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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH v.11 n.1 Rio de Janeiro jun. 2008

 

 

Síndrome de Burnout em trabalhadores da enfermagem de um hospital geral

 

 

Tatiana Detzel da Silva**; Mary Sandra CarlottoI, ***

Universidade Luterana do Brasil, Canoas

 

 


RESUMO

A profissão de Enfermagem tem a função de prestar assistência para sobrevivência de outros, garantindo seu bem-estar físico e emocional. Portanto, o ambiente hospitalar por lidar com pessoas debilitadas, dor, sofrimento e morte, torna-se um ambiente altamente propício a situações de estresse, que se persistentes, podem levar o trabalhador a desenvolver a Síndrome de Burnout. O objetivo deste estudo foi verificar a existência de associação entre a Síndrome de Burnout e variáveis demográficas, profissionais e psicossociais em 131 profissionais da enfermagem de um hospital geral de Porto Alegre. Foi utilizado como instrumento de pesquisa o MBI – Maslach Burnout Inventory (HSS), o Questionário de Satisfação no Trabalho (S20/23) e um questionário elaborado especificamente para este estudo para as demais variáveis. Os resultados obtidos indicam elevado índice de Realização Profissional e índices médios de Exaustão Emocional e Despersonalização. Também se evidencia maior associação entre dimensões de Burnout e variáveis laborais e psicossociais.

Palavras-chaves: Síndrome de Burnout, Estresse ocupacional, Enfermagem.


ABSTRACT

The profession of nursing has the task of providing assistance to survivors of other, ensuring their well-being physical and emotional. So the hospital environment by dealing with depressed people, pain, suffering and death, becomes an environment highly conducive to situations of stress, which is persistent, can lead the employee to develop Burnout Syndrome. The purpose of this study was to verify the existence of the association between the syndrome Burnout and demographic variables, and psychosocial professionals in 131 nursing professionals in a general hospital in Porto Alegre. It was used as a tool to search the MBI - Maslach Burnout Inventory (HSS), the Survey of Satisfaction at Work (S20/23) and a questionnaire designed specifically for this study for the other variables. The results indicate high level of Professional Conduct and average rates of Exhaustion Emotional and Depersonalization. It also shows up greater association between dimensions of Burnout and labour and psychosocial variables.

Keywords: Burnout syndrome, Occupational stress, Nursing.


 

 

Introdução

O trabalho em instituições hospitalares, de acordo com Benevides-Pereira (2002), geralmente, expõe os trabalhadores a diversos estressores como longas jornadas de trabalho, exposição a riscos biológicos, tensão, baixa remuneração, contato direto com dor, sofrimento e morte, o que, muitas vezes, exige um controle emocional maior que em outras profissões. O profissional tem que manejar com pacientes em estado grave; devem compartilhar com o enfermo e seus familiares a angústia, a dor, a depressão e o medo de padecerem (Aranda-Beltrán, Pando-Moreno, Salazar-Estrada; Torres-López; Aldrete-Rodríguez & Pérez-Reyes, 2004; Pando, Bermúdez, Aranda & Pérez, 2000). Malagris e Fiorito (2006) complementam apontando estressores como a dificuldade de executar as tarefas, dificuldades no relacionamento interpessoal, falta de tempo ou ter atividades cansativas após a jornada de trabalho, realizar plantões nos finais de semana, avaliação negativa por parte das chefias, jornada dupla de trabalho entre outros. O exercício profissional é marcado por múltiplas exigências que se somam as condições desfavoráveis de trabalho (Avellar, Iglesias & Valverde, 2007). Rodriguez-Marin (1995) refere que diante de tais situações, podem ocorrer sentimentos de incompetência profissional e insatisfação com a atividade laboral desenvolvida.

Estressores ocupacionais, se persistentes, podem levar o trabalhador a desenvolver a Síndrome de Burnout (SB).  Conforme Maslach e Jackson (1986), a síndrome é fundamentada na perspectiva social-psicológica, constituindo-se de três dimensões: exaustão emocional; despersonalização; e, baixa realização profissional. A exaustão emocional se caracteriza por uma falta ou carência de energia, entusiasmo e um sentimento de esgotamento de recursos. A estes podem somar-se sentimentos de frustração e tensão nos trabalhadores que percebem já não terem condições de despender mais energia para o atendimento de seu cliente ou demais pessoas como em situações profissionais passadas. Despersonalização caracteriza-se por tratar os clientes, colegas e a organização de forma impessoal. É um estado psíquico em que prevalece o cinismo ou a dissimulação afetiva, a crítica exacerbada de tudo e de todos os demais e do meio ambiente. Já a baixa realização profissional faz com que o trabalhador se auto-avalie de forma negativa, sentindo-se infeliz e insatisfeito com seu desenvolvimento profissional.

