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Estilos da Clinica

versão impressa ISSN 1415-7128versão On-line ISSN 1981-1624

Estilos clin. v.14 n.26 São Paulo  2009

 

DOSSIÊ

 

A representação e o gozo na clínica do autismo

 

The representation and the enjoyment in the authism clinic

 

La representación y el goce en la clínica del autismo

 

 

Maria Elizabeth da Costa Araújo

Professora do Curso de Especialização em Psicanálise da Universidade Federal Fluminense. m.elizabeth.araujo@terra.com.br

 

 


RESUMO

Considerando que o autismo suscita questões referentes ao momento mais primitivo da constituição da subjetividade, o trabalho aborda inicialmente as particularidades implicadas no gozo que, segundo a teoria psicanalítica, estabelece a representação como uma inscrição no inconsciente ao atrelar o sujeito ao Outro. Em seguida, o gozo no autismo, na medida em que se situa num aquém da representação, é abordado a partir do conceito de alíngua proposto por Lacan como o precursor da representação como gozo.

Descritores: autismo; alíngua; gozo; representação.


ABSTRACT

Considering that autism brings up questions about the most primitive moment of the subjectivity constitution, this paper first approaches the particularities of the enjoyment that, according to psychoanalytic theory, establishes representation as an inscription on inconscient tying up the subject to the Other. Then, since in autism the enjoyment is situated beyond representation, it is envisaged from the viewpoint proposed by Lacan with the concept of lalangue, the precursor of representation as enjoyment.

Index terms: autism; lalangue; enjoyment; representation.


RESUMEN

Considerando que el autismo plantea cuestiones relativas a las fechas más primitivas de la subjetividad, el texto aborda inicialmente las particularidades que participan del goce que, de acuerdo con la teoría psicoanalítica, postula la representación como una inscripción en el inconsciente que vincula el sujeto al Otro. Entonces, el goce en el autismo, en la medida en que se plantea por debajo de la representación, se discute desde el concepto de lalengua, propuesto por Lacan como el precursor de la representación como goce.

Palabras clave: autismo; lalengua; goce; representación.


 

 

Pode acontecer que um sujeito que dispõe de todos os elementos da linguagem, e que tem a possibilidade de fazer certo número de deslocamentos imaginários, que lhe permitem estruturar seu mundo, não esteja no real. Por que não está? - unicamente porque as coisas não vieram numa certa ordem. A figura no seu conjunto está perturbada. Não há meio de dar a esse conjunto o menor desenvolvimento. (Lacan, 1983)

 

Introdução

O sujeito autista suscita questões que dizem respeito à relação com o outro, à fala, à singularidade com que constrói sua realidade. A precocidade do aparecimento das características autísticas perm+ite supor que seu estudo possa trazer esclarecimentos a propósito do que está implicado na constituição do sujeito. Isso vem acarretando um interesse cada vez maior no tema, não obstante a baixa taxa de prevalência do autismo.

Em tempos de interlocução com Freud, Eugen Bleuler cunhou o termo autismo por subtração de eros do termo auto-erotismo proposto por Havellock Ellis. Bleuler designou como autismo o estado de alheamento e de desinvestimento no mundo, um dos sintomas mais importantes da patologia que o imortalizou ao nomeá-la esquizofrenia.

Em 1943, Leo Kanner descreveu, pela primeira vez, o que chamou de distúrbio autístico do contato afetivo, síndrome de aparecimento muito precoce, que tinha o fechamento autístico, manifesto na incapacidade de estabelecer relações desde o princípio da vida, como sintoma patognomônico. Em 1955, esse autor estabeleceu como fundamentais no autismo dois sintomas: o desejo de solidão (aloneness), que se expressa na busca de um isolamento profundo; e a preocupação com a imutabilidade (sameness), evidenciada na intrusão assustadora que a modificação no meio interno ou externo conota. Destacou que, com o avançar da idade costuma haver, em grau variado, a ruptura da solidão e a aceitação de algumas pessoas, embora sempre persista um nível elevado de isolamento afetivo.

A linguagem verbal no autismo pode estar completamente abolida ou limitar-se à repetição monótona de palavras, como a repetição continuada de anúncios publicitários, sequência de números, séries de palavras etc. Podem ocorrer alterações das palavras por assonância, duplicação ou triplicação de letras. Utilizam-se verbalizações aparentemente sem sentido e, sobretudo, sem endereçamento. Entre as onze crianças mencionadas na primeira descrição de Kanner, embora oito falassem e três fossem "mudas", ele considerou que não havia diferença fundamental entre as que falavam e as que não falavam, pois a linguagem não servia para transmitir qualquer mensagem aos outros. Um fenômeno linguístico despertou desde o início a atenção de Kanner: "os pronomes pessoais são repetidos exatamente como são ouvidos", não havendo a inversão pronominal. Ele também destacou "a excelência da capacidade de memorização decorativa" dos autistas (Kanner, 1997).

