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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH vol.15 no.1 Rio de Janeiro jun. 2012

 

ARTIGOS

 

Coração e alma: vida e outros símbolos das doenças cardíacas na realidade hospitar

 

Heart and soul: the life and other symbols of heart disease in hospital reality

 

 

Francieli de Fatima Otto*; Juliano Maluf Amui*; Marilza Mestre*

Faculdade Evangélica, Paraná–Hospital Universitário Evangélico de Curitiba

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente estudo mostra uma pesquisa realizada com uma amostra-piloto com N=14 participantes, pacientes internados na enfermaria de clinica cardíaca do Hospital Evangélico Universitário de Curitiba (HUEC). O objetivo geral foi verificar junto a esses pacientes se a constelação de complexos correlatos aos sintomas das doenças cardíacas seriam modificadas por meio de intervenção psicológica focal. O método utilizado foi o quasi-experimental, tendo como instrumento o Teste de Associação de Palavras (Jung, 1995), que identifica os possíveis complexos ativados num indivíduo, possibilitando uma intervenção mais eficaz aos pacientes. O procedimento se deu pela seleção da amostra, aplicação do: TCLE, questionário socioeconômico, Teste de Associação de Palavras e o pedido de um desenho de um coração. Em seguida aconteceram as intervenções psicológicas, com abordagem junguiana, onde foram repetidas a aplicação do teste de associação e o desenho do coração, que serviram como mensuração dos dados. Os resultados mostram uma redução significativa dos complexos, medida pela queda no tempo de reação ao teste e nos demais distúrbios definidos por Jung. Concluindo, o trabalho com o teste de associação de palavras no ambiente hospitalar, possibilitou a identificação de conteúdos inconscientes contribuindo ainda, para uma maior eficácia das intervenções realizadas. Os pacientes entraram em contato com seus complexos, houve conscientização dos conteúdos, que diminuíram sua força. E, uma nova estratégia de atendimento em psicologia hospitalar foi adaptada pela autora: expressão de sentimentos via simbolização no desenho de um coração.

Palavras-chave: Psicologia hospitalar, Coração, Complexos e método experimental.


ABSTRACT

This research shows a study conducted with a sample of N = 14 participants, patients admitted to the ward Evangelical University Hospital of Curitiba (HUEC). The overall objective was to check with these patients if the complex constellation of symptoms related to heart disease would be modified through psychological intervention focus. The method used was quasi-experimental testing as a tool with word association, which identifies the possible activated complex in an individual, enabling more effective intervention for patients. The procedure took place for sample selection, application of TCLE, socioeconomic questionnaire, test of word association and the request for drawing a hearth. Then came the intervention and was repeated the test application and design association, which served to data's measure. The results show reduction of complex measures for the fall in response time of the test and in other disorders of reaction defined by Jung, 1995. In conclusion, the work with the word association test in the hospital environment enabled the identification of unconscious contents thus contributing to greater effectiveness of interventions. And a new strategy of care in hospital psychology was adapted by author: expression of feelings through symbolism in design of a heart.

Keywords: Hospital psychology, Heart, Complex and experimental method.


 

 

Introdução

O coração é visto, desde antes da descoberta de sua real função fisiológica, que é transportar o sangue para todo o corpo, como o centro das emoções, da vida, da coragem e da razão. Seu símbolo é o mais universal de todos (Prates, 2005). Essa forma arquetípica de olhar o coração está presente na vida das pessoas e é usado para expressar vários sentimentos [...] "fulano está com o coração partido, sangrando, duro como pedra, apertado, explodindo de alegria, estou com um vazio no peito (onde se localiza o coração)", ou então "fulano mora no meu coração!"

As emoções são experienciadas corporalmente e isso quer dizer que o corpo, a psique e o mundo estão integrados, buscando um equilíbrio entre si. A doença, seja ela qual for, desequilibra ou reestrutura esse sistema. Na maioria dos casos, quando se descobre uma doença, o indivíduo pode ser tomado por um sentimento de castigo e não perceber que essa nova situação de vida pode estar iniciando um processo de transformação, que pode ser benéfica ou não a ele, e que vai depender do processo de enfrentamento de cada um.

