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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH vol.15 no.1 Rio de Janeiro jun. 2012

 

ARTIGOS

 

Representação social da Psicologia Hospitalar para familiares de pacientes hospitalizados em Unidade de Terapia Intensiva1

 

Representation of social Psychology Hospital for relatives of hospitalized patients in Intensive Care Unit

 

 

Emanuelle Karuline Correia Barcelos Moreira*; Tatiana Milhomem Martins*; Marleide Marques de Castro**

Centro Universitário do Leste de Minas Gerais

 

 


RESUMO

Este estudo teve como objetivo identificar a representação social da Psicologia Hospitalar para os familiares de pacientes hospitalizados em Unidade de Terapia Intensiva (UTI), uma vez que a psicologia hospitalar procura minimizar o sofrimento em relação à hospitalização. Para tal, foram realizadas entrevistas semi-estruturadas com doze familiares, tendo sido desenvolvida uma pesquisa de campo qualitativa e descritiva. Os dados foram categorizados e analisados a partir da análise de conteúdo, buscando relacionar as respostas com a teoria da representação social e estudos sobre a psicologia hospitalar. A representação social dos familiares de pacientes hospitalizados em UTI em relação ao psicólogo hospitalar baseia-se em vivências do atendimento psicológico. Assim, os familiares percebem o psicólogo como um profissional de ajuda, ao orientar, informar e preparar a família em relação à situação do paciente e ao ambiente de internação e, também, reconhecem a necessidade desse profissional em outros ambientes do hospital.

Palavras-chave: Psicologia Hospitalar, Família, Representação Social.


ABSTRACT

This study aimed to identify the social representation of the Health Psychology for the families of patients hospitalized in the Intensive Care Unit, since the hospital psychology seeks to minimize the suffering in relation to hospitalization. To this end, we carried out semi-structured interviews with twelve families. To his end, interviews were conducted semi-structured interviews with twelve families, having developed a field research qualitative and descriptive. The data were categorized and analyzed based on content analysis, seeking the answers relate to the theory of social representation and studies on the psychology hospital. The social representation of family members of patients hospitalized in the Intensive Care Unit in relation to hospital psychologist is based on the psychological experiences. Thus, family members perceive the psychologist as a professional for help´, advise, inform and prepare the family about the situation on the patient and the hospital environment and also recognize the need for this work in other hospital environments.

Keywords: Health Psychology, Family, Social Representation.


 

 

Introdução

Atualmente, com a humanização dos hospitais, a presença da psicologia no contexto hospitalar se torna uma realidade, uma vez que busca "resgatar a importância dos aspectos emocionais, indissociáveis dos aspectos físicos na intervenção da saúde" (Brasil, 2001, p.9), ou seja, procura perceber o ser humano em sua dimensão biológica, psicológica e social.

A psicologia hospitalar é "o campo de entendimento e tratamento dos aspectos psicológicos em torno do adoecimento" (Melo, 2008, p.9), pois o adoecer provoca, na maioria das vezes, alterações psicológicas, como, por exemplo, angústia, ansiedade, medo, insegurança e depressão e essas alterações acometem tanto o paciente como seus familiares.

O psicólogo em um ambiente hospitalar, seja na enfermaria, pronto-socorro, centros cirúrgicos ou Unidade de Terapia Intensiva (UTI), deve escutar e observar todos os aspectos ligados ao adoecer, respeitando os temores, crenças e fragilidades do paciente e da sua família.

Algumas UTIs contam com o serviço do psicólogo e, muitas vezes, o atendimento desse profissional é voltado para a família, pelo fato do paciente não estar desperto e considerando que, quando um membro da família adoece, o equilíbrio e os papéis ocupados por cada um são afetados, podendo eclodir antigos conflitos latentes e haver desunião momentânea. Assim, a atuação do psicólogo se torna importante, pois percebe a família como uma extensão do paciente e o seu cuidado como uma ajuda no processo de recuperação do parente internado.

Nesse sentido, o psicólogo deve ser um agente especializado do ponto de vista técnico para detectar as necessidades dos pacientes, familiares e equipe em relação ao momento que estão vivendo.

Assim, este trabalho busca identificar a representação social da Psicologia Hospitalar para os familiares de pacientes internados em Unidade de Terapia Intensiva, uma vez que o fazer da psicologia é, muitas vezes, desconhecido por muitas pessoas e até mesmo o próprio profissional tem dificuldade para definir o seu trabalho. E, pelo fato do hospital ser visto como um lugar que cuida do biológico e por ser a Psicologia Hospitalar uma área nova, acredita-se que os familiares dos pacientes tenham, a princípio, o desconhecimento do trabalho do psicólogo no contexto hospitalar, principalmente na Unidade de Terapia Intensiva, prejudicando a representação social da Psicologia Hospitalar.

A teoria da representação social busca compreender um fenômeno particular das sociedades modernas, isto é, seus conhecimentos científicos, teorias e conceitos do senso comum. Logo, procura analisar o processo envolvido na construção de conhecimentos do senso comum em relação aos objetos sociais, pois eles são construídos na interação social dos sujeitos e permitem a comunicação e a organização de comportamentos (Oliveira & Werba, 2002).

Em relação à representação social da psicologia, já foram realizadas várias pesquisas buscando compreender o entendimento das pessoas sobre o psicólogo e sua práxis. Porém, nas bases de dados pesquisadas, não foram encontrados artigos que procurassem conhecer a representação social da família em relação ao psicólogo dentro do contexto hospitalar, sendo que a Psicologia Hospitalar é considerada uma nova especialidade da psicologia. Assim, pelo fato desse profissional, dentro de um hospital, também atuar junto à família, além do paciente e da equipe, viu-se a necessidade deste estudo, uma vez que o psicólogo hospitalar visa à promoção e/ou recuperação da saúde física e mental do paciente, familiares e equipes.

