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Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.11 no.2 São Paulo dez. 2009

 

ARTIGO ORIGINAL

 

Estudo qualitativo sobre a opinião de atletas juvenis de tênis de campo sobre a sua preparação psicológica para a competição

 

A qualitative study on the views of young tennis players from the tennis on the psychological preparation for competition

 

Estudio cualitativo sobre las opiniones de los jóvenes jugadores de tenis en el ámbito de la preparación psicológica para la competencia

 

 

Daniel Souza Corrêa de MoraesI; Jorge Dorfman KnijnikII

I Universidade Presbiteriana Mackenzie
II School of Education in the University of Western Sydney – Austrália

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

A psicologia do esporte tem sido cada vez mais ressaltada como fundamental no desempenho dos esportistas. No tênis de campo, essa importância aumenta por causa das dificuldades inerentes a esse esporte, principalmente aquelas relacionadas às questões emocionais. Assim, este trabalho teve como objetivo verificar a importância do técnico no preparo mental de tenistas na categoria juvenil. Justifica-se o tema em razão da relevância do suporte psicológico e das dificuldades intrínsecas aos jovens em transição para a fase profissional. O técnico, como agente norteador, tem muito a contribuir nesse sentido. Foram realizadas entrevistas estruturadas com 10 jogadores juvenis, as quais foram analisadas por meio do discurso do sujeito coletivo. Constatou-se que o técnico é de suma importância para o preparo do juvenil no tênis e que a parte mental é decisiva, segundo os relatos dos jogadores; no entanto, pouco se tem feito para uma melhor preparação psicológica dos tenistas.

Palavras-chave: Psicologia do esporte, Tênis, Competição, Técnico, Jogadores juvenis.


ABSTRACT

The sport psychology has been emphasized more and more as fundamental for athlete’s performance. In Tennis this importance is increased due to the inherent difficulties to this sport, mainly those related to the emotional issues. Although this work had as objective to verify the importance of the coach in mental preparation of young tennis players’ category. It is because of the topic relevance of psychological support and the difficulties intrinsic to youth in transition to the professional stage and the coach. The guide has much to contribute in this direction. It was carry out interviews structured with 10 young players and were analyzed through Collective Subject Speech. According to reports players, verify that coach is highly important in training young tennis player and that mental aspect is decisive, however little has been done to improve tennis players’ psychological preparation.

Keywords: Sport psychology, Tennis, Competition, Coach, Young players.


RESUMEN

La psicología del deporte ha sido cada vez más hincapié en lo fundamental en El desempeño de los atletas. En tenis de essa cantidad aumenta debido a las dificultades inherentes a este deporte, especialmente con respecto a cuestiones emocionales. Por lo tanto, este estudio tuvo por objeto verificar la importância del técnico en la preparación mental de los jugadores de tenis en la categoría juvenil. El tema se justifica por la pertinencia de apoyo psicológico y las dificultades intrínsecas a los jóvenes en la transición a la etapa profesional. El técnico, como un guía, tiene mucho que aportar en esta dirección. Así pues, entrevistas estructuradas se llevaron a cabo con 10 jóvenes jugadores, que fueron analizadas por El discurso del Sujeto Colectivo. Se encontró que el técnico es muy importante para la preparación de los jóvenes en las canchas de tenis y que la parte mental es fundamental, de acuerdo a los informes de los jugadores, sin embargo, poco se ha hecho para mejorar la preparación psicológica de los jugadores de tenis.

Palabras clave: Psicologia deportiva, Tenis, Competência, Técnico, Jogadores juvenis.


 

 

Introdução

A importância da psicologia no esporte é cada vez mais notória. Grandes campeões, nas diversas modalidades, vêm ressaltando o quanto manter-se focado durante todo o jogo é fundamental para a vitória. O tênis de campo, além de ser um esporte individual, não permite a comunicação entre o técnico e seu atleta durante as partidas. Dessa forma, o tenista está só com seus pensamentos dentro da quadra – especialmente hoje que ocorrem "batalhas" de mais de três horas de jogo –, o que exige uma grande força mental por parte dos atletas para superar o adversário, o desgaste físico e o psicológico. Portanto, um bom preparo mental – que, segundo Souza e Scalon (2004), é a tentativa de influenciar os pensamentos e as representações mentais dos atletas objetivando a melhoria de sua performance – se torna fundamental para que se consiga ultrapassar esses obstáculos.

