SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.25 número1A importância da escuta psicológica na oncologia pediátrica hospitalar: quem é você apesar do câncerConjugalidade após infarto agudo do miocárdio índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Revista da SBPH

versão impressa ISSN 1516-0858

Rev. SBPH vol.25 no.1 São Paulo jan./jun. 2022

http://dx.doi.org/10.57167/Rev-SBPH.v25.026 

PARTE II - REPERCUSSÕES PSÍQUICAS DO ADOECIMENTO E INTERVENÇÕES POSSÍVEIS

 

Caracterização de variáveis envolvidas na atuação analítico-comportamental em contexto de cuidados paliativos

 

Characterization of variables involved in analytical-behavioral practice in palliative care

 

 

Bianca dos ReisI; Josiane de Fátima Farias KnautII

IUniversidade Federal do Paraná (UFPR) - Curitiba/PR - E-mail: reisbianca3@gmail.com
IIUniversidade Federal do Paraná (UFPR) - Curitiba/PR - E-mail: josiknaut@gmail.com

 

 


RESUMO

INTRODUÇÃO: apesar do avanço tecnológico na área médica, alguns quadros de saúde podem ameaçar a vida, sendo necessário promover e viabilizar práticas do serviço de Cuidados Paliativos. Esse estudo teórico tem como objetivo caracterizar variáveis relacionadas à atuação analítico-comportamental em contexto de Cuidados Paliativos, por meio de: (1) uma análise sobre as contingências históricas que podem interferir na discriminação de saúde e doença, (2) caracterização do processo de análise funcional em Cuidados Paliativos e (3) descrição de possíveis demandas para intervenções analítico-comportamentais em Cuidados Paliativos
MÉTODO: Para tais proposições, foram utilizadas bibliografias das duas áreas: Cuidados Paliativos e Análise do Comportamento, a partir de uma revisão assistemática da literatura. Resultados e Discussão: Foram propostas variáveis referentes ao histórico cultural das práticas em saúde, como as relações entre as condutas médicas e os movimentos sociais, variáveis de estímulo e resposta para análise funcional e de atuação analítico-comportamental em comportamentos que caracterizam conspiração do silêncio, dificuldade de comunicação profissional e luto complicado. A caracterização de variáveis relacionadas à atuação em Cuidados Paliativos cria condições para avaliação das intervenções, demonstrando a importância do profissional no contexto
CONCLUSÃO: Tais reflexões contribuem para aumentar a clareza sobre variáveis específicas do contexto de Cuidados Paliativos

Palavras-chave: cuidados paliativos; análise do comportamento; análise funcional.


ABSTRACT

INTRODUCTION: despite technological advances in the medical field, some health conditions can be life-threatening, and it is necessary to promote and enable Palliative Care service practices. This theoretical study aims to characterize variables related to behavior-analytic performance in the context of Palliative Care, through: (1) an analysis of the historical contingencies that can interfere in the discrimination of health and disease, (2) characterization of the process of functional analysis in Palliative Care and (3) description of possible demands for behavioral-analytic interventions in Palliative Care
METHOD: For such propositions, bibliographies from two areas were used: Palliative Care and Behavior Analysis, from an unsystematic literature review. Results and Discussion: Variables related to the cultural history of health practices were proposed, such as the relationship between medical conduct and social movements, stimulus and response variables for functional analysis and behavior-analytic performance in behaviors that characterize conspiracy of silence, difficulty in professional communication and complicated grief. The characterization of variables related to work in Palliative Care creates conditions for the evaluation of interventions, demonstrating the importance of the professional in the context
CONCLUSION: Such reflections contribute to increase clarity about specific variables in the context of Palliative Care

Keywords: palliative care; behavior analysis; functional analysis.


 

 

Introdução

A Organização Mundial da Saúde [WHO] (2002) define Cuidados Paliativos como um conjunto de ações realizadas de maneira multidisciplinar a um paciente que possui o diagnóstico de uma doença que ameace a vida. Essas ações visam garantir qualidade de vida a ele e sua família e, para isso, são adotadas práticas que reduzem ou previnem o sofrimento. Neste sentido, alguns princípios foram criados para direcionar as condutas dos profissionais que atuam nesse contexto, como: promover alívio da dor e outros sintomas; afirmar a vida e considerar a morte como um processo normal da vida; não acelerar nem adiar a morte; integrar os aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao paciente; oferecer um sistema de suporte que possibilite ao paciente viver tão ativamente quanto possível, até o momento da sua morte; oferecer sistema de suporte para auxiliar os familiares durante a doença do paciente e a enfrentar o luto; abordagem multiprofissional para focar as necessidades do paciente e seus familiares, incluindo acompanhamento no luto, melhorar a qualidade de vida e influenciar positivamente o curso da doença (WHO, 2002).

Estima-se que aproximadamente 40 milhões de pessoas precisem desse serviço a cada ano (WHO, n. d.) e que cerca de 60% das pessoas que morreriam em 2020 no Brasil necessitariam de Cuidados Paliativos (Santos, et al., 2019). Diante desse cenário, a viabilização desse serviço de saúde torna-se importante. Assim, a produção de conhecimento envolvendo a atuação dos profissionais que trabalham em Cuidados Paliativos, como reflexões sobre a prática analítico-comportamental do psicólogo, pode contribuir para tal objetivo.

A atuação analítico-comportamental do psicólogo em contexto de saúde apresenta algumas particularidades, visto que não constitui a mera replicação do conhecimento produzido para a área clínica (Gorayeb, 2001). O psicólogo fará parte de uma equipe multidisciplinar, relacionando-se com o paciente, família e equipe (Freitas, Melo, & Pacheco, 2018). Dentre os objetivos da atuação encontram-se planejar, aplicar e avaliar intervenções que busquem desenvolver repertório nos indivíduos (equipe, família ou pacientes), de modo que consigam enfrentar as contingências relacionadas ao processo de adoecimento (Amaral, 1999). Essa interação entre a tríade paciente, família e equipe, juntamente com os objetivos do serviço de Cuidados Paliativos que direcionam a atuação profissional, distancia a transposição direta e intuitiva da clínica em Análise do Comportamento para esse contexto. Assim, torna-se relevante produzir conhecimento que considere variáveis específicas de diferentes contextos de saúde, como o de Cuidados Paliativos.

 

Objetivos

Considerando, portanto, a alta demanda do serviço de Cuidados Paliativos, a relevância social da viabilização do serviço e a necessidade de produção de conhecimento em Análise do Comportamento que considere variáveis específicas do contexto de saúde, este estudo teve como objetivo caracterizar variáveis relacionadas à atuação analítico-comportamental em contexto de Cuidados Paliativos, por meio de: (1) uma análise sobre as contingências históricas que podem interferir na discriminação de saúde e doença, (2) caracterização do processo de análise funcional em Cuidados Paliativos e (3) descrição de possíveis demandas para intervenções analítico-comportamentais em Cuidados Paliativos. Tal caracterização pode contribuir para orientar a conduta de psicólogos analistas do comportamento que atuam em Cuidados Paliativos.