 

A psicologia no contexto hospitalar

A palavra hospital vem do latim "hospes", significando hóspede, a qual deu origem a "hospitalis", ao designar, na antiguidade, lugar onde se hospedavam enfermos, viajantes e peregrinos e a "hospitium", lugar ocupado por pobres, incuráveis e insanos (Gonçalves, 1983; Borda, 1985 apud Campos, 1995).

Historicamente, o hospital surgiu no ano 360 d.C. com o objetivo de restaurar a saúde e prestar assistência. "Os primeiros hospitais foram criados como locais de isolamento onde a caridade se exercia como prática do cristianismo" (Campos, 1995, p.18).

A partir do final do século XVIII, o hospital passou ser uma instituição que intervinha sobre a doença e o doente, procurando produzir a cura, numa nova visão de sua atuação pois, anteriormente, era visto como um lugar para morrer.

Com o decorrer do tempo, viu-se a necessidade de repensar essa visão de apenas tratar a doença, ou seja, atender apenas a necessidade física; porém, só quando o conhecimento de natureza preventiva se desenvolveu, em meados do século XX, é que se percebeu o hospital como um centro de investigação biopsicossocial. O hospital passou a ser compreendido "como um todo que busca proporcionar a manutenção do bem estar físico, social e mental do homem" (Campos, 1995, p.21). Assim, desde o início do século XXI, o hospital vem sofrendo um processo de humanização, por tratar da vida dos seres humanos, indivíduos que possuem suas particularidades e subjetividades.

Esse processo de humanização refere-se ao resgate da dignidade do ser humano e ao respeito por seus direitos (Carvalho, 2008). Assim sendo, humanizar é "adotar uma prática em que profissionais e usuários consideram o conjunto dos aspectos físicos, subjetivos e sociais que compõem o atendimento à saúde" (Brasil, 2001, p.9).

O hospital humanizado, além de abranger a dimensão física, estendeu o seu olhar para as dimensões psicológicas e sociais. Assim, a psicologia passou a fazer parte do contexto hospitalar, sendo de vital importância para o processo de humanização, pois "[...] fornece condições, recursos e técnicas para possibilitar as relações interpessoais [...]" (Leitão, 1993, p.100), e, ao possibilitar ajustamento e identificação da tríade paciente-família-equipe e compreensão das condições emocionais envolvidas no adoecimento e na internação, proporciona uma melhor recuperação do paciente.

No Brasil, segundo Camon (2004), os pioneiros da psicologia hospitalar foram Matilde Neder que, em 1954, começou a acompanhar psicologicamente pacientes submetidos à cirurgia de coluna na Clínica Ortopédica e Traumatológica da USP, e Bellkinss Wilma Romano que, em 1974, foi convidada para organizar e implantar o Serviço de Psicologia do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).

O principal objetivo da psicologia hospitalar é a minimização do sofrimento provocado pela hospitalização (Camon, 2004), pois o adoecer e o internamento "provocam angústia, dor, medo, insegurança, raiva, revolta e muitas vezes, depressão, o que faz necessária a atenção, escuta e técnicas do psicólogo hospitalar" (Melo, 2007, p.9).

O alívio do sofrimento acontece quando o psicólogo hospitalar deixa o paciente "[...] falar de si, da doença, da família, de seus medos, fantasias, esclarecendo suas dúvidas" (Campos, 1995, p.81). E para fazer essa escuta, o psicólogo hospitalar não possui um setting terapêutico definido, ela acontece no próprio leito ou até mesmo no corredor do hospital, sendo passíveis de interrupções e de acanhamento.

O hospital desmobiliza a segurança e a tranquilidade do consultório tradicional, levando o profissional a realizar seus atendimentos entre macas no pronto-socorro ou no centro cirúrgico, ao lado dos leitos dos pacientes nas enfermarias, muitas vezes conjuntamente com procedimentos terapêuticos e rotinas hospitalares (Chiattone, 2006, p.113).

No hospital, o psicólogo não precisa esperar o encaminhamento para ir ao encontro do paciente, mas deve se preocupar com o indivíduo doente e, não, com a doença, sendo que, ao escutar seu sofrimento, estará ajudando-o em sua reintegração biopsicossocial.

Além da escuta da dor do paciente, é interessante "[...] abranger a totalidade dos relacionamentos pessoais e familiares, para uma compreensão mais ampla da patologia que o acomete" (Carvalho, 2008, p. 18).

A assistência psicológica dentro do hospital deve também preocupar-se com a família e a equipe. "Tanto a família quanto a equipe poderão ser ajudadas pela psicologia diante das dificuldades no processo de reabilitação ou na eminência de perda ou morte" (Pinheiro, 2005, p. 33).

O psicólogo hospitalar deve estar atento, tanto na intervenção da família, quanto do paciente, para a questão da implicação emocional causada no núcleo familiar pela hospitalização, buscando, assim, o alívio emocional.

Na equipe, o trabalho do psicólogo hospitalar contempla uma visão multiprofissional, onde vários profissionais atuarão junto ao paciente e à família. Assim, Campos (1995, p.97) salienta que o psicólogo precisa:

[...] buscar a conscientização de todos os profissionais para o trabalho multiprofissional. Ajudando cada profissional a ter claras suas funções, definindo seus objetivos, facilitando a comunicação entre membros da equipe, sendo muitas vezes, o interlocutor entre os membros da equipe e os pacientes e familiares. O psicólogo buscará alertar os profissionais para a necessidade do conhecimento das atividades dos outros membros da equipe, trocando informações e buscando atender o mais completamente possível o paciente.

O psicólogo hospitalar precisa facilitar a liberação das emoções pelos membros da equipe diante a hospitalização do paciente.

Enfim, dentro do contexto hospitalar, ele deve preocupar-se em atender o paciente, a família e a equipe, possibilitando a compreensão e o tratamento dos aspectos psicológicos. E, ainda, ajudar na humanização do hospital, ao perceber o paciente como um todo, na junção da sua dimensão biopsicossocial.

