisa clínica com adolescentes em dificuldade que me propus a explorar a questão maior: como um adolescente representa para si mesmo o acesso ao saber? As análises aqui propostas aplicam-se a adolescentes que encontram dificuldades, mas podemos supor que eles exprimem, afinal de contas, problem áticas ligadas à dificuldade, presente em todo adolescente, de descolar-se do adulto e de se “reconhecer ” como autor de seu ato de aprender.

A pesquisa sobre a qual se funda esta análise vai permitir-nos retomar a relação complexa que o jovem constrói com o adulto. Buscaremos compreender precisamente as estratégias intercorporais que ancoram as relações intersubjetivas entre adultos e adolescentes, mas também entre adolescentes. A exploração da relação com o saber a partir de sua relação com o corpo vai nos conduzir, finalmente, a interrogar a necessidade de segurança afetiva necessá- ria ao aprender; a reconsiderar o conceito de “incorporação” como uma mise en abyme1 do objeto faltoso, mas também de uma perda fundamental: a da crença em sua capacidade continente. Isso nos levará a denunciar a ilusão na qual o adolescente corre o risco de perder-se imaginando, na falta de desejo, um saber que o adulto poderia infinitamente pôr a seu alcance, impedindo-o então de encontrar em si mesmo a força para transformar o mundo. É isso que vou chamar de “a metabolização sonhada”.

 

Uma associação pessoal: “engula sua vergonha e acomode-se”

Enquanto participava como co-organizadora de um colóquio nacional em Paris, recolhi-me à minha sala para preparar um evento de síntese que devia co-dirigir e que reunia os participantes de um ateliê sobre a análise de prática reflexiva. Mergulhada em minhas notas e completamente desligada, esqueço de verificar a hora do início da sessão e chego finalmente à sala com cerca de meia hora de atraso. Minha colega de mesa acolhe-me sorrindo e me diz discretamente “engula sua vergonha e acomode-se”. Retornando a posteriori às entrevistas clínicas que orientei no decorrer da pesquisa que veio-me ao espírito esse instante particular; instante em que nada havia aparecido de meu desapontamento, mas que ressurgiu no momento em que voltei à entrevista de Xavier.2

“Engolir” não é de modo algum degustar, mas ingerir, fazer penetrar em si, impelido mais pela necessidade do que pelo desejo. Uma ingestão nada fácil, uma vez que ela se impõe, e uma vez também que o objeto saber é tão pouco reconhecido como pró- prio que dele não se falará.

A “vergonha” de que se trata é relativa a isso que se gostaria de esquecer e que poderia bem nos torturar fazendo-se penetrar em nós e instalar-se.

E em seguida, com esse incitamento à ação que parece dizer “enfie-se rápido no trabalho”, percebemos uma injunção a um tipo de “dissimulação” que tomaria a forma de uma “assimilação”. A mistura desse mau objeto com o que já se tem em si: as idéias, as emoções, os projetos, os desejos, parece ao mesmo tempo incontornável e fácil.

Como preparamos nosso eu íntimo para acolher o que foi valorizado positivamente ou negativamente pelo outro, no exterior? Que energia psíquica é necessária para poder imaginar-se suficientemente próprio, suficientemente acolhedor, suficientemente tolerante? É com a sugestão interpretativa primeira, que proponho apresentar a seguir o objeto de minha pesquisa e as resoluções e atitudes dos adolescentes: o passado de dificuldades – sejam elas escolares, familiares, relacionais – ficaria marcado na confiança de um adolescente que, para crescer e apreender o mundo deve, justamente, afrontar a angústia da perda da segurança afetiva. Como o adolescente vai se livrar dessa marca?

 

O contexto da pesquisa clínica de inspiração psicanalítica, um “acontecimento”

Pertenço a uma equipe de pesquisa3 cujo trabalho é orientado para a problemática “saberes e relação ao saber”. Foi com a iniciativa de Françoise Hatchuel (2005) que nosso laboratório respondeu à solicitação da Association de Sauvegarde de l’Enfance et de l’Adolescence des Yvelines (ASEAY), que acolhe adolescentes em dificuldades. O ITES 4 era uma estrutura que desejava levar seu pessoal – ele mesmo em dificuldade profissional – a enriquecer-se com análises universitárias fundamentais para o grupo posicionarse melhor na relação a manter com o público particular que ele acolhe. Foi em dezembro de 2005 que nosso primeiro relatório de pesquisa chegou a um resultado e prestou contas de análises clínicas de 13 jovens rapazes entrevistados.5

Nosso procedimento de pesquisa inscreve-se em uma orienta ção clínica de inspiração psicanalítica que leva em conta ao mesmo tempo a complexidade da situação e a subjetividade do sujeito, e responde – como defende enfaticamente Claudine Blanchard- Laville (1999) – a uma dupla exigência: a de interessar-se pelos sujeitos, respeitados em sua história singular, e, concomitantemente, por um conjunto de condutas que permitem enunciar princípios suficientemente amplos e comentários.

A partir do momento em que escolhemos trabalhar com entrevistas não fechadas, sabemos que o material verbal não será fácil de recolher. Esses jovens são sensíveis ao olhar do outro e não estão particularmente ansiosos para falar de seu modo de aprender; um modo que poderia convocar as dificuldades – especialmente escolares – que tenham encontrado.

Esses jovens que se manifestaram sobre a relação que entretinham com a aprendizagem em geral eram todos rapazes, porque o instituto com internato não acolhia garotas. Eles concordaram em falar conosco depois de um encontro em uma jornada no centro em que estão acolhidos. Sua participação foi voluntá- ria e a organização das entrevistas foi feita em colaboração com o setor pessoal e administrativo do centro. As entrevistas não fechadas foram realizadas em um espaço previsto para esse efeito e em um tempo não definido a priori. Os dados analisados levaram em conta o que foi ativado pela situação e elaborado na interação original do entrevistador com o entrevistado. Desse modo, deixamos lugar, em nosso procedimento, tanto para o inesperado quando para a incerteza.

Nosso método de análise foi construído em dois tempos. Cada entrevista foi transcrita e, depois, analisada em sua dinâmica própria para a pessoa implicada na entrevista, que foi levada a debruçar-se sobre a dinâmica transferencial e contratransferencial engajada na interação. Cada um de nós escolheu um eixo temático.

