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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH v.10 n.2 Rio de Janeiro dez. 2007

 

 

Atendimento ao paciente idoso*

 

Elder care

 

 

Maria Alice Lustosa**

Santa Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro

 

 


RESUMO

O cuidado com o idoso, tanto hospitalizado quanto clínico, requer uma equipe interdisciplinar , ligada ao estudo das idiossincrasias do idoso. Assim como o idoso,a família deste também necessita de cuidados , orientações e mesmo apoio. A Gerontologia se desenvolve para prestar esclarecimentos a este assunto.

Palavras-chave: Gerontologia, Atendimento psicológico ao idoso.


ABSTRACT

The care with the hospitalized and clinical old one, needs  a group of different professionals , all of them, focusing  the study of the idiosyncrasies of an old one. As well as the older, his/her family also needs cares, directions and the same support. The Gerontology is developed to give explanations to this subject.

Keywords: Gerontology, Elder care.


 

 

A Geriatria, campo da Medicina que se propõe a cuidar do envelhecimento humano, junta-se a outras disciplinas como Gerontologia Social, Antropologia, Nutrição, Fisioterapia, Psicologia, Serviço Social, Arquitetura, Advocacia, Psiquiatria, Neurologia, com intuito de formação de uma equipe interdisciplinar formando o que se conhece por Gerontologia.

A etimologia da palavra gerontologia , remete à Grécia antiga, quando o geron, ou gerontos/es eram os reconhecidos idosos , sábios valorizados e respeitados daquela ocasião.

A história da Gerontologia é recente, tendo sido um marco importante, quando Metchicoff utiliza este termo pela primeira ,vez com o sentido que se conhece atualmente.

Na 2ª metade do séc. XX, devido ao crescimento da população idosa no mundo, a gerontologia tem seu desenvolvimento acelerado. A população cresce em termos de expectativa de vida, devido a alguns fatores amplamente conhecidos: a. implementação do saneamento básico em regiões carentes de higiene; advento da penicilina, auxiliando os tratamentos infecciosos, evitando-se mortes; diminuição do índice de morte infantil; diminuição das taxas de morte de mulheres durante o parto; e a fantástica aceleração no desenvolvimento tecnológico, possibilitando criação de aparelhos detectores de doenças em suas fases iniciais, assim como permitindo tratamentos a doenças graves.

A velhice é citada no Antigo Testamento, acusando-se assim sua existência em remotas eras .

Na Filosofia, ganha destaque desde conceituações realizadas por Platão, quando este relata que se envelhece da mesma forma que se vive. Platão é um incentivador de que se prepare para o envelhecimento desde a juventude, com atitudes propícias com a saúde. Ele, na verdade, é um precursor do incentivo à prevenção de saúde e da profilaxia, trazendo uma visão positiva da velhice para seus contemporâneos.

De forma diferente, Aristóteles se coloca frente ao envelhecimento, com uma posição pessimista, conceituando velhice como uma “enfermidade natural”, e afirmando que a fase de senectude é a de deterioração e ruína da existência humana.

As investigações científicas relativas à Gerontologia acontecem no século XIX, e encontram em Francis Bacon incentivador importante , quando afirma que a higiene, e condições   sociais  e    médicas,  são responsáveis pelo prolongamento da vida humana .

Outros autores vão desempenhando importante papel no desenvolvimento do estudo sobre a velhice, descobrindo que as diferenças individuais são muitomais acentuadas no período da velhice, do que em qualquer outra etapa da vida

Mais recentemente, precisamente em 1939, o americano Cowdry escreve o 1º Tratado de Gerontologia, descrevendo , sistematicamente, os aspectos biopsicosociais do envelhecimento. Neste mesmo ano, é aberta nos EEUU, a 1ª Associação para Investigação do Envelhecimento, aumentando o inderesse de multiprofissionais em estudos sobre esta temática.

Após a 2ª Guerra Mundia, o interesse pelo estudo do idoso ganha  impulso, e  é o período de florescimento da maioria das Sociedades de Gerontologia, sendo a Americana a primeira delas. A partir desta iniciativa, as publicações científicas são inevitáveis , sendo o Journal of Gerontology responsável pela divulgação de eventos e trabalhos ligados ao idoso.

