SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.18 número1Características de uma clínica psicanalítica com crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade socialA fabricação da loucura na infância: psiquiatrização do discurso e medicalização da criança índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Estilos da Clinica

versão impressa ISSN 1415-7128

Estilos clin. vol.18 no.1 São Paulo abr. 2013

 

ARTIGO

 

Estudo psicológico de um caso de distúrbio de linguagem

 

Psychological study of a case of language disorder

 

Estudio psicológico de un caso de perturbación del language

 

 

Maria da Graça Chamma Ferraz e FerrazI; Tassiana Barbeiro FragosoII; Andréa Regina Nunes MisquiattiIII

IProfessora do Departamento de Fonoaudiologia da Universidade Estadual Paulista (UNESP – Campus Marília), coordenadora do Núcleo de Escuta Psicológica ao Paciente da Comunicação (PACO ESCUTA) do Centro de Estudos da Educação e da Saúde (CEES) da Universidade Estadual Paulista (UNESP), Marília, SP, Brasil. Av. Santo Antônio, 2066 17506-040 – Marília – SP – Brasil. dagraca7@gmail.com
IIFonoaudióloga. Colaboradora do Núcleo de Escuta Psicológica ao Paciente da Comunicação (PACO ESCUTA) do Centro de Estudos da Educação e da Saúde (CEES) da Universidade Estadual Paulista (UNESP – Campus Marília), Marília, SP, Brasil. Rua Padre Francisco de Abreu Sampaio, 269/91C 13036-140 – Campinas – SP – Brasil. tassianafragoso@gmail.com
IIIDoutora em Linguística pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (FFLCH/USP), colaboradora do Núcleo de Escuta Psicológica ao Paciente da Comunicação (PACO ESCUTA) do Centro de Estudos da Educação e da Saúde (CEES) da Universidade Estadual Paulista (UNESP – Campus Marília), Marília, SP, Brasil. Av. Hygino Muzzy, 737 17525-900 – Marília – SP – Brasil. amisquiatti@uol.com.br

 

 


RESUMO

Buscamos descrever o caso de um menino de 6 anos, portador de distúrbio de linguagem associado a transtornos neurológicos, em terapia da linguagem. Relacionando as características psicopatológicas do paciente com um comprometimento neurológico pré-frontal, entendemos que os dois resultam em manifestações de agressividade verbal e física, bem como no distúrbio severo da linguagem. Esperamos ter contribuído para a compreensão dos distúrbios da comunicação associados aos sintomas psicogênicos e de transtornos neurológicos.

Descritores: distúrbio da linguagem; distúrbios psicogênicos; relação simbólica; vínculo objetal.


ABSTRACT

Our intention was to describe the case of a six-year-old boy, carrier of a language disturbance associated to neurological disorders, in language therapy. Our goal was to build instruments for the diagnosis of similar cases. Relating the patient's psychopathological characteristics with a neurological disease, we understood that both results in manifestations of verbal and physical aggressiveness as well as in the severe disturbance of the language. We hope we have contributed to the understanding of the disturbances of communication associated to psychogenic symptoms and of neurological disorders.

Index terms: language disorder; psychogenic disturbances; symbolic changes; objetal relations.


RESUMEN

Nuestra intención fue describir el caso de un niño de seis años, portador de una perturbación del lenguaje asociado a un problema neurológico, en la terapia del lenguaje. Relacionando las características psicopatológicas del paciente con un compromiso neurológico prefrontal, entendemos que los dos resultan en manifestaciones de agresividad verbal y física, así como en la perturbación severa del lenguaje. Esperamos haber contribuido a la comprensión de las perturbaciones de la comunicación asociadas a los síntomas psicogénicos y de problemas neurológicos.

Palabras clave: perturbación del lenguaje; perturbaciones psicogénicas; intercambios simbólicos; vínculo objetal.


 

 

1. Introdução

Nossa proposta de trabalho, enquanto profissionais de formação psicológica ou fonoaudiológica, membros de uma equipe multidisciplinar, é proceder a estudos na tentativa de traçar perfis dos pacientes da comunicação que apresentam sintomas psicogênicos e, consequentemente, contribuir para a prática diagnóstica e terapêutica junto a eles.

Este trabalho buscou relatar o perfil de um paciente com sintomas de distúrbio psicogênico associado a distúrbio neurológico. Luiz, que contava 6 anos e 6 meses à época deste estudo, foi encaminhado pela escola para a terapia fonoaudiológica. Sua condição psicológica, neurológica e fonoaudiológica, então, era bastante precária. A seguir, comentaremos as três instâncias referidas, buscando fundamentação na psicanálise e em estudos neurológicos.

