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Psicologo informacao

Print version ISSN 1415-8809

Psicol inf. vol.10 no.10 São Paulo Dec. 2006

 

Artigo

 

 

Qualidade de vida na velhice segundo a percepção de idosos freqüentadores de um centro de referência

 

Quality of life in the old-age among the users of an elderly reference center

 

 

Cláudia Emi Yokoyama*; Renata Soares de Carvalho*; Marília Martins Vizzotto**

* Universidade Metodista de São Paulo.
** Pontifícia Universidade Católica de Campinas.

 

 

 


RESUMO

A expectativa de vida tem aumentado em todo o mundo e viver mais e com qualidade tornou-se um grande desafio; de modo que estudar mais o assunto torna-se assim relevante. O presente estudo teve por objetivos: a) descrever características sócio-demográficas e culturais de uma população idosa freqüentadora de um centro de referência; b) investigar a qualidade de vida destes idosos segundo sua própria percepção; c) identificar semelhanças e diferenças entre homens e mulheres quanto à percepção de boa e de má qualidade de vida. Investigou-se 30 idosos, por meio de um questionário adaptado a partir de uma Escala de Qualidade de Vida. Os idosos, freqüentadores de um Centro de Referência do ABC paulista, foram dez homens e 20 mulheres com idade de 60 a 82 anos. A análise foi feita por agrupamento de dados, levantamento de categorias, e medidas as freqüências e médias das respostas. Os resultados indicaram que os idosos valorizaram e atribuíram, em uma escala de prioridades à "boa qualidade de vida" as dimensões da vida humana como: saúde física; equilíbrio emocional; valorizaram a manutenção de bons vínculos afetivos com a família e amigos; participação em atividades de lazer; após, valorizaram as condições financeiras favoráveis, o suporte de órgãos públicos no suprimento de necessidades como transportes e educação e, por último a espiritualidade. Quanto à "má qualidade de vida" foram igualmente atribuídas as duas primeiras dimensões: má saúde geral, estado emocional negativo e, diferente da boa qualidade, apontam as dificuldades financeiras como terceira dimensão, seguindo-se as demais igualmente. Observou-se ainda, que nas respostas sobre má qualidade, as perdas naturais da velhice surgem como uma preocupação, porém de modo subjetivo. Sugere-se que na implantação de medidas profiláticas, os técnicos se baseiem mais na percepção do próprio idoso.

Palavras-chave: qualidade de vida; velhice; percepção do idoso.


ABSTRACT

Life expectancy has increased all over the world and living longer with quality has become a great challenge, therefore, further studies on the subject are revealing relevant. The present study had as objectives: a) to describe social-demographic and cultural characteristics of an elderly population in a reference center for the elderly; b) to investigate the quality of life of these elder men and women according to their own perception; e c) to identify resemblances and differences between men and women towards their perception of good or bad quality of life. 30 elder people participated in this study. The quality of life was evaluated through a Quality of Life Scale. The elderly, users of a reference center in the ABC Paulista area, were 10 men and 20 women, aging 60 to 82 years. The analysis was made through the grouping of data and creation of categories. The frequencies and averages of the answers were also taken. The results indicated that the elderly valorize and attribute their good quality of life to dimensions of the human life such as: physical health; emotional equilibrium; keeping good affective bonds with family and friends; participating in recreational activities; favorable financial conditions; public organs support in providing their needs and education; and, spirituality. As for the bad quality of life, the first two dimensions pointed out were equally referred: bad general health and negative emotional state. Only the third dimension mentioned was different from the previous category: financial difficulties. The remaining dimensions were the same as the ones previously mentioned. The answers related to bad quality of life revealed that the natural losses of the old-age appeared as a matter of concern, however in a subjective manner. The implantation of prophylactic measures is suggested to be based on the elderly perception.

Keyword: quality of life; old-age; elderly perception.


 

 

 

Introdução

O interesse por este tema surge de uma preocupação social e ao mesmo tempo científica, na medida em que o crescimento acentuado da população idosa no Brasil traz consigo inúmeros problemas nos âmbitos político, econômico, comportamental e de saúde geral. O país ainda não está preparado para abrigar uma população idosa. Conta-se 15 milhões de pessoas com 60 anos ou mais, que representam cerca de 8,6% da população brasileira (IBGE: Censo demográfico 2000). Este mesmo censo menciona um fenômeno mundial de crescimento da população idosa, pois, em 1950 havia cerca de 204 milhões de idosos no mundo, e em 1998 já se contava 579 milhões de pessoas, ou seja, um crescimento de quase oito milhões de pessoas idosas por ano. Atualmente, os números mostram que um em cada dez pessoas tem 60 anos de idade ou mais, e as projeções para 2050 estimam que a relação será de um para cinco em todo o mundo, e de um para três nos países desenvolvidos. Em São Paulo, o Projeto Sabe (Saúde, Bem-estar e Envelhecimento), que faz parte de um estudo multicêntrico coordenado pela OPAS – Organização Pan-Americana de Saúde que levanta dados da América Latina e Caribe observou, no período de outubro de 1999 a dezembro de 2000, um total de 2.143 pessoas de 60 anos e mais (LEBRÃO; DUARTE, 2003).

Sobre este crescimento, Medeiros (1989) menciona que o mesmo se deve ao desenvolvimento científico-tecnológico, nos campos sociais e da saúde, com novas descobertas da cura de diversas doenças e diminuição da taxa de mortalidade. Laurenti (1992) acrescenta que a automação das tarefas no trabalho e a melhora geral na qualidade de vida nas cidades têm diminuído os desgastes físicos, possibilitando assim uma maior expectativa de vida na população idosa. Já Ribeiro (1999) aponta para o fato de que a maior longevidade se deve às grandes revoluções no campo da saúde pública – prevenção, promoção de saúde e educação sanitária que vieram se desenvolvendo ao longo dos últimos dois séculos. Bertolini (2001) aponta que o crescimento acentuado da população idosa levou o meio científico a assumir estudos dos processos psicológicos dessa etapa da vida, procurando entender as ansiedades e angústias dos idosos visando propiciar uma vida melhor desta fase do desenvolvimento humano, por meio da promoção da saúde e aumento da qualidade de vida, criando condições para um envelhecimento saudável.