A Gerontologia tem como objetivo, não só perspectivas do prolongamento da vida, mas da qualidade de vida dos anos adicionados. Sua intenção é o afastamento da morte para o mais longe possível, mas que a vida, até lá, possa ser vivida com qualidaee em várias áreas.

A compreensão da velhice impõe a consideração de aspectos culturais importante. As culturas tratam de seus velhos de diferentes formas, algumas valorizando este período , enquanto outras desvalorizando a população idosa em aspectos sociais de forma cruel.

Não se pode negar, que neste período existencial acontecem muitas perdas significativas, como a dos atrativos físicos jovens, em algumas culturas há perdas de função profissional e de padrão econômico, assim como de autonomia e responsabilidade. Em culturas onde estas perdas são mais valorizadas do que os ganhos de sabedoria, conhecimento, experiência, há de se esperar que podem ocorrer queda da auto-estima, visão negativa da auto-imagem . Neste sentido, o impacto de todos estes aspectos negativos podem atingir o humor, ocasionando sua queda, com perigo de aparecimento de transtornos desta área, onde a depressão maior é o maior risco.

Muitas vezes, incluído em culturas que negativam o envelhecer, o idoso pode sntir a mais profunda dor de viver, dificultando o enfrentamento de situações naturais desta etapa da vida do ser humano: principalmente a perda da acuidade visual, auditiva e motora. Desta forma, pode ser que o idoso recorra a mecanismos mais regressivos , infantilizando-se no trato com as mudanças físicas normais para sua idade, transformando-as em somatizações, trazendo sofrimentos imensos a si e seus familiares.

Uma estrutura familiar sólida e saudável garante ao idoso um lugar com papel ativo e participativo, o qual todos os seres humanos necessitam para uma existência plena e saudável. Isto pode facilitar o idoso a refazer o mapeamento de suas relações familiares e convivência social, garantindo-lhe qualidade de vida fundamental nesta etapa . A manutenção de uma vida de relação, representa a saída saudável do indivíduo que envelheve, pois evita-se o recolhimento narcísico e a regressão, responsável por tantos sofrimentos. O investimento fora do eu propicia uma continuidade subjetiva, rlacionada à razão de viver e à motivação para existir, assim como redirecionamento do projeto existencial.

Quando além de todos estes elementos, o idoso ainda se depara com o adoecimento, mais um grande desafio se lhe apresenta. Dependendo de sua estrutura interna, da integridade da mesma, e dos recursos internos disponíveis , o idoso poderá sair-se bem ou mal da experiência de adoecer e internar-se em uma instituição hospitalar para diagnóstico, tratamento ou cirurgia.

Desta forma , o atendimento psicológico clínico ou hospitalar ao idoso tem características específicas que precisam ser observadas com cautela.

Na clínica, o diagnóstico acurado de seu estado emocional, assim como o conhecimento de seu estado fisiológico, tratamentos e medicações utilizadas, além da contextualização social, permitirão ao psicólogo um planejamento de tratamento mais adequado a este indivíduo.

Não raro a família faz parte integrante deste atendimento, principalmente quando ela está diretamente envolvida na queixa apresentada. O manejo e observância das relações familiares assim como dos papéis desempenhados na tissitura familiar, permitirão ao psicólogo clínico um planejamento mais adequado, e eleição de estratégias mais ajustadas aos objetivos tratados para a situação apresentada.

Ao psicólogo cabe também , a capacidade de trabalho dentro de equipes interdisciplinares, pois este será, na grande maioria das vezes, o ambiente de seu trabalho com a população idosa.

No caso da atuação psicológica hospitalar, a família, o paciente idoso e a equipe de saúde, representam focos de trabalho do psicólogo. O apoio `a estrutura familiar, com o afastamente de um de seus membros deste contexto, se torna instrumento importante para atendimento ao paciente internado, dado que a angústia e ansiedade familiar, em muito podem comprometer o prognóstico e a adesão ao tratamento, por parte do paciente . As dúvidas da família sobre a patologia de seu parente precisam ser minimizadas para que a ansiedade persecutória regrida , e a paz interior possa encontrar lugar para se encaixar. O contato e bom relacionamento com a equipe de saúde, em muito auxiliam o alívio de angústias e ansiedades familiares, e o psicólogo hospitalar tem desempenho fundamental no êxito de tal tarefa.

