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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH v.7 n.2 Rio de Janeiro dez. 2004

 

ARTIGOS

 

O impacto da hospitalização em crianças de 1 a 5 anos de idade

 

The impact of the hospitalization in children from 1 to 5 years of age

 

 

Gislene Farias de OliveiraI, II, III, 1; Francisco Danilson Cruz Dantas2; Patrícia Nunes da FonsêcaI, 3

I Universidade Federal da Paraíba
II Universidade Federal do Ceará
III Universidade Regional do Ceará

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente trabalho se propõe a identificar as reações físicas e emocionais das crianças de 1 a 5 anos. A população alvo constou de 56 crianças internadas no Hospital Pediátrico Monsenhor Pedro Rocha de Oliveira, no Crato, Ceará. Os dados foram obtidos a partir de um formulário especialmente construído para a pesquisa e da observação. Os resultados demonstraram que o grupo de crianças que tiveram acompanhantes durante a hospitalização apresentou menor freqüência de reações físicas, tais como: choro, vômitos, diarréia, taquicardia, inapetência, insônia, enurese noturna, e emocionais tais como: indiferença, medo, apatia, agressividade e irritabilidade, do que o grupo de crianças, sem acompanhantes, durante a internação. Os acompanhantes das crianças mostraram-se cooperativos com a equipe de saúde. Concluímos que se deve exigir dos governantes políticas públicas que privilegiem a criança, especialmente no que diz respeito ao direito de permanecer com um familiar quando em situação de internamento hospitalar.

Palavras-chave: Hospitalização, Crianças, Reações emocionais.


ABSTRACT

The present work if it proposes to identify the children's emotional and physical reactions from 1 to 5 years. The population objective consisted of 56 children interned at Oliveira's Hospital Pediatric Monsignor Pedro Rocha, in Crato, Ceará. The data were obtained starting from a form especially built for the research and of the observation. The results demonstrated that the children's group that they had companions during the hospitalization presented smaller frequency of physical reactions, such as: cry, vomits, diarrhea, palpitation, lack of appetite, insomnia, enuresis night, and emotional such as: indifference, fear, apathy, aggressiveness and irritability, that the children's group, without companions, during the internment. The children's companions were shown cooperative with the team of health. We concluded that she should demand from the public political rulers that they privilege the child, especially in what he concerns the right of staying with a relative when in situation of internment hospitalar.

Keywords: Hospitalization, Children, Emotional reactions.


 

 

Introdução

Nos últimos anos têm-se modificado as bases de assistência à criança hospitalizada, em decorrência de pesquisas nas áreas das ciências da saúde, humanas e sociais. Como conseqüência, faz-se necessário uma nova visão acerca dos diversos aspectos ligados a internação infantil, bem como sobre o papel da família como suporte emocional.

A revisão bibliográfica na área de internação hospitalar infantil constatou que, entre os aspectos mais freqüentemente abordados nos trabalhos, encontra-se a experiência de pacientes no manejo de procedimentos médicos invasivos, considerando ser este um importante estressor presente no tratamento de crianças hospitalizadas (Motta & Enumo, 2002, Chen, Craske, Katz, Schwartz, & Zeltzer, 2000, Costa Jr., 1999; Manne, Bakeman, Jacobsen & Redd, 1993). Entre esses trabalhos, encontram-se artigos baseados em relatos de experiência, como o de Garcia (1996), ressaltando a importância de intervenções psicossociais que minimizem a ansiedade, o medo e a angústia, tanto das crianças quanto dos familiares e profissionais de saúde frente aos procedimentos invasivos.

Estudos experimentais, como os de Manne e cols. (1993), Fegley (1988) e Redd e cols. (1987), também abordam essa problemática. Nesses estudos são experimentadas técnicas como a distração e a busca de informações para auxiliar a criança no enfrentamento das situações aversivas.