Considerando estes fatores, surgiu a intenção de desenvolver uma pesquisa que pudesse contribuir junto ao paciente o desenvolvimento desta idéia de integração corpo-alma-psique e com isso promover maior conscientização de que o corpo é afetado pelas emoções podendo responder em forma de doença.

Enquanto estágio curricular, o trabalho teve objetivo de intervenção sócio-comunitária, no sentido de beneficiar aos doentes internados na clinica cardíaca, neste momento de dor e doença. Mas, também de atividade de pesquisa, onde os resultados de tal práxis pretendeu servir a mais pacientes e outros profissionais da saúde na sua aplicação à saúde pública. Ainda, enquanto pesquisa, objetivou coletar dados que comprovassem a importância de tal programa de intervenção, feita precocemente, como fator de melhoria na qualidade de vida da população, favorecendo diminuição dos gastos sociais com as freqüentes situações de recidiva de internamentos. Entendendo que a proposta de saúde pública seja além de reabilitação de doenças, mas a prevenção das mesmas.

Ressaltando que alterações emocionais e psíquicas causadas pelo processo do adoecer fazem com que pacientes possam alcançar um processo de autotransformação, voltando-se para o Si-mesmo através da ampliação da consciência e do desenvolvimento de sua psique, num processo de individuação, sendo esta uma hipótese clinica exaustivamente comprovada em consultório psicológico, mas ainda não tendo sido feita em espaço hospitalar.

 

Método

O método utilizado foi o quasi-experimental, com delineamento de caso-único, repetido caso a caso, com os pacientes, e orientado pela Dra. Marilza Mestre.

Para mensuração da variável dependente (VD, que são as constelações dos complexos), usou-se onze critérios descritos por Jung (1995), e observadas no momento da aplicação do teste. As variáveis independentes (VI) que se pretendia que controlassem tais alterações foram as intervenções psicológicas, escolhidas caso a caso, segundo a demanda particular dos participantes, avaliados por diagnóstico clinico analítico.

 

Participantes

Com um N= 14, participaram desta amostra pacientes internados em enfermaria cardíaca do HUEC. Contudo, esta foi dividida em duas sub-amostras: n= 10 pacientes que iniciaram com o estudo e deixaram de responder ao mesmo em alguma etapa de sua evolução (5 homens e 5 mulheres) e n'= 4 pacientes que concluíram a pesquisa (2 homens e 2 mulheres).

Os critérios de inclusão na amostra sendo: a) que o internamento fosse por um período de permanência hospitalar de, no mínimo três dias; b) serem todos adultos, entre 18 e 60 anos (pacientes menores de idade poderiam participar por meio da permissão de seu responsável), lúcidos e c) portadores de toda e qualquer patologia cardíaca.

A escolha dos pacientes aconteceu de forma aleatória, obedecendo aos critérios estabelecidos pela pesquisadora e seus orientadores e indicação da enfermagem do tempo provável de internamento.

Local

Enfermaria cardíaca, situada no 3º andar do HUEC, situado a Alemeda Augusto Stellfeld, 1908, Bigorrilho, Curitiba –Pr, 80730-150.

 

Instrumentos

Foram usados quatro (4) instrumentos para coletar os dados:

1) Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), em acordo com a resolução no 196/96 do Conselho Nacional de Saúde sobre pesquisas com seres humanos;

2) Questionário socioeconômico-cultural. A finalidade deste é servir de roteiro condutor de entrevista semi-direcionada, para coleta de informações clinicas sobre o contexto no qual o paciente está inserido e fornecer, assim, subsídios à escolha das técnicas de intervenção psicológica a ser escolhidas;

3) Teste de Associação de Palavras (Jung, 1995 p. 453). Como medida de pré e pós-teste, mensuradora de alteração na VD:

1. Tempo de reação da resposta;

2. Repetição pelo examinando da palavra-estímulo;

3. Compreensão errada da palavra-estímulo;

4. Reações mímicas;

5. Reações com mais de uma palavra;

6. Reação claramente superficial;

7. Reação sem sentido;

8. "Falha" (não ocorre reação alguma);

9. Perseveração;

10. Reprodução incorreta;

11. Lapsos de linguagem;

Para maior exatidão da apuração dos dados, foi criada uma tabela de registro de eventos – contendo as onze situações verificáveis, que apontam para a presença de um complexo e que serviu de linha de base à análise dos resultados.