 

A condição fonoaudiológica

Luiz apresenta linguagem oral pouco desenvolvida, considerando que suas primeiras palavras foram emitidas aos 2 anos e 8 meses. Comunica-se preferencialmente pela fala, respondendo quando solicitado e trocando turnos, mas com frases curtas e às vezes com uma única palavra. Em alguns momentos, ele apresenta fala sem significado e descontextualizada. Além disso, poucas vezes inicia uma conversa. Comunica-se com a mãe apontando o que quer, possui fala parcialmente ininteligível, e revela distúrbio fonético, fonológico e gagueira. Quanto à funcionalidade de objetos domésticos, tais como copo, faca, pente, caneta, etc., a criança mostra um bom desempenho.

Segundo Peña-Brooks e Hedge (2000) e Wertzner (2002), citados por Wertzner, Amaro e Teramoto (2005),

o distúrbio fonológico é definido como uma alteração de fala caracterizada pela produção inadequada dos sons e uso inadequado das regras fonológicas da língua, com relação à distribuição do som e ao tipo de sílaba, que resultam no colapso de contrastes fonêmicos, afetando o significado da mensagem. A causa do distúrbio é desconhecida, sendo a gravidade e a inteligibilidade de fala de graus variados. (p. 186)

Wertzner et al. (2005), citando Stoel Gammon e Dunn (1985), comentam que,

do ponto de vista linguístico, a literatura aponta que as crianças com distúrbio fonológico têm características de fala similares, tais como inventário de sons reduzido, estrutura silábicas simples, e uso de um número limitado de processos fonológicos, em geral semelhantes aos das crianças normais, sendo que algumas usam processos idiossincráticos. (p. 186)

O desvio fonético caracteriza-se por um comprometimento motor com etiologia orgânica. Ele pode ser causado por uma falha na arcada, produzida pela perda de um dente, ocasionando alterações na produção fonética. Pode ser também consequente da presença de um "frênulo lingual" (uma pequena tira de tecido que une a língua ao assoalho da boca) curto ou grosso, ou mesmo da ausência de frênulo. Essas situações inadequadas de frênulo lingual (vulgarmente conhecidas como "língua presa") impedem a movimentação adequada da língua para a produção de alguns fonemas.

Aliada às condições fonético-fonológicas já explicitadas, temos no caso de Luiz a precariedade no estabelecimento de relações simbólicas no plano das operações psíquicas, cognitivas e linguísticas. Estamos falando da dificuldade de aquisição da estrutura mental a que Jean Piaget (1969) chamou de "função simbólica", que se forma no período entre 2 e 7 anos de idade. Essa estrutura é fundamental para a aquisição da linguagem porque é ela que possibilita o movimento de representação mental.

Pensar o conceito de representação mental implica trabalhar com o conceito de "signo linguístico". A teoria linguística nos oferece a definição do signo como sendo composto por significante (imagem) e significado (conceituação sobre o "referente", a "coisa"). Um signo linguístico, portanto, corresponde a um conceito sobre uma dada realidade e a uma imagem (fônica, gráfica ou gestual) que possa comunicar esse conceito de interlocutor a interlocutor, em uma dada comunidade sociolinguística. A representação mental é justamente esse movimento que remete o indivíduo, a partir de um significante, a um significado. Podemos nos referir a esse movimento de representação mental também como "operação significante", que permite ao indivíduo comunicar-se em seu ambiente sociolinguístico.

A nossa experiência terapêutica, em equipe multiprofissional, tem deixado óbvio que a aprendizagem dos signos tem início no desenvolvimento psíquico e que um psiquismo malformado impossibilita a aprendizagem das operações significantes. Entendemos ainda que a aprendizagem dos signos "mãe", "pai" e "filho", que acontece nos primórdios da constituição do psiquismo e no plano dos afetos, é precursora e condição indispensável para a constituição do sujeito das operações significantes nos planos psíquico, cognitivo e linguístico. Sugerimos que a aprendizagem dos primeiros signos, "pai", "mãe" e "filho", no caso de Luiz, não aconteceu de forma satisfatória. Passamos, a seguir, à análise das condições de desenvolvimento psicológico de Luiz, buscando mostrar como a precariedade do sujeito psíquico pode ter acarretado a precariedade do desempenho linguístico.

