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Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH vol.16 no.2 Rio de Janeiro dez. 2013

 

ARTIGOS

 

Validação das escalas de perceção de risco da hipertensão e importância atribuída à saúde

 

Validation of the hypertension risk perception questionnaire and the health value scale

 

 

Maria da Graça Pereira*; Angela Pereira*

Escola de Psicologia, Universidade do Minho

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O presente artigo apresenta a validação do Questionário da Perceção de Risco de Hipertensão (QPRH) Crump (2010) e do Questionário da Importância Atribuída à Saúde (QIAS) (Lau, Hartman, & Ware, 1986). Participaram no estudo 25 doentes hipertensos, que foram avaliados, em contexto hospitalar, ao nível da sua perceção de risco de hipertensão, importância atribuída á saúde, qualidade de vida, satisfação com o suporte social e estilo de vida. Os resultados revelaram que o QPRH apresentou uma fidelidade razoável e o estudo de validade encontrou um único fator que explicou 42% da variância. O QIAS apresentou uma boa fidelidade e o estudo de validade encontrou um único fator, que explicou 62% da variância. Ambos os instrumentos apresentam boa validade convergente com estilo de vida, apoio social e qualidade de vida. Verificaram-se associações negativas entre o estilo de vida e a perceção de risco de hipertensão e entre a subescala atividade física do estilo de vida e o valor de saúde, e associações positivas entre o valor de saúde e a escala de satisfação com o apoio social. Com base nos resultados obtidos, pode-se concluir que as escalas apresentam qualidades psicométricas adequadas para serem utilizadas, em doentes hipertensos, em contexto hospitalar.

Palavras-chave: Validação, Escalas, Risco de Hipertensão, Valor de Saúde.


ABSTRACT

This paper describes the validation to the Portuguese population of the Hypertension Risk Perception (HRP)(Crump, 2010) and the Health Value Scale (HVS), (Lau, Hartman, & Ware, 1986). In this study, 25 hypertension patients were included that were assessed, in an hospital setting, on their perception of hypertension risk, health value, quality of life, satisfaction with social support and lifestyle. Results revealed that the HRP presented a reasonable fidelity. The validity study found a single factor that explained 42% of the variance. The HVS showed a good reliability and validity study found a single factor that explained 62% of the total variance. Both instruments have good convergent validity with lifestyle, social support and quality of life. There were negative associations between lifestyle and the perception of risk of hypertension and the physical activity subscale of lifestyle and health value, and positive associations between health value and the scale of satisfaction with social support .Based on the results, both questionnaires show good psychometric qualities that allow its use in hypertensive patients, in a hospital setting.

Keywords: Validation, Scales, Hypertension Risk, Health Value.


 

 

Introdução

A hipertensão arterial afeta muitos portugueses e é a causa de grande número de mortes e incapacidades por doenças cardiovasculares (Mota, Clara, Gonçalves, Rocha, Neves, & Santos, 2003). Portugal é o país da Europa com mais acidentes vasculares cerebrais devido à hipertensão arterial.

A hipertensão é o maior fator de risco para a doença da artéria coronária, enfartes, mortes súbitas, falha congestiva do coração, doenças crónicas renais e distúrbios visuais e por isso é importante tentar alterar os efeitos nocivos desta doença, através da promoção de comportamentos de saúde ou alteração dos estilos de vida (Berg-Cross, 2006). Considera-se que a hipertensão arterial (HTA) pode ser definida como a pressão arterial sistólica confirmada superior a 140 mmHg ou uma pressão arterial diastólica confirmada superior a 90 mmHg (Clara, et al., 1995).

Muitos são os fatores que podem provocar a elevação da pressão arterial, por isso, atualmente a hipertensão é considerada uma doença multifatorial (Warsy & el-Hazmi 1999.), envolvendo fatores de risco não modificáveis, como os fatores genéticos/hereditários: sexo, idade, raça, história familiar), e fatores de risco modificáveis como os fatores fisiológicos (stress, diabetes, depressão, padrão de comportamento tipo A, hostilidade inibida), comportamentais (tabagismo, consumo de álcool e sal, obesidade, sedentarismo) e do meio, que podem atuar isoladamente ou de forma combinada (Chesney, 1996). A hipertensão não é fácil de diagnosticar devido às oscilações que sofre ao longo do dia. As intervenções farmacológicas, para ajudar a controlar a tensão arterial devem atuar sobre os mecanismos fisiológicos alterados (atividade do sistema nervoso simpático, hormona natriurética, ingestão elevada de sódio, elevação da renina plasmática) que regulam as varáveis hemodinâmicas (débito cardíaco e a resistência periférica) (AACE, 2006).