O Ministério da Saúde do Brasil (2001) reconhece a SB, também denominada de Síndrome do Esgotamento Profissional, como um tipo de resposta prolongada a estressores emocionais e interpessoais crônicos no trabalho que afeta, principalmente, profissionais da área de serviços ou cuidadores, quando em contato direto e persistente com os usuários.

Segundo Rosa e Carlotto (2006), verifica-se uma tendência das organizações hospitalares no investimento da estrutura física, mais especificamente estéticas de suas instalações, com o intuito de gerar avaliação positiva no usuário, estando essa questão relacionada ao mercado consumidor. No entanto, os profissionais que trabalham na instituição precisam, acima de tudo, de melhores condições e organização de trabalho, com suporte de seus supervisores, benefícios e políticas organizacionais que contemplem sua qualidade de vida. Burnout, de acordo com as autoras, em profissionais que atuam na área hospitalar, é uma realidade preocupante, pois na ocorrência desta forma de adoecimento profissional, haverá comprometimento na qualidade da assistência que é prestada ao usuário e toda a rede social envolvida.

Estudo realizado por Curiel-García, Rodríguez-Morán e Guerrero-Romero (2006) em profissionais que atuam em serviços de saúde, identificou a SB em enfermeiras de acordo com o tipo de instituição de trabalho revelando a influência das variáveis contextuais na predição da síndrome. Borges, Argolo e Baker (2006) em estudo realizado em um hospital com profissionais da área da saúde encontrou associação positiva entre as dimensões de exaustão emocional e despersonalização com a carga horária realizada e negativa com o salário recebido, ou seja, quanto menor a renda do profissional, maior era a tendência a apresentar comportamentos de indiferença e ceticismo na relação com o usuário e colegas de trabalho. Investigação realizada por Rosa e Carlotto (2006) identificou associação negativa entre as dimensões de exaustão emocional e despersonalização e a idade dos trabalhadores. Associação positiva também foi identificada entreas três dimensões da SBe a totalidade dos fatores que avaliam a satisfação no trabalho. Dolan (1987), em estudo desenvolvido com enfermeiras, confirmou a hipótese de que a satisfação no trabalho se associava ao Burnout, sendo que quanto maior o nível de satisfação, menor era o nível da síndrome.

O estado atual de conhecimento sobre as possíveis conseqüências de Burnout indica que estas merecem registro importante por sua prevalência, severidade potencial e domínios afetados (Gómez de Cádiz & cols., 1997), bem como pela sua irreversibilidade (Heus & Diekstra, 1999).

A maioria das discussões sobre Burnout pontua que a síndrome é resultante de fatores pessoais e ambientais, contudo, estudos apontam que as características do trabalho são mais relacionadas ao Burnout (Maslach, Schaufeli & Leiter, 2001). Tendo em vista o exposto, o presente estudo buscou verificar se a Síndrome de Burnout apresenta associação com variáveis demográficas, laborais e psicossociais em profissionais de uma organização hospitalar. Assim, o referencial teórico orientou o trabalho para as seguintes hipóteses: H1 – Profissionais da enfermagem apresentam altos índices de SB; H2 - A SB associa-se a variáveis demográficas; H3 - A Síndrome de Burnout associa-se a variáveis laborais; H4 – A SB associa-se a variáveis psicossociais. Para tanto, buscou-se desenvolver um estudo epidemiológico observacional analítico de corte transversal (Grimes & Schulz, 2002)

 

Método

Amostra

A amostra se constituiu de 131 sujeitos, sendo 66 sujeitos do bloco cirúrgico e 65 da unidade de internação, de um Hospital Geral de grande porte da cidade de Porto Alegre. A maioria do grupo (85,5%) pertence ao sexo feminino, é solteiro, separado ou viúvo (55%), possui filhos (52,7%) e tem ensino médio completo (78,6%). A idade média dos sujeitos é de 33,52 anos (DP=8,81). Quanto ao turno de trabalho os resultados evidenciam que, mais da metade dos entrevistados trabalham no turno diurno (64,1%). Possuem, em média, 9,45 anos de experiência profissional (DP=7,97) e 6,58 anos (DP=6,46) de exercício profissional na instituição pesquisada.