O modo singular como se servem da palavra, de tal forma que não se pode identificar ali uma intenção de comunicação, coloca em questão a própria constituição da fala e a inserção do sujeito na linguagem, isto é, o modo como escolhe submeter-se a sua condição de ser falante.

A articulação entre os três aspectos fundamentais no autismo - a estranha relação com o semelhante, a excentricidade da linguagem e o enigma de sua realidade - atesta a vinculação entre a relação com o semelhante, o surgimento da linguagem e o estabelecimento da realidade psíquica. A teoria psicanalítica estabelece alguns parâmetros para abordar essa questão que remete ao momento mais primitivo da subjetividade a partir das particularidades implicadas na emergência da Vorstellung - a representação.

 

1. A estrutura da linguagem

No "Projeto para uma Psicologia Científica" (Freud, 1981), Freud define memória pela impressão de sucessivas marcas no nível do sistema nervoso oriundas, por um lado, do que passa pelo filtro do sistema perceptivo e, por outro, determinadas pela exigência de fluidez de Qh, a energia pulsional. Essas marcas se dão ao serem enlaçadas pela pulsão, que faz delas uma rede articulada segundo a facilidade com que o impulso as percorre. Trata-se de uma rede de marcas capaz de permanecer sempre aberta ao acréscimo de mais uma que favoreça a descarga. À facilitação, Freud contrapõe as barreiras de contato, verdadeiros sugadores de energia. O inconsciente é um sistema de memória que se organiza segundo uma espécie de automatismo que corresponde à função do princípio do prazer (Lacan, 1988) onde o que se repete e norteia o percurso é fundamentalmente a diferença, não de qualidades perceptivas inerentes à consciência, mas de quantidades de investimento pulsional que correspondem a marcas significantes, as representações de coisa.

Um significante na medida em que se define como marca de pura diferença, caracteriza-se por remeter sempre a outro significante, não significando nada em si mesmo, mas produzindo, no seu encadeamento, efeitos capazes de se organizar numa significação ou, nos termos de Freud, fazem surgir, de tempos em tempos, os signos de qualidade no nível consciente.

Considerando que a representação implica na presentificação de um gozo, isso nos instiga a interrogar como se dá o gozo no autismo.

 

2. Da experiência de satisfação ao gozo de alíngua

Embora todo humano esteja irremediavelmente imerso na linguagem, é necessário que cada sujeito dê o passo que efetiva sua captura e seu compromisso com a fala. Para a psicanálise, a instauração da representação - célula elementar da linguagem e da fala - pressupõe o ato que enoda o sujeito, a fala e a significação. A clínica do autismo evidencia um uso singular da representação, que parece desvincular-se de qualquer intenção de significação. No autismo, a concomitância do comprometimento da fala e da instauração da relação com o outro desde o princípio da vida, apontam no sentido do vínculo originário entre um ato de fala e a constituição subjetiva.

2.1 A experiência de satisfação

Vimos que é próprio da subjetividade humana articular-se a uma rede complexa de significantes. Embora todo ser falante esteja inserido na linguagem, para que o sujeito se expresse num discurso é necessária a operação mítica de um corte que instaure a diferença entre o eu e o mundo externo e inaugure a relação do sujeito com o Outro. Essa operação de corte ocorre numa sucessão de acontecimentos lógicos que requer a participação do que Freud chamou de Nebenmensch, termo que encerra a noção de próximo assegurador: um outro falante que, de alguma forma, toma o infans aos seus cuidados. Tradicionalmente, a mãe encarna esse lugar. Lacan lhe atribuiu a função de Outro primordial, na medida em que desempenha a função de transmissor da referência ao Outro, campo da linguagem diante do qual o infans advirá sujeito.

No Projeto, são fornecidos os elementos fundamentais para a compreensão da inserção do sujeito em sua realidade psíquica, a partir do que Freud estabeleceu como a primeira experiência de satisfação (Freud, 1981). Essa experiência é apresentada em termos de uma alteração irreversível no protoplasma das células nervosas que determinam as facilitações, responsáveis pela orientação dos trilhamentos. Foi assim que Freud abordou, naquela ocasião, a noção de um elemento mítico capaz de situar um gozo real tão inacessível quanto almejado pela representação.