Muitas das mortes prematuras que ocorrem nos países ocidentais podem ser atribuídas ao estilo de vida (Bennett & Murphy, 1997). Segundo Almeida e colaboradores (2007), o estilo de vida é um fator determinante para a população em geral no que diz respeito à melhoria da saúde e representa um conjunto de ações quotidianas que se refletem nas atitudes e valores das pessoas, as quais podem ser consideradas positivas ou negativas para o aumento da pressão arterial. Vários estudos (Beilin, 1997; Beilin, 1999; Beilin, Puddey, & Burke, 1999; Campbell, et al., 1999; Dickey & Janick, 2001) comprovam que os fatores do estilo de vida são determinantes críticos no aumento dos níveis de pressão arterial.

Mansur et al., (2003) defendem que o tratamento do doente hipertenso passa também pela adesão da família à mudança dos hábitos alimentares que estão na base deste fenómeno. Neste sentido, é possível afirmar que a família detém um importante papel no tratamento da doença coronária. De facto, o meio familiar e social constitui um patamar importante para a aquisição de hábitos e crenças do indivíduo. O contexto familiar onde cada individuo cresce tem um impacto forte no seu estilo de vida (Saraceno & Naldini, 2003). Mendes e colaboradores (2006) realizaram um estudo onde pretenderam verificar a existência de uma associação entre fatores de risco para doenças cardiovasculares e a influência familiar e concluíram que existe uma forte correlação entre a obesidade, tabagismo e sedentarismo e as características da família tendo um papel crucial na aquisição de um estilo de vida saudável (Gomes & Pereira, 2005). Um outro estudo demonstrou que o decréscimo nas lesões ateroscleróticas estava relacionado com a mudança do estilo de vida de pacientes coronários, facto este observado passado um ano da adoção de um estilo de vida mais saudável (Colombo & Aguillar, 1997).

Segundo Ribeiro (2007), a família desempenha uma função imprescindível no tratamento e reabilitação do doente, sendo relevantes as estratégias que cada família utiliza para lidar com acontecimentos stressantes desencadeados pela doença. A literatura refere ainda que os mecanismos de coping adotados pelo doente, estão relacionados com o apoio social que, por sua vez, promove melhores resultados em termos de funcionamento físico e emocional ao longo do tempo (King, Reis, Porter & Norsen, 1993). No caso especifico das doenças cardíacas, ter apoio social encontrava-se associado a uma relação estreita com uma menor recorrência de episódios de doença e uma sobrevivência mais longa (Reifman, 1995; Frasure- Smith et al., 2000). A falta de apoio social pode constituir um fator de risco para a doença cardiovascular, e consequentemente, para a hipertensão (Kamark et al., 1990).

De acordo com Cunha e colaboradores (2006), as pessoas com doenças crónicas (como é o caso da hipertensão) necessitam também de outras formas de apoio, uma vez que doença pode trazer implicações para a sua vida, e nem sempre conseguem lidar com os obstáculos com que se deparam (e.g. mudança de hábitos alimentares). A inexistência ou baixo apoio social é considerado um fator fragilizador. Por outro lado, as pessoas que contam com um apoio social consistente, mostram-se mais motivadas e dispostas a cuidar e conviver de forma mais saudável com a sua doença crónica (Favarato, 2004).

De acordo com Lima e colaboradores (2001), a perceção de risco e o valor de saúde que o doente hipertenso tem é influenciado pela perceção de risco (da hipertensão) e valor de saúde que o parceiro tem. Os processos familiares têm um impacto significativo num certo número de comportamentos relacionados com a saúde. No caso das doenças cardiovasculares, a gestão da doença é feita essencialmente no contexto familiar. De acordo com Wallston (1994), as pessoas com maior probabilidade de adotar comportamentos saudáveis são os que atribuem um valor elevado à sua saúde.