Foi levado em conta, também, o aparecimento repentino de alterações fisiológicas, que evidenciam o surgimento de emoções (Jung, 1995) no processo de aplicação do teste e, conforme observado anteriormente, também é considerado como indício de constelação de complexos.

4) Técnicas de Intervenção psicológica: Após levantamento dos dados, com cada participante, pôde-se então definir a intervenção ocorrida de modo individual. A definição das técnicas de intervenção adequadas para cada caso foi promovida pela aluna e o supervisor professor Juliano Amui.

Foram utilizadas as técnicas: amplificação ou método sintético construtivo (Jung, 2008; Kast, 1997), o manejo verbal de conteúdos projetivos (Gambini, 1988), a imaginação ativa (Weaver, 1996; Middelkoop, 1996), técnicas expressivas como o desenho e a escrita (Silveira, 1981). Neste trabalho a autora desenvolveu uma proposta de técnica de intervenção psicológica tendo como base Hillman (2010), uma vez que o tema de pesquisa especificamente trataria de conteúdos ligados a doença cardíaca. Lembrando que foram priorizadas técnicas e materiais de uso mais adequado ao contexto hospitalar e à condição do paciente em questão.

 

Procedimentos

1) Seleção da amostra: contato constante com a equipe de enfermagem local, para que pudessem indicar quais as pessoas que internados no tempo necessário para a pesquisa. Isto porque os enfermeiros têm mais contato com a equipe e cada paciente, sabendo, assim, quais seriam os procedimentos médicos de cada um deles.

2) Coleta dos dados com pacientes: Apresentação da pesquisadora ao paciente, solicitação de autorização via TCLE, seguida de avaliação (entrevista semi-estruturada), avaliação subjetiva (qualitativa) da percepção do paciente a respeito de quais constelações acerca da doença ele apresenta;

3) Intervenção psicológica: três sessões individuais, com duração aproximada de 60 minutos cada, organizada mediante a escolha das técnicas utilizadas.

3a) Imaginação ativa: Possibilita o trabalho com conteúdos inconscientes (via representação pessoal, uso de imagens e símbolos, auxiliando também na retirada de projeção (Weaver, 1996; Middelkoop, 1996; Gambini 1988);

3a1) Técnica de imaginação ativa elaborada a partir da idéia de Hillman (2010): A pesquisadora, a partir desta, adaptou-a utilizando a metáfora dos três aspectos do coração. Nesta técnica de narrativa acerca de: a) falar do coração "corpo" ou Harvey, enquanto órgão que manda sangue para todo o corpo, pelas veias e artérias. b) falar do coração "imagem" ou "coração de leão": "Meu coração é minha humanidade, minha coragem para viver, minha força e minha paixão selvagem. Por causa dele, nada me é estranho; tudo pode ser admitido em seu reino de dignidade. Minhas virtudes mais nobres emanam do coração: lealdade, audácia heróica, compaixão", sendo este relacionado aos sentimentos diante das vivências de cada um e que são demonstrados e percebidos pelos outros. c) E, do "coração alma" ou "coração de Agostinho": "Meu coração é meu amor, meus sentimentos, o lócus de minha alma e de meu sentido de pessoa. É o lugar da interioridade íntima, onde habitam pecado, vergonha e desejo, e também o inescrutável divino". Este trata da voz interior pouco escutada, mas que chama atenção da pessoa para sua individualidade, pois reverberam dentro do paciente e se trata de seus sentimentos mais íntimos e que só podem ser percebidos por ele mesmo (Hillman, 2010, p. 18).