Dois postulados de base serviram- nos de guia. O primeiro estabelecia que o tipo de ligação entre o pesquisador e o jovem prefiguraria a relação que ele constrói com o adulto. O segundo apoiava-se na convicção de que as atitudes e reações às instruções referentes ao ato de aprender dariam sentido à sua relação ao saber.

Antes de desenvolver a essência mesma da temática da relação ao corpo na qual estou interessada, talvez não seja banal sublinhar que as pesquisas clínicas de inspiração psicanal ítica que têm por objeto a relação com o corpo em ligação com o aprender não fazem sucesso na França. As obras de Claude Pujade Renaud, reeditadas recentemente (2005), mas também os trabalhos de Philippe Chaussecourte (2003) felizmente nos lembram de como temos a ganhar com a “escuta” do que dizem os corpos. E é exatamente a sensibilidade clínica que me parece a mais apropriada para desalojar as significa ções inconscientes das relações interpessoais, interrogando também a intercorporeidade. De fato, como lembra Florence Giust-Desprairies (2004), é ao corte epistemológico operado por Freud entre o olhar e a escuta que a clínica deve sua especificidade. Falarei, quanto a mim, de “intercorporeidade imersa” para defender esse contexto particular que serve de continente e permite a Florence Giust-Desprairies (2006, p.168) afirmar que “o dispositivo de pesquisa fala e, por si mesmo, produz significações que servem para compreender e orientar a inteligibilidade dos conteúdos”.

Nessa pesquisa, o procedimento clínico que escolhemos para levar a compreender o público de adolescentes em dificuldades convoca questionamentos particulares. De fato, por que os jovens aceitam encontrar pesquisadores e pesquisadoras que não são chamados a rever? Essas pessoas cujo estatuto e papéis são desconhecidos para eles, em todo caso, incitam suficientemente sua curiosidade para afrontar a estranheza da situa- ção. Nossa equipe pôde sinalizar as tensões e contradições essenciais para o trabalho: ao mesmo tempo em que “aceitam” a situação da entrevista, estão também na negação, na recusa e, talvez, na fuga ou na resistência; ao mesmo tempo em que se deslocam para falar conosco, seu discurso apresenta- se como desigualmente importante, como se eles não tivessem nada a dizer; ao mesmo tempo em que vêm nos falar, esperam do pesquisador uma atitude próxima da atitude que eles construíram do adulto, isto é, o adulto que faz uma pergunta cuja resposta já conhece. Finalmente, esse adulto realmente “não sabedor”, que é o pesquisador ou a pesquisadora que o acolhe, daria acesso a um lugar estranho, desconhecido, instaurando um tipo de relação adulto-jovem tão deslocada que poderia representar para eles uma realidade psíquica inconceb ível e, psiquicamente, difícil de suportar. Aliás, um deles, escutando nossas instruções iniciais: “será que você poderia me contar, bem à vontade, de que modo... como é que isso se passa com você, quando você aprende?”, parece jogar na cara de sua interlocutora uma tolice que não faria o papel de uma demanda orientada na direção de um saber que já está no espírito de seu interlocutor: “ah! essa sua questão aí não ajuda não!”. Sendo assim, de que pontos de refer ência o adolescente poderia valer-se para se situar de modo não tão doloroso no mundo dos adultos? Pude compreender, a partir das reações e posturas dos adolescentes, que era em um retorno à ancoragem corporal que sua estabilidade emocional pareceria poder edificar-se.

 

1. Uma intercorporeidade fundadora

A comprovação de nosso primeiro postulado foi claramente posta em evidência. A relação em que eles se empenharam com os diferentes membros da equipe permitiu dar sentido à relação que eles construíssem com o adulto.

1.1 O “corpo a corpo” da relação com o adulto

Foi nesse lento trabalho de elaboração pessoal – enriquecido com as associações partilhadas no seio da equipe entre o que observamos, vivemos, percebemos e entendemos – que a relação ao corpo me pareceu central. Além dos conteúdos manifestos dos discursos, foram certamente minhas próprias associações e minha sensibilidade pessoal a isso que diz respeito à relação corporal (Clerc, 2006) que fizeram o trabalho de articulação e de concepção mais teórica.

Testemunhamos muito rapidamente de que modo os jovens com quem nos encontrávamos mostravam certa perícia no “corpo a corpo” dos encontros. Eles não pareciam despreparados para o confronto com o adulto e pareciam mais hábeis para se adaptarem à situação pouco comum para a qual nós os havíamos convidado. Se admitimos que seus corpos são a primeira ferramenta para aprender, compreender e investir o mundo, esses jovens não estão manifestamente em dificuldade para reagir.

Já por ocasião de nosso primeiro encontro, eles souberam nos tocar (Le Breton, 2004). Por exemplo, provocando-nos quanto às particularidades físicas de alguns de nós, colocando-nos então, nós também, na posição de observados, de julgados. Eles tinham mostrado também muito talento nas extravagâncias e deboches, talvez para nos convidar a permanecermos em nossos lugares. Pelo tipo de laços que instauraram jogando com a indiferença, a arrogância, a zombaria, a sedução, as fugas ou as intrusões revelava-se que haviam aprendido como criar a incerteza e o mal-estar no outro. Sem dúvida, eles o faziam ainda com mais facilidade, na medida em que conheciam tais efeitos. Caso se mantenha a hipótese da marca afetiva que faz com que se sintam duplamente diferentes – diferentes de outros adolescentes que não estão no centro; ou, mais fundamentalmente ainda, diferentes dos adultos com os quais, todavia, querem se parecer – o corpo a corpo no qual se empenham permite-lhes provar que, mesmo sendo diferentes, eles são fortes e, ao mesmo tempo, sua esperteza poderia assegurá- los de seu poder de domínio sobre o outro. Eles se mostram, graças a nossa presença no centro, os “mais” fortes.

1.2 A ligação emocional

Tudo se passaria como se o estranhamento que eles parecem sentir entre nossos dois mundos pudesse tornar-se mais suportável com a instala ção de “emoções de proximidade ” (Tisseron, 2005) que fariam com que vivessem essa ilusão de fusão, espaço de serenidade entre a mãe e o bebê. Mas será que a emoção assim partilhada apaziguaria desse modo o sentimento de diferença negativa que eles poderiam sentir? Acompanhando especialmente os trabalhos de Philippe Jeammet (2002), compreendemos bem que, para os adolescentes, o sentimento de prazer partilhado está próximo demais do medo da dependência para que não se sintam, também, atacados em sua integridade. A análise precisa do comportamento desses adolescentes mostra muito claramente a função essencial de comunicação de emoções que, acompanhada de estratégias alternativas de aproximação e distanciamento dos adultos, deixam entrever sua desconfiança.

