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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH v.10 n.1 Rio de Janeiro jun. 2007

 

 

Câncer infantil: aspectos emocionais e atuação do psicólogo*

 

 

Flávia Tanes Cardoso**

 

 


RESUMO

O presente trabalho aborda os aspectos emocionais da criança portadora de câncer e de seus familiares. As mudanças na dinâmica de vida e as formas encontradas para lidar com uma situação tão difícil que é ter câncer ou um filho com este diagnóstico. Além disso, esta monografia também menciona a Psicologia Hospitalar e a Psico-oncologia, e baseado nestas duas especialidades, as possibilidades de atuação do psicólogo na Oncologia Pediátrica. Após a revisão bibliográfica utilizada para o desenvolvimento deste trabalho, discutem-se opiniões comuns entre os autores a fim de conhecer quais as questões mais relevantes na bibliografia relacionada ao tema abordado.


ABSTRACT

The present work boards the emotional aspects of the childish his relatives in touch with cancer. The changes in the dynamic of life and the forms to deal with a situation so difficult that is to have cancer or a son with this diagnosis. Besides, this monograph also mentions the Health Psychology and the Psico-oncology, and hemp in these two specialties, the means of acting of the psychologist at Child Oncology. After the bibliographical revision , common opinions are discussed between the authors in order to see the most relevant points.


 

Introdução:

O Câncer é uma doença que até hoje, mesmo com os constantes avanços tecnológicos na sua detecção e tratamento, ainda é extremamente temida e fortemente associada à morte. Desde o diagnóstico até o fim do tratamento, o paciente sofre danos tanto físicos quanto psicológicos, pois além de submeter-se a procedimentos médicos geralmente agressivos, tem sua vida totalmente transformada pela presença da doença.

Quando o portador de câncer é uma criança, não há como não falar da família, pois os danos causados pela doença também afetam seus familiares de uma forma muito intensa e estes tem papel fundamental no tratamento e recuperação do paciente.

A descoberta do câncer traz o medo da dor, do sofrimento, da mutilação e a insegurança em relação ao futuro devido ao risco de morte. A criança e seus familiares têm todos estes medos compartilhados e suas vidas e rotinas transformadas com a descoberta da doença. Cada criança e cada família irão reagir de formas diferentes, tudo dependerá, entre outros fatores, não só do estágio em que a doença se encontra como da personalidade de cada um dos sujeitos envolvidos, mas em todos os casos, recursos internos sempre serão utilizados para o melhor enfrentamento de uma situação tão difícil que é ter um câncer ou ter um filho com este diagnóstico.

Além disso, é de suma importância que todos os profissionais de saúde conheçam todos os aspectos que envolvem esta enfermidade (além dos aspectos biológicos) para que a relação com o paciente e sua família seja mais completa e principalmente humana, já que além de um diagnóstico, um tratamento e um prognóstico, também há uma história de vida e uma variedade de sentimentos envolvidos no mesmo contexto. 

Será realizada uma revisão bibliográfica a partir de livros, monografias, teses, dissertações, artigos, revistas e páginas da internet relacionados ao tema abordado.

 

Desenvolvimento histórico do papel da família e da criança na sociedade:

A estrutura familiar atual, mantida pelos laços de amor entre seus membros e permeada pela privacidade dos mesmos e de suas habitações, foi construída historicamente e por intermédio de diversas instituições sociais. Da mesma forma ocorreu o processo que resultou na valorização da criança no núcleo familiar e na própria sociedade e que contou com a participação de diferentes atores.

Ariès (2006) fala em sentimento de infância para referir-se a uma diferenciação entre crianças e adultos, que já não existia desde a época medieval.

Durante o período colonial, as famílias brasileiras eram patriarcais, numerosas e habitavam casarões rurais, onde não havia o mínimo de privacidade. A arquitetura das casas não respeitava a intimidade dos cômodos nem dos moradores. A criança, assim que completava os primeiros anos de idade, já se misturava aos adultos, compartilhando de seus ambientes, conversas e rotinas. A família não era a responsável pela educação das crianças, que logo cedo, viajavam para a casa de outras famílias, de quem eram transmitidos valores e todo o tipo de conhecimento( Melman 2006).

O que unia essas famílias não era o sentimento de afeição e sim a defesa da honra e da moral e a conservação dos bens materiais, do patrimônio familiar. O afeto até poderia existir, mas não era necessário.

Gradativamente, com a interferência de diferentes instituições sociais, o sentido de família foi sendo modificado e o de infância também. A família que valorizava as relações sociais, que se misturava aos criados na vida diária, que tinha sempre a casa cheia de visitantes e agregados, passou a isolar-se, defender a intimidade da vida privada e sua união passou a depender e ser mantida pelos laços de afeto. Já a criança, que logo após os anos mais precoces de sua vida, já estava entre os adultos e distanciava-se da família para ter sua educação garantida, passou a ser alvo de interesse e preocupação dos pais, tendo suas necessidades e especificidades reconhecidas e diferenciadas.

Em uma determinada época era a Igreja quem orientava as famílias nas questões relativas à sexualidade e ao casamento através de uma educação moral. A prática da confissão era um dos meios pelo qual a Igreja mantinha seu controle sobre as famílias e impunha sua autoridade. Ariès (2006) cita a escola como um dos meios de moralização utilizados pela Igreja e como um dos marcos na mudança de lugar assumido pela família e pela criança na sociedade, já que a mesma passou a substituir a aprendizagem da criança que se dava em meio aos adultos ou nas casas de outras famílias, para ocorrer no enclausuramento das escolas e sob as regras da instituição religiosa.

A partir do século XVIII, através da descoberta da etiologia de algumas doenças, a medicina passou a exercer influência sobre os corpos das famílias, até que, ao perceber a modificação provocada por suas descobertas e conselhos no interior do sistema familiar, Medicina e Estado decidiram unir-se. Desta forma, a Medicina tinha a oportunidade de legitimar suas práticas enquanto o Estado educava as famílias, visando principalmente às crianças, a fim de manter a ordem social, bem como conservar e produzir mão de obra saudável e produtiva. Foi o período dos médicos higienistas, que através de uma política higiênica (focada na redução da mortalidade infantil e nas precárias condições de saúde dos adultos) e da idéia de que as famílias não sabiam se cuidar, provocou uma revolução nos costumes familiares através de uma educação física, moral, intelectual e sexual baseada numa mudança radical de hábitos.

A Psicanálise também contribuiu para o que Costa (2004) chamou de “tutela terapêutica”. Através de conceitos como o inconsciente, a sexualidade infantil e o Complexo de Édipo, a Psicanálise exerceu grande influência no que diz respeito à valorização do grupo familiar como um dos principais responsáveis pelo bom ou mau desenvolvimento da criança, só que de uma forma muito mais compreensiva que os higienistas e a Igreja. Estas se utilizavam de um discurso que desvalorizava a capacidade da família de se autogerir e educar seus filhos, já os psicanalistas reforçavam a capacidade que a família possuía de corrigir suas falhas a partir de uma terapêutica adequada.  

Hoje, é possível perceber que a família e a criança ainda são preocupações das ciências humanas e biológicas, das instituições de ensino, das instituições religiosas e até mesmo do poder legislativo, que tem no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) a maior representação e pode-se até dizer imposição de responsabilidade aos pais pela guarda e bem estar de seus filhos. 