Para Jardim e colaboradores, (1996), modificar hábitos de vida envolve mudanças na forma de viver e nas representações da doença. Ainda segundo os autores, a conceção de saúde inclui a vivência e experiência pessoal de cada indivíduo, relacionando-se com as suas crenças. Invariavelmente, todas as pessoas atribuem um valor elevado à saúde. Efetivamente, num contexto de doença é provável que a importância atribuída à saúde seja mais elevada do que num contexto sem doença (Rokeach, 1973). No entanto, quando se procede à promoção de comportamentos de saúde, verifica-se que geralmente as pessoas não adotam comportamentos saudáveis para prevenir a doença e, por isso, o valor atribuído à saúde pode não ser tão elevado (Kasl & Cobb, 1966). Ware e Young (1979) referem que o valor de saúde se reflete primeiramente na saúde física e depois na saúde mental ou social.

De acordo com Lau, Hartman e Ware (1986), um elevado valor de saúde é um pré-requisito necessário para a adoção de comportamentos protetores de saúde. Assim, qualquer programa destinado a alterar crenças de saúde será bem-sucedido apenas nos participantes que atribuem um valor elevado à saúde. Segundo estes mesmos autores, diferentes atribuições (incluindo o valor da saúde) devem ser avaliadas para ajudar a explicar o sucesso ou o fracasso de qualquer programa de mudança de comportamentos em contextos de saúde.

O objetivo do presente estudo foi a adaptação para a população portuguesa dos instrumentos de Perceção de Risco de Hipertensão e Importância do Valor Atribuído à Saúde que contêm apenas quatro itens cada um, numa amostra de doentes com hipertensão.

 

Método

Participantes

A amostra foi constituída por 25 participantes hipertensos. 52% pertenciam ao sexo feminino. A média da idade foi de 56 anos (DP= 14,089) e a idade variou entre os 24 anos e os 83 anos No que concerne às habilitações literárias verificou-se que a maioria (48%) apresenta o 1º ciclo. Quanto à gravidade da hipertensão, 32% encontra-se no estádio 1, 36% no estádio 2 e 12% no estádio 3. Em termos clínicos, 52% referem ter familiares com hipertensão, 24% apresenta diabetes, 72% referem saber que possuem colesterol elevado e 40% refere ter problemas cardíacos.

 

Instrumentos

- Escala de Satisfação com o Apoio Social (ESSS) (Ribeiro, 1999). Este instrumento permite avaliar o grau de satisfação com o apoio social percebido em adultos. É constituído por 15 itens que se distribuem por 4 dimensões. A primeira dimensão denominada “satisfação com os amigos”, mede a satisfação com as amizades/ amigos que tem, e inclui 5 itens apresentando uma consistência interna de 0,83; a segunda dimensão composta por 4 itens denomina-se de “intimidade” e avalia a perceção da existência de apoio social íntimo, exibindo uma consistência interna de 0,74. O terceiro fator denominado de “satisfação com a família” mede a satisfação com o apoio familiar existente e inclui 3 itens que exibem uma consistência interna de 0,74. O último fator é referente às “atividades sociais”, avaliando a satisfação com as atividades sociais que realiza. Inclui 3 itens que mostram uma consistência interna de 0,64. A solução fatorial obtida inclui quatro fatores que explicam 66,7% da variância total da escala, apresentando um Alfa de Cronbach total de 0,83. É ainda de referir que esta escala permite uma opção de resposta que pode ser classificada através de uma escala de Likert de 5 pontos. Um resultado elevado significa mais satisfação com o suporte social.

- Questionário de Promoção de Estilos de Vida Saudáveis (Health Promoting Lifestyle Profile (HPLP-II). Trata-se de uma medida genérica de Walker, Sechrist e Pender (1987; versão Investigação de Pereira & Pereira, 2007) que avalia a adoção de hábitos e estilos de vida saudáveis nos hipertensos. É um instrumento que apresenta um formato de 52 itens, autoadministrado em formate de resposta Likert de 4 pontos, com resultados elevados a indicar a adoção de estilos de vida saudáveis. Esta escala avalia comportamentos promotores de saúde e que podem ser classificados ao longo das seguintes 6 dimensões: Responsabilidade pela Saúde, Atividade Física, Nutrição; Crescimento Espiritual, Relações Interpessoais e Forma de lidar com o stress. As propriedades psicométricas do HPLP II na sua versão original revelam que o coeficiente de Cronbach total do instrumento é de 0,92 e a consistência interna das seis subescalas encontra-se entre 0,70 e 0,92. Um resultado elevado corresponde a um estilo de vida mais saudável. A versão Portuguesa, nesta amostra, apresentou um alfa de 0,90.