 

Método

Foram utilizadas bibliografias referentes à área de Cuidados Paliativos e à Análise do Comportamento (livros, artigos, teses e dissertações), selecionadas de forma assistemática com base nos critérios de 1) apresentação de informações referentes à atuação analítico-comportamental e seus pressupostos; 2) descrição do serviço de Cuidados Paliativos; 3) relevância com base no número de citações dos estudos, de modo a possibilitar a proposição de uma análise teórica de base analítico-comportamental sobre a atuação do psicólogo no serviço de Cuidados Paliativos. Para seleção dos estudos, foram realizadas buscas nas bases Scielo, Pepsic, PubMed, Periódicos CAPES, além de buscas nos periódicos de Análise do Comportamento RBTCC e REBAC. Os descritores utilizados foram "saúde", "Análise do Comportamento", "Cuidados Paliativos", "Más Notícias", "Terminalidade", "Morte", "Conspiração do Silêncio" e "Luto". Também foram consultadas as listas de referências dos estudos selecionados.

 

Resultados e Discussão

Contingências históricas e a discriminação dos determinantes do processo de saúde e doença

A seleção cultural corresponde a um dos níveis de seleção por consequências no qual a evolução de práticas sociais se dá por meio das contingências mantidas culturalmente (Skinner, 1981/2007). Na área da saúde, diferentes contextos históricos contribuíram para a caracterização contemporânea do que é considerado saúde ou doença. Essa caracterização, por sua vez, direciona a atuação dos profissionais de saúde e influencia em respostas de enfrentamento de pacientes diante da ocorrência de doenças (Starling, 2001). Pacientes, acompanhantes e equipe multidisciplinar estão inseridos em contextos que compartilham práticas sociais semelhantes, sinalizando possíveis determinantes de comportamentos relacionados à saúde em comum.

Em Cuidados Paliativos, a clareza do psicólogo a respeito desses determinantes, tanto dos pacientes quanto da equipe, pode criar condições para planejar intervenções eficazes, propiciando maior qualidade de vida dos envolvidos. Diante disso, analisar historicamente a evolução da caracterização de saúde e doença, bem como suas consequências para os dias atuais, pode contribuir para a identificação de determinantes comportamentais e planejamento de intervenções eficazes de base analítico-comportamental, neste serviço.

O modelo biopsicossocial, amplamente discutido em intervenções na área da saúde, é registrado desde Hipócrates. Gradualmente as antigas civilizações abandonaram a visão biopsicossocial de Hipócrates, que considerava o homem como um ser holístico e integrado por diferentes variáveis que interferem na saúde e doença, para uma abordagem mística (Kerbauy, 1999). No misticismo, a doença sofria influência de um poder metafísico, sendo a saúde determinada pela harmonia entre a sociedade, deuses e antepassados. Os xamãs e bruxos exerciam então a função de médicos (Baremblitt, 2001).

Posteriormente, diante das contingências sociais produto do movimento Renascentista, buscou-se o rompimento do misticismo e superstições. Assim, o racionalismo e o cientificismo assumiram grande destaque. Como consequência, saúde, doença e os fenômenos relacionados ao homem passaram a ser estudados de forma racional e empírica, dando início ao denominado modelo biomédico reducionista. O homem passou a ser dividido entre duas instâncias: mente e corpo (Kerbauy, 1999). Aos estudos científicos de saúde, reduzia-se a investigação das doenças e sintomas. Vai se instalando, aos poucos, a ideia de autonomia humana e domínio de todas as angústias, inclusive da morte pela ciência (Oliveira, Collet, & Viera, 2006). Ou seja, a ideia de controle do processo natural pelo conhecimento científico.

Consequentemente, o modelo biomédico reducionista direcionava as práticas de saúde à cura, mais do que ao cuidado holístico, visto que as interações e o que era considerado "metafísico e, portanto, não passível de estudo", como o comportamento humano, permanecia sob responsabilidade de outros profissionais não cientistas (Kerbauy, 1999). A ênfase sobre a objetividade deixa de lado a subjetividade, assumindo que o saber técnico é soberano e sabe o que é melhor para o bem-estar do paciente, independentemente da sua opinião. Ou seja, a atenção recai sobre a doença e não sobre a pessoa que tem a doença.

Por outro lado, a noção de saúde e doença passa a ser modificada culturalmente diante das influências das publicações de Freud e da psicanálise, dando espaço à Medicina Psicossomática. Passou-se a considerar o psicológico como um fator relevante para se estudar o fenômeno saúde. Por volta da década de 70 há uma retomada da valorização do modelo biopsicossocial, destacando também a importância da atuação multiprofissional em contextos de saúde por meio da Medicina Comportamental (Almeida & Malagris, 2011; Kerbauy, 1999).

Apesar da inegável relevância da produção científica, as condições promovidas para estudo da saúde geraram como subproduto práticas focadas no ensino técnico dos profissionais, com ênfase na cura de sintomas (Vandekieft, 2001). Diante de esforços e de produção recorrente para retomada da visão holística de homem, muitos profissionais ainda enfrentam dificuldades durante a atuação para lidar com temas como morte ou adaptação da linguagem científica considerando o contexto social do paciente (Coriolano-Marinus, Queiroga, Ruiz-Moreno, & Lima, 2014; Maguire, 1985; Victorino, Nisenbaum, Gibello, Bastos, & Andreoli, 2007). A ênfase na cura e não no cuidado pode trazer sensação de fracasso aos profissionais (Pernambuco, Miragaia, & Pontes, 2019; Vandekieft, 2001), uma vez que, por mais que a ciência tenha avançado, não há total controle sobre a evolução das doenças.

Assim, alguns profissionais podem chegar a esquivar ou fugir de situações envolvendo a morte (Maguire, 1985), apresentando dificuldades em abordar o tema e, principalmente, em discutir a terminalidade com os pacientes e/ou familiares. Essas consequências dificultam o serviço eficaz de Cuidados Paliativos, sendo necessário ao psicólogo, portanto, avaliar a presença ou não do repertório de lidar com a finitude da vida na equipe, nos pacientes e também nos familiares para criar condições que transformem tal situação, de modo a promover maior qualidade de vida aos envolvidos, reduzindo ou prevenindo sofrimento e, assim, influenciando positivamente o curso da doença.