 

O Câncer Infantil

Etiologia: O câncer é uma doença genética caracterizada pela divisão e proliferação desordenada de células que sofreram mutação em seu material genético. Ele ocorre em qualquer parte do organismo e é o acúmulo das células dá origem aos tumores. Os tumores são caracterizados pelo agrupamento de células anormais, que uma vez formadas serão destruídas pelo organismo, permanecerão como tumores benignos ou se transformarão em tumores malignos. Tudo dependerá do sistema imunológico do indivíduo, que será influenciado por diversos fatores de risco. (Associação Brasileira do Câncer [ABC], 2007)

O tumor costuma atingir tecidos ou órgãos próximos à sua localização, mas caso ele não seja detectado e tratado precocemente, pode causar metástase, que é a formação de novos tumores a partir do primeiro e que atingem tecidos e/ou órgãos de áreas mais distantes da lesão inicial. Eles  podem ser classificados em benignos ou malignos. O que diferencia as duas classificações é que ao contrário da primeira a segunda oferece risco de vida ao paciente devido ao seu caráter invasivo. Esta classificação só é possível a partir da realização de uma biópsia. (op.cit)

O câncer é a principal doença causadora de morte em crianças com menos de 15 anos de idade (op.cit). O que diferencia a manifestação do câncer infantil  do adulto é que o primeiro geralmente afeta o sistema sangüíneo e os tecidos de sustentação, já o segundo afeta as células do epitéleo que recobre diferentes órgãos do corpo humano. (Instituto Nacional de Câncer [INCA], 2OO7)

No caso do câncer infantil, ainda não são claros os fatores de risco que podem desencadear ou ativar a doença, ao contrária dos cânceres dos adultos, que além do fator hereditário, também é influenciado por fatores ambientais, hábitos alimentares, estilo de vida e aspectos emocionais. Sendo assim, como a prevenção ainda não é possível, o diagnóstico precoce do câncer infantil torna-se ainda mais importante. (ABC, 2007)

Os tipos mais comuns de neoplasias infantis são as leucemias, os tumores do sistema nervoso central e os linfomas.As leucemias caracterizam-se pelo acúmulo de células imaturas anormais na medula óssea, sobrepondo-se ao número de células normais, que prejudicam a produção das células sangüíneas, já que, é na medula óssea que são produzidas as células que compoem o sangue. São elas: os eritrócitos (glóbulos vermelhos), que abastecem os tecidos com oxigênio retirado dos pulmões; os leucócitos (glóbulos brancos), que produzem anticorpos que protegem o organismo de infecções; e as plaquetas, que auxiliam a coagulação sangüínea. A leucemia é classificada como linfóide ou mielóide dependendo do tipo de célula sangüínea que tem sua produção reduzida ou impedida. (ABC, 2007; INCA, 2007)

Os tumores do sistema nervoso central são responsáveis por 20% das neoplasias malignas infantis. Estes tipos de tumor podem localizar-se por toda a área que compreende o SNC e sua localização vai determinar o ritmo de evolução da doença, os sintomas e o prognóstico. Geralmente os tumores do SNC não extrapolam a cavidade craniana, impedindo a ocorrência de metástases. Devido à localização sensível, dependendo da área onde se encontra o tumor, não é possível a realização da cirurgia para a retirada do mesmo ou caso esta ocorra, é comum o risco de seqüelas. Os sintomas mais freqüentes são: dor de cabeça, vômito, náuseas, convulsão, paralisia de nervos e alterações da fala, marcha, equilíbrio e coordenação. (ABC, 2007; INCA, 2007; Núcleo de Apoio à Criança com Câncer [NACC], 2007)

Os linfomas têm origem nos linfonodos. Estes localizam-se no sistema linfático, que é responsável pela produção de células responsáveis pela imunidade. Os linfonodos podem ser encontrados em todas as partes do corpo e produzem os linfócitos, que são células com funções importantes no combate a infecções. A transformação destas células de normais para anormais seguidas de crescimento e disseminação descontrolada (que pode causar metástase) é o que caracteriza os linfomas. Este tipo de câncer é classificado em linfoma de Hodgkin e linfoma não-Hodgkin. O primeiro pode ocorrer em qualquer parte do corpo e seu diferencial está na presença de células denominadas Reed-Sternberg no tecido do paciente. Já o segundo só ocorre no pescoço, nas axilas e na virilha. (ABC, 2007; INCA, 2007) 

 Além disso, também são típicos nas crianças o tumor de gânglios simpáticos (neuroblastoma), o tumor renal (tumor de Wilims), o tumor da retina do olho (retinoblastoma), o tumor germinativo, o tumor ósseo (osteossarcoma) e os tumores de partes moles (sarcomas). (INCA, 2007)

Os sintomas do câncer infantil podem ser facilmente confundidos com outros de doenças comuns na infância, o que pode retardar a procura de um pediatra e conseqüentemente a detecção precoce da doença, tornando-se assim, fundamental a atenção dos pais a qualquer um dos sintomas e no  caso do surgimento de algum deles, a procura de um especialista para que o mesmo possa fazer o diagnóstico correto. (NACC, 2007)

Diagnóstico. O diagnóstico do câncer infantil deve ser feito precocemente, a fim de impedir que a doença se agrave e com isso o prgnóstico seja ruim. Ao contrário dos adultos, não existem exames preventivos que, feitos rotineiramente, detectem a manifestação do câncer. Daí a importância da avaliação periódica de um pediatra durante toda a infância.

São muitos os prodcedimentos utilizados na detecção dos cânceres. Entre os mais comuns e conhecidos estão: biópsia, punção, ultra-sonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética, hemograma, mielograma (exame da medula óssea), entre outros. 

Tratamento. As tecnologias de detecção e tratamento do câncer infantil evoluiram muito nas últimas décadas, com exceção da prevenção, ao contrário dos adultos, já que nestes, já se sabe que a doença está asociada a fatores ambientais. Além disso, o diagnóstico precoce muitas vezes não ocorre pois, em geral, como já foi dito, os sintomas são muito semelhantes aos de outras doenças comuns na infância. (INCA, 2007)

As condutas terapêuticas utilizada no tratamento do câncer costumam ser a cirurgia, a quimioterapia, a radioterapia e o transplante de medúla óssea no caso das leucemias

Geralmente estas terapêuticas são utilizadas de forma associada e a escolha por cada uma delas, bem como a frequência e o tempo de utilização, dependerá de fatores como o tipo de câncer, a localização do tumor, o estágio de evolução da doença, o perfil do paciente, entre outros.

Prognóstico. O que determinará se o prognóstico da criança com câncer será bom ou ruim será a combinação de diversos fatores, como o tipo de câncer, a classificação (benigno ou maligno) e o estágio em que ele se encontra, sendo que o que determinará estes fatores será a precocidade do diagnóstico. Por este motivo ressalta-se a importância de uma detecção precoce para um melhor prognóstico.

 

A Criança com Câncer:

Aspectos Emocionais:Ao abordar a infância, é indispensável que haja uma delimitação deste período a fim de que se possa melhor compreender e relativizar as informações oferecidas.

O presente trabalho considera infância o período compreendido desde o nascimento até os 12 anos de idade como é determinado pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), sendo que todas as descrições que serão feitas a seguir a respeito da criança com câncer, não irão se referir a idades específicas e sim à criança de uma forma geral, partindo do princípio de que sempre haverá variações quantitativas e qualitativas dependendo da idade da criança.

A infância é um período crucial na vida de qualquer sujeito. É na infância, a partir das vivências das relações familiares e sociais como um todo, que o indivíduo constrói sua relação com o próprio corpo, com o mundo externo, e apartir daí adquire uma estrutura de personalidade que vai ser a base para todas as suas experiências futuras.

