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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH vol.14 no.2 Rio de Janeiro dez. 2011

 

DISCURSO DE ABERTURA DO CONGRESSO

 

 

DISCURSO DE ABERTURA DO CONGRESSO VIII CONGRESSO DA SBPH, OCORRIDO DE 11 A 14 DE AGOSTO DE 2011, EM CURITIBA, PROFERIDO PELA PRESIDENTE DA SBPH, GESTÃO 2009-20011 , CLAIRE THEREZINHA LAZZARETTI

 

 

Exmª. Sra. Isa Hermann, Representante do Secretário Estadual de Saúde
Exmª. Sra. Anice Holanda Nunes Maia, representante do CFP
Exmº. Sr. Bruno Mader, representante do CRP do Paraná
Exmª. Sra. Raquel Pusch, presidente do VIII Congresso da SBPH.

 

 

Inicialmente quero agradecer o CRP do Paraná, que sempre acreditou, incentivou e oportunizou que o trabalho da psicologia no hospital fosse discutido e apresentado, contribuindo para que esta especialidade da psicologia se fortalecesse no Paraná.

Agradeço também ao CFP por ter acreditado na parceria com a SBPH e nos conceder a responsabilidade de continuar realizando no interior de nosso Congresso o Concurso de Provas e Títulos de Especialista em Psicologia Hospitalar.

Meus agradecimentos aos colegas de Diretoria e à Comissão Organizadora que não mediram esforços para a realização deste Congresso.

Agradeço aos nossos patrocinadores e expositores pela credibilidade demonstrada e a todos que, de alguma forma, contribuíram para a realização deste evento.

 

Caros congressistas,

É com muita honra e imensa alegria que venho, em nome da SBPH, recebê-los para o seu VIII CONGRESSO.

Inserido numa série, há 13 anos vem acontecendo em diferentes estados do Brasil. Promover este Congresso, aqui no Paraná, é a realização de um sonho; o sonho de receber e congregar psicólogos dos mais variados cantos deste imenso Brasil, que vieram expor suas práticas voltadas para a psicologia no hospital, contribuindo com a consolidação de uma área de atuação da psicologia, que se encontra em franca ampliação.

O Paraná tem como um dos símbolos o pinheiro araucária, também denominado pelos indígenas de Curi, que deu o nome à cidade Curitiba. O pinheiro do Paraná, apesar de popular, não é completamente conhecido pela ciência. Esse conhecimento imperfeito da matéria, mais as variadas exigências que a planta impõe no cultivo planejado para que possa render bem, desanima muitos reflorestadores, que preferem espécies conhecidas, de crescimento mais rápido e que não demandem tantos cuidados. O pinheiro do Paraná é uma árvore que demora anos para engrossar, mas por outro lado é disseminado, segundo a lenda, pela gralha azul que deixa cair o pinhão e lá ele se transforma numa árvore valiosa.

A araucária é então mais dispendiosa, pois leva muito tempo para se desenvolver. Logo, o plantio de um outro pinheiro - o pinus - tem sido a escolha de reflorestamento por ser uma produção mais rápida e com melhor retorno comercial.

Nesta paisagem podemos entrever do primeiro uma história e do segundo uma produção, um resultado rápido.

Podemos também notar o tempo de desenvolvimento, que no primeiro é lento, mas duradouro, enquanto que no segundo é rápido, pode chegar a render bem mas não necessariamente é duradouro.

E ainda nesta paisagem não podemos reconhecer a realidade de um trabalho de psicologia clínica num ambiente hospitalar?

Afinal, nosso trabalho é plantado sobre um terreno contemporâneo, o da medicina moderna, que se inclina para a obtenção de resultados, muitas vezes ao custo de deixar de lado a história, as raízes, o tempo que cada paciente necessita para elaborar seu mal-estar. Seja este físico, mental ou espiritual.