Qualidade de vida
Hoje se tem dado grande importância à concepção de qualidade de vida e, de certo modo, esta se associa a uma maior longevidade. Sobre este aspecto, no Brasil, Neri (1999) aponta inúmeras variáveis relacionadas ao grande tema, tratando-os como indicadores de bem-estar na velhice, e considera, na longevidade, a saúde biológica, a saúde mental, a satisfação, o controle cognitivo, a competência social, a produtividade, atividade, a eficácia cognitiva, o status social, a renda, a continuidade de relações informais em grupos primários e rede de amigos. A autora salienta que essas multiplicidades de indicadores estão relacionadas à qualidade de vida na velhice e podem ter diferentes impactos sobre o bem-estar subjetivo.

Entre as pesquisas sobre qualidade de vida na terceira idade estão os estudos de Fleck et al. (2003), que investigaram as condições que permitem uma boa qualidade de vida na velhice. O resultado desse estudo mostrou que os idosos constituem um grupo particular e, como tal, apresenta especificidades de importante relevância para a qualidade de vida. Este estudo mostrou que a idéia de qualidade de vida constitui um constructo multidimensional. Há uma tendência de associação entre qualidade de vida e bem-estar ou sentir-se bem. Os aspectos de qualidade de vida salientados pelo grupo focal foram: saúde, sociabilidade, suporte social, atividade física, possibilidade de dar suporte e apoio e sentimento de utilidade. Alguns grupos apontaram religiosidade, condições financeiras estáveis e boas condições de vida como fatores importantes de qualidade de vida.

Paschoal (2000) salienta que qualidade de vida é uma palavra de difícil conceituação, que veio sofrendo transformações ao longo do tempo. Em sua pesquisa a palavra qualidade é definida como indicador de superioridade e a palavra vida inclue a saúde, relações familiares satisfatórias, condições financeiras estáveis, entre outros aspectos.

Deste modo, entendemos que o conceito de qualidade de vida não pode ser fechado e irá variar de acordo com o que está em questão, ou seja, quais aspectos estão sendo analisados; qualidade de vida então não pode ser vista como um conceito único.

Ainda nesta linha de raciocínio, Paschoal (2000) explica que na ocasião da Segunda Guerra Mundial o conceito de "boa vida" foi utilizado para expressar a conquista de bens materiais como: casa, carro, rádio, televisão, aplicações financeiras, boa aposentadoria, viagens etc. Mas, logo surgiram referenciais econômicos para mensurar e comparar qualidade de vida entre cidades, países e culturas diferentes. O PIB (Produto Interno Bruto) passou a ser um indicador, assim como a renda per capita, taxa de desemprego entre outros; dessa forma, concluía-se que os países com um melhor poder econômico teriam suas populações com uma melhor qualidade de vida.

Com tantas transformações esse conceito cresceu, ultrapassou as barreiras econômicas e passou a abranger também o desenvolvimento social, envolvendo: saúde, educação, trabalho, lazer e outros; ampliando mais ainda os indicadores como a mortalidade infantil, a taxa de evasão escolar, o nível de escolaridade, o nível de poluição, bem como as condições de moradia e trabalho, entre outros.

Partindo desta concepção, Paschoal (2000) prefere avaliar a qualidade de vida de forma subjetiva, ou seja, considera a qualidade de vida percebida pela pessoa (grifo nosso). De modo que o autor passa a valorizar a opinião dos indivíduos, pois não poderia avaliar a qualidade de vida dentro de um modelo construído previamente, já que o importante era conhecer a percepção das pessoas sobre o que era qualidade de vida para elas. Assim, sugeriu que se fizesse uma seleção dos aspectos mais relevantes, como o "experiencial da vida", e incluiu a soma das sensações, percepções, emoções, humores e atos cognitivos do indivíduo; as "atividades realizadas na vida", em que se encaixam as ações da vida; as "realizações na vida", que são os resultados das ações; os "eventos na vida", são aqueles que a pessoa tem ciência e são atribuídos a ela e as "circunstâncias da vida", que são como os eventos da vida.

Tendo em vista essas considerações, o autor constrói um instrumento amplo que dá vazão aos aspectos subjetivos e que norteiam o avaliador, levando-se em consideração nuances das várias dimensões da vida humana.

Compartilhamos aqui com esse autor que a medida de qualidade é uma vida máxima e completa, que engloba todos essas dimensões e que são percebidas por ele e pelos quais é influenciado.

Atividades e lazer na terceira idade
Segundo Deps (1989), a atividade é um meio privilegiado do idoso obter bem-estar psicológico. O termo atividade pode incluir atividades físicas e mentais, individuais ou grupais. A atividade praticada regularmente empresta significado e satisfação à existência, quer pelo compromisso e responsabilidade social nela implícitos, quer pela oportunidade de manter convívio social. A maioria das teorias de ajustamento ao envelhecimento concorda que o bem-estar emocional é, em parte, resultado da interação social e da força do vínculo social.

A mesma autora acrescenta que compartilhar de atividades grupais com pessoas da própria geração favorece o bem-estar do idoso porque facilita a emergência de significados comuns e a maior aproximação interpessoal e permite a ocorrência de catarse.

É neste sentido que buscamos em nosso estudo contemplar a população idosa freqüentadora de um Centro de Referência do Idoso, popularmente conhecido como "CRI". O Centro de Referência do Idoso é um local para atividades e lazer, mantido pela prefeitura do município.