 

A condição psicológica

Luiz apresenta comportamentos agressivos na maior parte do tempo das sessões terapêuticas. Mostra, ainda, dificuldade em simbolizar, ou seja, não é capaz do jogo de "faz de conta" e não sabe brincar. Lembrando Laplanche e Pontalis (2001), quando explicitam o conceito psicanalítico de relações simbólicas, sugerimos que a dificuldade de simbolizar de Luiz indica transtornos na constituição das relações simbólicas. Como comentamos anteriormente, tais relações são fundamentais, desde o plano da constituição do sujeito psíquico até a constituição do sujeito linguístico – este último, necessário para um desempenho satisfatório da linguagem. Entendemos com a psicanálise lacaniana (Vallejo & Magalhães, 1991) que os elementos de organização do inconsciente, os significantes, estão associados à situação edípica (Vallejo & Magalhães, 1991). Os significantes são representações das experiências vividas principalmente durante a fase fálica do desenvolvimento do psiquismo. A operação significante que constrói o inconsciente e vai, simultaneamente, permitir a constituição do sujeito da linguagem é movimento de reapresentação do mundo ao ego; um movimento obediente às leis universais do psiquismo humano. Isto quer dizer: um movimento de fundação de modelos humanos de efetuação dos afetos. Laplanche e Pontalis (2001), indicando o conceito freudiano de complexo de Édipo, observam que os referidos modelos são fundados à imagem das relações efetuadas no triângulo familialista, pai-mãecriança, pensado por Freud. As relações simbólicas, portanto, são da instância da fundação do sujeito psíquico, ou seja, da instância da inscrição da natureza primária, instintual, na Ordem Simbólica (Vallejo & Magalhães, 1991).

A agressividade apresentada por Luiz pode ser compreendida a partir dessa dificuldade de reapresentação da realidade ao ego. Seu comportamento está mais fundado em ações instintuais, e é evidente que encontrou dificuldade no estabelecimento das relações objetais, ideia explicitada por Laplanche e Pontalis (2001) que designa os modos produtivos de relações do indivíduo com o seu mundo, apresentando resultados complexos de uma certa organização da personalidade a partir do recalcamento da pulsão incestuosa. Sugerimos que a criança encontrou dificuldades na constituição do ego e no estabelecimento de vínculos afetivos satisfatórios.

Luiz é filho adotivo. A mãe adotiva relatou ter superprotegido a criança pelo fato de esta apresentar disritmia cerebral desde os 2 anos e 8 meses. Esse problema neurológico pode ter levado, de fato, a mãe adotiva a superproteger a criança, o que contribui intensamente para o enfraquecimento de vínculos objetais. Luiz apresenta comportamentos bastante agressivos com colegas de escola, professores e terapeutas. Em geral, se comporta de maneira inadequada para a sua idade e refere-se constantemente a situações relacionadas com a morte de pessoas e animais.

Segal (1975) afirma que a posição esquizoparanoide, uma das fases do desenvolvimento psicológico esperado, é caracterizada pela divisão do psiquismo em experiências boas (seio bom) e experiências más (seio mau). No desenvolvimento chamado normal, as experiências boas vividas pela criança predominam sobre as experiências más. No desenvolvimento normal, a posição esquizoparanoide é caracterizada por uma divisão entre objetos bons e maus, e entre o ego que ama e o ego que odeia. No desenvolvimento esperado, as experiências boas predominam sobre as más. No desenvolvimento malsucedido, o seio mau prevalece na condução da vida de relações.

O comportamento manifesto de Luiz sugere que as experiências más sobrepuseram-se às experiências boas e o dado de que a mãe de Luiz é superprotetora nos leva a questionar se o comportamento materno permitiu o processo adequado de constituição do ego e a emergência satisfatória do Outro lacaniano (Vallejo & Magalhães, 1991), ou seja, da estrutura mínima para a introjeção das regras do convívio social. Lacan pensa o inconsciente como uma cadeia de significantes (Vallejo & Magalhães, 1991). Esses significantes estão associados ao complexo de Édipo, pois são representações de experiências vividas principalmente durante a fase fálica, que ocorre por volta dos quatro anos de idade. Os significantes associam-se na construção de significados (eu, outro, pai, mãe, filho) intrapsíquicos. Os modelos são fundados à imagem das relações efetuadas no triângulo familialista (pai-mãe-criança) pensado por Freud. Se a relação mãe-criança não for mediada pelo pai, o interditor do corpo materno, a construção do mundo intrapsíquico pode se alterar, pois esta construção ocorre pela atuação do símbolo fálico, representante do poder castrador do pai ou da mãe. A mãe porta o "falo embutido", que é o significante intrapsíquico fundamental, pois construirá os primeiros significados do mundo psíquico, tais como pai, mãe e filho. Então, pode-se dizer que o falo simbólico, enquanto significante fundamental do psiquismo, dá forma aos conteúdos inconscientes, que são estruturas simbólicas.