A doença é um  evento inesperado e indesejável ,e o câncer, dependendo do tipo e da precocidade do diagnóstico, pode causar seqüelas físicas e psíquicas que serão marcantes para a criança. Além disso, ela tem sua rotina completamente alterada e todos os hábitos comuns próprios da infância tornam-se algo distante para ela devido às limitações que a doença e o tratamento impoem.

A reação da criança em relação ao diagnóstico dependerá da reção de seus pais. A respeito disso, Dávila (2006) afirma que quando uma criança é diagnosticada com câncer, são os pais os primeiros a necessitarem de ajuda, pois visto que a criança desconhece a doença, são eles quem vão transmitir ao filho todos os sentimentos provocados pela descoberta do diagnóstico, e quando a família está bem orientada, os efeitos da doença são menos prejudiciais, pois os pais saberão manejar a situação da melhor maneira possível para que ela não seja tão sofrida para a criança. Para o autor, a criança somente se depara realmente com a doença, no momento em que ela começa a sofrer os efeitos do tratamento, pois ela passa a ter sua vida limitada, não podendo realizar as atividades que costumava anteriormente.

Ainda que a criança não tenha sido informada do diagnóstico ela também reagirá, não ao diagnóstico, mas a uma situação, um clima que se instalará no ambiente familiar, já que os pais sabem da existência da doença e seu comportamento falará de alguma forma que algo está errado. Romano (1999, p.32) diz que “(...) a ignorância sobre a verdadeira condição é que alimenta a fantasia dos doentes, mobilizando sentimentos irracionais, e até desproporcionais de medo. O conhecer os dissipa (se não, atenua), reforçando sentimentos de cooperação, confiança e esperança”. Sendo assim, não revelar o que está acontecendo à criança, não impede que esta sofra e pode até ser pior, pois ao saber que algo não vai bem e ao mesmo tempo não saber o que se passa, faz com que a criança imgine e fantasie inúmeras situações, que podem até mesmo ser piores que a situação real.

Após o impacto do diagnóstico, a criança deve lidar com a incerteza em relação ao futuro. A sensação de perda de controle também é outra questão com a qual a criança terá que lidar tendo em vista que ela passará a depender dos outros para muitas tarefas que antes realizava sozinha, perderá sua privacidade, terá que se submeter a normas e tratamentos impostos pela equipe cuidadora, terá suas atividades limitadas e a superproteção de seus pais (Pedreira & Palanca, 2007).

 Segundo Greer (citado por Pedreira & Palanca, 2007), os sintomas físicos resultantes da doença e do tratamento representam uma ameaça à auto-imagem da criança e à imagem que os outros tem dela, gerando reações emocionais como ansiedade, raiva, cupla ou depressão. Além disso, no que diz respeito aos aspectos comportamentais, a criança poderá isolar-se, ter seu rendimento acadêmico prejudicado ou não desejar mais freqüentar a escola. “Sentimientos negativos de aislamiento, rabia, culpa, vergüenza, soledad, apatía y confusión se observan com frecuencia y están en relación com el miedo de la muerte, a la recurrencia de la enfermedad o a los procedimientos médicos”. (Pedreira & Palanca, 2007, p.8)

Segundo Silva, Teles e Valle (2005), estudos voltados à compreensão das experiências das crianças diante do câncer, revelaram que em diferentes contextos e momentos do tratamento, as temáticas abordadas pelas crianças diziam sempre respeito aos mesmos assuntos. São eles: a identidade (o mundo, o próprio corpo); a doença e o tratamento (o diagnóstico, a história do tratamento, os procedimentos, as conseqüências, a equipe), a vida (o mundo, relações, histórias e situações vividas e/ou imaginadas, a família, a escola) e a morte (expectativa diante de perdas). São temas que permeiam todo o período do desenvolvimento infantil e que com a presença da doença tornam-se mais vivos, mais presentes e por isso exigem uma maior elaboração.

Pedreira  & Palanca (2007) descrevem as particularidades dos momentos referentes ao tratamento da criança com câncer e todas as alterações psicossociais que estes eventos podem provocar. São eles:

- Hospitalizações: provocam o distanciamento da criança tanto do ambiente familiar quanto da escola, este último resultando em repercussões negativas no rendimento acadêmico e na socialização.

- Procedimentos médicos: devido ao caráter invasivo e doloroso, são causadores de muito estresse e de sentimentos de impotência da criança frente ao que vem de fora. Podem provocar quadros psiquiátricos como, por exemplo, fobias. Além disso é importante que a criança tenha a capacidade de distinguir os “pais bons” que cuidam dos “pais maus” que a obrigam a submeter-se aos procedimentos. Ao permitir que isto seja realizado os pais convertem-se em “carrascos” e temem perder o amor de seus filhos. Outro aspecto importante concernente aos procedimentos médicos é a correlação existente entre a ansiedade dos pais e a dos filhos, o que quer dizer que o nível de ansiedade dos pais irá refletir na conduta da criança diante da doença e do tratamento.

- Efeitos colaterais: são diversos os efeitos colaterais provocados pelo tratamento do câncer. Náuseas, vômitos, queda de cabelo, úlceras bucais, ganho de peso, amputação, esterilidade, danos cerebrais e atraso no crescimento são alguns desses efeitos. Mas os que são considerados como fator de risco para a apresentação de doenças psiquiátricas são aqueles que causam comprometimento neuropsicológico, podendo acarretar distúrbios referentes à visão, memória, atenção, cognição etc.

- Acompanhamento a longo prazo: refere-se às consultas médicas que devem ser mantidas, apesar da remissão da doença. No caso do câncer a remissão nunca é encarada como cura pois sempre há a incerteza da sobrevivência devido ao temor da recaída ou aparecimento de outros tumores, o que é gerador de extremo estresse mesmo com a ausência da doença, mas devido à sombra desta que costuma permanecer. 

A hospitalização:Sem dúvida, todo o processo que envolve o tratamento do câncer infantil é extremamente desagradável e causador de muito sofrimento para a criança, mas é fato que a hospitalização é uma situação que merece mais atenção pois além de submeter-se aos procedimentos tão incômodos, comuns deste processo, a criança se vê afastada de sua família, de seus amigos, de seu ambiente habitual.

De acordo com Steinmuller (1999), apesar da forte tendência e já notada mudança, os hospitais costumavam oferecer um ambiente hospitalar igual ao dos adultos para as crianças internadas, sem pensar na angústia e no sofrimento gerados por esta situação, e que para uma criança pode ter conseqüências muito mais sérias e traumáticas. A própria doença e as constantes internações podem provocar um impacto psicológico muito grande e negativo a ponto da criança ter seu desenvolvimento emocional comprometido e criar uma atitude negativa em relação aos serviços de saúde.

Apesar de todos os esforços na humanização do ambiente hospitalar e do próprio atendimento ao paciente hospitalizado, não há como a criança deixar de experienciar situações e sensações que são intrínsecas à hospitalização.

A presença da mãe ou de um familiar acompanhando a criança durante a hospitalização é uma questão importante e causadora de inúmeras divergências e resistências entre os profissionais de saúde, pois muitos ainda têm uma visão muito bioligicista da doença e não consideram o impacto emocional que a doença e a internação produzem, o que faz com que também desconsiderem a importância da presença de um familiar durante a hospitalização da criança.