Freud considerou que o investimento neuronal - correspondente à elevação de Qh -, tem como consequência uma propensão à descarga motora. Enquanto ela não ocorre, o aumento de Qh em y provoca uma sensação de desprazer em w - a consciência. Sua diminuição, ao contrário, suscita uma sensação de prazer. No sistema y, a primeira via a ser seguida em direção à diminuição dos níveis de Qh é a alteração interna. Para exemplificá-la, Freud evoca o estímulo proveniente da fome do bebê, que promove uma modificação interna expressa no grito. O grito cumpre, portanto, originariamente, uma função de descarga. No entanto, se o estímulo permanece, a descarga propiciada por essa ação interna não produz alívio suficiente, sendo necessária uma alteração no mundo externo através de uma ação específica. A especificidade dessa ação se deve ao fato de ela ocorrer tão-somente através de caminhos precisos. No exemplo da fome do lactente, a oferta do seio que alimenta pode ser considerada como protótipo da ação específica, evidenciando que o desamparo do organismo desse pequeno homem torna-o incapaz de realizá-la sem o auxílio externo. E é nessa impossibilidade real que se deve situar a centelha do enganchamento do sujeito em seu mundo.

O grito

O grito é o primeiro movimento do sujeito em direção ao Outro. Ele situa-se num ponto limite, na medida em que corresponde ao esgotamento das possibilidades individuais de redução de Qh e convoca uma ação que só pode provir de um Outro. Freud conferiu ao grito um lugar de destaque na constituição do sujeito falante ao afirmar que: "Essa via de descarga adquire, assim, a importantíssima função secundária da compreensão [comunicação com o próximo], e o desamparo original do ser humano converte-se, assim, na fonte primordial de todas as motivações morais" (Freud, 1981).

Dessa forma, a via de descarga que é o grito de apelo assume a função de comunicação por exigir que um outro lhe empreste um sentido, traduzindo-o numa demanda. Na leitura de Lacan, um grito de apelo se constitui como demanda e como desejo: "Quando a mãe responde aos gritos do bebê, ela os reconhece constituindo-os como demanda, mas o que é mais importante é que os interpreta no plano do desejo da criança de estar perto dela, desejo de tomar-lhe algo, desejo de agredi-la, pouco importa. O que é certo é que, por sua resposta, o Outro a dar a dimensão de desejo ao grito da necessidade, ao investir na criança, é de início resultado de uma interpretação subjetiva, função do desejo materno, de seu próprio fantasma." (Lacan, [1961-62]).

A ação específica que está em jogo na experiência de satisfação articula-se com a leitura que a mãe faz do grito conforme o desejo que a afeta. Isso faz do desejo do Outro a bússola que orienta a constituição do sujeito (Ciaccia, 2005). Lacan também destacou que, ainda que inicialmente exerça a função de descarga, o grito pontua a captura de algo passível de ser reconhecido posteriormente como consciência, ao sinalizar a instauração do objeto enquanto hostil: "O objeto enquanto hostil só é sinalizado no nível da consciência na medida em que a dor faz o sujeito soltar um grito. ... O grito cumpre aí uma função de descarga e desempenha um papel de uma ponte no nível do qual algo ocorre de ser pego e identificado na consciência do sujeito. Esse algo permaneceria obscuro e inconsciente se o grito não lhe viesse conferir, no que diz respeito à consciência, o sinal que lhe confere seu [do objeto] valor, sua presença, sua estrutura - da mesma feita, com o desenvolvimento que lhe é conferido pelo fato de que os objetos mais importantes para o sujeito humano são os objetos falantes, lhe permitirão ver, no discurso dos outros, revelarem-se os processos que habitam efetivamente seu inconsciente." (Lacan, 1988).

Assim, o grito corresponde ao primeiro movimento constitutivo do sujeito: o corte que, do lado do infans, exerce a função primordial de inscrever o sujeito na linguagem ao instaurar uma relação de dependência. No entanto, Lacan ressaltou que o grito deve ser situado num nível aquém da linguagem, pois não implica, em si mesmo, nenhuma dicotomia, nenhuma bipartição significante. É somente após o movimento interpretativo executado pelo desejo do Outro que aquilo que era puro vazio, pura escansão, assume o estatuto de palavra significativa e faz do grito um apelo. Dessa forma, "a resposta do Outro transforma o grito em apelo de um sujeito" (Miller, 1998). A clínica do autismo vem justamente evidenciar que há possibilidade de recusa do grito em seu estatuto de apelo.

A primeira experiência de satisfação

Freud esquematizou o que se passa na primeira experiência de satisfação descrevendo três ações ocorridas no sistema ψ:

1. Opera-se uma descarga duradoura que faz cessar o desprazer produzido no consciente (ω) pelo excesso de tensão (Qη) no inconsciente (ψ).

2. Gera-se o investimento que corresponde à percepção de um primeiro objeto: o semelhante que executa a ação específica capaz de fazer cessar a excitação endógena.

3. Registra-se a descarga que se segue à ação específica, promovendo a experiência de satisfação.

A experiência de satisfação gera uma facilitação entre duas imagens mnêmicas, a do objeto e da descarga (itens 2 e 3), mantendo-as de tal modo associadas que o investimento em uma remete facilmente ao investimento na outra. Com o re-afloramento do estado de urgência, lugar onde se situará o desejo, as duas lembranças são investidas simultaneamente. Devido a esse duplo investimento, na falta do outro assegurador, a ativação desejante dos traços mnêmicos de tal experiência é capaz de produzir algo idêntico a uma percepção, ou seja, uma alucinação. Dessa forma, a primeira experiência de satisfação serve de suporte para a instalação da experiência alucinatória de satisfação.