As perdas na terceira idade e elaboração dos lutos
Entende-se aqui, no presente estudo, que perdas estão relacionadas às crises evolutivas. Para Erikson (1978) crise de desenvolvimento significa períodos da evolução do indivíduo em que o comportamento é diferenciado. Esses períodos são de transição e são nesses que ocorrem intenções cognitivas e afetivas nas etapas do desenvolvimento normal da personalidade. Ainda, as crises acidentais, que são crises por acontecimentos vitais envolvendo perda, ameaça de perda ou aumento de suprimento de bens afetivos, físicos ou materiais.

Para explicar a teoria da crise, Caplan (1964) parte do conceito de homeostase adaptativa, desequilíbrio e reequilíbrio. Dá ênfase ao aspecto cognitivo na solução das crises, ou seja, mecanismos prévios de solução de problemas, deixando em segundo plano o aspecto afetivo.

Numa visão psicanalítica, porém não em desarmonia com Gerald Caplan, Simon (1989), explica que a crise se deve ao aumento ou redução significativos do espaço no universo pessoal, que é o conjunto formado pela pessoa, o psicossomático. Este universo vai além dos bens materiais ou espirituais e situações socioculturais.

Nas situações que geram crise por perdas, ainda segundo este mesmo autor, aparecem os sentimentos de depressão e culpa. Nas crises por aquisição ou ganho, os sentimentos são de insegurança, inferioridade e inadequação. Estes sentimentos podem se expressar de diversas formas, como: medo de não corresponder à situação, medo de não agüentar as pressões e ceder, de desagregar-se etc.

Nas crises por perdas significativas, perante sentimentos de depressão e culpa, o indivíduo corre o risco de tentar aliviar-se por auto-agressão, que pode ser mutilação pessoal, material ou situacional, ou até o suicídio, ou ainda, projeção da culpa em alguém menos resistente. Nas crises por ganho, os riscos são de fuga direta, abandono do ganho no universo pessoal, ou fuga indireta, por provocar a desaparição dissimulada do acréscimo no universo pessoal. Existe ainda, segundo este mesmo autor, um outro risco na crise por aquisição, que a pessoa admite mais que pode, por arrogância e voracidade e, portanto, sai da crise sustentada pela vida afora com ganhos que, em vez de aumentar, diminui sua eficácia adaptativa.

Podemos afirmar que a velhice faz parte do ciclo natural da vida, configurando-se como um processo complexo que envolve perdas e ganhos, os quais são intensificados conforme os fatores internos e externos, estrutura social e cultural onde o sujeito é situado.

Rosa (1993) esclarece que as formas de desadaptação costumam aparecer no processo de somatização, pode em alguns casos ser extremamente violenta e até levar à morte. Neste processo, o idoso transforma seus medos em problemas físicos, como hipertensão, diabetes, colites ulcerativas, enfarte, asma brônquica, histerias de conversão nas suas diferentes formas de paralisia, cegueira etc. A hipocondria vai se acentuando de tal maneira que acaba por não admitir que o indivíduo tome parte da vida, reduzindo-o a um estado vegetativo. Embora não sejam freqüentes esses casos extremos, essas perdas orgânicas podem ser sentidas como insuportáveis e levam ao suicídio.

Com relação aos problemas emocionais dos idosos entendemos que a perda é o tema predominante característico das experiências emocionais dos idosos. Uma pessoa deve lidar com a tristeza de múltiplas perdas (morte do cônjuge, amigos, familiares e colegas), mudança de status e prestígio profissional e declínio das habilidades física e saúde.

Na velhice, as perdas se tornam mais marcantes. Quando falamos em perdas, estamos nos referindo não apenas a morte, mas também as outras perdas que nos acompanham durante toda a nossa vida.

Nas palavras de Viorst (1998, p. 13-14):

(...) perdemos, não só pela morte, mas também por abandonar e ser abandonado,
por mudar e deixar coisas para trás e seguir nosso caminho. E nossas perdas
incluem não apenas separações e partidas do que amamos, mas também a perda
consciente ou inconsciente de sonhos românticos, expectativas impossíveis, ilusões
de liberdade e poder, ilusões de esperança – e a perda de nosso próprio eu jovem,
o eu que se julgava para sempre imune às rugas, invulnerável e imortal.

As perdas são necessárias à vida, pois para desenvolvermos precisamos perder, abandonar e desistir. Mas na velhice estas renúncias, sem dúvida, geram ansiedade, tristeza e dor. O medo da morte também aparece, e apesar de não ser universal, é um sentimento que a maioria das pessoas não pode suportar.

Diante de tantos sentimentos e emoções vivenciados pelos idosos, alguns se tornam introspectivos e isolados, tendo poucas atividades; outros idosos mantêm uma vida ativa, substituindo antigos projetos por novos relacionamentos; e outros ainda que puderam amadurecer com as experiências da vida, buscando fazer o que ainda se pode de acordo com os limites da idade.

Quando um indivíduo se sente bem, ele valoriza a vida e, portanto, o "estar pronto" para morrer é muito relacionado à qualidade de vida. O futuro para os idosos torna-se menos longínquo e a proximidade da morte suscita nos idosos uma menor tolerância às banalidades (BOEMER et al., 1991).

Diante do exposto, este estudo apresenta por objetivos: a) descrever características sócio-demográficas e culturais de uma população idosa freqüentadora de um centro de referência, b) investigar a qualidade de vida destes idosos segundo sua própria percepção; c) identificar semelhanças e diferenças entre homens e mulheres quanto à percepção de boa e de má qualidade de vida.

Considerando os resultados obtidos em pesquisas envolvendo alunos de Psicologia, o objetivo da presente pesquisa será o de verificar se existe diferença entre a descrição de contingências de universitários de diferentes cursos em relação a uma tarefa de construção de frases.

Considerando os resultados obtidos em pesquisas envolvendo alunos de Psicologia, o objetivo da presente pesquisa será o de verificar se existe diferença entre a descrição de contingências de universitários de diferentes cursos em relação a uma tarefa de construção de frases.

Considerando os resultados obtidos em pesquisas envolvendo alunos de Psicologia, o objetivo da presente pesquisa será o de verificar se existe diferença entre a descrição de contingências de universitários de diferentes cursos em relação a uma tarefa de construção de frases.