Considerando que Luiz dorme entre os pais desde bebê, além de ter sempre recebido uma atenção especial de sua mãe, sem grande atuação do pai, entendemos que a interdição paterna não foi feita corretamente, já que o pai não interferiu na relação da mãe e da criança. Dessa forma, Luiz não atribui poder ao falo (ao pai); não criou esse significante fundamental do inconsciente, responsável pela fundação do superego e, portanto, da socialização. A consequência disso foi a fragilidade egoica e a precariedade da construção do mundo intrapsíquico. Tal mundo é uma estrutura simbólica que a psicanálise descreve como sendo produto de uma perda, pelo fato de a criança ter renunciado ao corpo da mãe, em nome do pai.

Os comportamentos de Luiz não parecem demonstrar internalização das leis sociais, internalização essa que se refletiria em comportamentos mais adequados à vida social, linguagem mais adequada e mais eficiente na comunicação. Sugerimos que Luiz apresenta um psiquismo diferenciado, do tipo psicótico, o que dificulta sua inserção na linguagem e no grupo social. Na patologia do tipo psicótico, a pessoa apresenta maior ou menor dificuldade de inserção na linguagem, dependendo da maior ou menor fragilidade do ego. O processo simbólico tem início na instância do psiquismo e se estende para a instância cognitiva de constituição dos signos pertinentes à língua da comunidade em que a pessoa se insere. A constituição dos significados e significantes linguísticos, bem como a manutenção de uma relação estável (não flutuante) entre eles, se torna possível porque o significante fálico, intrapsíquico, recortou os primeiros significados, quais sejam: pai, mãe, filho. Na ausência ou na precariedade da linguagem, a inserção social se torna muito mais difícil também.

Dissemos acima que a criança se refere constantemente ao tema da morte e repete compulsivamente as palavras "sangue" e "fogo". Exemplo de diálogo entre criança e terapeuta da linguagem: a terapeuta lê um trecho de história infantil: "Joãozinho colocou as pedras no bolso". Em seguida, pergunta à criança: "O que Joãozinho fez mesmo, Luiz"? Ao que a criança responde: "Pegou fogo!" Em outro momento a terapeuta folheia um livro de figuras com a criança, aponta para a figura de um pato e pergunta: "Você gosta do pato?", ao que a criança responde: "O pato tem sangue? Em casa mata pato".

Verificamos com a mãe adotiva que não se matam animais na casa da criança, mas sim no sítio em que seus pais trabalham e onde Luiz já foi várias vezes. A mãe disse que assim que Luiz chega ao sítio corre a jogar pedras nas galinhas, dar pauladas e tentar matar os porquinhos. Sugerimos que o instinto de morte prevalece no psiquismo de Luiz, e seus comportamentos demonstram a prevalência de seio mau, de experiências ruins e mortíferas. Nesse caso, o ego deflete o instinto de morte, convertendo-o, em parte, em agressividade (Segal, 1975). Os comportamentos agressivos de Luiz foram relatados pela mãe: "ele bate e puxa o cabelo dos colegas de escola e chama a terapeuta por 'biscatinha'".

Além disso, a mãe referiu que a criança limpa a secreção do nariz nas outras crianças e sempre tenta "sujar" as pessoas com o que tiver na mão. Certa vez, manchou propositalmente, com sumo de tangerina, a calça de uma jovem que passava pela rua.

 

A condição neurológica

Outro fator que pode estar produzindo os comportamentos inadequados dessa criança é um comprometimento no lobo encefálico frontal, que é caracterizado principalmente por alterações no comportamento. De acordo com o DSM-IV-R: Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (Associação Americana de Psiquiatria, 1994) as lesões no lobo frontal podem proporcionar uma alteração significativa dos modos de comportamento do indivíduo. As alterações dizem respeito particularmente à expressão das emoções, das necessidades e dos impulsos. O quadro clínico pode apresentar também alteração das funções cognitivas, do pensamento e da sexualidade.

A área cerebral pré-frontal, que é a área mais anterior do cérebro, pode estar relacionada com algum tipo de memória para fatos recentes, com a escolha das opções e estratégias comportamentais mais adequadas à situação física e social do indivíduo, assim como com a capacidade de alterá-las quando tais situações se modificam. Machado (1993) observa que essa área também é responsável pela manutenção da atenção e controle do comportamento social. De acordo com a descrição das funções da área pré-frontal, e de acordo com exame neurológico realizado, é possível inferir uma alteração, no caso de Luiz, já que seus comportamentos e atitudes também permitem essa inferência. Como já foi dito, Luiz apresenta comportamentos agressivos e socialmente inadequados, fala descontextualizada e dificuldade na resolução de problemas cotidianos de relacionamento social. Além disso, não mostra habilidade de monitorar seu próprio comportamento de acordo com a sua idade e em poucos períodos toma alguma iniciativa. Portanto, concordando com Mattos, Saboya, & Araújo (2002), essa criança apresenta comprometimento sócioocupacional que é compatível com uma alteração de funções frontais.