A experiência alucinatória de satisfação

Na leitura de Freud a partir de Lacan, a experiência de satisfação é uma inscrição mítica de gozo que deixa traços mnêmicos dos atributos do gozo alocado no Outro. Essas marcas denunciam o investimento libidinal na medida em que criam o polo alucinatório de satisfação. Dito de outro modo, por meio da repetição da experiência de satisfação através da alucinação, o princípio do prazer rege os trilhamentos que se dirigem de um modo recorrente às representações vinculadas ao desejo e instala o lugar-tenente da representação da pulsão (Lacan, 1973). Essas representações correspondem ao reencontro alucinatório do gozo e só podem chegar à consciência sob a forma de identidade de percepção. Tal identidade diz respeito a uma percepção capaz de atender ao princípio de realidade (Lacan, [1968-69]).

O princípio do prazer comanda a associação de uma representação à outra, enquanto o princípio de realidade elege a aglutinação de certas representações como constituintes da realidade. Assim, a partir de um marco inaugural, a regulação homeostática visa o retorno a uma identidade que serve de suporte para a construção da realidade psíquica. A experiência de satisfação pode ser considerada a instauração de um traço real que se torna referência para tudo que há de relevante no mundo perceptivo e, consequentemente, para o que há de mais relevante na realidade psíquica. Nas palavras de Lacan: "sem algo que o alucine enquanto sistema de referência, nenhum mundo da percepção chega a ordenar-se de maneira válida, a constituir-se de maneira humana" (Lacan, 1988).

Com isso, Lacan destaca que a percepção, tal como apresentada por Freud, não leva em conta nenhum critério de realidade, uma vez que seu mundo se constrói a partir da alucinação fundamental. De certa maneira, podemos dizer que, no homem, a realidade é "alucinatória". A partir dela se constrói o mundo externo no qual o sujeito se desloca.

Embora Freud tenha se servido da fome do bebê para descrever o estabelecimento da satisfação como um marco inaugural, a instauração da satisfação pulsional independe de qualquer experiência real. A esse respeito, Lacan afirmou que: "nenhum objeto de nenhum Not, necessidade, pode satisfazer a pulsão. ... essa boca que se abre no registro da pulsão - não é pelo alimento que ela se satisfaz" (Lacan, 1979).

No entanto, a ideia de que a experiência de satisfação da necessidade alimentar serviria de apoio para a satisfação pulsional possibilitou a Freud instituir uma historicidade constitutiva do sujeito onde o outro, através da ação específica, assume um papel fundamental na estruturação do aparelho psíquico. O vínculo com um Outro primordial (suporte da linguagem), que a relação com o outro (semelhante) veicula, é o lugar fundador do sujeito.

2.2 Inscrições e repetição significante

No Projeto, Freud descreveu o pensamento inconsciente como o funcionamento de um aparelho de memória que consiste no deslocamento do impulso segundo as diferentes facilitações. Na carta 52, ele apresentou a Fliess a constituição e o funcionamento desse aparelho a partir da sucessão das Niederschriften, as inscrições, como uma concepção indispensável à compreensão do funcionamento do aparelho psíquico (Freud, 1977). Noções como signo (Zeichen) e inscrição (Niederschrift) sustentam a leitura de Lacan de que o que se passa nesse aparelho é da ordem de uma escrita e que os trilhamentos neurológicos propostos no Projeto são trilhamentos de significantes. As inscrições são o que efetivamente operam nos traços mnêmicos (Lacan, 1988). A carta 52 destaca-se, portanto, como momento privilegiado de "significantização" do esquema proposto no Projeto. Jacques Derrida (1971), citado por Garcia-Roza (1993) resumiu esta passagem dizendo que ali "o traço começa tornar-se escritura", ou seja, o traço, ao qual Freud já se havia referido no Projeto, assume mais claramente, na carta 52, o estatuto de escrita.

A rede de representações inconscientes se instaura a partir de uma sucessão de acontecimentos que marcam o assujeitamento do falante ao significante. Na carta 52, Freud descreveu o processo de estratificação onde os tempos lógicos da constituição do aparelho psíquico se distinguem conforme o esquema abaixo:

W _____ Wz _____ Ub _____ Vb _____ Bew

O circuito da apreensão psíquica inicia-se com W (Wahrnehmungen: percepções), que corresponde à pluralidade perceptiva decorrente das impressões brutas do mundo exterior. Trata-se de uma posição primordial, comparável à total transparência do papel celofane do bloco mágico, que não retém nenhum traço do que aconteceu. Essa etapa primitiva jamais vem à tona no sujeito como experiência registrável.