A maioria das crianças que adoecem fica mais chorosa e dependentes dos pais. Se a sua patologia for grave, a ponto de exigir uma hospitalização, seu quadro emocional tende a piorar, em função da possibilidade de afastar-se de casa e dos seus familiares, por conta do ambiente hospitalar a que será submetida e dos procedimentos médicos.

Há um despreparo das crianças no que se refere à experiência hospitalar e aos procedimentos correlatos. O motivo é baseado no princípio de que o medo de algo desconhecido resulta numa exacerbação da fantasia. Portanto, diminuir os elementos de desconhecimento para a criança resultaria em menor medo. Quando as crianças não sentem o medo paralisante de enfrentamento, elas são capazes de direcionar suas energias no sentido de lidar com os estresses inevitáveis da hospitalização e assim, se beneficiarem do potencial de crescimento inerente à experiência (Leifer, 1996).

Estruturar o tempo é uma estratégia efetiva para normalizar o ambiente hospitalar e aumentar o sentido de controle da criança. O dia de uma criança não-hospitalizada, especialmente durante os anos escolares, é estruturado com períodos específicos para comer, vestir-se, ir para a escola, brincar e dormir. Entretanto, esta estrutura horária desaparece quando a criança é hospitalizada.

Na maior parte do tempo de hospitalização, a criança fica restringida ao leito, submetida à passividade, cercada de pessoas estranhas e que, para ela, trazem mais dor e sofrimento. Dor representada pelas agulhas, cortes, medicações que ardem na pele, dentre outros procedimentos desagradáveis, até mesmo para um adulto. Imagens, cheiros e sons estranhos no hospital, comuns para os profissionais de saúde, podem ser ameaçadores e confusos para as crianças. Deste modo, cabe ao profissional avaliar os estímulos presentes no ambiente a partir do ponto de vista da criança e protegê-la desses elementos visuais e auditivos ameaçadores e desconhecidos.

A natureza das condições das crianças no hospital aumenta a probabilidade delas experimentarem procedimentos mais invasivos e traumáticos enquanto estiverem hospitalizadas. Esses fatores tornam-nas mais vulneráveis às conseqüências emocionais da hospitalização. É comum a ocorrência de mecanismos de defesa, do tipo regressão, onde a criança retorna a uma fase anterior à de sua real idade, como uma forma de proteção. Pode também ocorrer a recusa de alimentos sólidos, diminuição do vocabulário, perda do controle dos esfíncteres, além de outras reações emocionais (Sdala & Antônio, 1995).

Apesar de um grande avanço ter ocorrido quanto à atenção pediátrica, muito do que é feito com as crianças para curar a doença e prolongar a vida é traumático, doloroso, desagradável e ameaçador. Os profissionais de saúde devem dirigir sua atenção para a prestação dos cuidados da forma menos traumática possível.

Partindo do princípio de que as crianças podem reagir aos estressores da hospitalização antes da admissão, durante e após a alta, é possível e necessário intervir no processo da saúde pública. Neste sentido, o presente trabalho é uma tentativa de conhecer os aspectos que envolvem a criança durante a hospitalização.

Muitas crianças, especialmente aquelas com menos de 4 anos de idade, demonstram alterações comportamentais temporárias após a alta. Estas alterações constituem um resultado de separação dos entes queridos, da falta de oportunidade para formar novos vínculos e do ambiente estranho. Sem uma atenção especial que privilegie a satisfação das suas necessidades psicossociais, as conseqüências negativas da hospitalização prolongada podem ser graves.

Lima (1985) ressalta que hospitalização é para a criança uma experiência que, em maior ou menor grau, repercute no seu desenvolvimento emocional, tanto positiva como negativamente. Sabe-se que, em especial, nos primeiros anos de vida, a perda, ou mesmo o afastamento do objeto de amor, pode gerar uma descrença em relação aquele objeto, o que futuramente terá repercussões nas suas relações com as pessoas e com o mundo.