Após a escuta da narrativa, o paciente era estimulado a entrar em contato com estes três corações, a fim de percebê-los e escutá-los. Frente a isto, as técnicas junguianas auxiliavam a:

8b) Amplificação ou método sintético construtivo: método associativo para se trabalhar conteúdos psíquicos aparentemente sem significado, e trazê-los à consciência com sentido e compreensão (Jung, 2008). Possibilita formas de lidar e elaborar afetos incoerentes como, por exemplo, no enfrentamento do sofrimento (Kast, 1997).

8c) Manejo verbal de conteúdos projetivos: A projeção se trata de conteúdos inconscientes de um indivíduo, não reconhecidos como tais e percebidos como pertencentes a uma outra pessoa. Autônomos, pois inconscientes, daí a impossíbilidade de produzi-los ou impedi-los de se manifestar. O manejo verbal não conceitual e vivencial destes proporciona que se reconheçam seus conteúdos a partir daquilo que reconhece no outro. (Gambini, 1988)

8d) Técnicas expressivas (desenho): de cunho projetivo, visa manifestação e a elaboração de conteúdos inconscientes. Importante fonte de conteúdos simbólicos por meio de material artístico, como recurso indispensável para a elaboração de conteúdos psíquicos traumáticos (Jung, 2008 e Silveira, 1981).

9) Mensuração final (pós-teste). Repetiu-se a mensuração inicial;

10) Continuidade do tratamento:

A) Para os que permanecerem internados, continuidade das intervenções;

B) Para os que receberem alta, a possibilidade de iniciar tratamento psicológico nas clinicas integradas da Faculdade Evangélica do Paraná (FEPAR).

 

Análise dos resultados

A análise ocorreu de duas formas:

A) Qualitativa: por análise de conteúdo do relato verbal expresso pelos participantes, (sob a luz da psicologia analítica do discurso de cada paciente), emitido durante aplicação do instrumento de entrevista semi-direcionada (inventário socioeconômico), do processo de intervenção psicológica e do pré e pós-teste;

B) Quantitativa: Uma vez que a mensuração dos parâmetros de medida de Jung (1988) foi transformada pela autora, em um registro de evento, onde as respostas puderam ser trabalhadas e transformadas em dados comparáveis. Isto é, foram criados quadros comparativos entre os dados colhidos com os participantes e destes resultados foram confeccionado figuras de gráficos ilustrativos.

A média de tempo de cada paciente foi criada por meio da soma total dos tempos de reação, e dividida pelo numero total das cem palavras do teste. Isso quer dizer que se um paciente respondeu o teste em 232 segundos, sua média é de 2,3 segundos.

O tempo é importante indício de complexo (Jung, 1995). Este fator é o primeiro item que aparece dentro dos 11 distúrbios de reação, e por isso a importância de trabalhar as palavras que tiveram reações de tempo prolongadas.

Outro análise foi o número de variáveis indicativas de complexos por palavra aplicada. Essas tratam dos onze itens apontados por Jung (1995) como sinais de presença de complexos. Não foi estabelecido um número mínimo de variáveis, pois esses dados dizem respeito a cada um dos pacientes e seus complexos. Para a seleção foi estudado as presenças de variáveis mais significativas a cada teste.

De forma geral, as palavras foram selecionadas por meio da integração das palavras que tiveram os maiores tempo de resposta em conjunto com o maior número de variáveis. Todavia, aconteceram casos em que apenas o tempo, quando muito prolongado, serviu como fator determinante para a escolha da palavra estímulo, mesmo sem a combinação de variáveis. Por outro lado, quando o numero de variáveis foi significativo, estes determinaram também a escolha das palavras.

Outro fator levado em conta na escolha das palavras foi o irrompimento de conteúdos de carga emocional, evidenciados por alterações fisiológicas.

 

Resultados e Discussão

Apesar do rigor cientifico de um projeto de pesquisa, a realidade do campo prático profissional, no âmbito hospitalar, conta com situações instáveis e que não podem ser de todo controladas.