Em seguida há o registro em Wz (Wahrnehmungzeichen: signos de percepção), que corresponde à primeira inscrição mnêmica dos signos de percepção, associados entre si por simultaneidade. Lacan dá destaque a esse aspecto ao dizer que "temos aí a exigência original de uma primitiva instauração de simultaneidade" (Lacan, 1985a). São as representações primitivas de uma organização significante anterior à articulação do inconsciente. Nos termos do Projeto, esses traços primitivos correspondem às primeiras incidências do estímulo na matriz orgânica. O momento de gestação do bebê pode ilustrar o que seria um tempo em que a criança, embora ainda não nascida, encontra-se plenamente inserida no discurso do Outro, na medida em que é falada por alguém que está inscrito na linguagem. Este momento exemplifica um tempo da constituição subjetiva em que o sujeito se restringe a uma promessa, estando inteiramente submetido ao discurso do Outro e as suas consequências. É importante destacar que W e Wz são etapas que se impõem por dedução, pertencendo à mitologia da subjetividade.

Quando incide uma repetição sobre os signos de percepção, os Wz sensibilizados pela facilitação e ocorre uma transcrição que instaura o registro Ub (Unbewusstsein: inconsciente), a articulação entre os traços se estabelece. A experiência de satisfação exemplifica o que vem a ser a articulação entre duas representações, rompendo com a simultaneidade. Nota-se ali uma abordagem privilegiada desse momento inaugural, na medida em que o enlace de dois traços de memória é sincrônico com a instauração de um gozo e a vinculação inextrincável entre sujeito e Outro.

Freud descreveu o inconsciente como uma rede articulada de traços mnésicos que correspondem a "lembranças conceituais" (Freud, 1977). Lacan, a partir da leitura particular que faz da linguística de Ferdinand de Saussure, propôs que essas lembranças conceituais correspondem a significantes, de forma que o inconsciente consiste numa rede articulada de significantes. A estrutura do inconsciente deve, portanto, ser descrita tal como a da linguagem. Ela foi sintetizada por Lacan no binário fundamental S1 S2. Esse matema revela que a importância da relação entre essas marcas reside no fato de, no remetimento de uma a outra, haver um sujeito que se faz representar; isto é: "um significante representa o sujeito para outro significante" (Lacan, 1998). S1 S2 revela, também, que um conjunto de significantes S1, como um essaim1, um enxame de significantes, representa o sujeito para S2, o significante de exceção; ou, ainda, que a multiplicidade do saber, representado por S2, está relacionada a S1 como unidade. Dito de outro modo, S1 S2 revela que o sujeito surge no intervalo entre o Um e o Outro.

Antes da instauração da representação de coisa, o significante comparece como simultaneidade, sem instauração do tempo, mera sucessão sem encadeamento, numa cronologia só percebida pelo Outro. Pode-se deduzir que o impedimento da passagem dos signos perceptivos a traços mnêmicos corresponde ao impedimento da inscrição dessa hiância.

A repetição promove uma transcrição na medida em que implica a inscrição de uma marca diferencial entre os registros mnêmicos. A partir dessa marca diferencial, onde antes só havia simultaneidade, passa a haver deslocamento metonímico e, portanto, tempo e espaço. Dessa forma, o que vem distinguir um registro da ordem do signo perceptivo de um traço mnêmico é o fato de haver, no segundo, inscrição da hiância que se traça na diferença entre os trilhamentos. Essa descontinuidade, que constitui uma falta, promove a captura subjetiva pelo simbólico. A instauração do inconsciente consiste no corte em que o sujeito, ao ser barrado pelo significante, se faz representar por ele. É a única via pela qual o humano avaliza sua submissão ao simbólico ao alienar-se ao significante. O deslocamento metonímico de uma representação a outra, segundo o princípio do prazer, caracteriza o movimento do investimento libidinal inconsciente. Assim, o registro do traço mnêmico consiste na instauração de uma representação libidinalmente investida.

De acordo com Lacan, a inscrição mnêmica é um signo que corresponde alucinatoriamente à satisfação da necessidade (Lacan, 1999). Assim, vemos estabelecida a relação entre a experiência de satisfação e o registro dos traços mnêmicos. Na experiência primária de satisfação, a satisfação da necessidade corresponde ao gozo maciço que é barrado no momento em que, através da representação, se instaura uma ilusão de gozo que alucina essa satisfação. No gozo maciço, a percepção do mundo externo não é acessada pela via do significante.