A criança enferma reage à situação de acordo com a idade, personalidade e os hábitos familiares. Casos mais comuns são: a regressão (volta às fases já superadas, tais como, chupar o dedo), a depressão, a ansiedade, o choro, o sossego (sendo considerada boazinha pela equipe), o medo de escuro e do pessoal de branco (Oliveira, 1993).

A carência dos cuidados maternos quando da hospitalização depende de vários fatores tais como; idade da criança, tempo de internação, qualidade da relação família antes da separação e a presença ou não de uma substituta materna adequada. A satisfação das necessidades físicas e emocionais da criança parece, pois, contribuírem para que os objetivos do tratamento sejam alcançados, mais facilmente (Lima, 1985).

Informar às crianças seus direitos, enquanto hospitalizadas, fomenta uma maior compreensão e pode aliviar alguns dos sentimentos de impotência que elas tipicamente experimentam. Os hospitais que fornecem serviços às crianças devem ter uma política hospitalar ampla sobre os direitos e responsabilidades destes pacientes e de seus pais e/ou responsáveis, inclusive no que compete ao acompanhamento de um adulto a criança hospitalizada.

No Brasil, a preocupação com a permanência dos pais no hospital só veio a se tornar mais efetiva após a promulgação da Lei nº. 8.069, de 13 de julho de 1990. Essa regulamenta o Estatuto da Criança e do Adolescente e dispõe em seu Artigo 12: “os estabelecimentos de atendimento à saúde deverão proporcionar condições para a permanência em tempo integral de um dos pais ou responsáveis, nos casos de internação de criança ou adolescente”. (Brasil, 1991)

A inserção de um acompanhante e seu envolvimento no processo terapêutico é relevante, principalmente, no caso de crianças com menos de 5 anos de idade, quando exigem uma atenção maior dos cuidadores. Autores como Cypriano e Fisberg (1990) e Coyne (1995) concordam com a idéia de que a separação da mãe é um fator que provoca efeitos diversos no processo de hospitalização infantil, especialmente, naquelas menores de seis anos de idade.

Como se pode ver anteriormente, as alterações nas políticas hospitalares durante os últimos anos refletem uma atitude modificada em relação aos pais; muitos hospitais não mais consideram os pais como “visitantes” e enfatizam sua presença durante todo o período de hospitalização da criança. Atualmente, a maioria dos hospitais oferece horários de visitação irrestritos para os pais nas unidades pediátricas gerais (Farias, Araújo, Dockhorn & Pereira, 2003).

A hospitalização para a criança, devido ao custo associado à ausência da família, apresenta um impacto, não restrito apenas ao paciente, mas também a todo o sistema de saúde.

Para que tal abordagem seja útil, necessário se faz, uma ação conjunta de todas as pessoas envolvidas com as crianças. Além de ser indispensável uma diretriz específica para se desenvolver uma uniformidade de tratamento, mais adequado às suas necessidades.

Apesar das muitas transformações tecnológicas e sociais que o mundo vem enfrentando, os profissionais de saúde têm como desafio, tornar o ambiente hospitalar público ou conveniado com o Sistema Único de Saúde - SUS, mais humano e mais adaptado para receber a clientela infantil.

Os números oficiais são muito abrangentes e, nem sempre retratam a situação em seus detalhes mais significativos. Aspectos sócio-emocionais, geradores de comportamento preventivo ou não, são muitas vezes desprezados.

Frente a essa realidade, o presente estudo teve como objetivo identificar e comparar as reações emocionais das crianças de 1 a 5 anos hospitalizadas com/sem acompanhantes, bem como conhecer o comportamento dos familiares que acompanham as crianças durante o período de hospitalização.

Trabalho apresentado no V Congresso da Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar, de 7 a 10 de setembro de 2005 em São Paulo.

 

Método

Amostra

Participaram 56 crianças de 1 a 5 anos de idade, internadas no Hospital Pediátrico Monsenhor Pedro Rocha, no município do Crato, estado do Ceará, por um período de três meses. Dessas, 28 crianças estavam internadas com acompanhamento de familiares e 28 não dispunham de acompanhantes.