 

Método

Participantes
A amostra foi constituída por 30 idosos de ambos os sexos, sendo 20 mulheres e dez homens com idade de 60 a 70 anos; 73,3% se denominou de cor branca; 50% eram casados; 20% divorciados e solteiros e 30% viúvos. Estes eram freqüentadores de um Centro de Referência para Idosos. Esta população freqüentadora do Centro é pertencente à classe sócio-econômica cultural média, conforme Censo Demográfico (IBGE, 2000), que compreende pessoas aposentadas ou trabalhadoras que recebem uma renda familiar mensal de aproximadamente R$ 1000,00. Estes idosos foram selecionados por conveniência (REA; PARKER, 2000), ou seja, entrevistaram-se apenas aqueles que se dispuseram a participar do estudo.

Local
A pesquisa foi realizada em um Centro de Referência do Idoso (CRI), situado na cidade de São Bernardo do Campo. Este centro caracteriza-se por ser um local para atividades e lazer, mantido pela prefeitura do município. Dentre as atividades de lazer estão o baile da terceira idade, artesanato, oficina de tricô, aulas de violão e aula de canto, ginástica, aulas de alfabetização entre outras atividades

Instrumento
Para a coleta de dados foi utilizado um Questionário adaptado a partir do modelo de Paschoal (2000). O questionário investiga dados de qualidade de vida segundo a própria percepção do idoso. O instrumento oferece dimensões para essa medida, como: dimensão Saúde Geral, dimensão Psicológica, dimensão Social, dimensão Econômica.

Procedimento
Os sujeitos foram abordados individualmente, enquanto aguardavam o início de alguma atividade, ocasião em que lhes foram explicados os objetivos do estudo, o conteúdo do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e efetuado convite para participarem. Após aceite, cada sujeito assinou o Termo de Consentimento, autorizando a divulgação acadêmica dos dados desde que mantidas em sigilo suas identidades. A aplicação do questionário foi realizada em forma de entrevista individual, com duração aproximada de 30 minutos.

Tratamento dos Dados
Os dados foram tratados de forma quantitativa, descrevendo-se as médias para análise das características sócio-demográficas e culturais; principais atividades de lazer realizadas. Buscou-se, de acordo com o propiciado pelo instrumento, analisar as categorias sobre boa e má qualidade de vida sob níveis de dimensão humana (dimensão social; dimensão psicológica; saúde geral; meio ambiente e religiosidade).

 

Resultados e discussão

Os resultados são descritos a seguir por categorias de análise, apresentando- se dados sócio-demográficos da amostra estudada e, posteriormente, uma descrição da percepção do idoso sobre qualidade de vida.

1. Caracterização da Amostra Estudada
Julgamos pertinente uma descrição mais detalhada da amostra de idosos estudada, pois oferece vários vértices de discussão e não somente uma descrição metodológica de explicação da amostra estudada. Nas tabelas a seguir serão apresentadas características como Faixa Etária, Sexo, Estado Civil e Cor da amostra estudada.

Na tabela 1, observa-se que dos 30 idosos estudados, dez (33,3%) são do sexo masculino e 20 (66,7%) do sexo feminino. Conforme explicado anteriormente, a seleção destas pessoas foi por "conveniência", ou seja, referindo- se apenas às pessoas que se dispuseram a participar do estudo. Neste processo tivemos um número maior de mulheres a se disporem a participar do que a de homens; muito embora, o número de mulheres freqüentadoras do Centro de Referência do Idoso – CRI, é seguramente maior do que a de homens. Estes dados também nos remetem àqueles observados nos últimos censos. Segundo dados do censo de 2000, as mulheres correspondiam a 55,1% da população idosa, o que significa que, para cada 100 mulheres há 81 homens idosos; essa diferença é explicada pelo fenômeno mundial da maior expectativa de vida nas mulheres, que em média vivem oito anos a mais que os homens (IBGE, 2002). Outra fonte importante são os dados da pesquisa Sabe que apontam para uma estrutura etária de mulheres mais envelhecidas do que homens, pois uma em cada quatro mulheres tem 75 anos ou mais, enquanto que entre os homens essa proporção é de um para cinco. Dessa forma, pode-se dizer que a velhice é feminina, pois a maior longevidade da mulher acarreta nesse diferencial na composição por sexo (LEBRÃO; DUARTE, 2003).

Em termos sociais, as implicações da feminização tornam-se evidentes. Segundo Camarano (2002 apud IBGE, 2002), grande parte das mulheres são viúvas, vivem sozinhas, não possuem experiência de trabalho no mercado informal e são menos educadas. No entanto, Debert (1999 apud IBGE, 2002) vê de forma otimista a condição atual das mulheres idosas, pois tanto a velhice quanto a viuvez podem representar uma certa independência ou mesmo uma forma de realização.

 

 

 

Em relação à cor, quando perguntados, 73,3% dos idosos disseram ser brancos, 10% negros e pardos e 6,7% amarelos. Sobre esses dados "cor da pele", eles coincidem com a população geral pois, segundo informações do último censo demográfico de 2000, o Brasil possuía uma população de 170 milhões de habitantes, dos quais 53,7% se classificaram como brancos, seguido por pardos (38,4%), pretos (6,2%) e amarelos (0,4%) (IBGE, 2002).

Nas categorias referentes ao "estado civil", os casados representaram 50% dos idosos estudados. Os homens casados são maioria (80%) e 35% das mulheres apresentaram este estado civil. Os viúvos perfazem 30% da amostra, sendo que a maior incidência de viuvez (35%) está entre as mulheres. Entretanto, ao somarmos o número de pessoas em condição civil "sem parceiro" (viúvos, solteiros e divorciados) verificamos que a outra metade (50%) se encontra nessa condição, sendo 65% entre as mulheres e 20% entre os homens.