Chiattone (op.cit) cita a privação materna como a pior experiência que a criança pode passar durante uma internação hospitalar, principalmente quando não recebe o cuidado e o carinho adequados dos membros da equipe a fim de minimizar a ausência da figura materna. A autora destaca que todas as experiências serão influenciadas pela idade da criança, a situação psicoafetiva da mesma no momento da internação, seu relacionamento prévio com a mãe, sua personalidade, sua capacidade de adaptação a situações difíceis, às atitudes da equipe hospitalar, às experiências vividas durante a hospitalização, à duração da mesma, o tipo de internação e a natureza da doença.

 

A Família da Criança Portadora de Câncer:

Quando uma criança é diagnosticada com câncer, a notícia e todas as consequências do diagnóstico afetarão principalmente a criança, mas também os pais (ou aqueles que cuidam dela), já que são eles os responsáveis por seus filhos.

O câncer infantil, quando confirmado, não é exclusivo da criança mas também de seus pais, já que estes também terão suas vidas transformadas tanto na rotina doméstica quanto nos aspectos financeiro, profissional, assim como na vida conjugal. (Cavicchioli, 2005).

A forma como cada família irá reagir a esta situação irá variar e levará em conta diversos fatores que incluem desde o contexto social até a estrutura egóica de cada membro da família.

Segundo Gotflieb (citado por Tomaz, 1997), após confirmada a neoplasia de seus filhos, os pais experimentam choque e desesperança. Além disso, questionam-se do motivo pelo qual seus filhos são portadores de tal doença apesar de todo cuidado que ofereceram a eles desde o nascimento, o que leva a uma auto- culpabilização em relação à doença de seus filhos, ou uma atribuição aos médicos da culpa pela demora do diagnóstico.

Após o choque do diagnóstico, como responsáveis por seus filhos, os pais devem tomar importantes decisões em relação ao tratamento dos mesmos, que no geral são longos, invasivos, com efeitos colaterais bastante desagradáveis, limitam atividades cotidianas e em muitos casos provovam mutilações. Além disso, um câncer infantil sempre é permeado pelo risco de morte, e em alguns casos leva a óbito. Diante disso, diferentes reaçõs são manifestadas. A questão é que diante da agressividade provocada pela doença, o bem estar da criança passa a ser responsabilidade dos pais, já que apesar da equipe ser responsável pela realização dos procedimentos referentes ao tratamento, são os pais quem decidem se eles serão realizados ou não.

Apesar de raro, alguns pais recusam o tratamento pelos mais diversos motivos. “Eles podem negar a gravidade do diagnóstico, têm ansiedades confusas sobre o efeito do tratamento em seu filho, ou consideram o tratamento incompatível com suas crenças religiosas” (Tomaz, 1997, p.23). Por outro lado, muitos pais aceitam  aleatoriamente as opções de tratamento na tentativa desesperada de salvar a vida de seus filhos.

Mudanças na dinâmica familiar: Visto que a família de uma criança com câncer também é afetada pela doença, isso significa que a dinâmica familliar também sofre mudanças que refletem a maneira como cada membro está lidando com a situação.

Além das questões emocionais, a rotina e os papéis desempenhados por cada membro da família mudam muito, já que o tratamento do câncer geralmente exige uma atenção integral ao doente principalmente durante as longas internações às quais deve submeter-se e que exigem a presença constante de pelo menos um familiar (na maioria das vezes a mãe). No geral, a mãe, que é culturalmente a responsável pela casa e pelos filhos, abandona todas as suas atividades para se dedicar integralmente ao filho doente enquanto o marido tem que trabalhar e ao chegar em casa dividir com os filhos saudáveis ou fazer sozinho (no caso de não haver outros filhos) as atividades antes delegadas à esposa. A configuração familiar muda e todos devem adaptar-se a ela.

Segundo Ortiz (2003), a mãe da criança com câncer também está psiquicamente vulnerável às experiências decorrentes da doença, já que é ela a principal interlocutora e cuidadora nesta situação. Esta vulverabilidade psíquica diz respeito a todas as angústias resultantes de todo o processo que envolve a doença, desde o diagnóstico até o fim do tratamento, além das crises familiares que ocorrem como conseqüência de uma redefinição do papel da mãe dentro da família.

Após pesquisa bibliográfica, Silva, Teles & Valle (2005, p.258) concluiram que “o câncer infantil é caracterizado como um impacto desestruturador na unidade familiar” . A partir disso, é possível pensar que, em alguns casos, ainda que por um lado, a palavra “desestruturar”, tenha conteúdo negativo, por outro, seus efeitos também podem ser benéficos.  

Segundo o Novo Dicionário da Língua Portuguesa (1986), “desestruturar”  significa “desfazer a estrutura” (p.562).  Sendo assim, uma vez desfeita uma estrutura, esta nova realidade pode ser boa ou não, dependendo da forma como cada família irá lidar com ela. 

A relação matrimonial dos pais da criança geralmente sofre alguns abalos. Toda a tensão provocada pela situação do filho, faz com que o casal esqueça de sua vida conjugal e desloque toda a sua atenção e energia para os cuidados do filho doente, o que  pode resultar em sérios problemas no relacionamento do casal.

Irmãos de crianças com câncer também são membros da família que sofrem muito com a presença da doença pois, principalmente na fase do tratamento, o foco dos pais está todo no filho doente e isso trás diversos trasntornos na relação destes com o filho saudável e na rotina do mesmo:

Segundo Murray (citado por Cavicchioli, 2005, p.22), a atenção aos filhos saudáveis é extremamente negligenciada e estes apresentam sentimentos como “depressão, raiva, ansiedade, ciúmes, culpa e isolamento social”. Para  Pedrosa e Valle (citados por Cavicchioli, 2005) os irmãos saudáveis, por perceberem que o irmão  tem ganhos secundários com a doença, passam a manifestar queixas psicossomáticas na tentaiva de chamar a atenção da família.

 A instabilidade emocional provocada pelo câncer infantil nos irmão saudáveis, além de afetar seu comportamento dentro do contexto familiar, também repercute no ambiente escolar, provocando uma diminuição do rendimento devido à falta de atenção, indisciplina, agressividade, e em outros casos, introspecção (Cavicchioli, 2005).

Apesar das dificuldades provocadas pela doença, muitos irmãos saudáveis têm consciência da gravidade da situação de seus irmãos doentes, da necessidade que eles têm de cuidados e do quanto seus pais sofrem com tudo que acontece. Ainda que em alguns  casos  reações negativas como isolamento, depressão e agressividade sejam uma forma destes irmãos saudáveis demonstrarem que não suportam o tratamento diferenciado que passaram a receber, em outros são simplesmente uma demonstração de que não estão sabendo lidar com a situação sozinhos ou que estão, da forma deles, tentando enfrentar todas as dificuldades.

Mas mesmo que muitas reações negativas sejam notadas entre os irmão de crianças com câncer, também há reações positivas. Muitos irmãos assumem uma postura protetora da criança doente, assim como uma atitude cooperativa nas tarefas domésticas e nos cuidados com o irmão doente. Eiser (citado por Pedreira & Palanca, 2007, p.12) revela que “(...) en algunos estudios se han observado em estes niños, mayor empatia, más conductas de ayuda, de compartir y capacidad para mostrar afecto, que sus compañeros de clase”.

A desestrutura familiar causada pelo diagnóstico de câncer infantil é inevitável, mas a forma como cada membro da família irá reagir será singular, não havendo padrões de comportamento ainda que estes possam ser previsíveis, o que é muito importante para o trabalho da equipe de saúde com a família e com a própria criança doente.

