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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH vol.15 no.1 Rio de Janeiro jun. 2012

 

RESENHA-RESUMO

 

Um estudo sobre obesidade morbida

 

 

Daniela Achette*

Sociedade Brasileira de Psicologia Hospitalar

 

 

Resenha do livro: Santos**, F. C. G. dos (2005) Magro, e agora? - Histórias de obesos mórbidos que se submeteram à cirurgia bariátrica. São Paulo: Vetor Editora.

 

A partir de sua própria história de vida, ao acompanhar a trajetória de sua mulher no processo da cirurgia bariátrica, Francisco Carlos Gomes dos Santos decidiu fazer desse tema sua dissertação de mestrado. E, de sua dissertação, que abordou a identidade dos obesos mórbidos que passaram pela cirurgia bariátrica, surgiu este livro. Tem como perspectiva a Psicologia Social.

A apresentação começa com Obesos e famintos, escrita por Antônio da Costa Ciampa, são discutidas as questões sociais e políticas que envolvem a fome e a identidade da pessoa obesa, com uma leve introdução aos casos apresentados no livro. Helena Marieta Rath Kolyniak continua a apresentação com Identificar-se com uma nova corporeidade..., discorrendo que a corporeidade é o que permeia a identidade, a subjetividade e aos significados que cada pessoa traz em si. Em seguida, Fernando Lefèvre encerra a apresentação com A cirurgia bariátrica e seus desdobramentos subjetivos, apontando que a imagem da cirurgia foi distorcida em função do "mercado da magreza".

No primeiro capítulo, o autor discorre sobre os Subsídios médicos. Explica que a obesidade é uma síndrome multifatorial, tendo como critério o índice de massa corporal entre 30 e 40 e o obeso mórbido entre 40 e 50 ou mais, o que significa que a pessoa acumulou muito mais calorias do que ingeriu, tendo assim aumento de peso. Segundo ele, a obesidade mórbida se tornou um problema social, pois grande parcela da população sofre desse mal, que traz consigo doenças respiratórias e coronárias, agravando ainda mais o quadro clínico. Discorre ainda sobre a cirurgia bariátrica, os tipos, suas implicações e cuidados na escolha da mais adequada a cada pessoa.

No segundo capítulo, Revisão de bibliografia, o autor traz alguns estudos, como o de Benedetti (2001), sobre o sentido atribuído à obesidade, cirurgia e emagrecimento; de Sallet (2001), sobre o uso do balão intragástrico e o de Garrido Jr, Szego; de Almeida, Loureiro e Santos (2002), que compararam a auto-imagem de mulheres obesas e não obesas; de Ferreira, Mello Filho e Wada (2002), sobre a necessidade de cirurgia plástica após a cirurgia bariátrica; de Cordas e Franques (2002), sobre os estigmas da obesidade na infância, adolescência e vida adulta; de Lopes e Posso (2002), sobre os cuidados com o pré-operatório; de Oliveira (2002) sobre a técnica da estimulação elétrica do estômago; de Prudente (2003), sobre medidas contra o avanço da obesidade na população e o de Kurzweil (2003), sobre a robotização do ser humano.

Em Saúde e Doença, o autor coloca que junto a esses conceitos caminham questões como a cultura - o que cada sociedade entende como saúde e doença - e políticas de sistemas de saúde pública, que fazem parte da economia e da própria sociedade, além da questão do "ser" ou "estar" doente. Para ele, a saúde passou a ser algo "consumível", se tornando um negócio rentável, ao qual apelam aqueles que não tiveram controle aos excessos disponíveis (como é o caso do excesso de comida para os obesos). E, nesse mercado da saúde, o corpo se torna uma máquina para que os avanços técnico-científicos a "repare". Nessa indústria da saúde, a cirurgia se torna mais um produto disponível àqueles que podem pagar e fugir da fila do sistema público e, paralelamente, produtos outros que se fazem necessários ao processo cirúrgico e pós-cirúrgico têm seu mercado garantido. Faz-se, assim, conforme o autor, um processo naturalmente necessário.

O autor explica os conceitos que utiliza para análise dos discursos no capítulo Sobre identidade, corporeidade e estigma. Assim, define Identidade conforme Ciampa, ou seja, como uma metamorfose na busca de sua emancipação. Assim, o indivíduo atua conforme seus vários papéis sociais e se usa deles para descrever a si mesmo. Usa a definição de corporeidade proposta por Kolyniak, na qual o corpo se completa na sua relação sociocultural, posicionando-se no mundo e construindo sua história individual, através das ações, se sua consciência e suas percepções de sentidos, permeado por simbolismos. Utiliza a mesma idéia de Goffman para estigma, que é "a relação entre o atributo e o estereótipo" que se referem ao corpo, às culpas e à raça, nação e credo do indivíduo.

Mundo da vida e ordem sistêmica é o capítulo em que o autor fundamenta a opção pelo tema "identidade" e descreve seu método de análise. O que investiga é se é em sentido emancipatório a metamorfose identitária dos entrevistados. Para isso, usa da narrativa da história de vida a fim de resgatar "o sentido das transformações ocorridas", em nível individual e social.

Em O começo, discorre sobre os aspectos profissionais que levaram-no a estudar a obesidade mórbida e a cirurgia bariátrica, buscando não só dados na Psicologia, mas também no campo da Medicina e em reuniões em hospitais como meio de entender melhor todo o processo cirúrgico. Atenta que o sentido atrelado à busca na emancipação da identidade não é apenas enquanto a outra corporeidade, mas se as mudanças proporcionaram a metamorfose de obeso mórbido para uma outra realidade ou se essa identidade se manteve.Explica ainda todo o processo da busca pela cirurgia bariátrica, a partir de sua experiência pessoal com sua esposa (que fora submetida à mesma). Relata ainda alguns casos em que a cirurgia poderia ser um benefício e outros em que seria desnecessária.

No penúltimo capítulo, Depoimentos, começa com o depoimento de um médico cirurgião sobre a cirurgia bariátrica e depois traz a história das pessoas entrevistadas. A cada relato, o autor tece suas considerações, a partir do que foi exposto nos capítulos anteriores.

Nas Considerações finais, último capítulo do livro, o autor aponta que o obeso mórbido quer ser emagrecido e espera que essa ajuda venha de outra pessoa, submetendo-se ao mercado da venda de cirurgias bariátricas, o que o expõe a riscos que poderiam ser evitados. Aponta ainda que a cirurgia em si deva ser vista como não ajuda no processo emancipatório da identidade do indivíduo, o que pode levar o paciente à não seguir regras do pós-operatório. Atenta ainda que para o acompanhamento desse tipo de paciente, é necessário uma interação entre profissionais de diversas áreas, como da Psicologia, da Medicina e da Nutrição.

A obra traz grande contribuição para a sociedade e se torna de grande importância a todos os profissionais que queiram trabalhar com obesidade mórbida e com cirurgia bariátrica, além das próprias pessoas que sofrem desse mal.

 

 

* Diretora de publicação da rsbph.
** Francisco Carlos Gomes, Agir3, Núcleo de Logoterapia em Saúde, Educação e Trabalho, doutorando em Psicologia Clínica pela PUC –SP.