 

A psicologia e a família do paciente hospitalizado em Unidade de Terapia Intensiva (UTI)

A família pode ser compreendida como um sistema intercomunicante, onde cada membro exerce uma função, formando, assim, uma dinâmica com funcionamento próprio através de suas leis internas (Lucches, Macedo & Marco, 2008). "Seu equilíbrio, sua existência, sua organização e capacidade de adaptação dependem da busca incessante de manter seu equilíbrio, que é dinâmico, interativo e que sempre terá um resultado" (Romano, 2005, p.72).

O adoecimento de um membro da família representa uma ameaça à estrutura familiar: esse sistema, como um todo, vê-se abalado. E quando a pessoa é hospitalizada, principalmente na Unidade de Terapia Intensiva (UTI), todo o equilíbrio familiar é alterado.

A UTI surgiu na década de 1950 nos Estados Unidos. No Brasil foi apenas na década de 1970 que ela começou a ser implantada nos hospitais privados do Rio de Janeiro e de São Paulo (Haberkorn, 2004). No entanto, hoje em dia, a UTI está presente em quase todos os hospitais. Assim, de acordo com Melo (2008, p.36), a UTI pode ser considerada como

[...] uma unidade destinada a receber pacientes clínicos, pós-cirúrgicos, terminais e em estado grave com possibilidade de recuperação, que advêm de outros setores do hospital para um tratamento diferenciado, exclusivo e intensivo. É um setor que possui equipamentos específicos, recursos materiais e tecnológicos, assim como também uma equipe permanente de profissionais de saúde (médicos, enfermeiros, técnicos e auxiliares de enfermagem, além de psicólogo, fisioterapeuta, nutricionista e assistente social). As ações ali desempenhadas são diuturnas, rápidas e precisas e, por isso, exigem o máximo de eficiência da equipe.

Apesar da internação em UTI oferecer aos pacientes cuidados especializados e atenção constante, ela:

[...] é considerada um dos momentos mais críticos e amedrontadores no processo de hospitalização, por ser a UTI geralmente representada, em nossa sociedade, como um local assustador, fonte contínua de angústias, incertezas e medos, um lugar ao qual se vai para morrer. (Haberkorn, 2004, p. 100)

E isso, muitas vezes, representa um momento de instabilidade, pois, no núcleo familiar, "instaura-se um período de crise e os conflitos pré-existentes acompanham o grupo familiar no período de internação e podem refletir diretamente na relação com a equipe e com o próprio paciente" (Lucches et. al., 2008, p. 23).

Com a internação na UTI o vínculo familiar fica interrompido, aumentando ainda mais o descontrole emocional. A família passa a se sentir impotente, desolada e culpada por não poder cuidar de seu familiar, promovendo, com isso, um aumento da angústia e da ansiedade. Assim, "[...] a família do paciente interna junto com seu ente-paciente mesmo de forma indireta e junto com ele sofre e se angustia. Geralmente este familiar sofre as dores existenciais diante do medo iminente da morte de seu familiar hospitalizado" (Santos, 2007, p. 34).

Ao "adoecer" com o paciente, a família também se desestrutura em nível biopsicossocial interferindo diretamente na forma de enfrentamento da hospitalização. Para Lustosa (2007) e Gortado e Silva (2005), são vários os motivos que podem exacerbar tal desestruturação: a falta de informação sobre o estado de saúde do paciente e o pouco contato com o médico; o ambiente da UTI e o ritmo de vida incompatível com os horários do hospital; a idade e o papel que o paciente exercia na dinâmica familiar e a responsabilidade frente a uma tomada de decisão.

A família sente-se deixada a um segundo plano, privada da rotina hospitalar, tendo um tratamento impessoal da equipe (Ismael, 2004). Nesse sentido, Halm salienta que "esses aspectos geram para a família uma sensação de despersonalização e perda de controle sobre aquilo que é feito com o seu paciente, o que pode exacerbar a negação ou até mesmo gerar sentimentos de abandono e confusão cognitiva" (Ismael, 2004, p. 251).

Portanto, no ambiente hospitalar, faz-se necessário também cuidar da família, pois ela desempenha um papel importante na recuperação do paciente. Logo, a presença do Psicólogo Hospitalar se torna fundamental, pois tem como objetivo fazer uma escuta especializada, acessar as necessidades da família, planejar e executar intervenções para o bem-estar dos familiares (Lucches et al., 2008).

A atuação do psicólogo dentro de um hospital deve girar em torno do "[...] apoio, atenção, compreensão, suporte ao tratamento, clarificação dos sentimentos, esclarecimentos sobre a doença e fortalecimentos dos vínculos familiares" (Carvalho, 2008, p. 19).

A princípio, o psicólogo deve buscar compreender a dinâmica familiar do paciente internado em UTI, levando em consideração:

[...] o tipo de doença que acometeu o paciente, sua gravidade ou não, qual o papel e o lugar que o doente tem no contexto familiar, se a ocorrência da doença foi aguda ou se já era crônica, como a família lida com a questão de doença e como lidou com ela no passado, se ela se culpa pelo que aconteceu ao seu paciente, se é uma família super-protetora ou não, se o familiar doente é adulto ou criança (Ismael, 2004, p. 252).

O psicólogo deve atentar para a forma como a família chega à UTI, pois muitas vezes, encontra-se perdida e com medo do que irá encontrar. Ismael (2004) salienta que é conveniente o psicólogo preparar e dar segurança à família para poder ver e estar com o paciente, entrar e permanecer junto a ele ou para eleger, do ponto de vista emocional, um membro que possa fazer a visita e ser o interlocutor dos outros familiares.

É importante ouvir e compreender as necessidades dos familiares, que segundo Soares (2007, p.482) são:

[...] estar próximo ao paciente; sentir-se útil para o paciente; ter ciência das modificações do quadro clínico; compreender o que está sendo feito no cuidado e porquê; ter garantias do controle do sofrimento e da dor; estar seguro de que a decisão quanto a limitação do tratamento curativo foi apropriada; poder expressar os seus sentimentos e angústias; ser confortado e consolado e encontrar um significado para a morte do paciente.