No caso desta investigação a maior dificuldade enfrentada foi a de encontrar pacientes que ficassem internados por um período mínimo de dias para que se pudesse promover o estudo. A idéia inicial era a de fazer cinco encontros: a) aplicação do TCLE, questionário socioeconômico e teste de associação de palavras; b) três dias para as intervenções, desenho e narrativa do coração fisiológico, sentimento e alma; e contagem das palavras indicativas de complexos; c) no quarto dia seria um olhar simbólico da doença para que o paciente pudesse pensar sobre o significado da doença em sua vida, e; d) no quinto e último dia a repetição do mesmo procedimento do primeiro dia de intervenção.

Porém, diante das situações cotidianas do hospital, como altas inesperadas, procedimentos e exames que incapacitavam o paciente de participar das intervenções de forma idealizada, se adaptou o procedimento.

O projeto não previu que idade, cultura, baixa escolaridade (ou inexistência desta), comprometimento cognitivo (com dificuldade de compreensão) influenciassem na coleta dos dados. Mas isto fez diferença. A partir daí houve alteração na metodologia e a idade mínima passou a ser 60 anos e os encontros foram diminuídos para três dias. No primeiro encontro foi mantida a aplicação do TCLE, questionário sócio econômico e o teste de associação, e acrescentado intervenção com relação aos corações; no segundo dia foram trabalhadas as palavras retiradas do teste e, na terceira intervenção foi discutido o sentido da doença para a vida do paciente e em seguida foi feita a reaplicação dos procedimentos de mensuração, como no primeiro dia.

Devido à aplicação do teste, foi possível perceber que o primeiro e o terceiro dia foram mais cansativos, e o pesquisador teve o cuidado de verificar como o paciente estava se sentindo para participar da intervenção, devido ao fato da necessidade de uma carga energética maior. Nos casos em que a pessoa não se sentia bem (muitas vezes os pacientes fazia cateterismo, eletrocardiograma, ou outros exames e sentiam falta de ar, ou outro tipo de mal estar como reação ao medicamento), o pesquisador voltava em outro horário, ou no outro dia.

A pesquisa foi realizada de forma fidedigna com quatro dos catorze pacientes Para análise dos dados foram criados três quadros distintos: um com informações gerais e socioeconômicos de todos os participantes da pesquisa (quadro 1), outro com os dados obtidos nas intervenções não finalizadas (quadro 2) e, um terceiro com os resultados obtidos das intervenções que foram concluídos (quadro 3).

 

 

Dentre os participantes da pesquisa nota-se que a faixa etária acima de sessenta e cinco anos aparece com 35,7% do total de respostas, e com nenhum destes participantes ouve a finalização das intervenções propostas. Este fator parece confirmar que a idade, neste caso, pode estar relacionada com fato do mal êxito nas respostas do teste, é importante esclarecer que a pesquisadora pensando nas possíveis dificuldades de compreensão dos idosos quanto às instruções necessárias para a aplicação do teste, buscou instruir todos os participantes de forma a deixar claro como deveriam proceder, chegando até mesmo a utilizar técnicas de role play para melhor entendimento por parte do participante.

Este fato excluiu a possibilidade de falta de esclarecimento por parte do pesquisador ao paciente quanto ao procedimento de resposta do teste.

O mesmo percentual (35,7%) aparece nos pacientes de quarenta e oito a sessenta e cinco anos, e é nesta faixa etária que se encontra o maior índice das intervenções finalizadas (quadro 3), ou seja, das cinco pessoas pertencentes a esse grupo de idade, quadro delas tiveram as intervenções finalizadas. Os demais participantes com idades entre dezessete e quarenta e sete anos somam um total de 28,6% da amostra.

Os dados apontam os pacientes da classe social C e D, em sua maioria, não tiveram o teste finalizado, o mesmo para os da faixa etária maior que sessenta e cinco anos, apontando que o maior índice de dificuldades de aplicação do teste estiveram relacionadas, na presente pesquisa, com os participantes idosos pertencentes às classes C e D. Uma hipótese é de que, talvez, o teste não seja funcional para estas realidades conjuntas, mesmo que Jung (1995) não tenha percebido interferências de cultura e idade em seus estudos experimentais na Europa do século 19, que revelam diferenças com a realidade brasileira do século 21. Este dado fala da necessidade de estudos referentes ao teste de associação e a verificação da possibilidade de adaptação do mesmo para diferentes realidades e com ampliação da amostra.