Desse modo, podemos compreender as encenações psíquicas que descobrimos durante o tempo de ratificação da maior parte de nossas entrevistas. As encenações corporais eram diferentes para cada um: a tentativa de adormecer, de Mouloud6, a debilidade súbita de Khaled e Vincent, a postura excessivamente relaxada de Vincent e particularmente voluntariosa de Xavier. Evocando o que era para eles o ato de aprender, observamos posta em cena a diversidade de emoções que percorre uma experiência de aprendizagem.

Podemos levantar a hipótese de que seria mais fácil para eles encenar seu modo de aprender do que encontrar as palavras para dizê-lo, como pudemos descobrir desde o início das entrevistas. Nosso teste, com efeito, revelou-se bastante surpreendente para eles. Suas respostas foram muito curtas, freqüentemente fechadas, acompanhadas de atitudes de defesa, levando-os a expressar banalidades ou a tentar produzir as “respostas ” esperadas. Eles não estavam evidentemente em condições de desenvolver um discurso construído que lhes pertencesse, ainda mais que não possuíam o vocabulário próprio. Finalmente, o que descrevia o domí- nio da interioridade estava seja pouco investido, seja estabelecido com a ajuda de termos fortes, como se o que se passava em sua interioridade não fosse concebível. O modo de comunicação que passa pelo corpo seria então evidentemente mais leve para esses adolescentes.

1.3 O corpo aprendiz

Esse modo de comunicação seria ainda mais consolidado na medida em que parecia que a dinâmica da entrevista permitia-lhes, ao mesmo tempo em que evocavam sua experi ência de aprendizagem, elaborar sua capacidade de aprender com seus corpos. Defendo a idéia de que a abordagem clínica tem a capacidade – pelo fato de pôr em palavras e encenar com o corpo – de produzir um desenvolvimento elaborado; e levanto a hipótese de que, se esses jovens aceitaram falar com nossa equipe de trabalho, foi em parte para darem a si mesmos a oportunidade de se compreenderem de outro modo, simplesmente testando outro adulto.

Na falta de confiança suficiente em sua capacidade de expor um pensamento, eles se voltariam para seus corpos. Isso é tranqüilizador, porque podemos mostrar aos outros que o corpo, o deles em particular, pode aprender sem ter que convocar seu mundo interno.

De fato, a maior parte diz que se apóia essencialmente na ação para aceder ao saber-fazer [savoir-faire]. Eles testemunham, quando os convidamos a ultrapassar a primeira representa ção ligada às aprendizagens escolares, o saber-fazer que seria para eles um saber vindo deles mesmos, os “saberes da vida”, que podem mostrar aos outros. Hocine reconhece neles uma simplicidade tal que as palavras não são úteis para falar deles. De modo geral, é a imitação que é exibida “olhamos as pessoas e aprendemos ”, diz Vincent. Para eles, o problema seria sentir-se legitimado por um saber que diria respeito ao que Michel Maffesoli identificaria como “saber comum”, feito especialmente de “pequenos rituais cotidianos (que) fortificam o sentimento de pertença, a impressão de fazer parte de uma comunidade” (Maffesoli, 2005, p.234). Foi Nicole Mosconi (1996) que analisou como os “objetos de saberes privados” são substituídos pouco a pouco por esses saberes comuns que têm um valor social e que mostram a força do poder poss ível da criança sobre o mundo. Os adolescentes significariam com isso que eles souberam fazer a ligação entre seu corpo próprio e o que se passa no exterior. E essa ligação entre o interior e o exterior mostra-nos bem – se necessário fosse – que devemos dissociar bem as dificuldades sociais e/ou escolares da deficiência mental. Porque é próprio da doença de ordem psiquiátrica encontrar-se na incapacidade de trocar com o exterior. E então podemos “escutar” as propostas dos adolescentes tomando por referência essa demanda de que sejam considerados “normais”.

Podemos supor, também, que em seguida desse canal de comunica ção mais fácil de convocar – os seus corpos – eles podem arriscar-se a testemunhar a instabilidade emocional da qual experimentam as perturba ções quando se trata de aprender. Eles chegam a explicar que mesmo se seus corpos podem apresentar fraquezas/ falhas, eles sabem aprender.

Com efeito, eles enviam a imagem de um corpo sensível e reativo à aprendizagem expondo, contudo a fragilidade da funcionalidade do corpo. Como traços de seu temor de ver seus corpos desampará-los também, evocam seus limites energéticos e emocionais. Desse modo, eles explicam que a aprendizagem faz despender uma energia e leva a uma fadiga com a qual Sébastien jogou. Esse gasto de energia é percebido por Xavier como necessário. Para os outros, o esforço é associado aos limites que não querem transpor. Sébastien faz compreender não que é demais fazer esse esforço, mas que é perigoso. De tanto abusar, Kévin acabou por luxar o calcanhar! Para Vincent, isso seria mais um sinal de fraqueza, e de uma fraqueza pessoal que ele não está a fim de mostrar.

Além disso, o corpo é descrito como um “corpo perturbado ”, quando ele é levado a incorporar um saber. O saber, ou aquilo que o representa, provoca, enfraquece o corpo, mas pode tamb ém apaziguá-lo. Alguns evocam um corpo impaciente. A poesia “enerva” Mouloud verdadeiramente! Para Mehdi, sem dúvida alguma, o que perturba mais é o trabalho. Para outros, o corpo mostra-se mais dócil “se é preciso aprender...” e se... se ao menos Gré- goire conseguisse se concentrar! Sébastien, enfim, sugere a imagem de um saber que acalma, quando ele chega a conservar tudo.

Apesar de toda a agitação, a transformação emocionalmente sentida mostra que o saber terá sido realmente incorporado, uma vez que a ele os adolescentes são sensíveis. Imaginando-se indivíduos capazes de traduzir corporalmente um saber, situam-se entre os outros e reconhecem-se como indivíduos singulares.

 

2. A incorporação, uma prova de continência

Já desde o início de meus encontros com esse adolescente que chamei de Xavier7 emergiu a ligação que ele dá a entender entre o aprender e o fato de guardar em “si” o que foi aprendido; gesto de apoio.