Assim, é de responsabilidade da equipe da UTI atender a essas necessidades e é de responsabilidade do psicólogo promover uma aproximação entre a família e a equipe interdisciplinar, facilitando suas comunicações e fortalecendo vínculos de confiança.

No contexto hospitalar, é importante que o psicólogo ajude na reorganização de papéis no convívio familiar para que os familiares possam reestruturar o núcleo familiar diante da situação atual com menor sofrimento emocional (Ismael, 2004).

Ao escutar a família do paciente, o psicólogo "facilita a elaboração de fantasias, medos e angústias [...]", dando assim "[...] suporte ao enfrentamento da dor, sofrimento e medo da perda do paciente" (Lustosa, 2008, p.23). Caso o paciente não apresente uma melhora prevista ou venha a falecer, o psicólogo se coloca a disposição para assistir a família.

A escuta realizada pelo psicólogo pode ser através de acompanhamento individual, no qual os membros da família poderão expressar seus sentimentos, ou mesmo em grupo, sendo que Halm apresenta os benefícios dos grupos para as famílias:

[...] elas percebem que não estão sós, compartilham sentimentos com pessoas na mesma situação, aprendem que os problemas dos outros são frequentemente piores que os seus, reduzem a ansiedade, aprendem novos métodos de adaptação e conseguem uma melhor compreensão da doença e dos cuidados ao doente (como citado em Romano, 2005, p. 75).

No cuidado proporcionado à família de pacientes da UTI pelo psicólogo, faz-se necessário saber:

[...] identificar anseios angústias e dificuldades da unidade familiar em relação à doença e ao seu tratamento. Deve-se auxiliá-los a entender estes sentimentos, que sua ajuda tem limitações, mas que a pouca ajuda dada é muito importante na recuperação de seu paciente (Ismael, 2004, p. 252 e 253).

Ao ser incluída no atendimento hospitalar pelo psicólogo, a família aumenta suas condições emocionais para dar suporte ao paciente, transferindo-lhe confiança e força e, proporciona a ele alívio do sofrimento provocado pelo distanciamento do convívio familiar. Ou seja, o atendimento pode reduzir a ansiedade da família afim de que se sinta mais à vontade em um ambiente estranho e de que se torne beneficiada pelo processo de recuperação do paciente.

 

Sobre representação social

O termo Representação Social foi conceituado pelo psicólogo social francês Serge Moscovici, quando publicou, em 1961, um estudo que pretendia compreender a apropriação da psicanálise pelos diferentes grupos sociais. Para Moscovici, a representação social é "um conjunto de conceitos, proposições e explicações originado na vida cotidiana no curso de comunicações interpessoais" (Oliveira & Werba, 2002, p.106). Ou seja, " é um fenômeno coletivo co-construído pelos indivíduos em suas conversas e ações cotidianas" (Carvalho & Souza, 2005, p.14).

Toda representação é, portanto, uma forma de visão global e unitária de um objeto, mas também de um sujeito. Esta representação reestrutura a realidade para permitir a integração das características objetivas do objeto, das experiências anteriores do sujeito e do seu sistema de atitudes e de normas. Isto permite definir a representação como uma visão funcional do mundo que, por sua vez, permite ao indivíduo ou ao grupo dar um sentido às suas condutas e compreender a realidade através de seu próprio sistema de referências; permitindo assim ao indivíduo se adaptar e encontrar um lugar nesta realidade (Abric, 2000, p.27-28).

A representação social ajuda os indivíduos na construção da realidade, ao transformar o estranho (não familiar) em algo familiar. Assim, o não familiar é produzido pelo saber científico que será transferido para o saber popular, nos momentos em que os indivíduos, em suas conversas e ações cotidianas, constroem o seu mundo real.

A construção da representação social ocorre através do processo de ancoragem e objetivação. A ancoragem é o processo que procura classificar e nomear os objetos desconhecidos para se tornar algo familiar. Assim, conforme Carvalho e Souza (2005, p.17), esse processo permite que "o não familiar se torne familiar, consequentemente, irá estabelecer a forma com que os grupos irão se relacionar com o objeto, atribuindo-lhe significado e utilidade".

Já a objetivação é o processo de tornar visível e concreta uma realidade. Procura-se unir um conceito a uma imagem, esta deixando de ser uma imagem abstrata para se tornar algo concreto e real (Oliveira & Werba, 2002).

Para Carvalho e Souza (2005), a representação social é constituída de vários elementos, como informações, crenças, imagens, aspectos ideológicos e culturais, sendo assim, difícil de ser analisada. Seus conteúdos, porém, poderão ser apreendidos através da dimensão informativa, na qual se somam, quantitativa e qualitativamente, os conhecimentos que o sujeito ou o grupo possui acerca de um determinado objeto social; da dimensão do campo de representação, referindo-se à estrutura da representação, isto é, à sua combinação e organização; e da dimensão da atitude, do posicionamento do grupo referente ao objeto.

Conhecer a representação social de um grupo é entender como este elabora e partilha o conhecimento para a construção de uma realidade comum, pois:

a representação funciona como um sistema de interpretação da realidade que rege as relações dos indivíduos com o seu meio físico e social, ela vai determinar seus comportamentos e suas práticas. A representação social é um guia para a ação, ela orienta as ações e as relações sociais. Ela é um sistema de pré-decodificação da realidade porque ela determina um conjunto de antecipações e expectativas (Abric , 2000, p. 28).

Na área da saúde, as pesquisas com a aplicação da teoria da representação social vêm, desde a década de 1970, tendo um aumento significativo nos estudos que focalizam, principalmente, o doente (Trindade, 2000).

De acordo com J. W. A. Carvalho e Souza (2005), os sociólogos foram os primeiros a questionarem as definições de saúde e doença, seguidos pelos historiadores e antropólogos. Atualmente, porém, a área da saúde não se limita apenas a estudar o "[...] processo saúde/doença [...]", engloba o campo de saber, área de atuação, os profissionais da área de saúde e ainda mais além, as interações interprofissionais (J. W. A. Carvalho & Souza, 2005, p. 21).