Rodríguez, Albuquerque & Arenas (1999) apontam que o quadro clínico de um indivíduo com alterações no lobo frontal pode comportar alterações das funções cognitivas, do pensamento e da sexualidade, segundo as classificações internacionais.

Quando observamos Luiz, não temos dificuldades de inseri-lo na descrição da Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde – décima revisão (Organização Mundial da Saúde, 1993) e do DSM-IV-R (Associação Americana de Psiquiatria, 1994), visto que, de acordo com resultados de avaliação fonoaudiológica, essa criança também apresenta comprometimentos nas funções cognitivas. Luiz mostra comportamentos não esperados para a sua idade com relação à sexualidade. Segundo informações colhidas com a mãe, ele expõe seu órgão sexual aos colegas da escola e a pessoas desconhecidas, bem como o manipula frente a qualquer pessoa. Machado (1993) descreve outra dificuldade encontrada em pacientes com alterações frontais: a de fixação da atenção. Essa habilidade também se encontra comprometida no caso de Luiz.

 

Considerações finais

Relacionando as características psicopatológicas do paciente com o comprometimento neurológico préfrontal, conclui-se que os dois fatores estudados se somam, resultando nas alterações comportamentais e de linguagem apresentadas durante as sessões de terapia da linguagem. Esperamos, com este estudo, ter contribuído para o conhecimento dos efeitos dos estados psicológico e neurológico desfavoráveis no desenvolvimento linguístico. Esperamos, ainda, ter contribuído para a compreensão das manifestações de sinais fonoaudiológicos nos distúrbios da comunicação associados aos sintomas psicogênicos. Queremos ter contribuído também para a reafirmação da importância de se compreender as condições psicológicas e a condição de comprometimento neurológico de localização frontal para o encaminhamento multiprofissional, em especial o psicológico, bem como para definir as condutas terapêuticas fonoaudiológicas adequadas, em casos como o que foi descrito. Sugerimos que a desconsideração da condição psicológica, em casos como o descrito, pode tornar a terapia da linguagem improdutiva e, mesmo, ineficiente.

 

REFERÊNCIAS

Associação Americana de Psiquiatria (1994). DSM-IV-R: Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (4a ed.). Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Laplanche, J. & Pontalis, J. B. (2001). Vocabulário de psicanálise (P. Tamen, Trad., 4a ed.). São Paulo: Martins Fontes.         [ Links ]

Machado, A. B. M. (1993). Neuroanatomia funcional (2a ed.). São Paulo: Atheneu.         [ Links ]

Mattos, P., Saboya, E. & Araújo, C. (2002). Seqüela comportamental pós-traumatismo craniano: o homem que perdeu o charme. Arquivos de Neuro-Psiquiatria, 60(2A), 319-323.         [ Links ]

Organização Mundial da Saúde (1993). Classificação de transtornos mentais e de comportamento da CID-10: descrições clínicas e diretrizes diagnósticas (10a ed.). Porto Alegre: Artes Médicas.         [ Links ]

Piaget, J. (1969). Seis estudos de psicologia (M. A. M. D'Amorim, Trad.). Rio de Janeiro: Editora Forense.         [ Links ]

Rodríguez, J. L. S., Albuquerque, J. T. L. & Arenas, A. M. S. (1999). Estudio de un caso de Síndrome Frontal. Anales de Psicología, 15(2), 291-301.         [ Links ]

Segal, H. (1975). Introdução à obra de Melanie Klein. Rio de Janeiro: Imago.         [ Links ]

Vallejo, A. & Magalhães, L. C. (1991). Lacan: operadores da leitura (2a ed.). São Paulo: Perspectiva.         [ Links ]

Wertzner, H. F., Amaro, L. & Teramoto, S. S. (2005). Gravidade do distúrbio fonológico: Julgamento perceptivo e porcentagem de consoantes corretas. Pró-Fono Revista de Atualização Científica, 17(2), 185-194. Recuperado em 16 de julho, 2012, de SciELO (Scientific Electronic Library Online): http://www.scielo.br        [ Links ]

 

 

Recebido em abril/2012.
Aceito em outubro/2012.