- Questionário de Qualidade de Vida (WHOQOL-Bref). Este questionário foi criado pela organização mundial de saúde e inclui 26 itens e está organizado em quatro domínios: Físico, Psicológico, Relações Sociais e Ambiente (Fleck e colaboradores; 2000; Canavarro et al., 2007), existindo ainda o domínio de QV Geral, composto por dois itens, não contabilizados nos restantes domínios. No presente estudo só foi utilizado o domínio da QV geral. Valores mais elevados indicam melhor qualidade de vida no domínio considerado.

- Questionário da Perceção de Risco de Hipertensão (Hypertension Risk Perception Scale (Crump, 2010). O instrumento avalia o grau de perceção de risco que os sujeitos têm acerca da Hipertensão. É constituído por 4 itens que permite uma opção de resposta que pode ser classificada através de uma escala de Likert de 5 pontos em que resultados elevados indicam uma alta perceção de risco de hipertensão. Os autores recorrem a 3 itens que avaliam a perceção da suscetibilidade á hipertensão que apresenta um alfa de 0,76 e um item isolado que avalia a perceção da gravidade da doença.

- Escala de Importância atribuída à Saúde (Health Value Scale (Lau, Hartmen, & Ware, 1986). As propriedades psicométricas do HVS são adequadas. A consistência interna da escala original é de 0,67 e a fiabilidade do teste-reteste foi de 0.78. O valor de saúde diz respeito aos valores individuais de saúde, ou seja, a importância que atribuem à sua saúde física. Este questionário é constituído por 4 itens que permite uma opção de resposta que pode ser classificada através de uma escala de Likert de 7 pontos. Um resultado elevados indicar maior importância à saúde.

 

Procedimento

A amostra foi recolhida no serviço de cardiologia dum Hospital do Norte de Portugal. Os questionários foram aplicados aos doentes hipertensos depois de assinado o consentimento informado para participar no estudo. A participação foi voluntária.

O processo de tradução e adaptação necessários para a utilização dos instrumentos teve como base a orientação proposta por Bradley (1996) e, após consentimento da necessária autorização do autor de acordo com o seguinte procedimento:

a) Tradução pelo Investigador e simultaneamente por tradutor independente

b) Confronto das versões para elaboração da versão portuguesa

c) Retroversão por tradutor independente

d) Pré-teste com reflexão falada em 10 idosos para avaliar a adequação e compreensão dos itens

e) Elaboração da versão final do estudo.

 

Análise de Dados

Para estudar a validade de conteúdo, procedeu-se a realização duma análise fatorial exploratória tendo-se procedido previamente à realização do teste de esfericidade de Bartlett (p=0.001) e a medida de adequação da amostra de Kaiser-Meyer-Olkin com o objetivo de aferir da adequabilidade da amostra à análise fatorial.

Para calcular a validade convergente e discriminante foi utilizada estatística não paramétrica dado o tamanho da amostra.

 

Resultados

Fidelidade e Validade de Construto do Questionário da Perceção de Risco da Hipertensão

No sentido de avaliar a consistência interna do “QPRH” da versão Portuguesa foi calculado o coeficiente alfa de Cronbach relativamente à amostra em estudo. A escala apresenta um Alfa de Cronbach de 0.68, na qual os itens variam entre 0,35 e 0,58 (Tabela 1). Dado que o questionário é composto por 4 itens, o valor do alfa é considerado adequado (George & Mallery, 2003; Kline, 1999). Os resultados obtidos revelaram que a melhor solução inclui um fator que explica 42% da variância total dos resultados (Tabela 2), em que todos os itens saturam acima de 0,40.