Xavier é um jovem rapaz esportivo, esbelto, aberto, interessado e sorridente. Ele se mostra desejoso de responder e de participar da entrevista e meneia a cabeça com um ar de quem está de acordo com a autorização para gravá-la. Xavier explica que, na vida, a aprendizagem é obrigatória, e que aceita submeter-se a ela voluntariamente. “Se é preciso aprender, se devo aprender, eu aprendo, sei lá!” ele diz. E diz também que gasta sua energia de acordo com a dificuldade da tarefa. “Muitas vezes, isso entra facilmente, é coisa simples, sei lá”. Quando a tarefa é mais difícil, ele explica: “eu aprendo, aprendo, eu releio, releio; eu tento... eu fixo as palavras mais importantes, releio, releio o máximo que posso”. Ele compara o trabalho da escola com o esporte: “no esporte, é mais fácil que no curso” porque “quando a gente faz esporte, a gente se sente bem”. O cansaço não lhe dá medo, porque ele sabe que em seguida desse esforço vem o relaxamento psíquico. Aliás, de acordo com ele, para aprender bem “é preciso baixar a tensão [...] estar bem solto”. E ele continua: “se eu pudesse ir mais longe eu iria mais longe, sei lá... é isso”. O objetivo que ele se propõe, mesmo sozinho, mesmo que ninguém o ajude, é chegar “à descoberta do mundo”. Sua linha da vida está traçada: “eu vou aprender em 100 anos se precisar aprender em 100 anos, vou aprender em 90 anos, e aprendo ainda, hem, se precisar, se eu viver”.

A ansiedade que ele revelar concerne à necessidade de “guardar ” o saber. É preciso que este “se armazene em sua cabeça”. “Porque no espaço de um segundo ele sai da minha cabeça”, afirma. Seu único temor é “que ele se vá” porque “se a gente não utiliza o que aprende, bem, ele se vai, sei lá, e depois...”. O saber não deve tornar a sair, seria necessário por uma tampa em cima para não deixá-lo escapar.

A análise da entrevista de Sébastien permitiu-me, em seguida, observar que a imagem de um “corpo continente” tinha pertinência para esses adolescentes. Para Sébastien, também, o que é difícil é “reter as coisas” a fim de que elas não partam. Apontando para sua cabeça ele diz: “é preciso que elas entrem aqui dentro!”

É essa imagem de “corpo continente”, associada à metáfora digestiva de “incorporar” o saber como um alimento no outro – outro que se enche ou se esvazia sem que se possa controlar o gasto, chegando até a temer a “incontinência” – que vou então tentar compreender melhor, guiada pela intuição de que essa imagem ajudaria a aceitar psiquicamente o acesso ao saber como uma aventura íntima aceitável, uma vez que ela retorna sobre esse “si psíquico” que pode mostrar-se experiente no encontro com o outro. É porque de início o aprender é concebido como um mecanismo familiar – uma vez que está ancorado corporalmente – que Xavier vai aceitar pôr em palavras o que é para ele aprender, e, portanto, aceitá-lo psiquicamente como um processo interno imagin ável.

2.1 A “incorporação”, etapa para a introjeção do objeto desejado...

A “incorporação” é rica em ensinamentos quando notamos os diferentes elementos explicativos que dizem respeito a essa no- ção e quando calculamos finalmente toda a sua complexidade.

Essa noção explica como o sujeito social se enriquece culturalmente. O corpo pode mostrar que se pode ter um lugar na sociedade. A partir dos trabalhos de Marcel Mauss (1950), que mostram o corpo como suporte de certa visão do mundo e reflexo de uma cultura, pesquisas se sucederam para descrever um corpo que se alimenta de representações e de práticas; tanto para significar identidades sociais [por exemplo, I. Boltanski (1971) e P. Bourdieu, (1980)] quanto culturais (por exemplo, M. Chebel, 1984). O corpo é, de agora em diante, apreendido em “todos os seus estados”, e a noção particularmente associada às experiências ligadas ao corpo (G. Boëtsch; D. Chevé, 2000) encontram-se em diferentes estudos antropológicos. Os trabalhos de Mariella Pandolfi (1998) têm defendido precisamente a idéia de uma “incorporação” como inscrição corporal de uma prática que participa de uma identificação coletiva e é dependente de contextos sociais. O corpo falaria, mesmo que não o quisesse. Xavier é um desportista que mostra em sua postura que tem confiança em seu corpo e em suas potencialidades. Aliás, a entrevista se encerra, por pressão dele, em função da hora de seu treino.

Xavier incorporou o saber-fazer de um jogador de basquete e a aceita ção do esforço que essa prática exige. Finalmente, para ele, jogar basquete é fácil. Se encararmos a incorpora ção como um processo que põe em jogo as aquisições, como vêm mostrando os trabalhos de Sylvia Faure (2000) voltados para as técnicas de dança, Apprendre par corps é ser capaz de adaptar saberes já incorporados a situações novas. O movimento parte do corpo, lugar de riquezas interiorizadas, para participar de um processo criativo que utiliza a experi- ência do sujeito para ser mais pertinente e eficaz. O corpo seria bem uma matriz de riquezas pessoais constru ídas pela experiência. E Xavier parece perceber bem o que tem interesse para ele quando compara o esfor ço físico e o esforço que concerne aos estudos para melhor explicar como aprende na escola. E talvez ele queira lembrar ao adulto que o escuta que seria bom não esquecer isso!

A exploração da noção direcionada a fontes psicanalíticas conduznos a entrever, a partir dos estudos de Freud, que a incorporação do objeto deveria ser, de início, fonte de prazer. Na sua teoria das pulsões conjugam- se duas atividades: sexuais e alimentares. O processo de incorpora ção visaria, in fine, ao fato de que o sujeito “apropria-se8” das qualidades do objeto que fez penetrar nele. Mas o prazer supõe que o objeto seja apreciado e guardado pelo sujeito no interior de seu corpo. E nem todos os objetos são admitidos. É em 1905 que Freud introduz a noção de “canibalismo psíquico”, retomada desde então por autores mais contempor âneos como Gabrielle Rubin (1997), que convida a distinguir os objetos destinados a ser engolidos e os objetos destinados a ser cuspidos. Aí haveria de fato “maus” e “bons” objetos. A “incorporação” no sentido freudiano deve então ser compreendida como o protótipo corporal da “introjeção” e da “identificação”, mas supõe prazer e continência. Se retornarmos a Xavier, a imagem do “corpo continente” é uma condição essencial para que ele se assegure de sentir e de ser percebido como todo mundo. Sua sensibilidade à incontin ência mostra bem como reter é a imagem da norma a adquirir ou a recuperar.