Em contraste com a ênfase na cura, a noção de saúde e doença como fenômenos multideterminados assume função relevante para atuação analítico-comportamental e mudança de perspectiva em Cuidados Paliativos, visto que possibilita uma avaliação mais completa das variáveis envolvidas na saúde do paciente, criando, assim, contexto para intervenções mais efetivas. Kubo e Botomé (2001) examinam esses fenômenos, não como conjuntos de variáveis dicotômicas, mas como conjunto de variáveis que são determinados por diferentes fatores. Segundo os autores, o indivíduo apresenta diferentes graus de condições de saúde, caracterizando o fenômeno saúde como multideterminado (influenciado por variáveis genéticas, ambientais e sociais). Assim, parte dos determinantes de saúde do paciente envolve, por exemplo, a habilidade relacional dos profissionais, citada como uma dificuldade da área da saúde pela literatura e influenciada pelo modelo biomédico, cuja ênfase se dá no aprimoramento tecnológico na cura e não no cuidado (Cherpak, Hirschfeld, dos Santos & Arbex, 2019; Coriolano-Marinus, et al., 2014; Maguire, 1985).

Tais habilidades relacionais são imprescindíveis para o serviço efetivo de Cuidados Paliativos, uma vez que as condutas dos profissionais devem ser orientadas pela promoção de um suporte que integre os aspectos psicológicos e espirituais no cuidado ao paciente, promovendo bem-estar e redução do sofrimento (WHO, 2002). Suporte este, que se concretiza por meio da relação médico-paciente. Dessa forma, analisar historicamente a influência das mudanças de perspectiva entre saúde e doença, por meio das consequências produzidas em cada período contribui para aumentar a clareza em relação às variáveis que podem ser função de comportamentos que geram sofrimento nos profissionais e pacientes. Essa clarificação promove maior orientação de psicólogos ao longo da coleta de dados para planejamento de intervenções, utilizando o principal instrumento para análise: a análise funcional.

O processo de análise funcional do comportamento de pacientes em Cuidados Paliativos

A descrição histórica da evolução de uma prática social contribui para análise de possíveis determinantes que influenciam o comportamento de um organismo. Além do nível cultural, o comportamento é determinado filogeneticamente: características fisiológicas selecionadas por garantirem a sobrevivência da espécie; e ontogenéticamente: operantes selecionados na história de vida de um organismo por estímulos que possuem função reforçadora (Skinner, 1981/2007). Levando em consideração que o comportamento é a interação entre os componentes estímulos antecedentes, resposta e estímulos consequentes (Skinner, 1953/2003), analisar funcionalmente o comportamento de pacientes em Cuidados Paliativos, isto é, identificar em função de quais estímulos o comportamento é apresentado, torna-se necessário para o planejamento de intervenções. Nesse sentido, caracterizar particularidades do serviço de Cuidados Paliativos, como o seu objetivo, e informações a serem coletadas para a análise funcional, pode aumentar a clareza de quais componentes precisam ser identificados ao longo do processo de análise de um caso em Cuidados Paliativos. Dessa forma, o objetivo dessa seção será caracterizar variáveis a serem investigadas pelo analista do comportamento, fornecendo assim informações referentes a componentes do comportamento para análise funcional de casos em Cuidados Paliativos.

O objetivo da atuação do psicólogo na saúde é lidar com comportamentos que mantêm a doença ou que previnem o adoecimento (Amaral, 1999). Desenvolve-se assim, repertório no paciente, em acompanhantes ou na equipe que busquem adaptação às contingências relacionadas ao adoecimento, de modo que promova, como consequência, maior qualidade de vida e bem-estar (Gorayeb, 2001). Para isso, o processo de planejamento de intervenção analítico-comportamental e avaliação das intervenções assemelham-se ao método seguido em pesquisa científica: (a) identificação de um problema, (b) proposição do método para coleta de informações sobre o problema, (c) coleta de informações a respeito de variáveis que determinam o comportamento de pacientes, acompanhantes ou equipe, por meio de observação direta ou indireta (d) criação de objetivos e proposição da intervenção e (e) avaliação da intervenção (Gorayeb & Guerrelhas, 2003). Dessa forma, é necessário obter informações sobre o diagnóstico, prognóstico e tipo de tratamento do paciente.

Partindo do objetivo de propor um esquema de análise funcional levando em consideração o modelo biopsicossocial, Starling (2001) descreve dois diferentes conjuntos de variáveis a serem avaliadas no processo de análise funcional: "conjunto de variáveis de estímulo doença" e "conjunto de variáveis de resposta enfermidade". As variáveis de doença corresponderiam aos estímulos que geraram determinada alteração homeostática no organismo, como a invasão de vírus ou bactéria. Já os conjuntos de variáveis de enfermidade correspondem à resposta do organismo diante da variável de estímulo. Essas, por vez, incluem desde alterações respondentes, como palpitação no coração, até respostas operantes, como sofrimento emocional e respostas de enfrentamento disfuncionais (Starling, 2001). As variáveis de estímulo doença, com base na proposta de Starling (2001), seriam de responsabilidade do serviço médico, enquanto as de resposta enfermidade de responsabilidade da equipe da Psicologia. Apesar da diferenciação entre as atuações, cabe ao psicólogo também identificar as variáveis de estímulo referentes à doença, visto que interferirão nas respostas de enfrentamento do paciente.

Tendo como base McHugh e Vallis (1986), Starling (2001) propôs um esquema em que sugere a sistematização de variáveis envolvidas nos conjuntos de variáveis doença (estímulo) e enfermidade (resposta). Dentre as variáveis do conjunto de doença encontram-se: estímulos externos (estímulos que causaram a alteração da homeostase, como substâncias tóxicas, lesões); respostas fisiológicas (variável filogenética modificada no organismo por meio do estímulo externo, como alterações do nível de adrenalina) e estímulos internos (referentes ao ambiente genético do organismo e sua possível influência na saúde do paciente, como contexto orgânico favorável para desenvolvimento de neodisplasia ou alteração cerebral, por exemplo). Tais variáveis interagem diretamente com as variáveis de enfermidade (variáveis de resposta do organismo), sendo elas: variáveis externas sociais (práticas sociais que influenciam na discriminação do processo de saúde e doença do paciente); discriminações, modelos, padrões de ação e processos verbais (informações que sinalizam padrão de discriminação do paciente referente à sua condição de saúde, aprendido ao longo da sua vida); variáveis internas (referentes a aspectos genéticos do organismo que interferem em como ele lida com a doença, como grau de integridade do sistema nervoso central).