Nesse contexto, é primordial o papel do técnico para fazer o atleta acreditar na importância do trabalho mental e iniciá-lo desde as categorias de base. Em esportes individuais como o tênis, jogadores e técnicos, sobretudo quando o nível da competição é maior, passam muitas horas diárias em contato, o que configura naturalmente uma grande troca e grandes possibilidades para o técnico influenciar seu atleta. Portanto, considera-se importante verificar qual a relevância do técnico e como ele trabalha a parte mental dos tenistas, sob o ponto de vista dos atletas juvenis, jogadores entre 16 e 18 anos. Infelizmente no Brasil, nessa fase de transição para o profissional, o que se verifica hoje é que o treino psicológico é pouco ou nada realizado com esses tenistas em formação, muitas vezes pela falta de domínio do assunto por parte dos técnicos. Dessa forma, e considerando que na atualidade o tênis de campo é um dos esportes que mais atraem praticantes e espectadores, patrocínios e mídia, se os responsáveis pela modalidade no país quiserem fazer avançar solidamente as posições dos brasileiros nas competições internacionais, ganhando destaque para além de um grande jogador (como foi o Guga), é necessário que tanto os dirigentes quanto os técnicos e atletas entendam que o treino psicológico deve fazer parte da rotina de treinamentos de um atleta vencedor, assim como já fazem os treinos físicos, os técnicos e os táticos. Nesses últimos quesitos, aliás, em âmbito mundial, os atletas atualmente se assemelham muito. Assim, cada vez mais se admite que, no contexto da alta competição no meio tenístico, a parte psicológica pode ser decisiva.

Segundo Becker Júnior (2000), a psicologia aplicada ao exercício e ao esporte investiga as causas e os efeitos das ocorrências psíquicas que apresenta o ser humano na prática (antes, durante e após) do exercício ou do esporte, sejam este de cunho educativo, recreativo, competitivo ou reabilitador.

De acordo com Becker Júnior e Samulski (1998), a evolução da preparação psicológica mostra que existe uma série de possibilidades, em termos de estratégias e técnicas, cuja finalidade é preparar o ser humano para enfrentar uma enorme pressão e render o máximo do seu potencial psicofísico na hora da competição.

Segundo Gallwey (1996), os problemas que mais preocupam os atletas não são os que dizem respeito ao modo correto de executar os movimentos, a maioria dos atletas tampouco costuma se queixar de limitações físicas. A queixa mais comum dos esportistas é que eles não conseguem realizar, durante as competições, aquilo que realmente sabem e fazem nos treinos.

No confronto direto entre atletas de alto nível, ou atletas habilidosos, que apresentam níveis de desempenho equivalentes, há fatores de natureza psicológica que podem influenciar o desempenho deles, como percepção do esforço, diferentes estratégias cognitivas, níveis de motivação, entre outros. Esses fatores, e não apenas a capacidade e os conhecimentos específicos, podem, muitas vezes, ser os responsáveis pela pequena diferença de desempenho e, portanto, pela classificação final dos atletas na competição (WARD; WILLIANS, 2003 apud LIZUKA et al., 2005).

Para Santos e Shigunov (2000), as situações emocionais pelas quais passa um atleta ante a competição promovem uma repercussão cognitiva e somática, que, em dado momento, pode ser suscetível a variações e muitas vezes de forma instantânea.

Segundo Weinberg e Gould (2001), o treinamento de habilidades psicológicas (THP) é tão importante quanto treinamento físico. O THP refere-se à prática sistemática e consistente de habilidades mentais ou psicológicas.

De acordo com Samulski (2006), muitos atletas não sabem explicar a razão do fracasso ou até mesmo de um sucesso inesperado em alguns jogos. Quando estão atuando em seu melhor nível, experimentam uma série de sensações e emoções, as quais, por estarem muito envolvidos nos jogos, não conseguem perceber claramente. Não existem medos de errar, dúvidas ou distrações eventuais. Provavelmente, esse atleta esta em nível alto de concentração.