Instrumentos

Para o levantamento das variáveis demográficas (sexo, idade, estado civil, escolaridade), laborais (setor, tempo de experiência, tempo de experiência no local, número de pacientes atendidos, carga horária), psicossociais (pensar em desistir da profissão, percepção de fatores de estresse, dias de licença afastamento) foi elaborado um questionário auto-aplicado especificamente para responder aos objetivos do estudo, tendo como base principal o referencial teórico sobre a Síndrome de Burnout em profissionais da área da saúde. Para avaliar a Síndrome de Burnout foi utilizado o MBI - Maslach Burnout Inventory – HSS (1986) que tem a tradução validada para a língua portuguesa por Benevides-Pereira (2001). O inventário é auto-aplicado e avalia como o sujeito vivencia seu trabalho, de acordo com as três dimensões estabelecidas pelo Modelo Teórico de Maslach: Exaustão Emocional (EE) (9 itens), Realização Pessoal no Trabalho (RP) (8 itens) e Despersonalização (DE) (5 itens). Totaliza, portanto, 22 itens que indicam a freqüência das respostas com uma escala de pontuação variando de 1 a 7. Neste estudo, adotou-se o sistema de pontuação de 1 a 5, utilizado por Tamayo (1997) na adaptação brasileira do instrumento, pois foi verificado que os sujeitos apresentavam dificuldade em responder muitos itens dos instrumentos, devido à especificidade dos critérios da escala original. Utilizamos, portanto, 1 para “nunca”, 2 para “algumas vezes ao ano”, 3 para “algumas vezes ao mês”, 4 para indicar “algumas vezes na semana” e 5 para “diariamente”. A consistência interna das três dimensões do inventário é satisfatória, pois apresenta um alfa de Cronbach que vai de 0,71 até 0,90 (Maslach & Jackson, 1981). Para avaliação da Satisfação no Trabalho foi utilizada a versão adaptada para o Brasil do Questionário de Satisfação no Trabalho - S20/23 de Meliá e Peiró (1989) realizada por Carlotto e Câmara (prelo). Nessa, o instrumento constitui-se de três dimensões: Satisfação com as Relações Hierárquicas - SRH (11 itens), Satisfação com o Ambiente Físico de Trabalho - SAFT (5 itens) e Satisfação Intrínseca com o Trabalho e Oportunidades de Crescimento – SITOPC (7 itens). Totaliza 23 itens avaliados em uma escala de pontuação que varia de 1 (muito insatisfeito) a 5 (totalmente satisfeito). A consistência interna das três dimensões vai de 0,71 a 0,95.

Procedimentos

Primeiramente buscou-se a apreciação e autorização do projeto pela direção do Hospital, e a devida comunicação às chefias e gerências do setor de enfermagem. Assim, após esta etapa, foi selecionada a amostra e os sujeitos foram contatados pela pesquisadora, que explicou o objetivo da investigação, forneceu informações quanto ao preenchimento dos questionários e sobre as questões éticas envolvidas. A coleta dos dados foi iniciada na última semana do mês de março e encerrou na penúltima semana do mês de abril de 2008.

A pesquisa tem aprovação do Comitê de Ética da instituição hospitalar onde foi realizado o estudo, tendo sido realizados os procedimentos éticos conforme resolução 196 do Conselho Nacional de Saúde (CNS), no que diz respeito à pesquisa com seres humanos (Ministério da Saúde, 1997).

O banco de dados foi digitado e posteriormente analisado através do SPSS (Statistical Package for the Social Sciences). Após realizaram-se análises descritivas de caráter exploratório a fim de avaliar a distribuição dos itens, casos omissos e identificação de extremos. Posteriormente foram submetidos à análise descritiva (médias e desvio-padrão) e inferencial (correlação de Pearson, prova t de student e ANOVA) para identificar associação entre Burnout e variáveis demográficas, laborais e psicossociais.

 

Resultados

Os resultados obtidos indicam elevado índice de Realização Profissional (3,79; DP = 0,75), e índices médios de Exaustão Emocional (2,47; DP = 0,73) e Despersonalização (2,59; DP = 0,54), considerando uma escala de pontuação de 1 a 5.