Diante de uma situação de adoecimento as variáveis de resposta (enfermidade) interagem com as variáveis de estímulo (doença). Por exemplo, diante de caso do diagnóstico de um câncer de próstata, em que um indivíduo não busca atendimento médico: (1) Estímulos externos (e.g. condições de vida como alimentação, exposição a substâncias tóxicas etc); (2) Respostas fisiológicas (e.g. alterações do nível de adrenalina, colesterol, glicose etc) e (3) Estímulos internos (e.g. baixa resposta imunológica e alteração de síntese celular), consideradas variáveis de estímulo, as quais interagem com as variáveis de resposta: (1) variáveis externas sociais (ex: influência cultural quanto à expressão do sofrimento masculino diante de uma dificuldade, influenciando na busca por médicos); (2) discriminações, modelos, padrões de ação e processos verbais: (e.g. autorregra de que homem não chora, cuidar da saúde não é tão importante quanto ser produtivo); (3) variáveis internas (e.g. integridade do sistema nervoso central, mas não do sistema imunológico).

As variáveis propostas no esquema de Starling (2001) sugerem informações a serem coletadas pela equipe de Psicologia para a análise funcional dos comportamentos que causam sofrimento nos pacientes e para proposição de intervenções. No caso de Cuidados Paliativos, as variáveis de enfermidade e de doença precisam ser analisadas, de modo a criar condições que promovam aceitação da doença crônica, autonomia do sujeito para o tratamento diante de diferentes práticas para redução de sofrimento, elaboração da finitude e luto, bem como resolução de pendências (Melo, Valero, & Menezes, 2013). Deve-se também levar em conta que o trabalho do psicólogo nesse contexto é focal e que, ao contrário do ambiente clínico, as contingências estão operando no momento das intervenções psicológicas (Amaral, 1999). O setting terapêutico recebe influência do ambiente hospitalar ou da instituição de saúde responsável pelo tratamento do paciente, apresentando especificidades quanto à privacidade do paciente, tempo de sessão e disponibilidade de materiais. Portanto, Gorayeb (2001) sumariza também outras variáveis a serem avaliadas, como: horários da equipe, disponibilidade das salas, tempo de exames etc.

Diante das variáveis sistematizadas e por meio de observação direta e entrevistas com o paciente, acompanhantes e equipe, torna-se possível identificar variáveis que determinam o comportamento dos indivíduos e que acabam sinalizando dificuldades de enfrentamento das contingências atuais relacionadas ao adoecimento, como fugas ou esquiva de notícias sobre o diagnóstico ou prognóstico, seja por parte da equipe, do paciente ou de acompanhantes (Amaral, 1999; Maguire, 1985). Partindo do pressuposto de que é possível controlar e prever o comportamento de um organismo, devido à multideterminação do fenômeno (Skinner, 1953/2003), torna-se possível também prever situações que geram sofrimento para pacientes do serviço de Cuidados Paliativos. A análise funcional é a principal ferramenta de análise do psicólogo analista do comportamento. A identificação do maior número de variáveis possíveis, com base nas informações coletadas de forma sistemática, é um pré-requisito para o planejamento de intervenções efetivas. A maior clareza das variáveis a serem investigadas contribui para orientar o analista do comportamento no momento de analisar funcionalmente o comportamento da equipe e dos pacientes do serviço de Cuidados Paliativos.

Demandas psicológicas em Cuidados Paliativos e considerações sobre as intervenções analítico-comportamentais

A partir da etapa de avaliação e coleta de informações inicia-se o planejamento, aplicação e avaliação da intervenção. Apesar de cada indivíduo apresentar diferentes determinantes e processos de aprendizagem, inviabilizando consequentemente a proposta de estabelecer uma única intervenção que vise promoção de qualidade de vida a todos os pacientes, essa seção tem por objetivo descrever as demandas conspiração do silêncio, dificuldades de comunicação entre paciente, acompanhante e equipe multidisciplinar e luto complicado. Propõem-se também, breves considerações sobre a intervenção analítico-comportamental em cada situação, com base na literatura e pressupostos da Análise do Comportamento aplicada à saúde, com objetivo de orientar o psicólogo sobre as possibilidades de atuação no contexto.

Conspiração do Silêncio

A conspiração do silêncio é uma forma de comunicação desenvolvida entre equipe, paciente e família, em que os envolvidos optam, implicitamente ou explicitamente, por não se falar sobre a condição de saúde (Lemus-Riscanevo, Carreño-Moreno, & Arias-Rojas, 2019). O silêncio pode ocorrer desde não falar o nome do diagnóstico (como câncer), até sobre as consequências da condição de saúde do paciente (impossibilidade de cura, por exemplo). Nesse sentido, algumas consequências desta conduta podem ser derivadas da literatura, e assim, contribuir para o planejamento de intervenções.

Da perspectiva dos familiares, o não falar sobre as condições graves de saúde do ente querido, permanecendo em silêncio, evita que entrem em contato com a própria dor (Lemus-Riscanevo, et al., 2019; Volles, Bussoletto & Rodacoski, 2012). Em relação à equipe, evita-se entrar em contato com as próprias emoções; com as emoções de raiva e tristeza do paciente, com o sentir-se "impotente" diante do quadro de saúde apresentado (Maguire, 1985). No entanto, da perspectiva do paciente, devido à discriminação do próprio quadro de saúde, a conspiração do silêncio pode aumentar a sensação de incontrolabilidade e consequentemente aumentar as respostas de ansiedade (Lemus-Riscanevo, et al., 2019, Volles, et al., 2012). Além disso, esquivar de falar sobre o quadro clínico também evita entrar em contato com o próprio sofrimento, bem como dos familiares.

Identificar as variáveis envolvidas na manutenção da conspiração do silêncio torna-se essencial para intervenção analítico-comportamental. Tal identificação, realizada por meio de observação direta ou indireta do comportamento de pacientes, equipe e acompanhantes (Amaral, 1999) cria condições para manipulação de variáveis ambientais que contribuem para a manutenção do sofrimento. Nesse sentido, o comportamento descrito pela conspiração do silêncio parece ser mantido por reforçamento negativo, visto que as consequências de silenciar informações sobre diagnóstico, prognóstico e tratamento do paciente evitam entrar em contato com situações aversivas, como: manejo da emoção do paciente por parte da equipe; entrar em contato com o sofrimento do ente querido por parte da família e entrar em contato com o sofrimento alheio e o próprio, por parte do paciente.

A falta de repertório de enfrentamento da família, da equipe de profissionais e do paciente também pode contribuir para que esse cenário se mantenha. A regra de que falar a verdade ou comunicar o paciente pode fazê-lo deprimir e, assim matá-lo antes da hora é percebida por profissionais da área da saúde (Arantes, 2016), o que, por sua vez, é mais uma variável que pode atuar na manutenção do comportamento de silêncio. No entanto, a comunicação clara sobre o seu quadro de saúde, como a possibilidade de terminalidade, cria condições para que o paciente consiga resolver pendências importantes em sua vida e ao mesmo tempo faça escolhas sobre condutas médicas durante o período de fim de vida (Lemus-Riscanevo, et al., 2019; Fallowfield, Jenkins, & Beveridge, 2002). A atribuição de controle gerada por meio da comunicação garante maior autonomia ao paciente, sobre a sua vida e sua morte, criando condições para uma morte digna.