 

A Atuação Do Psicólogo:

A Psicologia Hospitalar: Nos últimos anos, a relevância dos aspectos psicológicos no processo de adoecimento tem sido cada vez mais reconhecida pelos profissionais de saúde e conseqüentemente a importância do psicólogo no ambiente hospitalar. É imprescindível falar deste tema devido ao fato de que a hospitalização é uma das etapas vividas pela criança com câncer durante seu tratamento e a presença do psicólogo nesta situação é extremamente necessária.Hoje, é inadmissível não reconhecer que a doença é resultado de uma interação constante entre mente e corpo e influenciada por diversos fatores, que vão além do biológico e incluem fatores psicológicos, sociais e culturais.

Fica claro que, seja no surgimento, desenvolvimento ou prognóstico de uma patologia, além de outros fatores, os aspectos psicológicos estão sempre envolvidos e por isso também necessitam de atenção, tanto quanto os aspectos físicos. Além disso, os aspectos emocionais também podem ser desencadeados pela própria doença. Para Simonetti (2004, p.20), “o psicólogo pode fazer muito pouco em relação à doença em si, este é o trabalho do médico, mas pode fazer muito no âmbito da relação do paciente com seu sintoma: esse sim é um trabalho do psicólogo”.

Rodrigues e Gaparini (In Mello Fillho,1992, p.97) também falam da questão da multicausalidade da doença quando refere-se ao adoecer “não como um evento casual na vida de uma pessoa, mas sim representando a resposta de um sistema, de uma pessoa que vive em uma sociedade”. Ou seja, não é por acaso que a doença se instala no sujeito. Tudo que ocorre não só na vida mas também no corpo do indivíduo é resultado de sua interação com o meio ambiente, e sua relação com este meio envolve vários aspectos que devem ser considerados quando o sujeito é acometido por alguma patologia.

Junto a esta gradual mudança de visão em relação à doença também tem ocorrido um grande esforço em torno da humanização do tratamento oferecido aos pacientes nos hospitais, visando a uma atenção global do sujeito sem focar a doença em detrimento da sua história de vida e da sua identidade. É importante lembrar que a humanização envolve desde a administração do hospital até a equipe de saúde que cuida diretamente do paciente. Ela é responsabilidade de todos.

Uma tendência ainda muito forte entre muitos psicólogos que atuam na área hospitalar e que é responsável por muitas atuações malsucedidas e até mesmo o isolamento do profissional em relação à equipe de saúde, é a transposição do trabalho de psicoterapia realizado nos consultórios particulares para o contexto hospitalar. Claro que isso não ocorre por simples má fé destes psicólogos. A formação acadêmica destes profissionais totalmente focada em uma psicologia clínica voltada para o consultório e com pouquíssimas ou nenhuma disciplina específica na área da saúde, contribui fortemente para a tendência destes profissionais de querer repetir no hospital o que fazem em seus consultórios ou aprenderam na graduação. Este fato demonstra a importância de uma especialização na área hospitalar para atuar na área da saúde, pois o hospital possui uma dinâmica de trabalho que é inerente a este contexto e que exige conhecimento teórico e técnico específicos, que caracterizam de fato o psicólogo como psicólogo hospitalar, pois não é somente o contexto que caracteriza esse profissional mas também a atividade exercida por ele.

O psicólogo hospitalar atua oferecendo assistência à paciente, família e equipe de saúde sempre visando ao bem estar do paciente, num contexto de trabalho que, como já foi dito, possui características próprias. Algumas destas características são:

- O ambiente institucional: no hospital, o psicólogo está referido a uma instituição e como qualquer outra esta possui regras e valores aos quais seus funcionários estão submetidos, e com o psicólogo não é diferente. Seu trabalho deve adequar-se ao perfil da instituição, mas isto jamais deve ferir os princípios éticos do seu exercício profissional.

- A situação do paciente: o paciente quando está internado em um hospital, perde sua identidade. Ele não é mais o sujeito de nome próprio, que mora em sua própria casa, possui objetos particulares, exerce atividades diárias, possui uma rede social e uma autonomia que lhe permite gerir sua própria vida. Numa enfermaria ele é mais um paciente doente, identificado por sua patologia, longe de sua casa, de suas coisas, de sua família, amigos e está totalmente dependente e submetido à equipe de saúde. É uma situação de completa fragilidade, desamparo e incerteza em relação à própria vida. De acordo com Moretto (citado por Simonetti, 2004, p.18), “a psicologia está interessada mesmo em dar voz à subjetividade do paciente, restituindo-lhe o lugar de sujeito que a medicina lhe afasta”.

- O trabalho multi e interdisciplinar: dentro de um hospital, o psicólogo nunca trabalha sozinho. Ele atua dentro de uma equipe multidisciplinar, ou seja, uma equipe composta por profissionais de diferentes especialidades. Como integrante de uma equipe multidisciplinar, o psicólogo deve estar apto para desenvolver um trabalho interdisciplinar, ou seja, um trabalho visando à interação e à troca de informações e conhecimentos entre os diferentes profissionais que integram a equipe.

- O setting: o hospital não é o local ideal para um atendimento psicológico, mas para o psicólogo hospitalar é o local de atendimento. Seja no leito, nos corredores ou no pátio do hospital, sujeito a interrupções da equipe, sem privacidade, sem tempo determinado, ou seja, em meio a toda imprevisibilidade do hospital, o psicólogo deve atuar de forma flexível e criativa tentando adequar na medida do possível suas atividades, à rotina hospitalar. Barroso (In Mello Filho, 1992, p.363) fala da conseqüência que o ritmo hospitalar gera para o trabalho do psicólogo quando diz que “ a prioridade, a freqüência e a duração das sessões só devem ser estabelecidas sob a forma de intenção”.

A área hospitalar oferece uma variedade de serviços com características muito particulares e que exigem um planejamento específico. Ambulatórios, emergências, CTIs e enfermarias oferecem serviço, ambiente, rotina e pacientes de características muito singulares e que devem ser levadas em conta no momento em que psicólogo delineia suas atividades.

O trabalho do psicólogo com o paciente tem como objetivo principal, através das palavras e das mais diversas formas de comunicação (olhares, gestos, entre outros), fazer com que o paciente expresse suas emoções, fale de seus medos e angústias, coloque-se como sujeito ativo e participante do seu processo de adoecimento e com isso possa simbolizar e elaborar da melhor forma possível a experiência do adoecer.

Para a realização dos atendimentos, o psicólogo respeitará a rotina do serviço bem como as condições físicas do paciente. Sendo assim, nem sempre atendimentos previamente programados poderão ser realizados, devendo ser remanejados, seja porque o paciente precisou fazer um exame de última hora ou porque está sob efeito de alguma medicação. Isto demonstra a necessidade da flexibilidade e da criatividade do psicólogo hospitalar.

Não são todos os pacientes de um hospital que necessitam de atendimento psicológico. Muitas pessoas, apesar dos aspectos negativos que o ambiente e a situação hospitalar proporcionam, possuem uma estrutura egóica forte o suficiente que permite que elas atravessem esta experiência sem repercussões emocionais negativas. Outras com ego mais fragilizado e que não desenvolveram uma maturidade emocional razoável, necessitam de suporte e é papel do psicólogo estar atento para esta necessidade que nem sempre é percebida pelo próprio paciente. Família e equipe também estão aptas para perceber a demanda e devem ser sensibilizados para esta atitude, colaborando para o trabalho da psicologia e conseqüentemente estimulando o trabalho interdisciplinar.