O critério de idade foi adotado, tendo em vista, ser nesta idade, que os efeitos da hospitalização são mais evidentes, durante a internação (Farias e cols., 2003).

Instrumento

Os dados foram obtidos a partir de um formulário e de observação in loco.

O formulário abordava os seguintes aspectos: identificação da criança (sexo, idade, tempo de internação, se estava com acompanhamento familiar) e as reações físicas (por exemplo: choro, crise de vômito, inapetência) e emocionais (por exemplo: indiferença, apatia, medo, agressividade) demonstradas pela criança durante a internação. Constava, também, de um item que fazia menção às reações demonstradas pelos acompanhantes das crianças durante a internação.

Procedimento

As informações acerca dos participantes foram obtidas diretamente da equipe de enfermagem e da observação das crianças. A observação foi realizada durante o período da internação, objetivando verificar quais as reações físicas e emocionais manifestadas pelas crianças hospitalizadas com e sem acompanhantes.

A observação foi feita com crianças com menos de 12 horas de internação, pelo fato das primeiras horas serem permitirem averiguar a adaptação da criança ao ambiente hospitalar.

Cabe destacar que esta pesquisa cumpriu todos os requisitos éticos estabelecidos para pesquisa com seres humanos.

 

Resultados e Discussão

1. Análises dos dados acerca das reações físicas apresentadas pelas crianças com e sem acompanhamento familiar durante a internação hospitalar.

TABELA 1 – Distribuição de freqüência das reações físicas das crianças hospitalizadas apresentadas durante o período de internação

 

 

Observando a Tabela 1, pode-se verificar que, no grupo de crianças com acompanhamento familiar durante a internação, a enurese noturna foi a reação física mais freqüente com 30,8% dos comportamentos observados, seguida do choro com 25,6%, inapetência 12,9%, taquicardia 11,5%, insônia 8,9%, crises de vômitos 6,5% e hipertermia 3,8%.

Quanto às crianças que ficaram hospitalizadas sem acompanhamento familiar, verificou-se que, das reações físicas observadas, a mais freqüente foi o choro com 22,8%, seguida pela enurese noturna 20,4%, inapetência 14,6%, taquicardia 13,8%, insônia 13%, vômito 8,1% e hipertermia 7,3%.

Considerando os dois grupos, crianças hospitalizadas com acompanhantes e sem acompanhantes, os resultados mostraram que as reações físicas se apresentaram da seguinte forma: enurese noturna 24,4%; choro 23,9%, inapetência 13,9%, taquicardia 12,9%, insônia 11,5%, vômito 7,4% e hipertermia 6% dos comportamentos observados.

Apesar da enurese noturna ser a reação física de maior freqüência no resultado geral dos dois grupos, no presente estudo, não será levada em consideração isoladamente, tendo em vista que, nesta faixa de idade, esta reação não é considerada um distúrbio. A mesma será observada juntamente com o conjunto das outras reações observadas, como informação adicional.

O choro foi a reação física que apareceu como a segunda mais freqüente em ambos os grupos de crianças hospitalizadas. Essa reação pode ter surgido em virtude da criança estar passando por uma situação desconhecida, onde tem a presença de objetos que furam, machucam e assustam. Ademais, a reação foi maior no grupo de crianças sem acompanhamento familiar constante, como visto na Tabela 1, possivelmente por essas se sentirem sozinhas para enfrentar o ambiente desconhecido. Ao mesmo tempo, o choro, pode estar se revelando, neste caso, como um pedido de ajuda da criança, de apoio ou de conforto frente às vivências hospitalares.

Carvalho (1983) refere que quando um adulto estranho se aproxima, e tenta manter um contato direto com a criança, esta desvia o olhar, chora, grita ou tenta de alguma maneira evitar o encontro, entretanto, quando está em companhia da mãe/responsável esta reação é abrandada.