2.2 Ou bem uma “introjeção” falhada?

Enquanto Xavier associa o pósesfor ço esportivo a um bem-estar (graças às endorfinas, em primeiro lugar), mas também psiquicamente à satisfação do herói que realizou as proezas esperadas e que justifica o relaxamento e o repouso, quando se trata de aprendizagens mais escolares, a imagem do outro que se esvaziaria sem cessar não lhe permite esperar uma satisfação da mesma natureza. O mito do tonel das Danaides poderia significar o desespero de uma tarefa sem fim e da qual não se poderia escapar. A passividade do processo de aprendizagem escolar tocaria, aliás, seu sentimento de virilidade, como sugere sua reação no iní- cio da entrevista comigo. Quando lhe peço para me explicar por que ele diz que não gosta que lhe digam que ele se esforça –, ele me explica: não gosta “ah, que me cumprimentem, que me façam bilu-bilu”. François Perrot (2003) mostra como é central na problemá- tica masculina o domínio da virilidade, justamente porque a ereção não é um ato voluntário e sugere uma perda de domínio. É debruçando-se sobre os fundamentalistas que o autor faz a ligação entre a frustração e o sentimento de falta de virilidade. Levanto a hipótese de que essa interpreta ção faz sentido no caso de Xavier, cujo corpo não responde às suas expectativas.

No sentido dos últimos trabalhos de Jean-Marie Delacroix (2006), talvez se trate também, para Xavier, de significar inconscientemente uma dependência em relação àquele que lhe trará o conhecimento necessário. É essa hipótese que retomarei, porque sua dependência parece ter sua fonte na não confiança nele.

Incorporar-se é também guardar os traços sensíveis de experiências anteriores de que o corpo se recorda. Pode-se facilmente supor, na história de Xavier, que uma “relação dolorosa” ao saber teria imprimido emoções que engendrariam uma “rela ção atormentada” ao corpo e ao saber, e teriam participação em uma falta de confiança importante. Para Xavier, esse vivido é difícil de pôr em palavras, mas ele também, como eu, parece ter “engolido” essa fatia da vida, até o ponto de significar que o presente não é doloroso. “Quando cheguei na 6ª série, eu tinha... como se diz, não era nada demais, depois da 5ª e é isso aí... é isso”. Ele pode ter “assimilado” essa perda sem que a frustração que ela supõe provocasse nele perturba- ções?

Para Xavier, a dificuldade de pôr em palavras a perda do sucesso escolar que ele havia conhecido antes da 6ª; tempo em que sabia de cor suas lições e tirava “sempre boas notas em declamação, em poesia [...]”, leva-nos a retornar à associação que eu fazia na conversação acima sobre a injunção que me havia sido feita de “engolir” minha vergonha. Pareceme pertinente associar o traumatismo do fracasso de Xavier, assim como o dos adolescentes desse centro, ao que havia chamado de “dissimulação”, para convidar a entrever o esquecimento como um ato que não é banal, uma vez que se aproxima da amnésia evocada por Abraham e Torok (1978, p. 242): “quando uma perda maior precede ou segue uma experiência libidinal importante, a culpa e a vergonha sentidas forçam a amnésia desse momento privilegiado. O recalcamento conseqüente separa a pessoa dessa experiência9, mas conserva-a nela sob a forma de um cadáver esquisito [cadavre exquis]10”.

Os medos de Xavier relativos às fugas de sua continência corporal convidam-nos, então, a pensar que elas assinalam sua “impot ência” em apoderar-se de um objeto do qual gostaria de adquirir as qualidades; é nesse sentido que a “separação” notada por Abraham e Torok tem sentido para nós. Ele não poderia, portanto, identificar-se como “sujeito sabedor”, pronto a incorporar o saber e a enriquecer-se com ele: guardá-lo, como supõe a introjeção; servir- se dele, como supõe a identificação.

 

3. As dúvidas do adolescente, a perda afetiva da separação

Quando se trata de construir seus próprios valores e escolher o caminho que é o seu na adolescência, os conflitos da perda afetiva decorrentes da busca de independência são tão perturbadores e difíceis de assumir quanto parecem ativos e opressivos no mundo dos adultos. A esse respeito, Hatchuel (2005, pp. 38-39) lembra-nos que

“certamente, a criança investe na escola objetos de saberes socializados e não somente objetos íntimos e pessoais. Ao mesmo tempo, porém, ela permanece a maior parte do tempo submissa na sua relação ao adulto e aos modos de organização do trabalho em um mundo inteiramente regido por outros”.

Nosso estudo mostra que esses adolescentes encontraram desvios para assumir a independência da qual buscam os contornos. Alguns, por exemplo, buscam seu próprio valor nos saberes ilícitos, cujo domínio foi adquirido fora da escola, longe desses adultos que não contribuíram para seu sucesso. Danielle Hans (2005) analisou mais particularmente as atitudes defensivas de desafio que eles podem mostrar nesses momentos. Quando, além disso, explicam que desabafam dentro dos limites das regras que afirmam ter fixado no jogo entre eles, por exemplo, parecem então ter bastante consciência de suas aquisições, e podemos ser levados a nos interrogar sobre o preço que eles têm que pagar para assegurar sua necessidade de serem diferentes e independentes dos adultos.

Três condições seriam essenciais, afirma Hatchuel (2005, p. 41), para que um adolescente pudesse comprometer-se serenamente com seu ato, assumindo as conseqüências dele:

“Para agir, é preciso, portanto, por um lado, acreditar, mesmo um pouco, que isso que fazemos é socialmente legítimo, isto é, que o ato visado será valorizado; e, por outro lado, que é possível realiz á-lo e, enfim, que as conseqüências negativas não serão importantes demais, isto é, que os riscos assumidos são suportáveis”.

Ora, nos caminhos paralelos que eles escolheram, o fato de assumir o risco é, para esses jovens, maior, se tomamos como refer ência seus desafios.

As análises das entrevistas permitiram-me finalmente esboçar um quadro, em três tempos, que nos ajude a compreender como o adolescente poderia afrontar a perda afetiva da separação do enquadre do adulto. Sugiro que seria necessário que esses adolescentes pudessem dizer: “o saber é minha questão”; que aprendessem a resistir à falha e chegassem, enfim, a construir seu próprio desejo. E poderemos ver – a partir das análises das entrevistas e das abordagens teóricas que me inspiraram – que essas balizas são difíceis de franquear, sobretudo quando conhecemos o fracasso escolar.