Em relação aos familiares do paciente internado, estes também sofrem as conseqüências do adoecimento do parente doente e necessitam de apoio psicológico. Eles também são tomados pelas incertezas e pela angústia da experiência vivida por seu ente querido, sendo fundamental que tenham a possibilidade de expor seus sentimentos, visando a um melhor enfrentamento da situação. O psicólogo deve oferecer uma escuta atenta e sensível às questões que emergem para os familiares devido ao momento difícil atravessado por seu parente e que gera implicações emocionais para todo o núcleo familiar. A oportunidade de poder falar e desta forma simbolizar todas as angústias sofridas proporciona não só um melhor enfrentamento da situação como também o estreitamento dos vínculos familiares, resultando assim em uma atitude mais cooperativa em relação ao tratamento do parente doente.    Em se tratando da equipe, esta lida com a possibilidade de morte durante todo o tempo que estão no hospital. Não só a possível morte do outro se faz presente a todo o momento como também esta situação provoca questionamentos sobre a própria finitude. Sentimentos de impotência e onipotência se alternam e demonstram uma grande dificuldade de lidar com a doença e a morte. Mecanismos de defesa são utilizados a fim de lidar melhor com um cotidiano extremamente estressante do qual não se pode fugir e muitas vezes estes mecanismos levam a comportamentos que podem prejudicar a relação da equipe com pacientes e familiares.

O apoio psicológico à equipe pode ser feito tanto através de conversas informais durante a rotina de trabalho, através da realização de grupos ou atuando em situações específicas, nas quais o psicólogo é solicitado ou perceba a necessidade e pertinência de uma intervenção.

É sempre importante lembrar que o psicólogo também faz parte da equipe de saúde e assim como ela, ele também está sujeito a uma rotina estressante e sendo obrigado a lidar com a finitude do outro e a própria também. Para realizar um bom trabalho e para poder dar suporte a pacientes, família e equipe, ele necessita rever sua posição diante da morte, elaborando o medo e a negação em relação a este tema. O psicólogo antes de ser um profissional, é e deve ser um ser humano sensível às questões da vida e das outras pessoas e empático na realização de suas atividades. De acordo com LeShan (1994, p.80) “Se os sentimentos do terapeuta estiverem mal resolvidos por ele estar trabalhando com alguém que está morrendo, fazendo-o sentir que seus esforços são inúteis e sem esperança, provavelmente esses sentimentos serão transmitidos ao paciente”. Assim sendo, ao invés de uma posição de neutralidade máxima, de onipotência, ou até mesmo de apatia, o psicólogo hospitalar deve manter seu lado humano e solidário, caso contrário jamais poderá compreender, lidar e ajudar pessoas em situações tão difíceis como as que são encontradas todos os dias nos hospitais.

Além das condutas terapêuticas realizadas no cotidiano hospitalar com a tríade paciente-família-equipe, é dever do psicólogo hospitalar investir nas áreas de ensino e pesquisa, formando e especializando novos profissionais para trabalhar na área e participando de estudos que proporcionem novas informações e conhecimentos sobre o tema e que divulguem a importância da especialidade na área da saúde. 

A Psico-oncologia: Segundo Holland e Almanza-Muñoz (2007), a Psico-oncologia tem como foco de cuidado o paciente oncológico e tem como objetivo principal proporcionar uma maior qualidade de vida ao paciente com câncer através de uma abordagem psicossocial, a incorporação do connceito de cuidados paliativos e a valorização do aspecto religioso.

Para os autores, o trabalho da Psico-oncologia tornou-se possível devido a uma maior possibilidade e abertura dos pacientes com câncer e seus familiares de falar sobre a doença e o prognóstico, já que antigamente muitos médicos tinham o costume de esconder ou atrasar a revelação do diagnóstico, o que impedia qualquer tipo de trabalho que envolvesse as questões emocionais relativas à doença.

Segundo Gimenez, Carvalho – Magui e Carvalho (In Angerami-Camon, 2006), a Psico-oncologia no Brasil surgiu a partir da mudança de visão dos profissionais de saúde e da opinião pública em geral, a respeito da doença e seu aspecto psicossocial. Neste mesmo contexto, o reconhecimento dos fatores psicológicos como contribuintes para o desenvolvimento do câncer e a necessidade de uma intervenção psicossocial nesta área, fez com que diversos profissionais, inspirados em serviços de Psico-oncologia existentes em outros países, percebessem a necessidade de investimento neste Campo.

A formação em Psico-oncologia é essencial para o cuidado aos pacientes com câncer já que representa a união entre Psicologia e Oncologia, resultando em um maior conhecimento a respeito destas duas áreas de trabalho. Este conhecimento posssibilita a integração destas duas especialidades dentro de uma perspectiva de trabalho que vise à valorização dos aspectos emocionais do paciente oncológico e a inclusão destes fatores no seu tratamento.

Possibilidades de atuação do psicólogo na Oncologia Pediátrica. Como já foi possível notar durante todo este trabalho, a participação do psicólogo na equipe de Oncologia Pediátrica é imprescindível, devido ao fato de que o câncer não se trata somente do adoecimento de um corpo devido a uma multiplicação desordenada de células. O câncer, assim como qualquer outra doença, atinge o corpo sim, mas o corpo de um sujeito, alguém que possui uma história de vida, faz parte de um contexto específico e possui uma singularidade, o que faz com que ele seja diferente de todos os outros pacientes com a mesma doença. Isto quer dizer que cada paciente enfrentará o câncer de uma maneira diferente e por isso não devem ser tratados como se fossem mais um paciente oncológico dentro de um grupo padrão. Sobre isto, Schavelzon (citado por Dubkin, 2007, p.1) diz que “para el cancerólogo la historia comienza com el diagnóstico de cáncer. Para el psicoterapeuta la historia comenzó mucho antes, compreende a su entorno, llega hasta el cáncer y continúa”.

Carnaviera (citada por Petrilli, 2004) fala da equipe de sáude que trata o paciente com câncer e do cuidado que esta deve ter para não tratá-lo como objeto, mas sim como sujeito, principalmente devido á posição passiva que a criança doente se encontra por estar submetida aos cuidados da equipe e também às características físicas dos pacientes  com câncer, que por acabar tornando-os parecidos, faz com que a equipe os trate como iguais.

Sendo assim, antes de qualquer intervenção na Oncologia Pediátrica, o psicólogo deve estar consciente de que está lidando com crianças doentes e não com a doença, e que não é possível levar a cabo nenhum tipo de intervenção terapêutica direcionada a uma criança que não inclua sua família. Além disso, outra regra básica que deve embasar e anteceder qualquer tipo de trabalho do psicólogo é a sua capacidade para o trabalho multi e interdisciplinar, pois para olhar o sujeito na sua totalidade é necessário que o seu trabalho seja compartilhado com todos os outros membros da equipe pertencentes a todas as especialidades necessárias ao tratamento do sujeito.

 Na Oncologia Pediátrica, o psicólogo tem 3 focos de intervenção: a criança, a família e a equipe de saúde. 

Em se tratando da criança, as intervenções do psicólogo podem ser realizadas de várias formas. No leito ou individualmente (quando a criança estiver impossibilitada ou recusar-se a participar de atividades grupais); ou em grupo (musicoterapia, arteterapia, etc.), através da elaboração de atividades com outras crianças, que visem a uma interação social e o compartilhamento de experiências e sentimentos que podem também ajudar para um melhor enfrentamento e elaboração da doença e da hospitalização. Além disso, caso haja necessidade, o suporte emocional à criança também deve ser oferecido após a alta hospitalar.