 

 

Estes dados trazem indicativos de que os idosos freqüentadores do CRI – Centro de Referência do Idoso, buscam esta referência independente da sua condição civil. Mais interessante ainda é observar que estes idosos (50%), mesmo casados, buscam freqüentar o CRI, fato que indica que o estereótipo de que o idoso sozinho ou sem companhia é aquela que busca centros de referência de lazer para idosos.

 

 

Quanto à categoria "escolaridade" observa-se que a maioria (66,7%) apresenta escolaridade baixa (Ensino Fundamental Incompleto), seguindo-se do Ensino Fundamental e Médio, ambos com 16,7%. Todavia, ao somarmos o total do que chamamos de baixa escolaridade, verificamos que este perfaz um total de 83,4%.

Historicamente, e já amplamente difundido entre nós, está o fato de que nas décadas de 1930 até 1950, o Ensino Médio (Escola Normal e outros cursos) era restrito aos segmentos sociais mais privilegiados. Dessa forma, a baixa escolaridade média dessa população idosa parece ser ainda conseqüência dessa época.

Também podemos entender que estes dados remetem a Neri (2000), quando destaca que as pessoas nascidas entre 1900 e 1929 não tiveram facilidade para ingressar no sistema educacional, sendo que da população total, entre 58% e 64% ultrapassaram a idade madura sem terem sido alfabetizados; entre 20 e 23% terminaram o primeiro grau; entre 4,8 e 6%, o segundo grau e apenas 1,1% concluiu o curso superior, sendo que a maioria entrou no mercado produtivo pelo setor agrícola. Entre os idosos da amostra, os dados parecem refletir as condições da qual vivenciaram em épocas remotas.

Também é interessante observar que, de acordo com o censo de 2000 (IBGE, 2002), os níveis de alfabetização entre homens e mulheres é diferenciado. Os homens (67,7%) são mais alfabetizados que as mulheres (62,6%). Uma explicação para essa diferença seria a de que até o ano de 1960 os homens tinham mais acesso à escola do que as mulheres, as quais eram quase que exclusivamente dedicadas ao lar. A força de trabalho feminino é que irá determinar um mais elevado nível de escolaridade, exigido pela competitividade da mão de obra, movimento que em nosso país se deu após 1960.

Outro aspecto relevante em relação à escolaridade de idosos é apresentado pelos dados levantados pelo Sabe (LEBRÃO; DUARTE, 2003), quando aponta que em Cuba mais de 50% da população idosa possui a mais alta educação, enquanto no Brasil, nossos idosos, independente de idade e sexo, possuem menos de 20% nessas condições.

 

 

Como se pode verificar pela tabela 5, a grande maioria dos idosos desta amostra cohabitam com seus esposos(as) ou com outros membros da família. Os idosos que vivem sozinhos representam uma pequena parcela da amostra, ou seja, 16,7%. Observa-se ainda que os idosos que residem sozinhos são mulheres.

Vale ressaltar que entre as viúvas (tabela 3), apenas 28,6% delas vivem sozinhas, sendo que a grande maioria (71,4%) vive com seus familiares.

Também é interessante associarmos esses dados com os da tabela 3, a qual mostra que o número de pessoas em condição civil "sem parceiro" (viúvos, solteiros e divorciados) representa 65% de mulheres e 20% de homens. Verifica-se então que estes estão sem parceiro, mas não são necessariamente pessoas solitárias, já que vivem na companhia de outras pessoas. De modo que, a grande maioria da amostra de idosos estudados não são aqueles considerados "solitários". O sentimento de solidão também parece ser evitado, ou não presente entre estes sujeitos, pois os mesmos freqüentam o CRI – instituição que provavelmente amplia ou ativa a rede social destes sujeitos. Ramos (1992 apud Cerqueira e Oliveira, 2002) também indica dados similares aos encontrados em nosso estudo; dados que apontam que 12% de pessoas idosas vivem sozinhas e 32% vivem em casas com uma geração (freqüentemente casais); 28% vivem em casas com duas gerações (casais ou não) e 28% vivem em casas com três gerações (casais, ou só um idoso, vivendo com filho casado e pelo menos um neto). Portanto, o número de pessoas que vive é ainda um número baixo.

Na tabela 6 a média da renda per capita foi de R$ 646,00, sendo o menor valor R$ 260,00 e o maior R$ 1.800,00; já em relação à média da renda familiar, esta foi de R$ 1.033,00, sendo que duas pessoas não souberam informar; tem-se ainda que o menor valor apresentado em renda familiar foi de R$ 260,00 e o maior R$ 5.800,00.

Os dados apontam para o fato de que os rendimentos mensais dos homens são consideravelmente maiores do que o das mulheres, somandose ainda o fato de que uma grande parcela de mulheres não tem nenhuma remuneração. Estes dados coincidem com aqueles apresentados pelo Sabe (2003), quando investiga a condição de emprego e renda da população idosa de São Paulo. Nestas investigações, o Sabe revela que a grande maioria dos idosos tinha, em média uma renda pessoal de 2,1 salários mínimos. Além da renda média ser baixa, mais de 50% dos idosos relataram não ter renda, e como esperado, as mulheres apresentaram níveis de renda inferiores aos dos homens. Dados esses amplamente coincidentes com os desta nossa pequena amostra.

Com relação ao censo 2000 (IBGE, 2002), os dados não são tão coincidentes, pois este órgão aponta que o rendimento nominal médio mensal das pessoas acima de 60 anos, responsáveis pelo domicílio à nível Brasil é de R$ 657,00 e, no Estado de São Paulo, os idosos receberam em média R$ 893,00. Os idosos de nossa amostra recebem, em média o semelhante ao país e não o esperado para São Paulo.