3.1 O saber é minha questão!

É verdade! Ninguém pode aprender no lugar deles, aprender é sua questão. Levanto, contudo, a hipótese de que as experi ências negativas que se infiltram no tempo de aprendizagem escolar (e os trabalhos de C. Montandon (2002) mostram que cerca de metade das crianças interrogadas no quadro de seus trabalhos evocavam um vivido negativo, ambivalente, ou mostravam a indiferença nas situações de aprendizagem!)11 provocam, em certos casos, uma reativação do medo de ser abandonado que podem ter sentido quando eram crianças, ou do medo de abandonar as ligações seguras com os adultos quando se é adolescente e, talvez, sobretudo, quando se é um garoto. Esses medos ressurgiriam quando se trata de enriquecer-se com objetos externos como os saberes, ou quando se trata de confiar no adulto que ensina, e que representaria uma nova oportunidade de conhecer a perda.

Será que seu “corpo muralha” resistiria à invasão do exterior? Será que o corpo todo poderoso bastaria para participar da “digestão” do saber? Quando os adolescentes do centro falam de saber escolar, tão exterior à sua suposta capacidade interna, isso parece ser complicado. Esse saber, fora deles, não seria sempre percebido como objeto precioso, um saber suficientemente bom para eles. Mathieu diz “quando não consigo... bem, eu deixo pra lá”, como se esse saber não “valesse” a pena. Para a maior parte deles, o objeto de prazer parece, em alguns casos, inacess ível no contexto escolar, um objeto sem valor, um objeto em que não se pode investir; aliás, eles não podem senão nomear esses saberes, hierarquizá-los, distingui-los dos “saberes da vida”. Eles seriam vividos também como proibidos, “objetos interditos” para eles e reservados a outros. Pode-se supor que, uma vez que a escola não os orientou a investir o que se passa no interior de cada um no momento em que aprendem, o medo de aprender – mas também de falhar, e mesmo de ter sucesso – junta-se à frustração de não poder possuir esse objeto de bom êxito. Assim, esses saberes seriam apreciados como objetos sem laços afetivos, o que nos conduz a retornar aos trabalhos de Bion.

Para esse autor, o bebê estaria constituído por um aparelho para pensar sem capacidade de pensar, a partir da compreensão do que ele chama de “elementos Beta”: coisas em si sem ligações, dispersas, fragmentadas, a partir das primeiras singulares experiências emocionais do bebê. Os “elementos Alfa” transformariam os elementos Beta em conte údos psíquicos, contribuindo para participar da função da aprendizagem pela experiência [Bion (1979), Blanchard-Laville, (2001 e 1996)]. Se, como defende Bion, os elementos “beta”, constituídos de “saberes não digeridos”, não são tomados ao encargo da função “alfa” da mãe para desembaraçar o bebê, esse bebê é intoxicado e não pode se desenvolver. Para Bion, a mãe põe em jogo aqui sua “capacidade de devaneio materno”. Parece que para certos jovens persistiria um temor de deixarse invadir por esses elementos perigosos para eles. O saber tornar-seia, então, um “mau objeto”, por falta de não ter sido transformado pelo adulto.

Mas a confiança no adulto parece ser outra fonte de inquietude e convocaria, mais uma vez, a imagem do corpo protetor. Certas propostas de endereçamento ao corpo docente como “Os profs, eles fazem seu serviço” não evocam um docente que provocaria a admiração e de quem se poderia querer possuir as qualidades intelectuais. Os educadores “mudam o tempo todo”, como contar com eles? O outro é um possível perigo contra o qual eles construiriam atitudes de prudência, de suspeita, cólera, revolta, provocação. Compreendemos suas atitudes defensivas para com esse ambiente que não os reconhece, mas que se “cola em sua pele” (Anzieu, 1985); com adultos que os abandonam ou não os apóiam para domesticar saberes que pensam que não foram feitos para eles; levando-os a esperar que se desembaracem sozinhos ou a irem buscar a força que lhes é necessária nos ideais místicos ou mágicos. Observamos que se a separação do sujeito e do objeto já tiver sido feita no curso de experiências mal digeridas de suas primeiras aprendizagens, a distância parece aumentar infinitamente, porque esse outro não pode ser suficientemente generoso; suficientemente hábil para deixá-los esperar que o saber seja acessível e a distância franqueável.

Esse mesmo adulto seria o mais sentido como incapaz de proteger sua intimidade, como se pode supor, quando Grégoire, guardando sua pochette junto a seu pescoço, protegia, talvez, o que considerava importante para ele. Outros se indignaram com nosso modo de querer saber “tudo” sobre eles. Eles responderam também com o silêncio. Kahled lembrou- nos, aliás, que suas histórias eram seu segredo (Aulagnier, 1976). Eles sabem bem que a humilhação é sempre possível (Merle, 2005). Sua “pulsão de saber” seria refreada pela necessidade de se proteger das viol ências de seu mundo interior, como bem o descreve Serge Boimare (1999). Eles bloqueariam o mecanismo do pensamento para não ser dominado pelas perturbações emocionais de seu mundo interno.

Pode-se dizer que seu equilíbrio psíquico seria um equilíbrio em tens ão entre momentos nos quais seria dominante sua vontade de se desembara çar sozinhos – junto com a esperan ça de que os saberes feitos para eles existam; ou com o intenso desejo de acreditar no outro, que permanece fascinante por sua diferen ça; com ânsia de dominar sozinhos esses saberes tão perigosos – e outros momentos em que dominariam seus medos de confiar no que vem do exterior, uma vez que se sentiriam incapazes de guardá-los em sua interioridade fervilhante; em uma palavra, de “apropriar-se” deles. Mas se seu percurso autônomo supõe saberes magicamente preparados para eles, ou formatados pelo adulto para seu nível de apropriação, percebemos que o saber será sua questão no real, quando eles se firmarão com saberes construídos por eles; a não ser que o auxílio dos colegas seja uma etapa facilitadora para eles, etapa formadora de uma “socialização horizontal ” (Hatchuel, 2000, 2005) na qual “os saberes se comunicam de adolescente a adolescente sem que sua aprendizagem seja mediada pelos adultos [...]”.