 

 

Neste grupo, os quatro primeiros foram aqueles que responderam ao teste no momento em que as intervenções eram feitas em cinco dias, isto é, na metodologia proposta no projeto inicial e por isso verifica-se a paciente S.C com três intervenções efetuadas, embora não conste nas intervenções finalizadas. Os demais pacientes foram os que participaram da pesquisa quando se estabeleceu três dias de intervenção. Quanto ao sexo dos participantes, as pessoas do sexo feminino e masculino se igualaram com 50%, ou seja, cinco homens e cinco mulheres.

A pesquisadora apesar de desconsiderar os dados dos pacientes descartados da amostra após a troca de metodologia continuou fazendo o atendimento psicológico.

O quadro 3 traz os dados dos pacientes que finalizaram o processo da pesquisa.

 

 

Houve redução na média de todos os participantes que é nítida na diferença entre os dois resultados (Tr1 e Tr2). A paciente D.P , por exemplo, teve um decréscimo de 66 % para esta variável.

Em relação à segunda variável, o tempo médio há maior indicio de efetividade do processo terapêutico em situação hospitalar, com queda entre Tm1 e Tm2.

Quanto à terceira variável de mensuração, número de palavras que trouxeram existência de complexos, para todos os participantes houve redução no número de palavras indicativas de constelações.

As figuras 1, 2 e 3 (diferenças entre a primeira aplicação e a última). A primeira traz a comparação entre os tempos médios, em segundo, de reação total (Tm1 e 2) à palavra-estímulo. A segunda compara o numero de palavras que demonstram constelações (Vc1 e Vc2) e Nv1 e 2 dizem respeito a somatória das variáveis dos complexos.

 

 

Apesar de parecer curto o tempo existente entre a primeira e a última aplicação do teste, com cada paciente, o próprio Jung (1995) aplicava o teste, às vezes repetidamente num mesmo dia num mesmo paciente. Ele acreditava que o curto tempo ajudava a dar contorno, claridade, às manifestações dos complexos, ou seja, evidenciavam ainda mais a existência de tais conteúdos na psique do paciente.

A mobilização e o trabalho, por meio de técnicas de intervenção psicológicas, dos conteúdos expostos no teste, parecem ser a justificativa da diminuição da intensidade nos quais os complexos se manifestaram na aplicação do pós-teste. Isto porque, ao se trabalhar e conscientizar os conteúdos constelados há uma tendência natural de diminuição da autonomia destes e, conseqüentemente, uma diminuição significativa de sua interferência, tanto nas onze variáveis, quanto nas alterações de ordem fisiológica / emocional (Jung, 2008).

Embora se tratando de uma amostra-piloto, portanto reduzida, os dados apontam para a confirmação da hipótese construída no projeto de que se repetiria para as atividades psicoterapêuticas hospitalares os resultados já identificados na clínica. Ou seja, as intervenções psicológicas, evidenciam a diminuição da força do complexo, mensurados pela diminuição no tempo de reação às palavras-estímulo que os denotavam. A figura 2 parece confirmar esta análise.

 

 

Jung (1995) preocupado com o rigor científico propôs 11 variáveis para a identificação de um complexo. Com a presente amostra isto se confirma, pois não apenas o tempo de reação diminuiu, mas também as palavras contidas no teste, que se tratam de estímulos capazes de tocar em pontos de crise dos pacientes. A figura 2 mostra que houve diminuição do numero destas palavras afetadas por complexos. Para todos os participantes houve diminuição das palavras-estímulo, mesmo para I.C que foi a paciente com menor índice de mudança, esta ocorreu com um valor de 25%. Pode-se levantar como hipótese que, esta paciente, provavelmente, teria necessidade de um maior número de intervenções. O paciente G.F que na análise do primeiro resultado referente ao Tm, parecia não ter se beneficiado das intervenções, agora em relação a Vc teve uma mudança da ordem de 60%. Este dado indica, sem dúvida, que houve benefícios também para ele.