Algumas variáveis psicológicas importantes são: ansiedade (que surge ante situações de perigo), ativação (referente à intensidade de motivação), autoconfiança, burnout, concentração e atenção, estresse, motivação e tomada de decisão.

No tênis, a precisão técnica é de suma importância, qualquer detalhe culmina com um erro, e, segundo Román e Savoia (2003), a ansiedade e a tensão prejudicam a precisão, pois as vias neurais se ocupam com impulsos de alerta do sistema de luta ou de fuga, decrescendo ou inibindo os impulsos precisos, para completar a destreza e o movimento coordenado. Ainda segundo esses autores, as reações psicológicas são: decréscimo da flexibilidade mental, sentimento de confusão, aumento do número de pensamentos negativos, menor capacidade de centrar-se na atuação, atenção inadequada a vivências internas, esquecimento de detalhes, recorrência a antigos hábitos inadequados, tendência a precipitar-se na atuação e decréscimo da capacidade de tomar decisões.

Para Gallwey (1996), uma boa maneira de iniciar um treinamento é, primeiramente, encorajar o atleta a ver e sentir o que está fazendo, antes de passar-lhe dicas sobre técnica ou tática, o que aumentará a sua consciência da realidade.

Para Singh (2005), é importante o treinador elogiar e encorajar os atletas quando fizerem coisas certas e mais frequentemente os mais novos. No entanto, o elogio deve ser sincero, pois a falta de sinceridade pode fazer o treinador perder credibilidade. O treinador deve desenvolver expectativas realistas e adequadas à idade e ao nível de capacidade, e recompensar mais o esforço e o desempenho do que os resultados. O técnico deve concentrar- se ao ensinar as habilidades psicológicas, modificar as regras para melhorar a ação e a participação dos atletas, estimular a criatividade e incentivá-los a solucionar os problemas. É fundamental que o técnico sorria sempre, interaja com os atletas e escute-os.

De acordo com Knijnik, Greguol e Silenos (2001), os técnicos deveriam se preocupar menos com técnicas e táticas, e mais com o desenvolvimento de práticas que tornem os atletas cada vez mais responsáveis por suas atitudes. Esses autores questionam os mecanismos utilizados por técnicos para treinar os atletas e as orientações, às vezes excessivas, sobre o modo de execução das habilidades, como se houvesse apenas uma maneira correta de realizá-las.

A preparação psicológica de atletas jovens, segundo Samulski (2006), deve incluir o desenvolvimento da autoconfiança, a aquisição e o treinamento de habilidades mentais, como concentração, imaginação, automotivação, autoverbalização, autorresponsabilidade, controle emocional e capacidade de relaxamento e recuperação. Recomenda-se que um psicólogo do esporte, capacitado em técnicas psicológicas de intervenção, desenvolva essas habilidades nos atletas a fim de que eles possam dominá-las e aplicá-las em situações competitivas. Os treinadores também deveriam aprender essas técnicas para reforçar as capacidades mentais de seus atletas e apoiá-los emocionalmente em situações difíceis e estressantes, como série de derrotas, problemas com lesões, conflitos familiares etc.

Segundo Becker Júnior e Samulski (1998), a aplicação das técnicas de preparação psicológica para os atletas não será necessariamente feita somente pelo psicólogo. Na verdade, ele não estará em contato com os atletas com a mesma frequência que o treinador. Dessa forma, o psicólogo do esporte deverá fazer, na área de preparação psicológica, uma intervenção indireta sobre o atleta, capacitando o treinador para essa tarefa.

Para Lubbers (2004), os técnicos devem ser capazes de criar um ambiente favorável para a prática diária de preparação psicológica. Os jogadores precisam entender a ligação entre um treino de qualidade e picos de performance. Conforme esse autor, a cultura de excelência deve ser transmitida ao atleta. É imprescindível que os treinos de qualidade sejam recompensados, e habilidades mentais, trabalhadas dentro e fora da quadra.