 

 

Outro aspecto de interessante observação, diz respeito aos idosos responsáveis pela remuneração do lar. No presente estudo não se tem este dado, porém os dados do IBGE (2002) mostram que a distribuição dos responsáveis idosos por classes de rendimento ainda se encontra extremamente concentrada nos estratos de renda mais inferiores. Por outro lado, esses idosos também apresentaram uma ligeira melhora no aspecto educacional, aumentando a proporção de idosos alfabetizados, embora a média de anos de estudo deste segmento ainda seja extremamente baixa, com cerca de 60% dos responsáveis idosos considerados analfabetos funcionais. Este é um dado de importante investigação em trabalhos futuros.

 

 

Em nosso estudo não foram abordados, de forma completa e sistemática, os indicadores sobre a qualidade da moradia (bens móveis, saneamento, tipo de construção etc.). Acreditamos ser possível vislumbrar pela tabela 7, os bens destes idosos e outros pertences como seguro saúde e seguro de vida. Vale ressaltar que do total de entrevistados, 90% possuía casa própria.

Finalizamos esta primeira parte que teve como objetivo analisar os aspectos sócio-econômico-cultural dos idosos a fim de conhecer a realidade da qual fazem parte.

A seguir, serão analisados e discutidos dados que se referem à percepção do idoso sobre boa e má qualidade de vida.

Da análise das respostas dos 30 idosos às perguntas: "O que é uma boa qualidade de vida?" e "O que é uma má qualidade de vida?", emergiram os indicadores de boa e má qualidade de vida, segundo a percepção do próprio idoso. Estes indicadores foram agrupados dentro das "dimensões da vida humana" propostas pelo próprio instrumento (PASCHOAL, 2000). Cabe ressaltar que a ordem em que as dimensões e seus indicadores aparecem referem-se à ordem de importância dada pelos idosos.

Boa qualidade de vida
As respostas sobre a questão "ter uma boa qualidade de vida" mostraram o significado que as dimensões propostas pelo instrumento tinham em suas vidas, conforme quadro 1.

 

 

O quadro 1 mostra os indicadores de qualidade de vida dessa amostra de idosos localizados em dimensões da vida, conforme preconiza Paschoal (2000) em seu instrumento. Para esses idosos, ter qualidade de vida está intimamente ligado ao significado que estes indicadores tem para suas vidas. Assim, na dimensão Saúde Geral encontrou-se o indicador Saúde, o qual mostrou que ter saúde é de importância fundamental para se ter uma boa qualidade de vida, estando diretamente relacionado com ter boa saúde física e mental, alimentação saudável, ter hábitos de vida que valorizam a saúde, como praticar exercícios físicos e não depender dos outros para viver. Algumas falas dos idosos ilustram essa compreensão: "Dormir bem"; "alimentação melhor"; "não ter doença e nem dor" (sic). Na dimensão Psicológica encontrou-se o indicador Estado Emocional Positivo, no qual qualidade de vida é dispor de recursos subjetivos para enfrentar a velhice; apontando o equilíbrio psíquico como fundamental. Segundo os idosos, isso significa ter alegria, felicidade, auto-estima, paz e sentir-se satisfeito com a vida. Em suas falas encontramos: "Ter paz"; "É se amar"; "Sempre rir"; "Ter disposição" (sic). Na dimensão Social encontramos os indicadores Relações Interpessoais Positivas e Lazer. Para os idosos da amostra, ter qualidade de vida é manter vínculos saudáveis com familiares e amigos, solidificando o suporte social na velhice. O lazer também é um indicador importante, pois promove divertimento, distração e relaxamento, contribuindo para a qualidade de vida desses idosos. Viajar, freqüentar o centro de referência do idoso, dançar, são algumas das atividades mencionadas pelos idosos como sendo indicadores de qualidade de vida. Assim, as respostas indicaram: "Ter amizades"; "Ter bons amigos e boa família"; "Conviver com os outros" (sic). Na dimensão Econômica encontrou-se o indicador Condições Financeira, que relaciona-se ao fato de que ter boa qualidade de vida é ter condições para suprir suas necessidades de alimentação, saúde, medicamentos, moradia, entre outras, para viver com dignidade. Suas falas assim expressaram: "Não se preocupar com os gastos, sem se preocupar com o amanhã"; "Ter o suficiente para comer"; "Ter condição financeira razoável" (sic). Na dimensão Meio Ambiente tem-se o indicador Suporte, indicando que qualidade de vida implica na possibilidade da existência de condições favoráveis para se locomover com segurança e respeito, por meio de transportes adequados às suas necessidades. Também implica em ter acesso à educação formal, como escolas e cursos. Na dimensão Religiosidade/ Transcendência, encontrou-se o indicador Religiosidade que indica a possibilidade de vivenciar a fé, buscar conforto e paz espiritual. Tido como indicador de boa qualidade de vida, para alguns idosos que expressaram este indicador nas seguintes falas: "Ter paz espiritual"; "Acreditar em Jesus e Nossa Senhora" (sic).

Assim, pudemos verificar, a partir do discurso desses idosos, que todas as dimensões apontadas por Paschoal (2000) foram contempladas. Os idosos de nossa amostra tiveram total discernimento das dimensões da vida em termos de qualidade. De modo que se pode dizer que esses têm boa percepção do que representa a qualidade de vida na terceira idade.

Na tabela 8, constam os dados distribuídos em indicadores de boa qualidade de vida, segundo a percepção do idoso em quantidade de respostas.