O paciente hospitalizado, idoso e adoentado, necessita do acolhimento e identificação de suas ansiedades , angústias, medos. Ao psicólogo do ambiente hospitalar cabe o planejamento e execução do atendimento a estas necessidades. O paciente também  pode ter dúvidas sobre seu estado físico, em níveis que precisam ser detectados, observados e respeitados. Necessita de ter alguém com quem possa expressar e dividir seus temores e indecisões, a respeito das temáticas que ali o cercam, e sobretudo, necessita da observância do respeito e ética no lidar com seu corpo, seus aspectos emocionais, e sua religiosidade (caso a tenha). Ao psicólogo cabe a observância do cumprimento adequado destas necessidades.

A equipe de saúde merece também um olhar do psicólogo hospitalar, com relação ao lidar com o paciente idoso internado no hospital. Nem sempre ela está preparada para as idiossincrasias deste atendimento, e às vezes se surpreende ou interpreta erroneamente o comportamento de idosos internados. O sofrimento e as situações fora de recursos terapêuticos de alguns idosos podem abalar sobremaneira a equipe, fazendo-a contratransferir positiva ou negativamente, assim como reações comportamentais inesperadas a medicações realizadas. Não raro, idosos se recusam ao tratamento proposto, ou por sua grande invasão , ou por não acreditarem em sua eficácia. Cabe à equipe de saúde a avaliação de caso a caso, com auxílio da psicologia, para serem traçadas estratégias adequadas às situações vividas.

Desta forma, percebe-se que o idoso demanda atendimento psicológico diferenciado, dependendo de seu estado, mas , certamente, muito se pode oferecer para seu reequilíbrio e remanejamento de defesas egóicas com intuito de reestruturação de seu ambiente interno, abalado , em alguns casos, pelo processo de envelhecimento,assim como por adoecimentos diversos.

 

BIBLIOGRAFIA RECOMENDADA:

Fiorini, H.J. (1985). Teoria e Técnica de Psicoterapias. Rio de Janeiro: Ed.Francisco Alves        [ Links ]

Watzlavick , P; Beavin, J.H.; Jackson, D.D. Pragmática da Comunicação Humana . São Paulo:Editora Cultrix

Mello  Filho, J. de (1992). Psicossomática Hoje. Porto Alegre: Ed Artes Médicas

Helmann, C.G. (1994).  Cultura, Saúde e Doença . Porto Alegre : Ed Artes Médicas

Freud, A. (1966). O Ego e os Mecanismos de Defesa. Rio de Janeiro: BUP

Néri, A.L. (2005). Desenvolvimento e Envelhecimento. Ed. Papirus

Figueiredo, N.M.A.; Tonini, T. (Org). (2008) . Gerontologia: Atuação da Enfermagem no Processo de Envelhecimento. Ed Yendis

Ramos ,L.R. (2005) Geriatria e Gerontologia, Ed Manole

 

 

* Resumo do Trabalho apresentado no VI Congresso da SBPH
** Doutora em Psicologia da Personalidade e Social, pela UFRJ; Coordenadora dos Cursos de Especialização em Psicologia Hospitalar , e de Psicologia Clínica, da 28ª Enfermaria da Sta Casa da Misericórdia do Rio de Janeiro; Coordenadora e Supervisora de Psicologia Hospitalar das Enfermarias 10,15, 28, 32,34, e dos Ambulatórios 18, 28 e 39, da Santa Casa da Misericórdia do RJ; Diretora de Publicação da Revista da SBPH biênios 2005-2007 e 2007-2009; Professora de Gerontologia e Sexualidade Humana do IBMR/RJ; Responsável Técnica do Centro de Estudos em Psicologia (Cepsi); Psicóloga Clínica ; www.cepsi.psc.br

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