Com relação à inapetência, verificou-se que, de forma geral, essa reação foi mais presente nas crianças hospitalizadas sem acompanhamento familiar. Segundo Souza (1979), o medo, a insegurança e a ansiedade decorrentes das mudanças e dos fatores envolvidos na hospitalização dão origem a vários distúrbios na conduta da criança, dentre esses a inapetência. A criança tende a modificar seus hábitos de alimentação (ex. retorno ao uso da mamadeira, anorexia ou superalimentação) e, em alguns casos, apresenta regressão na linguagem e no comportamento cotidiano (ex. volta a sugar os dedos).

Em relação à taquicardia, os dados mostraram que essa reação física foi mais freqüente nas crianças sem acompanhamento familiar. De acordo com Brunner e Suddarth (1992), as reações fisiológicas, como a ansiedade, são reações do sistema nervoso-autônomo e da respiração, aspectos que causam mudanças na pressão sangüínea e na temperatura. Isto vem mostrar que a situação de hospitalização pode causar ansiedade e medo à criança, refletindo assim no seu sistema fisiológico.

Sabe-se que a criança traz para o hospital uma experiência de vida, com hábitos e rotinas domésticas. Com a internação, há mudanças nos seus cuidados habituais, impostos pela hospitalização, o que pode vir a provocar a insônia. Observou-se também que as crianças que sofreram a separação dos familiares reagiram mais ao ambiente hospitalar com esse tipo de comportamento.

Na análise dos resultados, observou-se que tanto as crianças internadas com e sem acompanhamento apresentaram crises de vômito, embora as últimas tenham demonstrado uma maior suscetibilidade a esse tipo de reação.

O impacto da hospitalização parece representar para a criança uma experiência, por si só, estressante, já que é uma vivência do desconhecido, do estranho. Lindquist (1993) acredita que a ausência de familiares junto à criança aumenta a sua sensação de que, a hospitalização, é para ela um castigo, uma agressão ou abandono por parte dos familiares. Sendo assim, ela pode utilizar o vômito como uma forma de externalizar sua dor ou de chamar a atenção.

A hipertermia foi detectada nas crianças com acompanhamento de familiares, e mais freqüentemente, em crianças desacompanhadas. Em alguns casos, essa pode representar uma somatização ao medo de enfrentamento das situações para elas desconhecidas (Fadman e Frager, 1980).

Por fim, a pesquisa constatou que as crianças sem acompanhamento constante, apresentaram um maior número de reações físicas durante o processo de internação quando comparadas ao número das reações demonstradas pelas crianças com acompanhamento familiar constante. O presente estudo demonstrou a importância da presença dos pais ou familiares junto à criança hospitalizada. Esses podem contribuir efetivamente para melhorar a assistência à criança e a sua adaptação, cooperando e ajudando a equipe médica. O apoio dos familiares também pode permitir as crianças sentirem-se mais seguras e protegidas, e assim reagirem mais positivamente ao ambiente hospitalar.

Brunner e Suddarth (1992) comentam que uma das principais intervenções do atendimento do setor de enfermagem é tentar reconhecer a ansiedade na criança, de modo a estar alerta aos indícios fisiológicos, emocionais e comportamentais. Deve-se, portanto, encorajar a criança a reconhecer e expressar seus sentimentos de ansiedade. Se a fonte de ansiedade é extrema, como barulhos e cenas desagradáveis, a equipe de enfermagem deve estar atenta à possibilidade de mudar estas condições, ou se não for possível, ajudar o paciente a compreender e a controlar suas reações.

2 . Análises dos dados acerca das reações emocionais apresentadas pelas crianças hospitalizadas com e sem acompanhamento familiar.