Vários são os estudos realizados que buscam compreender a representação social das pessoas sobre a psicologia e/ou sobre a práxis do psicólogo inserido na área da saúde. Um estudo com pacientes, funcionários e técnicos de um posto de saúde que disponibiliza o serviço da psicologia foi realizado por More, Leiva e Tagliari (2001) acerca da representação social do psicólogo e sua prática. Os seguintes resultados foram encontrados: o psicólogo é um profissional que lida com problemas emocionais e que ajuda, orienta e conversa, e seu trabalho é importante na equipe de saúde, tanto pelas pessoas que procuram seus serviços, como pelo profissional que ali trabalha.

More et al. (2004), com o objetivo de analisar as representações sociais que os residentes do Programa Multiprofissional de Saúde da Família da Universidade Federal de Santa Catarina tinham a respeito da Psicologia, bem como visualizar possibilidades de ação do psicólogo neste contexto, conduziram um estudo que obteve os seguintes resultados: desconhecimento da Psicologia como ciência; presença da dicotomia mente/corpo e necessidade de rever a formação acadêmica.

Carvalho e Souza (2005) objetivaram investigar as representações sociais construídas por dois grupos de médicos não psiquiatras (médicos com experiência e médicos sem experiência junto a psicólogos hospitalares) acerca da psicologia e do psicólogo clínico no contexto hospitalar. As autoras não encontraram diferença nas representações dos dois grupos médicos. Obtiveram uma visão otimista, porém superficial, dos médicos com experiência junto a psicólogos e a constatação de que os psicólogos hospitalares acreditam na possibilidade de se construir uma relação interprofissional, sendo que o estabelecimento dessa relação apresenta muitos obstáculos.

Nunes e Gióia-Martins (2003) conduziram uma pesquisa cujo objetivo era investigar a percepção do paciente hospitalizado a respeito do psicólogo que atua em hospitais gerais. Os resultados encontrados por estas pesquisadoras apresentam uma grande diversidade de respostas, pois cada paciente percebeu o psicólogo hospitalar de uma forma bastante pessoal, esta diversidade de visão podendo ser consequência da flexibilidade desse profissional para oferecer respostas terapêuticas às demandas individuais surgidas dentro de um hospital geral.

Todos esses estudos são de grande importância pois proporcionam aos psicólogos uma reflexão em relação as suas práticas e saberes. Entretanto, não foram encontrados, nas bases de dados pesquisadas, artigos que possuíssem esse mesmo objetivo de identificar a representação social da Psicologia Hospitalar para os familiares de pacientes hospitalizados em UTI, sendo assim, relevante o presente estudo.

Metodologia

O presente estudo consistiu numa pesquisa descritiva e qualitativa, uma vez que "observa, registra, analisa e correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis), sem manipulá-los; estuda fatos e fenômenos do mundo físico e, especialmente, do mundo humano, sem a interferência do pesquisador" (Rampazzo, 2005, p.53) e busca compreender particularmente o que será estudado, tendo um foco centralizado no específico, almejando a experiência de todos os sujeitos e, assim, valorizando o ser humano.

Utilizou-se entrevista semi-estruturada contendo perguntas referentes ao trabalho do psicólogo no contexto hospitalar; a percepção dos familiares em relação ao trabalho e o cuidado adotado pelo psicólogo hospitalar para os mesmos e em relação aos pacientes internados em UTI. A análise dos dados coletados foi realizada através da análise de conteúdo proposta por Bardin (como citado em Minayo, 2004).

Os sujeitos que compuseram a amostra foram doze pessoas, familiares de pacientes internados em UTI de um hospital do Vale do Aço, tendo sido escolhido um membro de cada família, maior de 18 anos de idade, que mantivesse um convívio constante com o paciente. A escolha poderia recair sobre o pai, a mãe, os irmãos, os tios, os primos, os avós, desde que o escolhido convivesse diariamente com o paciente. Não foi considerado para responder à entrevista o familiar que mora distante do paciente, isto é, em outra cidade e/ou em outro estado. Os possíveis participantes da pesquisa foram abordados no período da tarde, após visitar seu familiar internado, ocasião em que lhes foi explicada a proposta da pesquisa. Mesmo sendo permitida, no momento de visita da UTI, a entrada de três familiares para ver o paciente internado, só respondeu à entrevista um membro de cada família.

O Comitê de Ética em Pesquisa do Centro Universitário do Leste de Minas Gerais (CEP/UNILESTEMG) analisou e aprovou o projeto do presente trabalho, protocolo de pesquisa nº. 28.161/2009.

No presente estudo, utilizaram-se as seguintes categorias para a análise das entrevistas: pacientes hospitalizados; atendimento psicológico em UTI e percepção da atuação do psicólogo hospitalar para os familiares. Logo, foi através dessas categorias que se alcançou a representação social pesquisada.

 

Resultados e Discussão

A doença é, muitas vezes, caracterizada como uma ameaça à vida do ser humano, uma vez que o adoecer remete ao medo da morte, principalmente quando o paciente está hospitalizado em UTI. Nesse sentido, Campos (1995) aponta que "a doença surge como um inimigo que deve ser estudado, localizado e combatido e, para tanto, existe uma série de medicamentos e profissionais de saúde para combater a doença" (p. 41).

Por muito tempo, o cuidado da doença foi focado no biológico, deixando de perceber que o adoecimento possui as características próprias de cada sujeito, ou seja, sua história pessoal, familiar e social (Campos, 1995). Nesse sentido, a doença física é "[...] acompanhada de manifestações na esfera psíquica, ocasionando também alterações na interação social. A doença provoca, precipita ou agrava desequilíbrios psicológicos, quer no paciente, quer na família" (Campos, 1995, p.42).