Vb (Vorbewusstsein: pré-consciente) é o terceiro registro, que corresponde à tradução da representação de coisa em representação de palavra; isto é, corresponde à transformação da pura alucinação, ligada ao princípio do prazer, em identidade de pensamento, regido pelo princípio de realidade, princípio que instaura o "eu oficial". Freud destacou que o pré-consciente "está ligado à ativação alucinatória das representações da palavra". Os movimentos do inconsciente, regidos pelo princípio do prazer, chegam à consciência à medida que podem ser verbalizados, quer dizer, traduzidos pelas palavras ao princípio de realidade que vigora no pré-consciente e no consciente. Freud afirmou que: "o material presente sob a forma de traços mnêmicos fica sujeito, de tempos em tempos, a um rearranjo, de acordo com as novas circunstâncias - a uma retranscrição" (Freud, 1977).

Os traços mnêmicos são inscrições diferenciais - significantes - que se deslocam indefinidamente e só se estancam mediante uma retranscrição, uma tradução, no registro do pré-consciente, num signo de qualidade, que corresponde à aparição de um significado no nível da consciência. Nesse processo, a liberação de desprazer que a tradução de certos traços pode provocar promove uma falha de tradução que corresponde ao recalcamento desses traços.

Segundo Freud, a representação de palavra que se constitui no pré-consciente vem ordenar-se, na consciência (Bewusstsein), de acordo com certas regras, as quais, para Lacan, são as regras do significado. Assim, o campo da consciência é dominado pelo ordenamento num significado que se presta à ilusão da comunicação. Nele, o inconsciente comparece através de suas formações - chistes, atos falhos, sintomas - que se contrapõem ao que se quer dizer conscientemente.

2.3 O gozo de alíngua

A experiência de satisfação descrita por Freud implica numa descarga na qual a satisfação em questão encontra-se essencialmente ligada a uma experiência de gozo. A leitura da carta 52 e do Projeto indica que na instauração do inconsciente ocorre um ciframento atrelado a um gozo capaz de enlaçar sujeito e Outro. Esse enodamento suscita a comunicação no nível consciente, ainda que não se restrinja a ela.

Assim, pode-se considerar que, no momento inaugural do sujeito - a experiência de satisfação - a matéria significante destaca-se das marcas de gozo do Outro que vêm configurar o objeto.

Miller aponta que, com a noção de discurso, elaborada mais detalhadamente no seminário O avesso da psicanálise, Lacan deslocou o enfoque da relação primitiva e originária entre significante e gozo, passando a valorizar a repetição como repetição de gozo. Parafraseando a clássica definição de significante proposta por Lacan - "O significante é aquilo que representa o sujeito para outro significante" (Lacan, 1998) -, Miller afirma que: "o significante representa o gozo para outro significante" (Miller, 2000), uma vez que o significante faz faltar o gozo assim como faz faltar o sujeito. O significante faz faltar o gozo na medida em que promove o gozo fálico, que é o gozo fictício da linguagem. O sujeito é estruturalmente irrepresentável. Paradoxalmente, ele requer a representação, pois só surge cristalizado no significante, que representa sua morte. É o que traduz a frase de Lacan: "o significante faz surgir o sujeito ao preço de cristalizá-lo" (Lacan citado por Miller, 2000). Se considerarmos, inicialmente, a primeira experiência de satisfação como correspondente à instauração da imaginarização do gozo, convém lembrar que ela também estabelece o gozo como ponto de inserção do sujeito no aparelho significante.

No animal existe um saber instintual que possibilita a realização do coito através da correspondência entre Imaginário e Real. Um breve exemplo dessa colagem pode ser verificado na constatação de que uma pomba atinge a maturidade sexual mediante a visão de um semelhante da mesma espécie. Por tal motivo, quando se coloca um espelho diante desse animal, obtém-se o mesmo resultado, evidenciando que ele não se engana quanto aos traços imaginários do objeto sexual determinado pelo real orgânico. Por outro lado, no ser falante, a intervenção do Simbólico estabelece a inexistência da relação sexual Real-Imaginária, tal como ocorre nos outros animais, forçando-o na direção da construção de uma unidade promovida pelas palavras, que possa estabelecer alguma equivalência com a relação sexual para sempre perdida. O sentido é sexual porque faz suplência ao sexual que sempre falta (Lacan, [1973-74]). Essa unidade, sempre falha, é possibilitada pontualmente nos efeitos de sentido que emergem do remetimento de um significante a outro. O efeito de sentido resultante do trilhamento representado no binário S1 - S2, que corresponde à articulação significante inconsciente, não tem intenção de significação e, portanto, não está a serviço do diálogo, mas da realização do gozo possível para o falante (Henry, 2004).