TABELA 2 – Distribuição de freqüência das reações emocionais das crianças hospitalizadas apresentadas durante o período de internação

 

 

Na Tabela 2, verificou-se que, no grupo de crianças com acompanhamento familiar durante a internação, o medo foi à reação emocional mais freqüente com 53,6% dos comportamentos observados, seguida pela indiferença com 35,7%, irritabilidade 7,1% e a agressividade com 3,6%.

Quanto às crianças que ficaram hospitalizadas sem acompanhamento familiar, observou-se que das reações emocionais apresentadas a mais freqüente foi a irritabilidade 39,4%, seguida pelo medo 26,4%, agressividade 21% e, por fim, a indiferença 13,2%.

Analisando os dois grupos de crianças, hospitalizadas com e sem acompanhantes, os resultados mostraram que, dentre as reações emocionais observadas nas crianças, o medo 37,8% apresentou-se como a mais freqüente, seguido da irritabilidade 25,7%, da indiferença 22,7%, sendo a última, a agressividade 13,8%.

Constatando que o medo foi a reação de maior freqüência nas crianças com acompanhantes e a irritabilidade nas crianças sem acompanhantes, sugere-se que no primeiro grupo, alguns procedimentos causam reações naturais de medo frente aos possíveis procedimentos invasivos como aplicação de injeções, a implantação de soros e o fato de ficarem confinados ao leito, sem poderem movimentar-se livremente. Já no segundo grupo, a reação emocional de irritabilidade e não de medo, justifica-se, segundo Fadman e Frager (1980) como um mecanismo de defesa da criança. Neste caso, o medo do desconhecido, transforma-se numa formação reativa de irritabilidade, no sentido de afastar de si, situações desagradáveis que lhes pareçam ameaçadoras.

É mister notar que as crianças com acompanhantes apresentaram mais comportamentos de indiferença a situação de hospitalização do que aquelas sem acompanhantes. Esse resultado sugere que, a indiferença do primeiro grupo se deu em virtude dos acompanhantes transmitirem apoio, segurança as crianças frente à situação, o que não aconteceu com o segundo grupo. Com isso, entende-se que a presença de familiares na hospitalização, ajuda a criança a superar a ansiedade da internação.

O comportamento agressivo foi encontrado em um número menor dos que os comportamentos já mencionados, entretanto, ele foi mais presente no grupo de crianças sem acompanhamento. Parece sugerir que a falta de um apoio emocional em uma situação de dor pode gerar comportamentos agressivos, já que a criança tem que ser forte para superar as dificuldades da situação hospitalar sozinha.

Comparando-se os resultados das reações físicas e emocionais dos dois grupos estudados, ressalta-se que as crianças com acompanhantes apresentaram menor freqüência de ambas as reações do que aquelas sem acompanhantes durante a internação.

3. Análises dos dados acerca dos comportamentos dos acompanhantes das crianças internadas

TABELA 3 – Distribuição de freqüência das atitudes dos acompanhantes das crianças hospitalizadas durante o período de internação

 

 

Na Tabela 3, pode-se verificar as atitudes positivas e negativas dos acompanhantes das crianças hospitalizadas em relação aos profissionais de saúde e das normas do hospital. Conforme os resultados, observou-se que os acompanhantes apresentaram 62 comportamentos positivos, sendo 42% referentes a uma comunicaçãofácil com a equipe de assistência à criança, 37% cooperação com a equipe de enfermagem, aceitando o tratamento a ser aplicado e ajudando na assistência à criança e 21% dos comportamentos referentes a aceitação das normas e das rotinas hospitalares.

As atitudes negativas dos acompanhantes distribuíram-se da seguinte forma: 65,2% de não aceitação das normas dos hospitais, onde questionavam, as normas dos hospitais alegando serem inflexíveis, rígidas e/ou limitadas, onde não se levava em consideração a individualidade da criança e família, 26% de não cooperação com a equipe de saúde e 8,8% de dificuldade de comunicação com os profissionais de saúde.

É interessante observar que o fato de haver um número considerável de comportamentos de não aceitação das normas do hospital pelos acompanhantes das crianças gerou dificuldade desses em se comunicar com a equipe de médicos e enfermeiros.