Ao serem perguntados sobre o motivo da internação em UTI, os familiares dos pacientes hospitalizados em UTI, inicialmente, focaram suas respostas no contexto físico da doença. Assim, explicam que a maioria dos pacientes estão hospitalizados pelo fato de terem passado por uma cirurgia. Cada pessoa fez um tipo de cirurgia: no aparelho digestivo, devido a câncer abdominal, a acidente de carro e à redução de estômago; de coração, para colocar marcapasso; retirada de nódulos no abdome e angioplastia (este paciente também por causa de infarto); dois foram internados por causa de pneumonia; e os demais por causa de diabete, infarto, atropelamento por moto e problema cardíaco.

Durante a entrevista, alguns dos familiares apresentaram alguns aspectos da história de vida do sujeito, permitindo que se observasse a singularidade de cada paciente hospitalizado e de sua família:

Minha irmã foi internada na UTI para fazer uma cirurgia abdominal (intestino). Ela sofreu um acidente de carro onde estavam os filhos e a mãe que morreu. Antes dessa, já fez duas cirurgias e os médicos disseram que seu caso é grave. (Entrevistado 1)

Ela tem diabete, e teve um pequeno AVC no ano de 2007 e seu quadro está piorando. Ela faz hemodiálise no HMC e está aguardando vaga na UTI de lá para não precisar ficar indo e voltando. (Entrevistado 6)

A família, segundo Lucchese, por ser constituída como uma "unidade proximamente ligada ao paciente, podendo ou não ter laços legais ou de consanguinidade" (como citado em Haberkorn, 2004, p.104), distribui papéis a seus participantes e, com o adoecimento de um membro, todo o equilíbrio do sistema familiar é afetado, desencadeando uma crise. Assim, em relação à pergunta sobre quem da família está internado, dos doze pacientes, três são os pais e as mães, dois são os cônjuges e os irmãos, uma é a tia e outra a avó dos familiares.

Conforme já pontuado, quando o hospital tem outro olhar para as dimensões psicológicas e sociais do paciente, não se limitando à dimensão física, passa a necessitar de um profissional diferente do modelo biomédico, entrando, assim, o psicólogo no contexto hospitalar. Logo, Gianneti salienta que "[...] o trabalho do psicólogo no contexto das instituições médicas e hospitalares, pode-se dizer, vem delineando uma nova especialidade em psicologia [...]" (como citado em Chiattone, 2000, p.74).

A chamada Psicologia Hospitalar, ao se tornar então, essa nova especialidade, teve que fazer adaptações teórico-práticas baseadas nos recursos técnicos e metodológicos das diversas áreas do saber psicológico (Chiattone, 2000). Nessa medida, o psicólogo como profissional da saúde, exerce um papel clínico, social, organizacional e educacional ao se preocupar com a qualidade e a dignidade da vida do sujeito hospitalizado (Campos, 1995).

Chiattone (2000) salienta que, ao entrar em um contexto sedimentado arcaicamente, dentro dos princípios do saber biomédico, o psicólogo hospitalar deve ter o cuidado de não se moldar a tal modelo e, pelo fato de possuir um saber distinto e uma prática quase sempre estranha à rotina hospitalar, o outro, a princípio, desconhece o seu trabalho.

Nesse sentido, ao serem questionados se a UTI possuía psicólogo, dos doze familiares, um deles não sabia responder e onze responderam que sabiam do trabalho da psicologia na equipe da UTI, mas apenas dois deles tinham o conhecimento da práxis do psicólogo na UTI antes de terem sidos atendidos por tal e serem informados que o psicólogo trabalha em equipe dentro de um hospital. Os outros nove entrevistados souberam de seu trabalho só após o atendimento.

Sei que a UTI possui psicóloga, são uma equipe e já fui acompanhada por elas, tive toda assistência (sic). Eu tenho conhecimento desse trabalho, pois sou pedagoga e também estamos neste contexto hospitalar, que abrange do (sic) paciente a família. (Entrevistado 6)

Sim, fui atendida.. E como enfermeira, acredito que esse profissional está inserido no contexto da saúde para complementar a cadeia (sic) ao obter um bom resultado. (Entrevistado 12)

Com a humanização do hospital, a presença do psicólogo tornou-se um elemento fundamental, pois oportuniza o direito da fala e da escuta por parte do paciente, família e equipe. Assim, ao serem indagados em relação à atuação do psicólogo na UTI, os familiares, de forma geral, apontaram que a atuação do psicólogo no contexto hospitalar está voltada para o paciente, para a família e para a equipe.

Em relação ao trabalho com o paciente, os familiares relatam que o psicólogo dá uma atenção especial ao seu estado de saúde, transmite tranquilidade, dá suporte, apoio, conforto e acalma o paciente.

Minha esposa fez tratamento psicológico fora do hospital para fazer a cirurgia, pois esta cirurgia é uma exigência do médico. Não conheço o atendimento dentro do hospital, mas deve ser bom, pois o paciente fica isolado e precisa de um atendimento especial e o médico está mais ocupado. (Entrevistado 4)

Dá suporte ao paciente e ao familiar. Não é enganar, mas fortalecer, tirar dúvidas e, o doente que está fragilizado acalmá-lo (sic), sendo sincero e a família não deve falar mentira pode até amenizar, mas sempre dizer o quadro real em que se encontra, mesmo porque minha mãe é esclarecida não resolveria mentir ou omitir. (Entrevistado 6)

De certa forma, a percepção dos familiares sobre a atuação do psicólogo no contexto hospitalar vai ao encontro do preconizado pelas publicações pesquisadas, ou seja, o psicólogo ao trabalhar com o paciente, deve escutar a sua dor, compreendendo sua história de vida e sua patologia. Assim, de acordo com P. C. Melo (2008, p.37), a atuação do psicólogo em relação ao paciente baseia-se em:

[...] assistir e verificar os fatores que influenciam sua estabilidade emocional, avaliar a adaptação do paciente frente à hospitalização (sono, alimentação, contato com as equipes, aceitação do procedimentos, visitas e outros), avaliar o estado psíquico do paciente (orientação, consciência, memória, afetividade, entre outros) e sua compreensão do diagnóstico, além das reações emocionais frente a internação e a doença.