De acordo com Crespo (2005a), os atletas devem ter uma equipe multidisciplinar de trabalho, com técnico, médico, preparador físico, nutricionista, fisioterapeuta e psicólogo, em todas as categorias. No entanto, como ressalta esse autor, existem dificuldades financeiras para tal. O treinador deve ser o coordenador dessa equipe de trabalho e estar ao lado do atleta na maior parte do tempo. O psicólogo, por sua vez, deve atuar por meio do treinador, ou seja, treinar o técnico para que este saiba como passar as rotinas psicológicas aos atletas (CRESPO 2005a).

O tênis brasileiro tem se destacado no cenário internacional desde a década de 1960, com participação e sucesso em grandes eventos, como Taça Davis, Olimpíadas, Masters e torneios de Grand Slam (GALLEGOS et al., 2002). Há vários exemplos de atletas de sucesso internacional: Maria Ester Bueno (tricampeã de Winbledon); Thomaz Koch e Edson Mandarino em 1966; Luiz Mattar, Jaime Oncins, Cássio Mota e Fernando Meligeni em 1992 (semifinalistas na Taça Davis); e Gustavo Kuerten (tricampeão de Roland Garros e campeão do Master em 2000) que encerrou o ano de 2000 como número um do ranking da Associação dos Tenistas Profissionais. Esse painel de sucesso tem estimulado o surgimento de muitos tenistas que pretendem alcançar o topo do nível profissional. No entanto, muitos esbarram em enormes dificuldades. Apesar do significativo empenho quanto à técnica e à tática, têm deixado a desejar em outros fatores, como alimentação, organização de trabalho, fisioterapia e, principalmente, no que se refere à parte psicológica, considerada o aspecto mais crítico no desenvolvimento dos tenistas.

No entanto, apesar desse destaque internacional, o Brasil carece de mais tenistas e da popularização do esporte. Para Brustolin (1995), um dos fatores para essa carência está no ensino do tênis no Brasil, que sempre foi um assunto polêmico, pois cada professor ensina como quer ou sabe, e os nossos alunos, principalmente as crianças, são obrigados a aceitar os ensinamentos, pois não existe um padrão no ensino que possa ser tomado como referencial. Portanto, para o autor um grande passo para melhorarmos o tênis no Brasil reside em identificar quem são nossos professores, o que ensinam e como ensinam, e, com base nesses dados, traçar um plano de ação para melhorar o ensino desse esporte no país.

O tênis é uma "guerra" de espaço e tempo, pois deve-se conseguir jogar a bola em um espaço vazio sem que o adversário tenha tempo de chegar e devolver. Portanto, deve-se jogar na maior velocidade possível, para, assim, ganhar espaço e manter o adversário na defensiva. O tênis exige um bom nível de percepção visual (controle visual da bola) e uma boa antecipação (SAMULSKI, 2006). A base para uma boa percepção e antecipação são as imagens perfeitas dos movimentos e técnicas (padrões mentais das técnicas), as quais são armazenadas na memória motora.

Para Samulski (2006), a transição da etapa do tênis juvenil para o profissional, que deve acontecer entre os 16 e 19 anos, é uma fase conflituosa que envolve inúmeros fatores de mudanças pessoais, familiares, sociais e profissionais. A decisão da profissionalização do jovem tenista às vezes é uma decisão de vida, que implica a dedicação total para treinamentos diários de até oito horas, viagens constantes, participação em competições, convívio com um técnico e com os mesmos adversários (circuito internacional), fases de sucessos e derrotas, lesões, fases de recuperação e distância da família e de amigos.

O tênis exige uma grande demanda de resistência cardiorrespiratória (coração e pulmões), afinal há jogos que duram muitas horas. No entanto, a grande diferença está na capacidade mental, na vontade, na perseverança e na insistência que os jogadores possuem (FARIA, 2002). Em algumas partidas, os jogadores quase sucumbem ao cansaço, mas não se entregam e vão até o fim. Geralmente, os confrontos da Taça Davis são um exemplo dessa capacidade. Nos jogos que demoram horas, a capacidade mental é de grande importância e deve ser bem trabalhada pelos jogadores.