 

 

Nesta tabela 8 são apresentados esses mesmos indicadores de qualidade de vida segundo as respostas dadas pelos próprios idosos, quando se perguntou o que os mesmos consideravam sobre ter uma "boa qualidade de vida". Observa-se que nas respostas isoladas a saúde aparece em primeiro lugar, com o total de 32,9%, sendo que os homens parecem apontar mais para esse indicador do que as mulheres. Um segundo indicador é o estado emocional positivo, que aparece em 29,3% das respostas da amostra. Este indicador está relacionado aos aspectos psicológicos ou subjetivos, relativos aos sentimentos e emoções agradáveis, sendo um indicador importante de qualidade de vida, visto que entre as mulheres existe uma preocupação maior com o bem-estar subjetivo, seguido da saúde, o que difere dos homens que apontam para uma preocupação maior com a saúde. As relações interpessoais aparecem em 13,4% das respostas, seguidas do indicador lazer (12,2%). Ao analisarmos pela dimensão social, agrupando estes dois indicadores, obtivemos 25,6% das respostas da amostra. As mulheres têm uma maior preocupação com o lazer, seguido das relações interpessoais. Para as mulheres, viajar, passear, dançar e participar de atividades no Centro de Referência do Idoso são afazeres mais relevantes do que o simples fato de estar em contato com o outro. Os homens, diferentemente das mulheres, parecem ter uma preocupação maior de estar em contato com o outro, mantendo bons vínculos afetivos familiares e de amizade e menor preocupação com danças, passeios e viagens. O indicador financeiro aparece em 6,1% das respostas, o que indicou que para os idosos ter boa qualidade de vida está muito mais relacionado ao bem-estar físico, psíquico e social do que ao conforto material, mesmo apresentando rendimentos considerados baixos, pois a média da renda per capita foi de R$ 646,00 e renda familiar de R$ 1.033,00..

A religiosidade aparece em 3,7% das respostas e por fim o suporte, como ter transporte melhor e ter condições para estudar, em 2,4% das respostas.

Deste modo, estes dados coincidem com aqueles apontados pelo autor do instrumento no qual nos baseamos, Paschoal (2000), bem como nos apontamentos de Neri (1999), que em outras palavras demonstra que a qualidade de vida relaciona-se a saúde biológica, a saúde mental, a satisfação, o controle cognitivo, a competência social, a produtividade, atividade, a eficácia cognitiva, o status social, a renda, a continuidade de relações informais em grupos primários e rede de amigos. A autora salienta que esta multiplicidade de indicadores – ou variáveis, estão relacionados à qualidade de vida na velhice e podem ter diferentes impactos sobre o bem-estar subjetivo.

Estes dados sobre "boa qualidade de vida" também se aproximam muito dos de Bertolini (1993), quando esta aponta que o envelhecimento bem sucedido relaciona-se com uma competência adaptativa do indivíduo, ou seja, flexibilidade aos desafios biológicos, emocionais e sociais. Dessa forma, os indivíduos envelhecem de forma diferenciada, dependendo de como organizam suas vidas, levando-se em conta fatores históricos, culturais, genéticos e ambientais, ocorrência de doenças, durante o processo de envelhecimento.

Má qualidade de vida
O quadro 2 pretende mostrar os indicadores de má qualidade de vida e os atributos dados pelos idosos dentro de grandes dimensões do existir humano na dimensão Saúde Geral tem-se o indicador não ter saúde. Para os idosos, não ter saúde, ser doente, não gozar de adequada alimentação e depender dos outros para as atividades diárias como comer, beber, banharse e andar representaram má qualidade em suas vidas. Nas falas dos idosos, má qualidade de vida surgiu como: "Não ter saúde"; "Depender dos outros para comer, tomar banho"; "Pessoa que está numa cama dependendo dos outros" (sic). Na dimensão Psicológica tem-se o indicador Estado Emocional Negativo. Sentir desânimo, tristeza, mágoa (estados intra-psíquicos) e não dispor de recursos subjetivos para enfrentar as perdas inerentes ao processo de envelhecimento foram ressaltados pelos idosos. As falas a seguir representam bem os estados subjetivos que indicam má qualidade em suas vidas: "Sentir desânimo"; "Ter sofrimento", "Sentir tristeza"; "Reclamar de tudo" (sic). Na dimensão Econômica tem-se o indicador Condições Financeiras – dificuldades em suprir suas necessidades de alimentação, saúde, moradia, entre muitas outras, não receber mais salário, depender dos familiares são alguns dos descontentamentos apontados e que se expressam em suas falas: "Vida financeira difícil"; "Não ter teto, morar de favor"; "Gente idosa que tem que trabalhar para sustentar a família" (sic). Na dimensão Social tem-se o indicador Relações Interpessoais Negativas – não dispor de boa qualidade de vida significa não ter vínculos afetivos, amizades e apresentar dificuldades no relacionamento familiar. Para eles, má qualidade de vida é: "Não ter amizades"; "Não viver bem com a família"; "Não conversar com ninguém" (sic). Na dimensão Meio Ambiente tem-se o indicador Suporte. Má qualidade de vida implicou em dificuldades no acesso aos transportes; transportes pouco adequados para idosos se locomoverem com tranqüilidade e respeito.

 

 

Na tabela 9, constam os dados distribuídos em indicadores de má qualidade de vida, em termos quantitativos.

 

 

Na tabela 9, os dados indicam que preocupação com a saúde apareceu em 40% do total de respostas sobre "má qualidade de vida". Entre os homens "não ter saúde" foi um forte indicador de má qualidade, perfazendo 50% das respostas masculinas versus 35,3% das respostas femininas. Cabe ressaltar que, quando se referiram a "não ter saúde" esta indicou saúde física e mental, e também às condições que contribuíam para o surgimento de doença, como a falta de uma alimentação adequada.

Cabe ressaltar que uma grande preocupação destes idosos foi com a perda de sua independência e autonomia. Ficar doente pareceu significar ter de depender dos outros em suas atividades mais corriqueiras, por isso, a qualidade de vida pareceu intimamente ligada a ter saúde e, portanto, a falta dela indicou uma grande desvantagem nessa fase da vida.

Podemos também pensar que a saúde está muito diretamente ligada à manutenção da vida, e perder a saúde talvez possa ser entendido como um processo de adoecimento que tem muitas desvantagens, podendo culminar na morte do indivíduo. Em nosso estudo estas questões aparecem veladas, talvez por causa do temor suscitado no plano subjetivo.

No âmbito psicológico, o estado emocional negativo também foi um forte indicador de má qualidade de vida na velhice (30%). Uma má qualidade de vida relacionou-se ao plano subjetivo, das emoções e sentimentos. Assim, este foi o segundo indicador mais apontado para ambos, homens e mulheres, porém observa-se uma tendência maior entre as mulheres (32,4%) do que entre os homens (25%).