Nos resultados que investigam a relação entre Burnout e as variáveis qualitativas, pode-se verificar que a Exaustão emocional eleva-se na medida em que diminui a satisfação com as relações hierárquicas, a satisfação intrínseca com o trabalho e oportunidades de crescimento, a carga horária e o número de dias por licença-pessoal. Com relação aos fatores de estresse, observa-se que quanto maior a percepção de que a profissão é estressante assim como a carga horária, a escala, o tipo de paciente atendido, as condições de trabalho e a dificuldade em conciliar trabalho e família, maior é o sentimento de exaustão emocional.  A despersonalização aumenta com a insatisfação com as relações hierárquicas, com o menor tempo de experiência profissional e número de dias de licença-saúde.  Já a realização profissional aumenta na medida em que aumenta a satisfação com as relações hierárquicas, com o ambiente físico de trabalho, com o conteúdo das atividades desenvolvidas e  com as oportunidades de crescimento profissional. Quanto maior a carga horária, maior a realização profissional. Já perceber como estressante conciliar família e trabalho, diminui o sentimento de que o trabalho é elemento de realização profissional.

Tabela 1 - Relação entre dimensões de Burnout e variáveis quantitativas

inserir tabela

Nota: * Correlação significativa ao nível de 5%

** Correlação significativa ao nível de 1%

EE: Exaustão emocional   DE: Despersonalização   RP: Realização profissional

No que diz respeito às variáveis qualitativas, verifica-se que profissionais com curso superior apresentam médias mais elevadas em despersonalização e os que trabalham somente no hospital apresentam maior realização profissional no trabalho. Os trabalhadores que possuem afastamento por problemas de saúde apresentam menor exaustão emocional, maior despersonalização e realização profissional.

 

 

Discussão

Os resultados obtidos indicam elevado índice de Realização Profissional e índices médios de Exaustão Emocional e Despersonalização. Assim, a hipótese 1 do estudo, a de que  os profissionais apresentavam a SBnão foi confirmada., uma vez que, segundo Maslach e Jackson (1981), altos escores em exaustão emocional e despersonalização e baixos escores em realização pessoal são indicativos  de Burnout.

Com relação à hipótese 2, que avaliava a relação com variáveis demográficas, esta foi confirmada parcialmente, somente na variável escolaridade.  Resultados indicam que os profissionais com curso superior apresentam maiores índices de despersonalização.Resultado semelhante foi identificado por Shulz, Greenley e Brown (1995) em estudo com enfermeiras e por Ahola, Honkonen, Isometsä, Kalimo, Nykyri, Koskinen e Aromaa (2006) com trabalhadores finlandeses de várias ocupações. É possível que pessoas com alto nível de educação tenham maiores expectativas quanto ao futuro de sua carreira e o que ela acrescentará em sua vida. O nível de escolaridade pode ser visto como uma garantia de um trabalho com alta remuneração, prestígio e poder (Friedman, 1991; Maslach & Jackson, 1985).  Associado a este fato, são destinadas ao enfermeiro várias atribuições como a assistência e realização de atividades burocráticas e organizacionais que podem influenciar na despersonalização.

No que diz respeito à relação das dimensões de Burnout com variáveis laborais, referente à hipótese 3, verifica-se que  o tempo de experiência no local associa-se à despersonalização. Pode-se supor que á medida que o profissional adquire maior domínio do trabalho e manejo nas relações que tem que estabelecer na instituição, menor é o sentimento de distanciamento da clientela atendida.  Segundo Mendes e Nunes (1999) e Isorna (1998), este resultado pode estar relacionado ao fato de profissionais com mais tempo de trabalho possuir mais segurança na realização de tarefas, bem como relações de trabalho mais significativas, sendo, portanto, menos vulneráveis ao Burnout.  Verifica-se que quanto maior a carga horária, menor é o sentimento de desgaste emocional e realização profissional. Este resultado também foi encontrado por Cornelius e Carlotto (2007) em estudo com trabalhadores de atendimento de urgência. Segundo as autoras, menos horas de trabalho, não significa trabalhar menos, mas sim realizar mais atendimentos dentro de determinada jornada, aumentando a pressão por concluir os mesmos, ocorrendo assim a sobrecarga laboral, e, conseqüentemente, o sentimento de desgaste.  Já a elevação da carga horária destinada ao local de trabalho, aumenta a Realização Profissional, podendo este resultado sinalizar que um maior tempo de dedicação à execução da atividade, permite um maior envolvimento do indivíduo para com seu trabalho, tornando-o mais gratificante, pois provavelmente em uma jornada mais extensa, o profissional consegue ter retorno dos resultados do seu trabalho. Esse resultado corrobora o encontrado com relação aos trabalhadores que atuam somente na instituição.