As fases para um programa de treinamento psicológico no tênis podem ser as seguintes: 1. avaliação e análise das habilidades psicológicas exigidas pelo esporte e inerentes aos jogador, e estabelecimento de objetivos; 2. treinamento de habilidades psicológicas, preparação geral (controle emocional, ativação, concentração, autoconfiança e visualização) e específica (uso durante o treinamento), trabalho teórico-prático dentro e fora da quadra; 3. projeto, prática de um plano pré-competitivo (alimentação, descanso, autoverbalização positiva, planejamento da partida e aquecimento) e focalização (aquecimento psicológico); 4. desenvolvimento de um plano para manter o foco durante a competição; 5. avaliação do programa no período pós-competição (CRESPO, 2005a).

Samulski (2006) fornece algumas dicas de rotinas mentais a serem realizadas:

1) Antes do jogo (mental pre-play)

  • Aquecimento mental (mental warming-up): visualizar golpes, imagens de sucesso.

  • Desenvolvimento de um plano mental estratégico de jogo (mental game plan) para analisar os pontos fracos e fortes do adversário.

  • 2) Durante o jogo (mental play).

  • Observação e análise do comportamento técnico e tático do adversário.

    Antecipação dos próprios golpes e das jogadas, e também do adversário.

  • Iniciativa e tomada de decisões de forma rápida e eficiente.

  • Concentração antes do saque.
  • 3)Após o jogo (mental replay)

  • Avaliação mental do jogo em geral: comportamentos em certas situações, estratégia de jogo, controle emocional etc.

  • Avaliação dos pontos fortes e fracos do adversário.
  • Avaliação dos próprios pontos fortes e fracos.
  • Conclusões importantes para o treinamento de habilidades mentais e para o próximo jogo, a fim de otimizar o pensamento estratégico.
  • Todas essas rotinas podem ser adquiridas e aperfeiçoadas por meio de um treinamento mental sistematizado.

    Para Abes (1999), a concentração é uma das habilidades mais importantes para que o tenista seja bem-sucedido. Portanto, é crucial que ela seja treinada regularmente dentro e fora da quadra. Dentro da quadra, o tenista pode tentar quicar várias vezes a bola na borda da raquete ou jogar com a máxima atenção na bolinha, tentando visualizar a marca dela. Fora da quadra, pode fixar o pensamento na bolinha e pensar nela durante cinco minutos ou focalizar a atenção na respiração, entre outros exercícios que podem ser feitos para melhorar a concentração.

    Atitude vencedora e comportamento positivo fazem parte de um grande jogador de tênis. Não basta apenas pensar e imaginar, é preciso ter atitude dentro da quadra, entrar com determinação, andar sempre com a cabeça erguida, encarar firmemente os olhos do adversário e os olhos dos árbitros, vibrar bastante com boas jogadas, relaxar na hora do saque e sempre demonstrar equilíbrio emocional.

    Desenvolver rotinas consistentes é fundamental na preparação mental, já que os rituais podem contribuir para melhorar a concentração mental, manter um ótimo nível de ativação e desenvolver um bom nível de equilíbrio emocional nos tenistas (CRESPO, 2005b).

    O treinamento mental deve ser bem trabalhado desde o início da carreira para que seja assimilado pelos atletas, o que no futuro facilitará esse tipo de treinamento na sequência da vida como atleta. De Rose Júnior (1998) critica a falta de conhecimento sobre a necessidade de um preparo psicológico do atleta, assim como o pouco espaço destinado às pesquisas científicas da área. Portanto, a importância do treinamento mental, os poucos estudos nessa área, a importância do tênis de campo no cenário esportivo mundial ea influência decisiva dos técnicos na vida dos tenistas nos levaram a estudar o papel do técnico no preparo mental dos jovens tenistas.

     

    Método

    Para estudar a importância da psicologia no tênis e verificar qual é o papel dos técnicos na formação da categoria juvenil (de 16 a 18 anos), o instrumento eleito para satisfazer os objetivos da pesquisa foi de ordem qualitativa, não excluindo dados de forma quantitativa. Segundo Lefévre e Lefévre (2003), quando uma pesquisa é qualitativa, isso não quer dizer que ela não possa ser também quantitativa. Afinal, em pesquisa social, quantidade e qualidade são conceitos complementares e não, como muitos acreditam, mutua mente exclusivos.