 

 

 

 

 

Propriedades Psicométricas da Escala da Importância da Saúde

O coeficiente alfa de Cronbach foi de 0,68 (Tabela 3). A validade foi estudada, recorrendo à análise fatorial de componentes principais, seguida de rotação varimax. Após análise dos resultados, verificam que a retirada do item 2 fazia subir o alfa de 0.68 para 0,83. Além disso, o item saturava muito abaixo de 0,40. Nesse sentido decidiu-se retirá-lo. A versão Portuguesa para doentes hipertensos apresenta assim 3 itens, explicando 62% da variância e um alfa de Cronbach de 0,83 (Tabela 4).

 

 

 

 

 

Estudo da Validade Convergente

A análise da validade externa ou convergente foi realizada através da correlação com o estilo de vida, o apoio social e a qualidade de vida. Neste sentido, verificaram-se associações negativas entre o estilo de vida e a perceção de risco (rho= -0,879; p= 0,032), e entre a subescala de atividades sociais e a perceção de risco (QPRH) (rho= -0.929; p= 0,019), entre o valor de saúde e a subescala atividade física (QEV) (rho=0,537; p=0,008). Por outro lado, verificaram-se associações positivas entre o valor de saúde e a escala de satisfação com o apoio social total (rho=0,819; p=0,048); entre a subescala satisfação com amizades (ESSS) e a subescala relacionamentos Interpessoais (QEV) (rho=0.962; p= 0,010); entre subescala satisfação com amizades (ESSS) e o valor de saúde (rho= 0,945; p= 0,015); entre a subescala intimidade (ESSS) e a subescala nutrição (QEV) (rho= 0,992; p= 0,002); entre a subescala satisfação familiar (ESSS) e a subescala crescimento espiritual (QEV) (rho=0.958; p=0,011), e entre a subescala de atividades sociais (ESSS) e a subescala relacionamentos interpessoais (QEV) (rho= 0,859; p= 0.037)

Verificou-se também que os doentes hipertensos com melhor qualidade de vida total possuem uma menor perceção de risco (rho = -0,879, p≤ 0.05) e aqueles que apresentam bom estilo de vida, ao nível da pratica de atividade física, dão mais importância à saúde ( rho = 0,537; p≤0.05).

 

Validade Discriminante

Verificam-se diferenças significativas, em termos de género, nomeadamente as mulheres apresentam melhor estilo de vida ao nível da responsabilidade com a saúde (c2= 26,000; p= 0.004), nutrição (c2= 42,000; p= 0,049), e relacionamentos interpessoais (c2= 28,000; p=0,006).

 

Discussão

O presente estudo procurou efetuar a adaptação de dois questionários: Questionário da Perceção de Risco de Hipertensão (Crump, 2010) e a Escala do Valor de Saúde, (Lau et al., 1986), numa amostra composta por doentes hipertensos.

As associações significativas entre o estilo de vida e a perceção de risco e a importância atribuída á saúde vão de encontro ao de outros estudos, nos quais as pessoas com maior probabilidade de adotar comportamentos que melhoram a saúde são os que atribuem um valor elevado à sua saúde e consequentemente têm uma perceção de risco de hipertensão menor do que aquelas que adotam estilos de vida pouco saudáveis (Wallston, 1994), ou seja, quando o estilos de vida é saudável, a perceção de risco diminui e por isso seria compreensível que os pacientes que atribuem um valor elevado a saúde fizessem mais atividade física mas tal não aconteceu. Provavelmente os doentes hipertensos receiam a atividade física e futuros estudos deveriam utilizar amostras maiores e testar as representações do exercício físico nestes doentes.

Uma explicação para a relação entre o valor de saúde e a satisfação com o apoio social segundo Badger (1992) pode ter a ver com o facto da família constitui um foco especial de apoio para abordar a doença. Na experiência clínica tem-se comprovado que as famílias têm uma forte influência na saúde dos seus membros e são também influenciadas por esta. De acordo com Lima e colaboradores (2001), a perceção de risco e o valor atribuído á saúde que o doente hipertenso tem é influenciado pelos familiares particularmente o parceiro que tem um impacto significativo em vários comportamentos relacionados com a saúde. Por exemplo, no caso da hipertensão, muitas vezes é necessário alterar os hábitos alimentares, tornando-os mais saudáveis, sendo necessário estabelecer uma dieta para o doente hipertenso, englobando o parceiro sempre que possível.