Um dos familiares comentou que a atuação do profissional de psicologia também está voltada para a equipe da UTI, uma vez que o psicólogo deve trabalhar em conjunto com os demais profissionais, para facilitar a comunicação e melhor atender o paciente.

O atendimento na UTI deve ser feito com todos os profissionais, não podem distrair com nenhum tipo de dificuldades, é bom estar atento a tudo, é um trabalho de equipe. (Entrevistado 2)

Para Campos (1995), os diversos profissionais de saúde devem trabalhar multiprofissionalmente, buscando ver o paciente como todo e facilitando a comunicação entre a equipe e visando melhor compreensão da situação do paciente.

Com esta visão integrada do paciente, considerando os aspectos físicos e emocionais, o psicólogo poderá com a equipe efetivar as atividades de diagnóstico e de terapia, detectando os aspectos fantasiosos que estejam interferindo no aparecimento da doença, na sua evolução e no processo de recuperação (Melo, 2007, p. 10).

Os familiares também apontaram que o trabalho do psicólogo em UTI está direcionado para a família dos pacientes, pois promove um maior contato desta com o paciente e com os médicos, dá informações e orientações sobre o quadro clínico do paciente, tira dúvidas, dá segurança, transmite tranquilidade, trabalha o emocional da família e acolhe as ansiedades.

Atuação é de dar segurança e fazer uma ponte entre o clinico e os familiares é um apoio um conforto ao paciente, passa uma confiança. (Entrevistado 7)

Trabalha dando suporte, orientando a família, fui bem atendida é importante, pois não é só o paciente, mas o emocional da família, a equipe é boa. (Entrevistado 3)

Nesse sentido, Camon (2004) salienta que quando a família é incluída no atendimento hospitalar, recebe condições e sustentáculos emocionais para ajudar o paciente a encontrar alívio para o sofrimento provocado pelo afastamento do núcleo familiar. Assim, é necessário que o psicólogo detecte os focos de ansiedades e dúvidas na família para diminuí-los ou extingui-los, além de facilitar a comunicação do grupo familiar com a equipe de saúde (Lustosa, 2008).

Segundo Haberkorn (2004), minimizar as fontes estressoras pode ser um modo de aprimorar a qualidade da colaboração dos familiares e, por consequência, a possibilidade de melhores condições para o restabelecimento do paciente. Para tanto, devem-se acolher os familiares, proporcionando-lhes confiança e adaptação diante a situação vivenciada. É importante ouvir a família a respeito do que sente e de suas necessidades, além de informá-la sobre como participar positivamente do tratamento.

Quando questionados sobre o atendimento psicológico que receberam enquanto seu parente estava na UTI, os familiares, de forma geral, disseram que a psicóloga facilitou a comunicação da família com a equipe médica, deu apoio e ajudou no processo de internação dando informações sobre o quadro clínico do paciente, esclareceu dúvidas, amenizou a ansiedade, atendeu o paciente em suas angústias e medos, orientou a família a se portar e até mesmo o que dizer perto do paciente e preparou a família para entrar na UTI e o que iria ver neste local. Com isso, nota-se que as falas dos familiares em relação ao atendimento psicológico não diferem muito das suas opiniões sobre a atuação do psicólogo no contexto hospitalar. Talvez pelo fato da maioria dos familiares ter tido atendimento psicológico, eles acreditam que, de uma forma geral, seja esta a atuação do psicólogo hospitalar.

Foi bom, e ela orienta e passa toda informação necessária e prepara (sic) ao entrar na UTI, e prepara para o que a gente irá ver. (Entrevistado 12)

O atendimento foi bom, o contato com a UTI é difícil e a psicóloga nos orienta (sic) como nos portar e até o que dizer. (Entrevistado 10)

Além do trabalho já realizado pela psicologia na UTI, procurou-se saber, na opinião dos familiares, como o psicólogo poderia atuar junto à família dos pacientes hospitalizados. Dois dos familiares comentaram que, pelo fato de seus parentes terem estado em apartamento e enfermaria antes de serem internados em UTI, acham que seria importante estender o atendimento psicológico também para esses lugares, uma vez que orienta melhor, acalma a família e tira dúvidas acerca da hospitalização.

De acordo com Chiattone (2000), o trabalho do psicólogo dentro de um hospital deve existir em todos os ambientes, sejam eles apartamentos, enfermarias, UTIs, ambulatórios, salas de quimioterapia, unidades de análise, dentre outros, pois a função desse profissional em hospitais deve ocorrer onde estão os acontecimentos.

Esses dois últimos familiares citados anteriormente também relataram que o psicólogo deveria trabalhar também com grupos de familiares, pois, assim, poderia conhecer melhor o contexto familiar de cada paciente e haveria uma troca entre as famílias, podendo-se minimizar o sofrimento. Uma outra familiar disse que o trabalho poderia incluir dinâmicas para acabar com o estresse da família, evitando que esta demonstre para o paciente a sua preocupação. Assim, para Romano (2005), na hospitalização, o grupo de apoio serve para possibilitar maior controle cognitivo de uma situação confusa e desconhecida, além da família poder "receber, aceitar e participar do tratamento, de suas orientações para torná-lo eficiente e eficaz durante o processo de reabilitação" (p. 76). No grupo também poderão participar outros profissionais da equipe para que, desta forma, percebam o paciente como um todo e seja facilitado o processo de tratamento.