Um estudo realizado por Wright, et al. (2008) objetivou avaliar a relação entre as discussões sobre o fim da vida realizada pela equipe médica e o uso de intervenções de saúde menos agressivas, como menor taxa de ventilação ou ressuscitação. Participaram do estudo 332 pacientes em estágio terminal, acompanhados por quatro meses, em média. Quase 40% dos pacientes relataram ter tido discussões sobre o fim de vida antes do acompanhamento. Os pesquisadores avaliaram as taxas relacionadas ao Transtorno Depressivo Maior antes e após o acompanhamento por meio de entrevista clínica inventários (McGill Quality of Life Psychological Subscale e Edicott Scale). Não foram encontradas associações estatísticas significativas entre aumento na taxa de humor deprimido e discussões sobre final de vida (8.3% vs 5.8%). Em contrapartida, as discussões estiveram associadas a taxas mais baixas de intervenções consideradas agressivas, como uso de ventilação (1,6% vs 11,0%) e ressuscitação (0,8% vs 6,7%). A redução de medidas invasivas é um dos objetivos do serviço de Cuidados Paliativos. Outro estudo realizado por Ahrens, Yancey e Kollef (2003) demonstrou efeitos positivos da reunião familiar, com uma equipe especializada em comunicação em Cuidados Paliativos, sendo observada uma redução das taxas de utilização da Unidade de Terapia Intensiva (cerca de cinco dias a menos que pacientes sem a intervenção).

Dadas as consequências que mantém o comportamento de conspiração do silêncio identificadas, dentre as intervenções possíveis estão as que objetivam desenvolver repertório comportamental da equipe para lidar com a morte, evolução da doença, e sofrimento alheio (Gorayeb, 2001). A conscientização de que a comunicação sobre o diagnóstico pode ser libertadora para o paciente, visto que ele conseguirá ter o controle sobre a sua morte e consequentemente resolver as pendências que considera importante, promove melhor qualidade de vida ao paciente e cria um contexto favorável para uma morte digna (Arantes, 2016). Para isso, torna-se necessário desenvolver comportamentos relacionados à comunicação e acolhimento na equipe multiprofissional, de modo a viabilizar o contato dos pacientes e acompanhantes às contingências em vigor, de forma clara, evitando, assim, possíveis fugas e esquivas.

Dificuldades de comunicação entre paciente, acompanhante e equipe multidisciplinar

De acordo com o Princípio Bioético de Autonomia do Sujeito (PAS), o ser humano tem autonomia, demarcada pela liberdade de ação. Dessa forma, é fundamental que a equipe de saúde respeite a liberdade e dignidade do paciente diante das suas escolhas, de modo que ele consiga exercer sua autonomia como sujeito de direitos (Assumpção & Vieira, 2018; Torres, 2003). A comunicação viabiliza a tomada de decisões e, sendo assim, torna-se importante que os profissionais da saúde estejam treinados para ter uma comunicação eficaz com os pacientes. Apesar da importância de tal habilidade, alguns profissionais ainda enfrentam dificuldades de comunicação (Cherpak, Hirschfeld, Santos, Arbex, 2019; Coloriano-Marinnus, et al., 2014), sendo necessário um exame dos processos de ensino e de aprendizagem de comportamentos complexos de interação entre médico e paciente ao longo da graduação. A sinalização de uma lacuna no ensino de comportamentos de interação pode estar correlacionada à crença em docentes de que esses comportamentos "não técnicos" se aprendem por meio da experiência ou de que os médicos já devem possuir os comportamentos desenvolvidos (Afonso & Mitre, 2013; De Marco, Vessoni, Capelo, & Dias, 2010). Devido à defasagem do ensino de determinados comportamentos não considerados técnicos na área médica, diversos profissionais utilizam sua experiência prática para avaliar como se comportar (Lino, Augusto, de Oliveira, Feitosa, & Caprara, 2011). Assim, a avaliação da comunicação dos médicos sobre o diagnóstico, prognóstico e tratamento para pacientes, feita por psicólogos em Cuidados Paliativos torna-se indispensável.

Além das intervenções para os pacientes e acompanhantes, o psicólogo pode contribuir para desenvolver repertório na equipe multidisciplinar (Conselho Regional de Psicologia - 8ª região, 2016). Com base nas observações diretas e indiretas é possível identificar as dificuldades na apresentação de comportamentos, como o de informar notícias difíceis. Tal comunicação é responsabilidade do profissional da área da Medicina, no entanto, é importante que, além de não omitir informações, o profissional consiga promover o acolhimento necessário. Não obstante, as competências de comunicação não são inatas ou de características de personalidade, mas enquanto habilidades relevantes para o contexto de saúde podem e devem ser ensinadas aos profissionais (Dohms & Gusso, 2021). Dessa forma, a Análise do Comportamento cria um contexto favorável para o ensino de comportamentos profissionais referentes à comunicação, como o de comunicar notícias difíceis. A aprendizagem de um comportamento se desenvolve em função das condições de ensino planejadas para tal objetivo. Nesse sentido, a tecnologia produzida por meio da Programação de Condições de Ensino pode contribuir para aprendizagem de comportamentos por parte dos profissionais da saúde que promovam acolhimento e uma comunicação clara. Botomé (1980) propõe quatro etapas do processo de Programar Condições de Ensino: (1) construção do programa de ensino; (2) aplicação do programa de ensino; (3) avaliação da eficácia do programa de ensino e (4) modificação do programa de ensino com base na avaliação. Dessa forma, a sistematização do ensino de comportamentos pode contribuir para desenvolvimento de aprendizagens eficazes e necessárias para o contexto de saúde, como de comportamentos referentes à comunicação de notícias difíceis. Além disso, o método proposto para programar condições de ensino pode ser utilizado por psicólogos da saúde para programar treinamentos e desenvolver aprendizagens de outros profissionais com base nas necessidades do contexto.

Apesar da possibilidade de dificuldade na aprendizagem devido à defasagem do ensino médico, ao psicólogo também cabe avaliar a possibilidade de dificuldade da equipe em lidar com a terminalidade. O psicólogo ao planejar intervenções deve considerar os limites de fazer parte da equipe multidisciplinar. Dessa forma, a depender da demanda dos profissionais, alguns encaminhamentos como psicoterapia individual realizada por um psicólogo externo à equipe podem ser viáveis (Gorayeb, 2001).