Além de receber informações, a criança deve ser ouvida, seja através de suas palavras, gestos ou até mesmo através do brincar, quando esta e outras técnicas lúdicas tornam-se possíveis de serem utilizadas no ambiente hospitalar. Toda forma de expressão deve ser utilizada como meio de comunicação com a criança para que esta possa falar de seu mal estar, de sua angústia, tirar dúvidas, dar significado aos acontecimentos e tentar minimamente posicionar-se como sujeito na situação que vivencia.

Alguns temas básicos na vida do ser humano e que ganham significado durante a infância, tornam-se mais presentes durante a vivência de um câncer para a criança.  Vida, morte, doença, identidade, auto-imagem, corpo, são alguns destes temas e a maneira como eles serão tratados definirá a importância e o significado que cada um deles terá no futuro da criança. É papel do psicólogo auxiliar a criança a fim de que o sofrimento proporcionado pelo câncer não influencie de forma negativa nas significações atribuídas pela criança a estes temas.

A sensação de perda de controle sobre o próprio corpo (tanto pela submissão aos procedimentos invasivos quanto pelas limitações impostas pelos sintomas da doença e efeitos colaterais do tratamento) e a sençação de perda da liberdade (tanto devido às limitações de certas atividades impostas pela equipe ainda que a criança sinta-se disposta a realizálas quanto pela superproteção dos pais) deverá ser trabalhada com muita cautela com a criança pois são sensações desagradáveis, sobre as quais ela não tem controle e dos quais ela deve ser orientada e muitas vezes até mesmo convencida do motivo, da importância e  da necessidade de submeter-se a elas.

A auto-imagem também é um tema importante a ser trabalhado com a criança, pois sua aparência modifica bastante durante o tratamento e a forma como ela se vê, a maneira como ela imagina que os outros a percebem e a importância que ela dá a isso, são fundamentais na forma como ela vai lidar com as mudanças estéticas que ocorrem com ela.

O ambiente hospitalar também deve ser modificado de acordo com a necessidade exigida e as possibilidades oferecidas pela instituição a fim de que a criança, apesar dos aparelhos e dos procedimentos invasivos, sinta-se o menos possível longe de casa através de uma proximidade com objetos que sejam familiares a ela e que tornem o ambiente minimamente com a sua “cara”. Além disso Steinmuller (2007) afirma que o espaço hospitalar deve ser rico em elementos sensoriais que estimulem o interesse visual, auditivo, olfativo e tátil, na tentativa de fazer do hospital o lugar mais agradável possível.

Todo o trabalho da Psicologia realizado com a criança na Oncologia Pediátrica, visa à elaboração dos efeitos traumáticos que essa experiência pode proporcionar e fazer dela uma vivência positiva, na medida em que possibilitará a aquisição de recursos saudáveis para lidar com situações difíceis. Além disso a Psicologia também ajudará a impedir que a relação desta criança com o ambiente hospitar e a imagem que ela terá dele sejam negativas e acabem provocando problemas para ela já que independentemente da criança ter outras doenças ou não, uma vez acometida pelo câncer e mesmo curada clinicamente o contato com o ambiente hospitalar ou algo que remeta a ele, ainda que seja através de um consultório médico será inevitável.

Em relação à família, o psicólogo deve oferecer um suporte emocional a fim de que esta possa também enfrentar, da melhor forma possível a situação, já que ela também vivencia tudo com a criança, principalmente a mãe que geralmente é quem toma para si a responsabilidade pelo cuidado do filho doente. O grupo terapêutico com familiares é uma excelente forma de fazer com que estes coloquem em palavras suas emoções e compartilhem sentimentos e vivências com outros familiares que estão passando pela mesma situação. Atendimentos individuais também são indicados em momentos de maior angústia ou para familiares que demonstram uma dificuldade tão grande de lidar com a situação que o impede de assistir a criança doente sem que esta seja afetada negativamente por seu estado emocional

Além de ser bom para cada membro da família ter a oportunidade de falar sobre seus medos, angústias e fantasias e assim ter seu nível de ansiedade reduzido, a criança também ganha com isso pois quanto mais tranqüilos os pais, mais tranqüilidade eles transmitirão à criança, pois eles são uma das formas de mediação entre esta e a doença, já que são eles, juntamente com o médico e todos os demais integrantes da equipe que vão dar significado e justificativa de tudo que se passará com a criança a partir do diagnóstico.

 Inicialmente, um dos meios de minimizar e organizar a confusão de sentimentos que acomete os pais com o recebimento do diagnóstico do filho é desmistificar o caráter mortal do câncer. Mostrar aos pais que cada caso é único e o câncer não afeta a todos da mesma maneira. Também é de grande utilidade esclarecer dúvidas ou pontos obscuros quando necessário e de preferência juntamente com o médico (a fim de estreitar a relação paciente-médico e não desempenhar um papel que não é do psicólogo, quando o esclarecimento de informações médicas tornam-se uma rotina). Outra questão importante e que determina muitas das reações dos pais é a auto culpabilização ou a atribuição de culpa do diagnóstico do filho ao médico. É necessário que os pais tenham consciência de que não há culpados e de que buscar uma causa para a doença, além de ser uma esforço iníutil, não ajudará na recuperação da criança.

A questão da culpa também está relacionada ao consentimento dos pais para que procedimentos invasivos e dolorosos sejam administrados. O motivo pelo qual os procedimentos serão realizados assim como o caráter de necessidade dos mesmos deve ser sempre reforçado para que os pais não se culpem e não temam perder o amor de seus filhos. Este tipo de intervenção também deve ser utilizado nos momentos em que os pais precisam tomar decisões importantes em relação ao tratamento, decisões que muitas vezes podem colocar em risco a vida da criança. 

Ao falar em família, não se pode esquecer os irmãos da criança com câncer, pois eles também têm suas vidas abaladas e sofrem com a ausência dos irmãos quando estes estão hospitalizados. A forma de abordar os irmãos irá variar de acordo com a idade mas independentemente da faixa etária, eles também devem ser ouvidos, receber um suporte emocional e serem informados de tudo o que se passa. Os pais devem ser encorajados a falar com os outros filhos sobre a doença e o tratamento, e atualizá-los a respeito do estado do irmão doente sempre que houver novidades, pois a falta de informação pode levá-los a pensar o pior, e dessa forma agravar o sofrimento. As visitas também devem ser estimuladas.

Devido ao sentimento de abondono vivido pelos irmãos da criança com câncer é importante que haja uma uma conscientização dos pais a respeito da rotina  familiar, orientando-os para que esta permaneça a mesma na medida do possível. Que não negligenciem suas atividades e obrigações por causa da doença do filho e pricipalmente que não deixem de atender também às necessidades dos filhos saudáveis, que podem não ter caráter de vida ou morte mas também podem ser traumáticas se negligenciadas por muito tempo.

Também deve haver um trabalho específico com os pais, a fim de que estes não negligenciem a própria relação conjugal, pois uma vez descoberto o câncer de um filho, toda a rotina da família passa a girar em torno da criança e da sua doença, como se mais nada importasse e merecesse atenção. Sendo assim, quando a criança é curada e a vida volta ao normal, esta já não é mais a mesma. A realidade se mostra e tudo aquilo que deixou de ser investido, expões as consequências do abandono, e no caso dos pais, a maior conseqüência costuma ser a separação, que muitas vezes ocorre ainda durante o tratamento da criança. Um trabalho voltado para os pais consiste em um apoio psicológico tanto preventivo, antes mesmo que o conflito entre o casal se instale, através de aconselhamento e orientação para que não se esqueçam da vida conjugal e não permitam que esta seja afetada pelo momento vivido. No caso de uma conflito já instalado, a terapia de casal ou individual caso um dos pais não aceite a primeira opção também são válidas.