A figura 2 mostra a diminuição do número de palavras após a finalização das intervenções, possivelmente pela amplificação destes conteúdos. Ou seja, estes temas, foram trazidos a consciência e elaborados pelos pacientes. O que aponta para o benefício da presença do psicólogo no serviço hospitalar.

Outra variável, a Nv, aponta nesta mesma direção, cujos resultados são demonstrados na figura 3.

 

 

Nv trata da somatória de vezes em que foi observado nos pacientes, distúrbios de reação dentro dos onze estipulados por Jung (1995), que auxiliam na identificação de conteúdos constelados, na figura 3 aparece como benefício para todos os pacientes.

A paciente D.P teve um ganho de 87,5% e A.S, de 83,3%. Lembrando que estes já haviam demonstrado este fato nas outras análises e continuam apresentando evolução na redução de seus complexos. O paciente G.F, foi o que mais cresceu em direção a diminuição de seus complexos com 86,7%. Já I.C, apresenta a menor evolução. Contudo ela apresenta um crescimento de 61,5%.

 

Conclusão

O trabalho com o teste de associação de palavras no ambiente hospitalar possibilitou a identificação de conteúdos inconscientes. Os pacientes entraram em contato com seus complexos e a conscientização destes diminuiu sua força. Para os quatro pacientes houve ganho relatado por eles e a coleta de dados numéricos confirmam a percepção subjetiva destes.

Então, poder contar com instrumentos que possibilitem a realização de investigação cientifica é de suma importância. Neste sentido, este trabalho cumpriu com seu objetivo.

A maior parte dos participantes dessa pesquisa afirmou possuir dificuldade de entrar em contato com seus próprios sentimentos e, acabaram optando por acatar os desejos do outro deixando suas necessidades para depois. Acredita-se que daí venha a surpresa que os pacientes demonstraram ao viver a metáfora do "coração alma", pois assim eles puderam perceber a importância de olhar para seu interior e colocar-se em primeiro lugar ao tomarem decisões sem sentimentos relacionados por exemplo à culpa, ao egoísmo, ou seja, ao outro. A fala deles mostra essa idéia:

"...mas que chamou atenção mesmo é desse coração saber esperar. Coração alma. ..." (SIC do paciente G.F, na entrevista do dia 16.09.2010).

"...espero que esse coração feio que eu desenhei (choro), esteja dentro de mim um outro coração muito melhor..." (SIC do paciente G.F, na entrevista do dia 17.09.2010).

No caso dos pacientes cardíacos olhar para o coração doente foi, também, olhar para o corpo e, simbolicamente, integrar corpo, psique e mundo, de forma harmoniosa, onde o indivíduo passa por uma transformação e com isso busca seu espaço na sociedade. Isto remete ao mito de Esculápio, que traz a idéia de que "aquele que envia a morte dá também a vida".

 

Referências

Gambini, R. (1988). Espelho Índio – Os jesuítas e a destruição da alma indígena. São Paulo. Ed. Terceiro Nome.         [ Links ]

Hillman, J. (2010). O pensamento do coração e a alma do mundo. Campinas, SP. Verus.         [ Links ]

Jung, C.G. (1995). Estudos experimentais. Petrópolis, RJ: Ed. Vozes.         [ Links ]

______. (2008). A Psicologia do Inconsciente. Petrópolis, RJ: Ed. Vozes. B        [ Links ]

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Middelkoop, P. (1996). O velho sábio : cura através de imagens internas. São Paulo. Ed. Paulus.         [ Links ]

Prates, Paulo R (2005). O símbolo do coração: história, ciências e saúde: Manguinhos, 12(3), 1025-31.         [ Links ].

Silveira, N. (1981). Imagens do inconsciente. Rio de Janeiro. Ed. Alhambra.         [ Links ]

Weaver, R. (1996). A velha sábia : estudo sobre imaginação ativa. São Paulo. Ed. Paulus.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência
Francieli de Fatima Otto
E-mail: francieli_otto@yahoo.com.br

 

 

* Faculdade Evangélica do Paraná–Hospital Universitário Evangélico de Curitiba. E-mail: francieli_otto@yahoo.com.br.