Luto complicado

O processo de tomar consciência da terminalidade em Cuidados Paliativos pode indicar a necessidade do acompanhamento profissional psicológico, tanto pela perspectiva do paciente, quanto dos familiares. Diante da incontrolabilidade da morte de entes queridos, diferentes comportamentos podem ser apresentados pelos familiares, a depender do seu repertório comportamental. Levando em consideração que o comportamento humano é definido como a interação entre organismo e ambiente (Skinner, 1953/2003), o comportamento de outras pessoas pode adquirir função reforçadora (Banaco, Nico, & Kovac, 2013). Assim, quando uma pessoa morre, os reforçadores gerados pela interação dessa pessoa com outras deixam de fazer parte do ambiente destas (Torres, 2010). Devido à alteração das contingências, diferentes reações adaptativas, denominadas pela comunidade verbal como "luto", podem ser percebidas.

O luto considerado saudável corresponde à adaptação da pessoa à vida após a morte do ente querido, não excluindo a possibilidade de sentimento de tristeza e raiva ocasionalmente. Quando o processo de luto gera uma desorganização do sujeito, impossibilitando sua adaptação ao cotidiano, tal processo é considerado um "luto complicado" (Santos, 2010). Algumas variáveis podem auxiliar a identificar a possibilidade de configuração do luto complicado, como: tipo de vínculo do enlutado e a pessoa que faleceu; o ciclo vital da pessoa falecida, tipo de morte, acesso ao corpo, possibilidade anterior de resolução de pendências (Braz & Franco, 2007). Algumas dessas variáveis puderam ser observadas, por exemplo, durante a pandemia de COVID-19, dificultando a elaboração do luto diante da morte de entes próximos. A impossibilidade da realização dos rituais para a despedida, a alta taxa de mortes em um curto período de tempo, a ocorrência de mais de um óbito em um mesmo núcleo familiar e a impossibilidade de contato entre os pacientes e familiares durante as internações são exemplos dessas variáveis (Crepaldi, Schmidt, Noal, Bolze, & Gabarra, 2020).

O processo de luto acompanha perda de reforçadores importantes ao sujeito (de-Farias, et al., 2021), expondo-o a contingências aversivas que contribuem para a apresentação de fugas e esquivas. Consequentemente, a não exposição às contingências, devido à fuga e esquiva impossibilita ao sujeito entrar em contato com reforçadores relevantes para sua vida (do Nascimento, Nasser, Amorim & Porto, 2015). Dessa forma, diante do cenário da terminalidade, o psicólogo pode criar condições que previnam o luto complicado, por meio da escuta não punitiva e da validação dos sentimentos verbalizados. Nessa perspectiva, criar um contexto comunicacional efetivo se faz importante, visto que os pacientes ou acompanhantes podem esquivar de falar sobre o assunto (Torres, 2010), e assim, impossibilitar a identificação de estímulos sob os quais tal comportamento referente ao luto complicado é função.

A intervenção envolve ensinar a pessoa a viver sem o vínculo perdido, identificando novos reforçadores (de-Farias, et al., 2021). Portanto, o encaminhamento à psicoterapia analítico-comportamental para acompanhamento do luto pode ser considerada uma conduta favorável e adequada (do Nascimento, et al., 2015). Em contexto hospitalar, intervenções que promovam um contexto comunicacional, juntamente de condições que previnam o luto complicado por meio da escuta não punitiva e validação dos sentimentos dentro do ambiente de saúde, também são necessárias. Um exemplo dessas intervenções, observadas em contexto da pandemia de COVID-19, é o incentivo das famílias à realização de rituais religiosos de forma virtual ou da comunicação entre os pacientes também de forma remota (Crepaldi, et al., 2020).

A partir dos três objetivos específicos propostos, o presente estudo buscou apresentar algumas variáveis referentes à atuação do analista do comportamento em Cuidados Paliativos, considerando as contingências do contexto, se distanciando da transposição intuitiva da área clínica. Dessa forma, caracterizar relações entre a evolução cultural das noções de doença e saúde; identificar variáveis envolvidas na análise funcional de um serviço que possui o objetivo de promover saúde, como o de Cuidados Paliativos; e identificar possíveis demandas envolvidas torna-se relevante. Essa caracterização aumenta a clareza a respeito de determinantes do comportamento do paciente e da equipe e contribui, assim, para direcionar o comportamento do psicólogo em seu campo de atuação.

O trabalho de Cuidados Paliativos e a evolução das práticas de humanização são considerados uma conquista por priorizar a qualidade de vida dos envolvidos a partir de uma perspectiva holística do ser humano. No entanto, ainda enfrentam-se limitações em relação ao acesso do serviço. Mais de 5 mil hospitais estão ativos no Brasil e apenas 10% possuem uma equipe de Cuidados Paliativos (Academia Nacional de Cuidados Paliativos, 2018). Produzir conhecimento que busque trazer maior sistematização e reflexão a respeito da prática dos profissionais envolvidos, como o psicólogo, pode contribuir para a viabilização do serviço e, além disso, aumentar a valorização do profissional dentro do contexto de saúde. A sistematização cria condições para avaliação das intervenções e, consequentemente, para divulgação dos resultados de intervenções eficazes, demonstrando a importância do profissional no contexto.

Os pressupostos de que o comportamento é definido como interação (atividade do organismo e ambiente); a multideterminação do comportamento; o modelo de seleção por consequências, relacionados a uma visão monista do fenômeno, possibilitam explicações não circulares a partir da identificação de determinantes comportamentais, o que viabiliza intervenções mais eficazes, retirando o foco de elementos intrínsecos ao sujeito e passando para elementos do ambiente passíveis de manipulação (Skinner, 1953/2003, 1981/2007). Tais pressupostos direcionaram as reflexões descritas neste estudo, porém faz-se necessário a produção de conhecimento que fundamente empiricamente intervenções no contexto de Cuidados Paliativos ou que contribua para a caracterização do comportamento dos envolvidos no serviço (usuários do sistema de saúde e equipe multidisciplinar), ultrapassando reflexões teóricas.

 

Conclusão

A partir da revisão assistemática foi possível (1) identificar componentes de uma análise sobre as contingências históricas que podem interferir na discriminação de saúde e doença relacionadas à evolução do conceito de saúde, (2) caracterização do processo de análise funcional em Cuidados Paliativos, envolvendo variáveis de estímulo e resposta e (3) descrição de possíveis demandas para intervenções analítico-comportamentais em Cuidados Paliativos, e considerações a respeito das intervenções neste contexto. Tal caracterização possibilita coletar dados em Cuidados Paliativos de forma mais completa e contextualizada.