A inserção da psicologia clínica nos hospitais leva muito mais o tempo de uma araucária do que de um pinus. E não apenas pelas dificuldades da ciência médica moderna em compreender que, tal qual uma araucária, é incompleta e não domina o conjunto complexo de elementos, órgãos e funcionamento do ser humano.

É que as diversas ramificações da área do saber não devem se destacar umas sobre as outras, pois o paciente é um só. Não é só corpo e nem é só mente.

A psicologia em hospital geral não deixa de ser psicologia. Com seus referenciais conceituais e éticos, a prática da psicologia em hospital deve abrir seu galho nesta grande copa das ciências, instituindo mais uma clínica dentre tantas que acontecem no hospital.

Hoje, com a multidisciplinariedade, muitas vezes somos contratados para cumprir protocolos, mas nossos atos só por isso deveriam ser "protocolares?". Nas emergências somos chamados a tranquilizar pacientes e/ou familiares, mas nossos atos deveriam ser os de bombeiro? (Pois quantas vezes a urgência denuncia algo que ao invés de calar podemos propor a escutar?). Nos preparos para cirurgia somos muitas vezes chamados a orientar, às vezes até a informar, mas nosso procedimento deveria sobrepor uma adaptação ou convencimento ao acolhimento de uma eventual angústia?

Este VIII congresso da SBPH reunirá trabalhos, dos mais variados, que abordarão tanto os passos já caminhados quanto os passos ainda por construir, em sintonia como o seu tema central: “As Construções Históricas e as especialidades na psicologia hospitalar”.

O compromisso de propiciar estas discussões e possíveis construções em seus congressos é um dos principais objetivos da SBPH. Acreditamos que o imenso avanço da ciência e tecnologia na área da saúde, exige também o avanço do conhecimento em outras áreas como a das ciências humanas, não só no que toca aos equipamentos e materiais, mas também nas atividades profissionais e demais instâncias do comportamento humano. A psicologia na sua especificidade pode abordar e dar lugar à subjetividade no contexto da medicina e da assistência hospitalar, construindo um saber, que amplia este espaço a partir da formalização de práticas, reflexões, pesquisas e produções científicas neste campo.

Apesar das mais de três décadas de existência, a psicologia no hospital é recente em nosso meio. Muitos ainda questionam se bons médicos não dariam o apoio do qual necessita o doente, já que os médicos sabem da importância dos fatores psicológicos nas doenças. O médico atende a demanda dos pacientes que chegam ao hospital, lida, antes de mais nada, com variáveis orgânicas, com histórico e etiologia da doença. Seu objeto é a doença. A psicologia se tem o singular da pessoa como seu universo de tratamento. É certo que habitamos um corpo, que possuímos um cérebro, que funcionamos movidos por neurônios, hormônios, órgãos sensoriais e motores, mas é certo também que tudo isso parece e produz uma dimensão que marca nossa espécie e que chamamos de humana. Falar de singularidade é falar desse humano que existe em cada um de nós e que nos constitui enquanto sujeitos.

Nos hospitais, as pessoas vão em busca do cuidado. Estão angustiadas e temerosas frente à ameaça da doença e da morte.

A singularidade nos mostra a importância de vermos estas pessoas como detentoras de características peculiares, herdadas ou construídas no decorrer da sua história de vida, que é única e intransferível. Por isso, para saber sobre uma pessoa, para conhecê-la, precisamos, sobretudo ouvi-la, escutá-la. E este é o foco da psicologia clínica no hospital. Ouvir clientes, familiares e profissionais de saúde, na busca da compreensão de suas histórias pessoais, de sua forma peculiar de pensar, sentir e agir é a estratégia básica de ação do psicólogo.

E para finalizar, são os votos da SBPH que os trabalhos possam estimular novos plantios. Se à gralha-azul se atribui a origem de nossos pinheirais seculares, que possamos renovar o conhecimento em nosso meio, sem que esqueçamos nossa história, nossa origem, nossa ética.

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