3.2 A resistência à falta

Pode ser que, uma vez capturados pela problemática da necessidade solução radical para não conhecer a frustração a elaboração de seu próprio desejo ficaria truncada e o recurso fácil ao outro seria privilegiado.

As capacidades dos adolescentes de resistirem à falta parecem manter- se.

São inúmeras as vezes em que encontramos nos discursos a necessidade de obturar um vazio com uma forma de preenchimento que, aliás, nem sempre faz sentido. Mouloud decora os números das placas de carro e explica: “faço isso quando me entedio/ faço isso // quando me entedio”. O preenchimento concerne aos saberes da vida, assim como aos saberes escolares. Sébastien cita, por exemplo, conscienciosamente, as disciplinas que ele aprende na escola e tudo o que ele sabe sobre o Brasil. Será que se trataria para eles de acumular saberes, o suficiente para compensar perdas possíveis, talvez utilizando o adulto, como faz Grégoire quando demanda “você não pode me fazer perguntas? ”, ou delas se desvencilhando, retendo somente, por exemplo, as “pequenas regras” dadas pelo professor. Fantasmaticamente, esse vazio se estenderia infinitamente, como poderia sugerir a conversa de Xavier: basta ser “bem entendido”, ele nos diz.

O esquecimento e a perda põem em cena dois mecanismos psíquicos que dizem respeito ao medo do outro, tanto quanto ao medo de suas perturbações internas. Em suas interven ções12, Salomon Resnik gosta de lembrar que o vazio não existe, ele seria sempre “um vazio pleno de alguma coisa”. Pode-se dizer aqui que o vazio evocado nas entrevistas está cheio de medos. Para os adolescentes, parece difícil resistir à falta; falta da qual vimos que ele reaviva os sentimentos de perda, e mais ainda quando, como lembra Françoise Hatchuel (2005, p. 27), “tudo nos impele a voltar-nos para o gozo da satisfação imediata do desejo do outro, ou do nosso”. A ligação muito estreita dos medos com esses impulsos quase compulsivos de tapar o vazio ou a contrario de esquecê-lo para escapar desses mesmos medos (talvez dissimular a vergonha) mostra adolescentes de alguma forma prisioneiros de um fantasma de possessão sem limites. Eles recuariam, então, forçados pela inacessibilidade do saber e antes de tudo pela necessidade (excluindo o desejo surgido da experiência do prazer), fantasmando uma possessão sem limite. A problemática da “necessidade ” repete esse processo de incorporação “de sobrevida” à semelhan ça das “pulsões de autoconserva ção” da teoria freudiana, que superinvestiria o “eu psíquico” à custa do que se dá no exterior de si. O que acentuaria ainda mais os temores ligados à incontinência do saber. O termo comum “apropriação” parece- me, então, mais apto a significar uma “incorporação” de um “objeto desejado”, além, unicamente, da “necessidade13 ” de possuir. O saber, fonte de prazer, seria “saboreado”, apreciado, antes de ser “digerido”, para permanecer na primeira metáfora digestiva, e o jovem se reconheceria como sujeito desejante, mesmo que o termo “incorporação” responderia a um aniquilamento do desejo.

As estratégias que levam a obturar o vazio diferente segundo os adolescentes, sem dúvida, segundo sua história. Enquanto Grégoire espera desvencilhar-se e Xavier espera ter toda a vida para aí chegar, outros adolescentes preferem esperar e empenhar- se numa espera sem projeto. Percebemos as diferenças em seu ní- vel de tolerância à frustração e na atitude de construir-se o que Giovan Francesco Lanzara chama de “capacidade negativa”, isto é, essa capacidade de suportar não compreender e estar nessa incerteza; de satisfazerse com conhecimentos ainda imperfeitamente alcançados, o que supõe, então, suspender a tensão emocional que requer o desejo de encontrar uma solução. Essa expressão de um tipo de inteligência intuitiva pareceme remeter a uma capacidade adjacente que consiste em saber se desembara çar do complexo, do indeterminado e, portanto, da desordem, e em desenvolver uma engenhosidade que permanece sensível ao ambiente. É nesse sentido que emprego, na contramão desse propósito, o termo “intersubjetividade imersa”.

As propostas dos adolescentes quanto às soluções adaptativas sugerem que o investimento não foi sen ão esboçado. O que nos conduz a nos questionar de forma mais geral sobre o desejo de aprender.

3.3 A difícil conquista do desejo de aprender

Os jovens descrevem os processos nos quais não parecem investir intimamente. Alguns deles recorreram à obediência. Hocine nos diz “eu escuto e aplico”. E se isso não funciona, Grégoire se tranqüiliza: “De tanto ah! / isso vem, isso entra, hem!” Ele diz mesmo que é possível “desembaraçar-se sozinho ”.

Para conseguir sentir-se intimamente concernidos, alguns recorrem a impulsos talvez excessivos nos quais seu corpo está em jogo, o que satisfaria seu fantasma de possessão. Eles se colocam psiquicamente em perigo para chegar a “sentir” seus limites e provar a si mesmos que eles existem. Tentando alcançar dentro dos limites da “normalidade” a tomada de consciência de sensações novas, eles conseguiriam, então, ao mesmo tempo, assegurar-se de sua capacidade de conter “objetos de desejo desencarnados”, (tendo introjetado as qualidades mórbidas de seus saberes sem vida); e sempre mostrando finalmente aos adultos que nesse procedimento eles guardam sua liberdade. Eles evocaram dois tipos de comportamento mostrando essa tendência a se libertarem da razão e da norma. O entusiasmo ligado à exposição ao risco e à sedução de forças superiores como a magia ou a religião.

E quando parecem ser capazes de tornar a dar sentido ao saber escolar, fazendo a ponte entre seu mundo adulto e o da escola, existe o perigo de ver seu desejo submetido ao do adulto. Eles evocam os saberes que chamarei de “projetados” na escola. Sébastien parece investir afetivamente a ligação entre a escola e os saberes que lhe pertencem: “Quando me divirto, me divirto, jogo no computador / uso o que aprendi na escola e me esbaldo ”; falando de sua perícia, diz tamb ém: “ela me ensinou a fazer bolo// e agora eu sei fazer bolo”. O ajuste corporal e psíquico ao objeto parece mobilizado, e percebe-se bem a passagem entre “ela” “me” ensinou e “eu” sei fazer.