 

Referências Bibliográficas

Academia Nacional de Cuidados Paliativos (2018). Panorama dos Cuidados Paliativos no Brasil. Recuperado em 17 de setembro, 2020, de https://paliativo.org.br/wp-content/uploads/2018/10/Panorama-dos-Cuidados-Paliativos-no-Brasil-2018.pdf        [ Links ]

Afonso, S. B. C., & Mitre, R. M. D. A. (2013). Notícias difíceis: sentidos atribuídos por familiares de crianças com fibrose cística. Ciência & Saúde Coletiva, 18, 2605-2613. https://doi.org/10.1590/S1413-81232013000900015        [ Links ]

Ahrens, T., Yancey, V., & Kollef, M. (2003). Improving family communications at the end of life: implications for length of stay in the intensive care unit and resource use. (Journal Club Feature). American Journal of Critical Care, 12(4), 317-324. https://doi.org/10.4037/ajcc2003.12.4.317        [ Links ]

Almeida, R. A. D., & Malagris, L. E. N. (2011). A prática da psicologia da saúde. Revista da SBPH, 14(2), 183-202. Recuperado em 17 de setembro, 2020, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582011000200012        [ Links ]

Amaral, V. L. A. R. (1999). Novos desafios na formação do psicólogo na área da saúde. Em R. R. Kerbauy (Org.), Comportamento e saúde: explorando alternativas (pp.3-9). Santo André: ARBytes.         [ Links ]

Arantes, A. C. (2016). A morte é um dia que vale a pena viver. Leya. Rio de Janeiro: Casa da Palavra.         [ Links ]

Assumpção, J. B., & Vieira, T. R. (2018). O princípio bioético da autonomia na concretização do direito constitucional à saúde: uma perspectiva a partir do princípio da dignidade da pessoa humana. Revista Ciência & Saberes-UniFacema, 4(1), 1043-1052. Recuperado em 14 de abril de 2022. de http://www.facema.edu.br/ojs/index.php/ReOnFacema/article/view/347        [ Links ]

Banaco, R. A., Nico, Y. C., & Kovac, R. (2013). A relação de casal frente aos novos padrões sociais. In C. Zeglio, I. Finotelli Jr, & O. M. Rodrigues Jr (Orgs.), Relações Conjugais: Discutindo alternativas para melhor qualidade de vida (pp. 17-26). São Paulo: Zagodoni.         [ Links ]

Baremblitt, G. (2001) (Org.). Manual de orientação do agente multiplicador. Belo Horizonte: PNHAH Regional Centro Oeste.         [ Links ]

Botomé, S. P. (1980). Objetivos comportamentais no ensino: a contribuição da Análise Experimental do Comportamento. Tese de doutorado apresentada ao Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. São Paulo: Universidade de São Paulo. Não publicado. Recuperado em 28 de março de 2021, de https://obmbrasil.files.wordpress.com/2013/10/objetivos-comportamentais-no-ensino-a-contribuic3a7c3a3o-da-anc3a1lise-experimetnal-do-comportamento.pdf        [ Links ]

Cabral, H. L. T. B., Muniz, M. S. F., & Carvalho, V. B. C. (2015). Distanásia: Lesão à dignidade à beira do leito. CONINTER, 4, 71-83. Recuperado em 17 de setembro, 2020, de http://www.aninter.com.br/Anais%20Coninter%204/GT%2018/06.%20DISTANASIA %20E%20LESAO%20A%20DIGNIDADE%20A%20BEIRA%20DO%20LEITO.pdf        [ Links ]

Cherpak, G. L., Hirschfeld, H. P., dos Santos, L. G., Arbex, M. C. F. B. (2019). Guia de Comunicação de Más Notícias. São Paulo: Atheneu.         [ Links ]

Conselho Regional de Psicologia - 8ª Edição. (2016). Psicologia Hospitalar: Considerações sobre assistência, ensino, pesquisa e gestão. Tempo de Diálogo e CRP - 08. Recuperado em 28 de março, 2021, de https://crppr.org.br/wp-content/uploads/2019/05/AF_CRP_Caderno_Hospitalar_pdf.pdf        [ Links ]

Coriolano-Marinus, M. W. D. L., Queiroga, B. A. M. D., Ruiz-Moreno, L., & Lima, L. S. D. (2014). Comunicação nas práticas em saúde: revisão integrativa da literatura. Saúde e Sociedade, 23, 1356-1369. https://doi.org/10.1590/S0104-12902014000400019        [ Links ]

Crepaldi, M. A., Schmidt, B., Noal, D. D. S., Bolze, S. D. A., & Gabarra, L. M. (2020). Terminalidade, morte e luto na pandemia de COVID-19: demandas psicológicas emergentes e implicações práticas. Estudos de Psicologia (Campinas), 37. https://doi.org/10.1590/1518-8345.4519.3361        [ Links ]

de-Farias, A. K. C. R., Fonseca, F. N., Nery, L. B., Valcacer-Coelho, A. E., Coelho, C., Pedroso, R., Fonseca, S. A., Andrade, M., Silva, B. A., Gomes, K. C., Almeida, L. E., Ormond, H., Figueiredo, V., & Sperandio, V. A. (2021). Luto: Uma homenagem a João Claudio Todorov. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 23, 1-16. https://doi.org/10.31505/rbtcc.v23i1.1687        [ Links ]

De Marco, M. A., Vessoni, A. L., Capelo, A., & Dias, C. C. (2010). Laboratório de comunicação: ampliando as habilidades do estudante de medicina para a prática da entrevista. Interface-Comunicação, Saúde, Educação, 14, 217-227. https://doi.org/10.1590/S1414-32832010000100018        [ Links ]

do Nascimento, D. C., Nasser, G. M., de Amissis Amorim, C. A., & Porto, T. H. (2015). Luto: uma perspectiva da terapia analíticocomportamental. Psicologia Argumento, 33(83). http://doi.org/10.7213/psicol.argum.33.083.AO01        [ Links ]

Dohns, M. & Gusso, G. (2021). Comunicação clínica: Aperfeiçoando os encontros em saúde. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Fallowfield, L. J., Jenkins, V.A., Beveridge, H. A. (2002). Truth may hurt but deceit hurts more: communication in palliative care. Palliat Med. 16(4), 297-303. http://doi.org/10.1191/0269216302pm575oa        [ Links ]

Freitas, D. N., Melo, T. E. A., & Pacheco, K. H. (2018). Psicologia e Cuidados Paliativos: um olhar a tríade família, paciente e equipe de saúde. Caderno de Graduação-Ciências Biológicas e da Saúde-UNIT-ALAGOAS, 5(1), 33. Recuperado em 17 de setembro, 2020, de https://periodicos.set.edu.br/fitsbiosaude/article/view/5518/3079        [ Links ]

Gorayeb, R. (2001) A Prática da Psicologia Hospitalar. In Marinho, M.L., Caballo, V.E. (org) Psicologia Clínica e da Saúde (pp. 263-278), Londrina: UEL.         [ Links ]