A hipótese 4, que investiga a relação com variáveis psicossociais, confirma-se quase que totalmente uma vez que encontra-se relação entre as dimensões de Burnout e praticamente todas as variáveis psicossociais.  Pensar em desistir da profissão associou-se as três dimensões, podendo esse resultado ser entendido como uma conseqüência da SB, segundo Maslach e Goldberg (1998). A intenção de abandonar a organização ou a saída psicológica são tentativas de lidar com a exaustão emocional (Lee & Ashforth, 1996). O absenteísmo por problemas de saúde também evidenciou relação com as três dimensões da síndrome. Os trabalhadores que possuem afastamento por problemas de saúde apresentam menor exaustão emocional, maior despersonalização e realização profissional. Quanto maior o número de dias licença-saúde, menor é a despersonalização e quanto maior a quantidade de dias de licença-pessoal, maior é a exaustão emocional. Segundo Rudow (1999), os trabalhadores com Burnout apresentam, em sua fase inicial, pequenas ausências, tornando-se mais contínuas à medida que as fases de Burnout progridem. Conforme Pereira (2002), o absenteísmo, enquanto sintoma defensivo, torna-se uma possibilidade de alívio para tentar diminuir o estresse laboral, sendo que, as faltas servem para que o indivíduo possa levar adiante a situação desconfortável que se tornou sua atividade laboral.

A percepção de que a profissão, a carga horária, a escala de trabalho, o tipo de paciente atendido, as condições de trabalho e que conciliar o trabalho com vida familiar é estressante, maior é o sentimento de desgaste emocional. Perceber como estressor a dificuldade em conciliar o trabalho com a vida familiar diminui o sentimento de realização profissional.   Tendo em vista que os estressores associam-se a fatores contextuais do trabalho e que esses elevam o sentimento de exaustão emocional, primeira dimensão a surgir, de acordo com o modelo processual de Burnout, pode-se pensar serem esses importantes fatores de risco de desenvolvimento da síndrome. Segundo Cherniss (1995), a natureza das organizações e a organização do trabalho afetam as respostas do indivíduo em seu trabalho. Burnout representa uma forma de adaptação às fontes de estresse, geralmente causadas pelo trabalho estressante, frustrante e monótono, típico das profissões de ajuda.

Com relação à satisfação no trabalho, verifica-se que quanto maior a satisfação com as relações hierárquicas e com o trabalho intrínseco e oportunidade de crescimento profissional, menor é o sentimento de desgaste emocional. Já, somente a satisfação com as relações hierárquicas, influencia para a diminuição da despersonalização.  A realização profissional no trabalho aumenta com as três dimensões da satisfação no trabalho.  Segundo Hackman e Oldham (1980), o trabalho desenvolvido pelo indivíduo deve ser importante não só para ele, mas também para seus colegas, clientes, chefias e para os resultados globais da organização onde trabalha. O trabalho deve ser desafiador, fazendo com que o indivíduo tenha oportunidade de utilizar e desenvolver suas várias habilidades podendo crescer profissionalmente a partir dos seus investimentos. De acordo com Gil-Monte e Peiró (1997), a relação entre SB e a satisfação no trabalho é significativa e demonstrada de forma consistente na literatura, sejam estas variáveis estimadas de forma global ou mediante suas diferentes dimensões. Segundo os autores, as dimensões de Burnout e satisfação no trabalho estão negativamente relacionadas com os sentimentos de exaustão emocional e despersonalização e positivamente relacionada com a dimensão de realização pessoal no trabalho.

O estudo aponta para um quadro complexo de variáveis que podem prevenir ou ocasionar Burnout no grupo de enfermagem do hospital investigado. Certamente há necessidade de aprofundamento dos resultados obtidos, uma vez que a literatura ainda é bastante restrita no Brasil sobre a SB com esta população. Assim, sugere-se a realização de novos estudos, com outros delineamentos e variáveis. Porém, os resultados encontrados sinalizam a importância de intervenções que atuem sobre as variáveis laborais e psicossociais que influenciam o desenvolvimento do Burnout em trabalhadores.

 

Referências

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** Tatiana Detzel da Silva: Psicóloga graduada pelo Curso de Psicologia - ULBRA/Canoas
Rua José da Silva Bernardo 205 – Porto Alegre-RS. E-mail: tatianadetzel@hotmail.com
*** Mary Sandra Carlotto: Psicóloga, Mestre em Saúde Coletiva (ULBRA-RS), Doutora em Psicologia Social (USC/ES); Professora do Curso de Psicologia, pesquisadora do LAEPPSI-Laboratório de Ensino e Pesquisa em Psicologia e do PPG em Saúde Coletiva da ULBRA/Canoas. E-mail: mscarlotto@gmail.com

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