Uma outra explicação para justificar as relações obtidas entre a satisfação com amizades, os relacionamentos interpessoais e o valor atribuído á saúde, bem como entre a intimidade (apoio social intimo) e nutrição, ou ainda entre a satisfação familiar e o crescimento espiritual, a satisfação com as atividades sociais e os relacionamentos interpessoais e, finalmente, entre a satisfação com as atividades sociais e a perceção de risco de hipertensão, prende-se com o facto de atualmente, se enfatizar a importância do apoio social na diminuição dos efeitos deletérios do estresse, bem como no bem-estar e qualidade de vida do indivíduo saudável ou doente (Underwood, 2000). É neste contexto que Ribeiro (1999) refere que o apoio social alivia o estresse em situação de crise, pode inibir o desenvolvimento de doenças e, quando o indivíduo está doente tem um papel positivo na recuperação da doença”. O apoio social funciona como um “recurso de coping” atuando essencialmente como uma “almofada” na diminuição das exigências da situação stressante. Nesta perspetiva, o apoio social, nomeadamente o relacionamento interpessoal (família, amigos e intimidade), parece ter um papel determinante na resistência psicológica ao estresse da doença, manifestada através da perceção subjetiva de bem-estar (Santos, Pais Ribeiro & Lopes, 2003).

Em diversos estudos (Achat et al., 1998; Caron, Tempier, Mercier & Leouffre, 1998), o isolamento social aparece associado a algumas doenças como a hipertensão, favorecendo um decréscimo na saúde mental, vitalidade, funcionamento social e desempenho de papéis sociais (Baker e colaboradores, 2002).

Os doentes hipertensos com melhor qualidade de vida total possuem uma menor perceção de risco e este resultado é intuitivo uma vez que não sentem nenhuma ameaça proveniente da sua doença (Bardage, & Isacson, (2001) e aqueles que apresentam bom estilo de vida, ao nível da pratica de atividade física, dão mais importância à saúde e por isso recorrem a praticas saudáveis. De facto, a organização mundial de saúde estima que a inatividade física seja a causadora de 30% das doenças isquémicas do coração e que a atividade física reduz a pressão a pressão arterial e os níveis de colesterol tendo um papel protetor nas doenças cardíacas (WHO, 2009).

As doentes do sexo feminino apresentaram um estilo de vida mais saudável quando comparados com os do sexo masculino. Segundo Nolen-Hoeksema (2004), homens e mulheres adotam distintos comportamentos relacionados com a saúde e os homens tendem a reagir à doença adotando mais comportamentos de risco para a saúde como o aumento do álcool e do tabaco. Ainda segundo o mesmo autor, existem diferenças entre homens e mulheres, ao nível do acesso aos cuidados médicos já que as mulheres procuram mais vezes os serviços de saúde e preocupam-se mais com a sua saúde.

 

Limitações

O facto deste estudo se ter circunscrito a um único hospital geral, incluir uma amostra pequena e de conveniência são consideradas limitações no presente estudo assim como o uso exclusivo de medidas de auto relato.

 

Conclusão

Nos últimos anos, a investigação científica tem chamado a atenção para a importância da alteração dos estilos de vida que contribuem para a hipertensão e doenças cardiovasculares resultantes da incapacidade de controlar a hipertensão e seus fatores de risco.

A hipertensão arterial afeta muitos portugueses e é a causa de grande número de mortes e incapacidades por doença cardiovascular (Gomes Mota et al., 2003).Tendo em conta a escassez no nosso país de estudos que investiguem a relação entre estilos de vida, perceção de risco e valor atribuído á saúde, na hipertensão e doenças cardiovasculares, esperamos que a validação destes dois instrumentos possam contribuir para um maior investimento, em termos de investigação futura, nesta área.

As escalas que foram alvo da adaptação para a língua Portuguesa, no presente estudo, apresentam qualidades psicométricas razoáveis permitindo a sua utilização em doentes hipertensos, em contexto hospitalar.

 

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Endereço para correspondência
Maria da Graça Pereira
E-mail: gracep@psi.uminho.pt

 

 

*Escola de Psicologia, Universidade do Minho. Email: gracep@psi.uminho.pt
**Escola de Psicologia, Universidade do Minho. Email: angelapereira@portugalmail.com

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