Ao compararmos o indicador "não ter saúde" com "estado emocional negativo", pode-se afirmar que para as mulheres existe uma preocupação tanto com a "saúde" quanto com a "saúde mental", e o parco funcionamento das dimensões – física e psicológica acarretará má qualidade de vida. Já para os homens, existe uma diferença, já que a grande preocupação é com a saúde física e menos com o estado psicológico.

As dificuldades financeiras foram apontadas como o terceiro indicador de maior preocupação entre os idosos da amostra estudada, em 18% das respostas emitidas por eles. As mulheres parecem ter maior preocupação do que os homens (20,6% e 12,5%, respectivamente). O fato das mulheres terem essa maior preocupação talvez se relacione ao fato da maioria delas serem dependentes de seus cônjuges e/ou familiares.

Também estes dados relacionados à má condição financeira (medo de ficar sem recursos) nos remetem à discussão da perda na terceira idade. Isso porque este fato também denota uma dependência de outras pessoas e uma certa impotência – agora na velhice – de poder recorrer a outros trabalhos ou "bicos" como se pode fazer quando se ainda é jovem.

Sobre este aspecto podemos lembrar Knobel (1996), quando aponta que trabalhar mentalmente, afetivamente e socialmente com esses lutos – provenientes das perdas – é uma tarefa difícil; para uma pessoa idosa isso pode ser traduzido nos momentos depressivos de raiva ou rebeldia. Também nesse mesmo raciocínio, Mello e Abreu (2003) apontam que na velhice o psiquismo passa por momentos difíceis, mas que são normais e naturais. Em cada período da vida existem dificuldades que são próprias do desenvolvimento vital normal, com suas frustrações e gratificações, que requerem um esforço de adaptação nessa fase da vida.

De forma bem abrangente, as respostas dos idosos também denunciaram além das próprias dificuldades financeiras, a preocupação com os filhos desempregados, o descontentamento do idoso em ter de trabalhar para sustentar a família, desemprego pelo fato de não serem mais aceitos no mercado de trabalho, não possuir moradia própria, muitas vezes tendo que morar de favor. Tudo isso denota uma preocupação com o que consideram má qualidade de vida.

As relações interpessoais negativas tiveram 10% das respostas entre os indicadores de má qualidade de vida, vindo na ordem de importância abaixo do indicador "condição financeira". Os dados apontaram para uma realidade social factual, concreta, já que as dificuldades financeiras interferem num envelhecimento com qualidade, sendo portanto, mais emergentes do que a preocupação na qualidade vincular. Todavia, ao compararmos as duas tabelas (8 e 9) que se referem à boa e à má qualidade de vida segundo percepção do próprio idoso, notaremos que na tabela 8 o indicador "relações interpessoais positivas" ocupa a terceira posição na ordem de prioridade para os idosos, ao passo que na tabela 9 "as relações interpessoais negativas" perde lugar para as condições financeiras desfavoráveis, ocupando a quarta posição. Podemos pensar que essa inversão de prioridades também esteja relacionada ao medo de "não ter boa saúde", porém caberia investigar melhor este aspecto em outro trabalho, pois essas dificuldades nas relações interpessoais podem indicar também dificuldades nas relações familiares e conjugais.

Por fim, a desvantagem de não se ter suporte adequado às necessidades de idosos e a falta de religiosidade foram apontados em último lugar na ordem de preocupações frente à má qualidade de vida, obtendo apenas 2% das emitidas pelos idosos.

 

Considerações finais

A idade dos idosos que participaram deste estudo está concentrada na faixa etária de 60 à 69, perfazendo 76,7% da amostra. A maioria (73,3%) se denomina da cor branca (50%), são casados, 20% divorciados e solteiros e 30% viúvos.

O nível de educação foi considerado baixo em 83,4% da amostra. A grande maioria (83,3%) dos idosos não vive sozinha, coabitando com seus familiares ou amigos.

Os dados econômicos apontam para uma média de renda per capita de R$ 646,00 abaixo do rendimento esperado para o estado de São Paulo, que é de R$ 893,00. Todavia, ao acrescentarmos os rendimentos dos membros familiares, dois salários mínimos, tendo concentração na faixa de R$ 601,00 à R$ 1200,00 em 40% da amostra, e 33,3% se encontram na faixa de R$ 1201,00 à R$ 1500,00 de rendimento familiar. 90% deles possuem casa própria e 80% tem plano de saúde. Para eles, ter boa qualidade de vida significa em ordem de importância, ter saúde, equilíbrio emocional, estar bem com a família e amigos, em interação, se divertir, ter condições financeiras, ter suporte do Estado e apoio espiritual.

A má qualidade de vida para estes idosos é não ter saúde, estado emocional negativo, não ter condições financeiras, não ter bom vínculo afetivo com a família e não estar em interação com outros, além de não ter suporte do Estado para suas necessidades básicas.

No presente estudo os achados sugerem que o conceito de qualidade de vida resulta da valorização, pelos idosos, da saúde física e mental prioritariamente, e um afastamento da espiritualidade, a qual, hipotetizamos, relaciona-se com a morte – sobre a qual não querem pensar.

O envelhecimento tem exigido respostas especialmente das políticas de saúde. E, houve indicativos neste estudo de que o Centro de Referência do Idoso é um forte aliado para um envelhecer com qualidade, pois é um local que propicia o encontro desses idosos e sua interação com as atividades propostas que representam certo grau de saúde física e psicológica.

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Recebido em: 10/09/2006
Aceito em: 01/12/2006

 

 

*Graduadas em Psicologia pela Universidade Metodista de São Paulo.
**Psicóloga, mestre em Psicologia Clínica pela Pontifícia Universidade Católica de Campinas e doutora em Saúde Mental pela Universidade Estadual de Campinas – Unicamp. Professora titular do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Saúde da Universidade Metodista de São Paulo.