Lacan diz que lalangue, palavra traduzida como alíngua, está relacionada à língua materna (Lacan, 1985b). Miller, por sua vez, considera que através de alíngua, transmite-se a coletânea dos traços do Outro em que cada um inscreveu seu desejo (Miller, 1996a). Dessa forma, podemos supor que alíngua se vincula à língua materna na medida em que diz respeito à repetição aos traços do Outro que marcam o desejo do sujeito. O fenômeno essencial de alíngua não é o sentido, mas o gozo (Miller, 1996b). Dessa forma, alíngua não está comprometida com o significado das palavras, mas com a gramática e com a repetição, pois retorna como um estribilho, assim como o registro da primeira experiência de satisfação. O motor de alíngua não é a comunicação, mas a homofonia - o que desloca o foco da função da linguagem em direção à estrutura da fala. No discurso inconsciente, o significante, despojado do lastro de significado, faz emergir efeitos de sentido capazes de se propagar e proliferar ao infinito, mas que costumam se aglutinar num sentido. Dito de outro modo, na medida em que não há relação sexual, esta se dá por intermédio do sentido precipitado do sem-sentido que caracteriza alíngua.

A alíngua se sustenta no mal-entendido que mobiliza o sentido, fazendo com que se cruze e se multiplique. É porque há alíngua que todo sentido é equivocado. Ela diz respeito a um gozo promovido pela unidade vinculada ao efeito de sentido e tem, simultaneamente, função de escoamento de sentido (Lacan, [1973-74]), na medida em que toda palavra é ambígua. Assim, a alíngua diz respeito ao que é da ordem do Real no campo da linguagem (Lacan, [1971-72]).

As noções de alíngua e efeito de sentido possibilitam inserir o que é descrito por Freud como experiência de satisfação numa abordagem linguageira. Apresenta a vantagem de, ao levar em conta o vínculo inelutável com o Outro, salientar que ele pode ou não estar acoplado a uma intenção de dizer. Dissociado da intenção de dizer, o efeito de sentido corresponde a uma unidade vinculada ao gozo da fala promovida por alíngua que estabelece uma relação de continuidade entre sentido e sem-sentido. Alíngua se vincula tanto ao sentido proveniente da experiência de satisfação quanto ao sem-sentido, anterior a qualquer simbolização. O autista torna manifesta, de um modo privilegiado, essa relação com a fala que não passa pela comunicação, mas que, nem por isso, deixa de implicar um gozo.

Lacan distinguiu um saber sobre alíngua de um saber fazer com alíngua. O saber sobre alíngua corresponde a uma construção de saber capaz de estabelecer laço social. Assim, a linguagem é uma elucubração de saber sobre alíngua (Lacan, 1985b). O saber fazer com alíngua, por sua vez, diz respeito a um saber capaz de fazer emergir um gozo que não implica num enodamento. O inconsciente é testemunho de um saber fazer com alíngua (1985b), pois é um saber que se define como um gozo vinculado ao significante que não está, necessariamente, atrelado a um sentido. Lembremos da afirmação de Lacan de que: "se se pode dizer que o inconsciente é estruturado como uma linguagem, é no que os efeitos de alíngua, que já estão lá como saber, vão além de tudo que o ser que fala é suscetível de enunciar" (Lacan, 1985b). Por outro lado, o encadeamento significante inconsciente chega à realidade na forma de um saber não sabido - um enigma - que sustenta o laço social. Portanto, o inconsciente atesta um saber fazer com alíngua que, ao se organizar como discurso inconsciente - na medida em que é estruturado como uma linguagem - é, também, uma elucubração de saber sobre alíngua.

Alíngua é correlativo à disjunção Real implicada no sentido Imaginário - o semblante - através do campo Simbólico do significante. É a falta de sentido que sustenta os efeitos de sentido que, por sua vez, possibilitam o gozo fálico, que Lacan denomina, neste contexto, gozo semiótico (Lacan, [1973-74]). A alíngua é pura diferença que encontra seu saber fazer à medida que essa diferença se introduz no campo da linguagem. Esse avanço na teorização da psicanálise permite sustentar a hipótese de uma anterioridade de alíngua ao significante mestre, de tal forma que o campo de alíngua, antes de ordenar os significantes, põe a nu um enxame de significantes sem efeito de sentido. Isso permite supor um saber fazer com alíngua anterior ao saber sobre alíngua.

 

3. O gozo no autismo

Kanner propôs que não havia diferença entre os autistas que falavam e os que não falavam, pois "a linguagem não servia para transmitir mensagem aos outros" (Kanner, 1997), e sugeriu que o emprego das palavras no autismo deixa às claras um uso diverso daquele que parecia a razão de ser da fala: a comunicação. Freud, ao elaborar a lógica dos sintomas de seus pacientes, indicara que há, nas palavras, uma satisfação alheia à necessidade de comunicação. Lacan chamou-a de gozo.

A crença que se tem no sentido das palavras dificulta a percepção da defasagem que há entre gozo e comunicação. A criança autista não compartilha desse engano. Isso a coloca sensivelmente apartada do discurso social, o que vem comprovar que estar na linguagem não garante que se esteja no discurso. Os discursos são formados de representações e se caracterizam pelo enlace que vincula gozo e significação. A problemática autista favorece a explicitação da defasagem entre comunicação e gozo, na medida em que diz respeito a um modo de estar na linguagem atrelado a um gozo que nada tem a ver com a significação. Ao revelar a desconexão entre sujeito e Outro, o autista explicita a estrutura de gozo que caracteriza a fala.