Segundo Lima (1985), os comportamentos agressivos dos pais/acompanhantes de crianças hospitalizadas com as pessoas que estão prestando cuidados a seu filho podem advir do fato desses sentirem-se culpados pela hospitalização ou, superprotegerem a criança. Em outros momentos, os pais podem parecer indiferentes, calmos ou ansiosos, enfim, qualquer desses comportamentos afetará diretamente a relação com os profissionais de saúde, e conseqüentemente poderá influenciar no tratamento da criança hospitalizada.

Assim, segundo o autor, a participação dos pais nos cuidados à criança hospitalizada deve ser sempre facilitada, pois só assim se poderá minimizar os efeitos desagradáveis da doença e da hospitalização.

 

Considerações Finais

Neste artigo, argumenta-se a importância da presença de um acompanhante durante o período de hospitalização da criança, tendo como demonstração os resultados das reações físicas e emocionais apresentadas pelas crianças. Como se pôde ver, as crianças hospitalizadas sem acompanhamento manifestaram mais reações físicas (inapetência, taquicardia, insônia, vomito) e emocionais (irritabilidade e agressividade) do que as crianças acompanhadas.

Entretanto, apesar de se saber que o alojamento conjunto acompanhante/criança seja relevante para a superação do impacto da hospitalização e para a rápida recuperação das crianças internadas, o que se percebe é que as situações de infra-estrutura dos hospitais conveniados com o Sistema Único de Saúde – SUS inviabilizam a presença dos acompanhantes na internação.

Todavia, Novaes (1998) e Mitre (2000) reinteram que, quando os pais não puderem estabelecer o alojamento conjunto, eles devem deixar artigos domiciliares preferidos com a criança, como por exemplo, um cobertor, brinquedo, mamadeira, utensílio de alimentação ou peça de vestuário. A importância de objetos preciosos para as crianças em idade escolar é freqüentemente desprezada ou criticada por profissionais de saúde. Esses objetos ajudam as crianças a se sentirem mais confortáveis em um ambiente estranho.

Ademais, as atitudes de cooperação da família, contribuem, sobremaneira, para a melhor condução do tratamento da criança. Portanto, um serviço hospitalar, eficaz, também deve contemplar a orientação aos acompanhantes, quanto aos procedimentos e normas do hospital, de forma a conseguir a cooperação e a participação destes, durante a hospitalização das crianças (Collet & Rocha, 2004).

As crianças que experimentam hospitalização prolongada ou repetida encontram-se em maior risco de retardo de desenvolvimento, portanto uma meta importante nos cuidados para a criança hospitalizada é minimizar as ameaças para o seu desenvolvimento.

Os resultados desta pesquisa poderão servir como um propulsor, principalmente na comunidade onde foi realizada, de reivindicação junto aos órgãos oficiais de saúde, no sentido de exigir o cumprimento, de forma digna, da Lei 8.069/1990 que permite a permanência dos pais nos casos de internação de crianças e adolescentes.

 

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Endereço para correspondência
Gislene Farias de Oliveira
Rua: Manoel Medeiros Guedes, 95, apto. 901, Ed. Lousane. Bairro de Manaíra
58038-360 João Pessoa-PB
Tel.: +55-083 3246-4255
E-mail: gislenefo@hotmail.com

 

 

1 Gislene Farias de Oliveira é professora da Universidade Federal do Ceará (UFC) e da Universidade Regional do Ceará (URCA), mestre em Desenvolvimento Regional pela URCA e doutoranda em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB).
2 Francisco Danilson Cruz Dantas é fisioterapeuta e Especialista em Saúde Pública pela Universidade Estadual do Ceará (UECE).
3 Patrícia Nunes da Fonsêca é professora substituta da Universidade Federal da Paraíba, especialista em Educação, mestre e doutoranda em Psicologia Social pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB).

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