O risco estaria no bloqueio da distância entre o sujeito e o saber, caso o adolescente não se sinta capaz de elaborar seu desejo e caso o adulto não o ajude a se “reaproximar” do saber para que pudesse investi-lo.

Considerando, ao mesmo tempo, o temor de um enfraquecimento em sua capacidade de “continente” e os limites por demais flutuantes e pouco seguros afetivamente que não lhe permitiriam elaborar seu espaço psíquico interno, nem ter a coragem de explorar o mundo para avaliar a medida de sua força psíquica e de desenvolvimento íntimo, postulei que a energia psíquica necessária à elaboração do desejo de investir os objetos externos seria desviada pela necessidade de proteger-se. Proteger- se do outro, de si, de seus enfraquecimentos. As emoções ligadas aos saberes de experiência poderiam, então, ser abafadas por um envelope transformado em couraça, não suscitando nem satisfação nem prazer, sobretudo se admitimos que a incorporação é um modo de negar uma perda associada à vergonha e à culpa.

Impelidos por sua determinação de obturar um vazio, saturariam seu desejo de apropriar-se do saber, e dissimulariam sua necessidade de satisfazer a falta, fonte desse desejo.

3.4 A metabolização sonhada

Como aprender a se desprender para crescer melhor? Os jovens parecem querer libertar-se da possível dominação (Dorey, 1981) dos adultos, afastando-se sempre mais deles, talvez até sonhando com outro mundo que os faria suportar o espaçotempo presente e exerceria a função de esperança; tal como um “ultrapassamento de si” (Quéval, 2004), que teria uma função de “sobrevida “eu vou aprender em 100 anos se precisar aprender em 100 anos, vou aprender em 90 anos, e aprendo ainda, hem, se precisar, se eu viver ”, diz Xavier. Gregório imagina ter sucesso mais tarde e tornar-se “normal ”. A ilusão do tempo garantiria sua segurança, e o retorno a si, percebido como sem interesse, tornarse- ia inútil.

Ao mesmo tempo, porém, quando insistem na ajuda dos docentes que os cercam; quando reconhecem o acompanhamento de que se beneficiam; quando imploram, por exemplo, as questões para encontrar a “boa resposta”; quando percebem o modo como são conduzidos em direção ao saber, o docente é então compreendido como uma pessoa indispensável que poderá guiá-los rumo a um saber “feito” por eles. Ainda que não sejam enganados por certos acordos, eles reivindicam, à sua moda, sua identidade de jovens normais; a primeira resposta à nossa indagação foi “como eu aprendo? Bem, normal, sei lá, normal!” No centro, no qual os encontramos, o que lhes é proposto não é a mesma coisa que haveria fora de lá; contudo, existe a forte esperança de “apreciar” um saber escolar “como os outros”; mas na condição de que o outro, o adulto, transforme esse saber julgado excessivamente estranho, muito diferentes deles, em saberes familiares. A solução com a qual sonham existiria para eles em uma “metabolização” do saber elaborada fora deles. Um saber que estaria ao alcance deles; um saber particular que poderia acalmar suas inquietações e tornar continente sua interioridade.

Essa “metabolização sonhada”, que examinei como mecanismo que se evitaria no exterior do sujeito e de seu desejo em um objeto encerrado pelo desejo do outro, representa um perigo certo para os adolescentes. Eles poderiam se contentar com uma postura atenta, impondo inconscientemente ao adulto “mastigar” o saber suficientemente para que eles pudessem ingeri-lo. Parece- me importante mergulhar ainda na compreensão dos medos e das esperanças dos adolescentes para ajudá-los a galgar sozinhos os degraus de seu acesso ao saber. Talvez ensiná-los a perder, para não mais ter que se proteger e saber ganhar; a esperar, para saber construir; a suportar correr o risco.

 

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Endereço para correspondência
e-mail: clercpnp@free.fr

Recebido em fevereiro/2007
Aceito em maio/2007

 

 

* Docente no Institut Universitaire de Formation des Maîtres (IUFM de Versalhes), pesquisadora associada à equipe Savoirs et rapport au savoir da Universidade de Paris 10, Nanterre, França
1 N do T - Mise en abyme (grafia antiga de abîme) é um procedimento literário que lembra um jogo de espelhos, em que uma figura dentro da outra também reflete essa pintura dentro da outra provocando um efeito de vertigem. O exemplo literário exemplar é o de um relato dentro de outro, retomando o tema do relato principal, como acontece em Hamlet de Shakespeare
2 Nome fictício de um dos entrevistados sobre o qual vou construir minha argumenta- ção teórica
3 A equipe é composta de Françoise Hatchuel, Valérie Carlin, Nicole Clerc e, principalmente, Danielle Hans
4 O ITES é uma estrutura organizada em torno de três missões: terapêutica, educativa e escolar. N. da T. O Instituto para o Trabalho Educativo e Social (ITES) é um organismo de forma ção em trabalho social com diversas atividades como: formação contínua, organiza- ção de colóquios, publicações, ofertas de empregos e estágios, etc. A ASEAY é uma associação de proteção à infância e à adolesc ência em Yvelines
5 Título do relatório de pesquisa: “A relação ao saber de jovens em dificuldade”
6 Todos os prenomes dos adolescentes são fictícios
7 Todos os prenomes de adolescentes foram escolhidos pela equipe para preservar o anonimato de todos eles
8 As aspas nesse termo têm o objetivo de precisar a confusão que o termo “incorpora- ção” sugere como o termo “apropriação”; confusão que este texto contribuirá para exclarecer
9 Itálicos para facilitar a compreensão da argumenta ção
10 N. da T. O Cadavre exquis é um jogo coletivo verbal ou visual praticado pelos surrealistas como um exercício para o automatismo psíquico. Na forma escrita, um papel era dobrado (sanfonado) segundo o número de participantes e cada um escrevia o que lhe passava pela cabeça, sem ver o que o outro havia escrito. No final, obtinha-se uma produ ção inconsciente coletiva. Segundo o dicion ário Le trésor da la langue française, a primeira frase obtida com o procedimento (e que serve de nome ao jogo) teria sido: le cadavre exquis boira le vin nouvea
11 Fontes citadas por Blanchard-Laville (2005)
12 Refiro-me especialmente a sua interven- ção na Sorbonne, Paris 24-26 de novembro de 2006 no Colóquio Cliopsy
13 Termo que corresponde, na teoria freudiana, às pulsões de autoconservação caracter ísticas das grandes funções corporais.

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