Ao trabalhar com o paciente e sua família, o psicólogo deve basear-se no conceito de crise.

Sendo asssim, é tarefa do psicólogo atuar junto a pacientes e familiares neste momento de crise que é a descoberta do câncer e auxiliá-los na busca de recursos mais eficientes para adaptar-se à situação e lidar com ela da forma mais saudável possível, fazendo dela uma oportunidade de crescimento e amadurecimento. Assim como as crianças, no caso das famílias, caso seja necessário, o apoio psicológico também deve ser oferecido após a alta hospitalar da criança.

O trabalho da Psicologia com a equipe, além de envolver a permanente troca de informações a respeito do paciente a fim de que este seja visto na sua totalidade, também é importante que o psicólogo fortaleça o vínculo terapêutico entre paciente,família e equipe, pois uma boa relação entre eles só tende a favorecer um melhor enfrentamento da situação por parte do paciente e da família, além de colaborar para o trabalho da equipe. O psicólogo deve estar atento a falhas na comunicação na tríade paciente-família-equipe que possam causar uma dificuldade de relacionamento e intervir quando necessário, pois o mais prejudicado em uma situação destas costuma ser o paciente.

É fundamental levar em conta que a equipe que trata de crianças com câncer também necessita de um suporte emocional pois ainda que aquelas crianças não sejam seus parentes, elas estão sob a responsabilidade da equipe, e cabe a ela salvar vidas ou pelo menos tentar amenizar os prejuízos que a doença pode causar. Mas no geral estes sentimentos não são exteriorizados e interpretados por pacientes como frieza ou má vontade.

Sendo assim, em situações de crise, é importante a mediação do psicólogo como facilitador da comunicação entre a equipe-paciente-família visando sempre ao bem estar da criança doente.

As formas e oportunidades de intervenção do psicólogo não se esgotam aqui. O que foi exposto foram algumas das inúmeras possibilidades de trabalho que podem ser realizados na Oncologia Pediátrica. A atuação no contexto hospitalar, seja com pacientes com câncer ou acometidos por outras patologias é extremamente versátil e como já foi dito, exige muita flexibilidade e criatividade nas ações cotidianas, pois as demandas são sempre diversas e imprevisíveis. Desta forma, não há como enumerar todas as possibilidade de atuação do psicólogo, pois elas são infinitas e estão sempre em constante invenção e renovação.

 

Conclusão E Considerações Finais:

A partir da revisão bibliográfica realizada no desenvolvimento do presente trabalho, foi possível perceber opiniões comuns entre os autores que tratam do tema em questão, sendo que o mais importante deles foi a importância dos aspectos emocionais no surgimento, desenvolvimento e cura do câncer. Através de uma visão multifatorial da doença, todos os autores consultados acreditam que os fatores psicológicos influenciam fortemente no processo do adoecimento do câncer devido a uma constante interação entre corpo e mente, e que aqueles fatores merecem a mesma importância dada aos aspectos físicos pela equipe de saúde.

O risco de comprometimentos psíquicos graves também foi mencionado pelos autores, visto que a infância é um período de desenvolvimento da personalidade e conseqüentemente dos padrões de comportamento do sujeito diante do mundo e das pessoas. Sendo assim, situações tão difíceis como um câncer, se não contarem com um apoio adequado, tendem a provocar traumas sérios com graves conseqüências para o futuro da criança.

Também foi unânime entre os autores o fato de que é impossível pensar um tratamento para a criança com câncer que não inclua sua família, já que a imaturidade emocional da criança exige alguém que possa juntamente com ela dar significado a todos os acontecimentos e sensações resultantes do câncer, e não há ninguém melhor e mais apropriado que a própria família.

A necessidade de uma preparação do psicólogo para lidar com a doença e a morte também foi muito mencionada. É imprescindível que este profissional elabore possíveis questões relacionadas a estes temas, que possam interferir negativamente na realização de seu trabalho e impedi-lo de dar o suporte necessário àqueles que tanto necessitam.

Ainda que cada instituição e equipe de saúde tenha crenças, valores e formas de trabalhar próprias e que cada família possua regras e condutas singulares, todos os autores falaram da importância da participação da criança no seu tratamento. É fundamental que, a seu nível de compreensão, a criança seja informada de tudo que diz respeito a sua doença, pois além de saber de que e porque sofre, deve-se impedir que a falta de informações cause um sofrimento ainda maior e desnecessário.

A questão da hospitalização também recebeu destaque em toda a bibliografia utilizada como o momento mais crítico do tratamento da criança com câncer e merecedor de maior atenção. É neste momento que a criança se encontra mais fragilizada, pois além de vivenciar todos os sintomas e limitações inerentes à doença, durante a hospitalização ela ainda deve permanecer longe de seu lar, de sua família, amigos e submeter-se a uma rotina diária e limitadora imposta pela equipe de saúde e a exames e procedimentos invasivos e dolorosos.

A necessidade de um apoio à equipe de saúde também é amplamente discutido pelos autores, pois é ela a responsável pela vida e bem estar da criança durante a hospitalização e isto não é pouca responsabilidade. A equipe que trabalha com crianças com câncer vive um estresse diário muito grande e merecedor de cuidados para que a mesma possa desempenhar seu trabalho da melhor forma possível e em harmonia com o paciente e sua família.

Foi possível perceber após a revisão da bibliografia utilizada, que o trabalho na Oncologia Pediátrica possui além das questões intrínsecas ao trabalho em hospital, questões que são próprias ao trabalho com criança, que exigem, por exemplo, um conhecimento a respeito das várias fases do desenvolvimento infantil, pois cada faixa etária possui características diferentes e que demandam intervenções distintas por parte do psicólogo. Além disso, o conhecimento de Oncologia também torna-se imprescindível, pois não é só do psíquico que deve tratar a Psicologia, assim como não é só do biológico que deve tratar a Medicina. Toda a equipe deve ter um conhecimento e uma visão global da doença e do sujeito doente.

Assim sendo, é importante destacar a necessidade da especialização do psicólogo em Psicologia Hospitalar e em Psico-oncologia, para que o trabalho em Oncologia Pediátrica possa ser mais bem sucedido e não se torne uma adaptação de atividades realizadas em consultórios particulares ou em outros tipos de serviço de saúde que nada tem a ver com as especificidades de uma Oncologia Pediátrica.

Este trabalho não teve a pretensão esgotar o assunto, mas sim contribuir para uma reflexão acerca dos aspectos emocionais da criança com câncer e de seus familiares, e as possibilidades de atuação do psicólogo na Oncologia Pediátrica, a fim de sensibilizar os profissionais de saúde para a necessidade da presença deste profissional nas equipes de Oncologia Pediátrica como mais uma peça fundamental no tratamento de crianças com câncer e humanização dos atendimentos e do ambiente hospitalar.

 

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* Monografia Apresentada, em julho 2007, ao Serviço de Psicologia Hospitalar da 28ª Enfermaria da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, como Requisito Parcial à obtenção do Título de Pós graduado em Psicologia Hospitalar, orientada por Maria Alice Lustosa, PhD, Coordenadora do Curso

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