Gorayeb, R., & Guerrelhas, F. (2003). Sistematização da prática psicológica em ambientes médicos. Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 5(1), 11-19. https://doi.org/10.31505/rbtcc.v5i1.87        [ Links ]

Kerbauy, R. R. (1999). Comportamento e saúde: explorando alternativas. Santo André: ARBytes.         [ Links ]

Kubo, O. M., & Botomé, S. P. (2001). Formação e atuação do psicólogo para o tratamento em saúde e em organizações de atendimento à saúde. Interação em Psicologia, 5(1). http://dx.doi.org/10.5380/psi.v5i1.3319        [ Links ]

Lemus-Riscanevo, P., Carreño-Moreno, S., & Arias-Rojas, M. (2019). Conspiracy of silence in palliative care: A concept analysis. Indian journal of palliative care, 25(1), 24. http://doi.org/10.4103/IJPC.IJPC_183_18        [ Links ]

Lino, C. A., Augusto, K. L. L. O., de Oliveira, R. A. S., Feitosa, L. B. & Caprara, A. (2011). Uso do protocolo Spikes no ensino de habilidades em transmissão de más notícias. Revista Brasileira de Educação Médica, 35(1), 52-57. https://doi.org/10.1590/S0100-55022011000100008        [ Links ]

Maguire, P. (1985). Barriers to psychological care of the dying. Br Med J (Clin Res Ed), 291(6510), 1711-1713. https://doi.org/10.1136/bmj.291.6510.1711        [ Links ]

McHugh, S., & Vallis, M. (1986). Illness behaviour: Operationalization of the biopsychosocial model. In Springer US, Illness Behavior: a multisciplinary model. (pp. 1-31). Boston, MA, Springer US.         [ Links ]

Melo, A. C. D., Valero, F. F., & Menezes, M. (2013). A intervenção psicológica em Cuidados Paliativos. Psicologia, Saúde & Doenças, 14(3), 452-469. Recuperado em 17 de setembro, 2020, de http://www.scielo.mec.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1645-00862013000300007        [ Links ]

Oliveira, B. R. G., Collet, N., & Viera, C. S. (2006). A humanização na assistência à saúde. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 14(2), 277-284. https://doi.org/10.1590/S0104-11692006000200019        [ Links ]

Pernambuco, A. C. A., Miragaia, M. C. R., & Pontes, T. E. (2019) Ética em Cuidados Paliativos. In: A. F. T. Góis & A. C. A. (Eds). Pernambuco. Guia de Comunicação de Más Notícias, Rio de Janeiro: Atheneu.         [ Links ]

Santos, C. E. D., Campos, L. S., Barros, N., Serafim, J. A., Klug, D., & Cruz, R. P. (2019). Palliative care in Brasil: present and future. Revista da Associação Médica Brasileira, 65(6), 796-800. http://dx.doi.org/10.1590/1806-9282.65.6.796        [ Links ]

Skinner, B. F. (1953/2003). Ciência e comportamento humano. Todorov, J. C. & Azzi, R. (tradução). São Paulo: Martins Fontes.         [ Links ]

Skinner, B. F. (1981/2007). Seleção por conseqüências. Cançado, C. R. X., Soares, P. G., & Cirino, S. (tradução). Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva, 9(1), 129-137. Recuperado em 18 de setembro de 2020, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1517-55452007000100010        [ Links ]

Starling, R. (2001). Análise funcional da enfermidade: um quadro conceitual analítico-comportamental para orientar a intervenção psicológica em contextos médicos. Em H. Guilhardi (Org.), Sobre comportamento e cognição: Volume 8. Expondo a variabilidade. (pp. 262-296). Santo André: Arbytes.         [ Links ]

Torres, W. C. (2003). A Bioética e a Psicologia da Saúde: Reflexões sobre Questões de Vida e Morte. Psicologia: Reflexão e Crítica, 16(3), 475-482. Recuperado em 17 de setembro de 2020, de https://www.scielo.br/pdf/prc/v16n3/v16n3a06.pdf        [ Links ]

Torres, N. (2010). Luto: a dor que se perde com o tempo (... ou não se perde?). MR Garcia, PR Abreu, EN Cillo, PB Faleiros, & P. Piazzon (Orgs.), Sobre Comportamento e Cognição: Terapia Comportamental e Cognitiva, 27, (pp. 385-393).         [ Links ]

VandeKieft, G. (2001). Breaking bad news. American family physician, 64(12), 1975-1978. Recuperado em 17 de setembro, 2020, de https://www.aafp.org/afp/2001/1215/p1975.pdf        [ Links ]

Victorino, A. B., Nisenbaum, E. B., Gibello, J., Bastos, M. Z. N., & Andreoli, P. B. A. (2007). Como comunicar más notícias: revisão bibliográfica. Revista da SBPH, 10(1), 53-63. Recuperado em 17 de setembro, 2020, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582007000100005&lng=pt        [ Links ]

Volles, C. C., Bussoletto, G. M., & Rodacoski, G. (2012). A conspiração do silêncio no ambiente hospitalar: quando o não falar faz barulho. Revista da SBPH, 15(1), 212-231. Recuperado em 17 de setembro, 2020, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1516-08582012000100012        [ Links ]

World Health Organization (2002). Palliative Definition. Recuperado em 7 de setembro, 2020, de http://www.who.int/cancer/palliative/definition/en/        [ Links ]

World Health Organization (n.d.). Palliative Care, Fact sheet. Recuperado em 7 de setembro, 2020, de http://www.who.int/news-room/fact-sheets/detail/palliative-care        [ Links ]

Wright, A. A., Zhang, B., Ray, A., Mack, J. W., Trice, E., Balboni, T., Mitchell, S. L., Jackson, V. A., Block, S. D., Maciejewski, P. K., Prigerson, H. G. (2008). Associations between end-of-life discussions, patient mental health, medical care near death, and caregiver bereavement adjustment. JAMA, (14), 1665-73. http://doi.org/10.1001/jama.300.14.1665        [ Links ]

 

 

Bianca dos Reis - Psicóloga clínica, Mestranda em Psicologia (UFPR) e Pós-graduanda em Desenvolvimento de Habilidades Terapêuticas para Terapia Analítico-Comportamental (Instituto Continuum/UNIFIL).
Josiane de Fátima Farias Knaut - Psicóloga clínica, Especialista em Psicologia Clínica (UFPR), Mestre em Psicologia (UFPR), Doutoranda em Psicologia (UFPR). Professora e coordenadora do Curso de Pós Graduação Desenvolvimento de Habilidades Terapêuticas para Terapia Analítico-Comportamental (Instituto Continuum/UNIFIL).

Creative Commons License