Meu pai está no hospital já há três semanas (sic) estava no quarto e lá não teve visita do profissional de psicologia. Ele esteve internado em outro hospital maior e a psicóloga trabalhava com a família e o próprio paciente, sendo que aqui, só possui este atendimento na UTI. A psicologia poderia ajudar a família através da conversa individual e em grupo. (Entrevistado 1)

Se possível conversar mais sobre nossos próprios problemas em forma de grupo, o psicólogo, às vezes, não sabe o que realmente está acontecendo e tem várias coisas ao redor, além da própria doença. Esta troca minimizaria o sofrimento, veria o paciente como todo. Deveria ter acompanhamento também nos apartamentos, pois o psicólogo orienta melhor, nos acalma, tiram dúvidas. (Entrevistado 3)

O psicólogo, para um dos familiares, deveria também ser proativo e criativo, sendo uma ponte entre o paciente e a família, mesmo que esta comunicação ocorra de diferentes formas, como telefone e e-mail, no caso de familiares que moram distante. Em relação a isto, Campos (1995, p.94) enfatiza que "o psicólogo pode fazer os esclarecimentos utilizando explicações verbais, cartazes, desenhos, gráficos, sendo, muitas vezes, a ponte de ligação entre o hospital, a equipe de profissionais e a família".

Acredito que explicando e informando mesmo como já é feito, e sendo proativo, pois eu moro longe e o psicólogo poderia ser uma ponte de contato entre meu pai e eu, mesmo que está comunicação ocorra de diferentes formas, como telefone, e-mail, para manter (sic) informado o tempo todo. (Entrevistado 12)

A maioria dos familiares disse que o contato do psicólogo com a família deveria ser maior para que todos pudessem expor suas ansiedades, receber mais apoio e suporte, informações e orientação e alívio para a tensão. As informações deveriam ser colocadas com clareza e de forma mais suave, sem omitir nada, porém, devendo-se, sempre, dizer a verdade. A equipe, quando trabalha com orientação, torna-se capaz de disponibilizar melhores atendimentos.

Passar informação com clareza e sem omitir nada, tem que estar acompanhando e ter segurança. A psicologia deveria trabalhar com orientação a (sic) equipe também para melhorar todos os atendimentos. (Entrevistado 8)

Queríamos que alguém pudesse aliviar nossa tensão. Agindo com a verdade é melhor, pois a gente precisa da verdade e a psicóloga tem que passar de forma mais suave. O nosso contato com a psicóloga é pequeno só nas visitas, (sic) poderia ter um contato maior para expor nossas ansiedades e perceber o que estar mais gritante na gente para tranquilizar e não demonstrar para a paciente na UTI. (Entrevistado 2)

Assim, com relação ao tempo de atendimento, Chiattone (2000) salienta que o fator do tempo é distinto e específico para cada paciente e/ou família, isto devido à necessidade de se falar da doença e hospitalização. Além disso, Haberkorn (2004) vem apontar que o atendimento psicológico no contexto hospitalar pode ser de forma breve, com cada família individualmente focando o momento de hospitalização, a doença e as dificuldades dessa situação. Esses encontros poderiam ser realizados antes ou após o momento de visita ou, ainda, serem agendados, podendo estar presentes um ou mais membros da família.

A representação social da Psicologia Hospitalar para os familiares dos pacientes hospitalizados em UTI foi construída a partir de suas vivências em relação ao atendimento psicológico dentro do hospital. Os familiares dispõem de uma visão positiva do trabalho do psicólogo hospitalar, uma vez que o percebem como um profissional de ajuda, ao orientar, informar e preparar a família em relação à situação do paciente e ao ambiente de internação e, também, pelo fato de reconhecerem a necessidade desse profissional em outros ambientes do hospital. Nesse sentido, o psicólogo hospitalar, para os familiares, ajuda na elaboração de seus medos, de suas fantasias sobre a morte, de suas dúvidas, de suas ansiedades e de seus sentimentos ligados à hospitalização, além de ajudar no estabelecimento do vínculo entre equipe/família/paciente.

 

Considerações Finais

A pesquisa possibilitou a obtenção de dados relevantes que permitiram conhecer a representação social da Psicologia Hospitalar para os familiares de pacientes hospitalizados em UTI. Esses familiares percebem o psicólogo hospitalar como um profissional de ajuda. Constatou-se, também, que a família necessita de orientação e informação em relação ao estado de saúde do paciente e, com isso, percebe o psicólogo como a pessoa que atenderá suas necessidades, uma vez que faz a ponte entre ela e a equipe.

Os dados obtidos apontam que os próprios familiares vêem a necessidade de um atendimento psicológico mais específico para as famílias dos pacientes internados, pois estas também revelam um sofrimento psíquico diante a hospitalização de um membro familiar.

Acredita-se que o presente trabalho forneça elementos que podem contribuir com os estudos a respeito da atuação do psicólogo hospitalar em relação aos familiares dos pacientes hospitalizados. Além de servir como ponto de partida para futuros trabalhos, como, por exemplo, análise da percepção das necessidades que os familiares de pacientes hospitalizados possuem, podendo o psicólogo vir a trabalhá-las; análise da semelhança entre a percepção do trabalho do psicólogo hospitalar para os familiares de pacientes hospitalizados nos diversos ambientes do hospital e, também, para os profissionais de saúde.

Esse estudo ajudou a ter uma visão de como a psicologia vem sendo percebida em um de seus diversos campos de atuação e também perceber qual seria a função do psicólogo dentro de um hospital. Assim, favorece a reflexão por parte do psicólogo, como profissional da saúde, de seu papel clínico, social, organizacional e educacional, no sentido de proporcionar uma assistência psicológica mais definida aos pacientes e a seus familiares, à equipe interdisciplinar e aos demais funcionários do hospital. Além disso, possibilitou expor a necessidade de se estender o atendimento psicológico dentro do hospital, em todos os seus ambientes, para os familiares dos pacientes, pois estes também sofrem diante a hospitalização de um membro da família. Com o cuidado da família, podem-se buscar contribuições para os avanços da recuperação da saúde do familiar internado.

 

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1 Trabalho de Conclusão de Curso.
* Graduadas em Psicologia pelo Centro Universitário do Leste de Minas Gerais, UnilesteMG.
** Psicóloga, Mestre em Psicologia Social pela UFMG e Professora do curso de Psicologia do Centro Universitário do Leste de Minas Gerais, UnilesteMG.