O autismo vem evidenciar a possibilidade de uma fala não ser causada pela intenção de significação. Nesses casos, uma vez que se trata do falante, devemos considerar, com Miller, que o motor da enunciação persiste sendo a pulsão - embora desvinculada da intenção de significação - e que o que se produz é o gozo (Miller, 1998). Trata-se de um comportamento atípico da pulsão em que o gozo não emerge enlaçado pela palavra, produzindo um sentido imaginário, mas em sua pureza real. Em decorrência disso, a realidade que se produz na tensão da relação entre o sujeito e o Outro não assume a organização de um campo passível de ser compartilhado socialmente.

Na conferência de Genebra, ao afirmar que os autistas não nos ouvem quando nos ocupamos deles (Lacan, 1985c), Lacan sugere que, para o autista, não parece haver pacto possível com o Outro. Antonio di Ciaccia abordou essa solidão dizendo que para o autista só existe o Um-sozinho, o Um-sem-o-Outro (Ciaccia, 2005), onde a linguagem é puro gozo que independe da identificação primitiva. Trata-se, portanto, de um gozo distinto daquele que é promovido pela experiência alucinatória primitiva.

Rosine Lefort, por sua vez, ao considerar que no autismo "não há gozo do balbucio" (Lefort, 1984), referiu-se à ausência do gozo que se marca na identificação primitiva com S1, onde o registro de um traço diferencial remete à alteridade e inaugura uma cadeia significante com possibilidade infinita de proliferação. O gozo fálico advém da emergência da representação e da experiência alucinatória de satisfação, que estabelecem a captura do sujeito nas malhas do Outro simbólico. Não ocorrendo dessa forma, torna-se pertinente a interrogação sobre o gozo que pode comparecer no lugar desta "falha" na constituição da Vorstellung.

A articulação significante S1 S2 vincula o gozo à significação fálica, onde o sujeito é identificável com os equívocos inerentes ao sentido presente nessa significação. A teoria de alíngua estabelece que existe uma cadeia sem efeito de sentido, anterior ao ordenamento significante. Esse encadeamento sugere que há um saber fazer com alíngua anterior ao saber sobre alíngua, marcado pela relação de simultaneidade entre os significantes que caracteriza um gozo que não depende do sentido veiculado pelo discurso. Tais elaborações teóricas são de crucial importância para situar o gozo autista como um gozo de alíngua.

 

4. Conclusão

A abordagem de Lacan nos permite considerar os trilhamentos, estabelecidos por Freud no "Projeto para uma Psicologia Científica", como o encadeamento de significantes. A existência desses trilhamentos é a marca diferencial do ser humano e o ponto de sustentação de sua realidade. Essa rede signficante se estabelece a partir de marcas da relação com o Outro na medida em que o significante, ao cingir a impossibilidade real de repetir uma experiência mítica de satisfação, possibilita o estabelecimento de um gozo vinculado a uma significação, ainda que provisória. É o gozo fálico, que está em jogo na ilusão da comunicação e sustenta o laço social.

O autista expressa uma desconcertante indiferença com relação àqueles que se endereçam a ele. Sua fala é precária, suas expressões, incompreensíveis, caracterizando-se pelo não estabelecimento do laço social sustentado no gozo fálico.

Os fenômenos que se verificam na clínica do autismo destacam que, diante do impedimento da captura do sujeito nas malhas do gozo fálico, esse trabalho de enlaçamento semiótico ocorre a céu aberto, no real. O significante comparece no que seria o auge de sua materialidade impedido de realizar o remetimento que lhe é característico, persistindo num registro de simultaneidade, atemporal.

De acordo com Lacan, a alíngua é responsável pelo equívoco na linguagem. Desprotegido do equívoco que alíngua imprime ao significante, o imaginário comparece no real como terrorífico e o gozo que advém nesse lugar congela o sujeito, como se estivesse submetido ao olhar da medusa. O permanente trabalho autista no sentido de neutralizar o Outro parece confirmar essa noção. Impedidos de elucubrar o falacioso saber sobre alíngua que caracteriza o discurso, os autistas são, entretanto, seres de linguagem que apresentam um saber fazer com alíngua.

Dessa forma, podemos considerar que, assim como as histéricas convocaram Freud a ocupar o lugar de analista ao endereçar-se ao Outro no lugar de sujeito-suposto-saber, o autista convida o analista a participar de seu saber fazer com alíngua e, dessa forma, a esvaziar a plenitude do gozo de seu Outro Real.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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NOTA

1 Em francês, essaim, que quer dizer enxame, é homófono de S1.

 

 

Recebido em setembro/2008.
Aceito em dezembro/2008.

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