    Para Lefévre e Lefévre (2003), para saber o que uma pessoa ou um conjunto de pessoas pensam, é preciso perguntar para ensejar que elas expressem um pensamento ou um discurso. E uma maneira de atingir esse discurso é deixar que as pessoas se expressem mais ou menos livremente. Quando juntamos os discursos individuais gerados, podemos formar o pensamento da coletividade.

    Dessa forma, para verificar as representações que um grupo de jogadores de tênis constrói a respeito da importância do técnico no preparo mental, foram realizadas entrevistas estruturadas com 10 jogadores da categoria juvenil (de 16 a 18 anos) que possuem pontos na Federação Paulista de Tênis.

    As perguntas versaram sobre o início da vida como atleta, o que os atletas esperam do técnico, como eles se sentem durante uma partida, como lidam com derrotas e vitórias, se existe algum ritual dentro e fora da quadra, como é o relacionamento com o técnico, como é feita a preparação psicológica e qual a importância do técnico para o atleta.

    Após as transcrições das entrevistas, submetemos o material à análise com base na metodologia criada e sugerida por Lefèvre e Lefèvre (2003), intitulada discurso do sujeito coletivo (DSC), indicado exatamente, segundo seus autores, para a tabulação de pesquisas com entrevistas estruturadas. Por meio dessa metodologia, inicialmente se anotam as expressões-chave de cada uma das entrevistas; posteriormente, destacam-se as idéias centrais dessas expressões, ideias estas que sintetizam o teor daquele discurso; essas ideias centrais foram agrupadas de acordo com suas semelhanças, formando assim categorias, por meio das quais os discursos foram efetivados. Os resultados formam uma série de discursos-síntese – que são os discursos do sujeito coletivo – que representam discursos individuais semelhantes agrupados, ou seja, as próprias representações sociais daquele grupo ou subgrupo sobre os temas discutidos, mantendo a ideia de grupos de pessoas diante de um tema. A seguir, apresentam-se fragmentos desses discursos coletivos e uma série de inferências e comentários sobre as ideias.

    Todos os procedimentos adotados nesta pesquisa foram realizados com o máximo rigor requerido para pesquisa de opinião com seres humanos.

    Todos os atletas, sem exceção, receberam explicações, antes do início de sua participação, sobre todos os procedimentos a serem adotados. Tiveram total liberdade para se submeterem ou não a qualquer atividade e instrumento de pesquisa, devendo manifestar sua concordância por escrito, por meio da assinatura de um termo de consentimento livre e esclarecido para a pesquisa. Nenhum procedimento aqui proposto teve caráter invasivo. E todos serão esclarecidos a qualquer momento se isso for necessário.

    Estabeleceram-se um contrato e um compromisso ético com os participantes das entrevistas, e foi assegurado ao participante que todas as informações obtidas com as entrevistas seriam de uso exclusivo da pesquisa e que seus dados pessoais não seriam informados a ninguém sem o seu expresso consentimento, assim como teriam acesso a esses dados caso os solicitassem.

     

    Resultados e discussão

    Início da vida como tenista

    Sobre como os jogadores iniciaram a vida no esporte, constatou-se uma divisão. Alguns começaram em clubes: "Eu comecei a fazer algumas aulas no clube da minha cidade, aí fizeram um esquema de treinamento e desde então eu tenho treinado todos os dias e venho jogando os torneios" (DSC 1). Outros foram influenciados pela família:

    Eu comecei mais pela minha irmã e pelo meu pai, que falou: "Quando você for mais velha vai poder jogar, pois toda família joga tênis, no trabalho você vai poder jogar, então pelo menos faz um pouco de aula para poder saber jogar". E também eu via meu irmão jogando e aí eu fui gostando até entrar nos campeonatos (DSC 2).

    A pergunta foi fundamentada na importância que a iniciação esportiva tem na vida dos atletas. Fatores positivos e negativos terão de ser gerenciados pelos técnicos, pois uma iniciação precoce pode gerar uma desmotivação na fase juvenil ou ainda atletas que iniciam no esporte por pressão familiar. Segundo Marques e Kuroda (2000), quando pensamos nos diversos fatores que influenciam a iniciação das crianças no esporte, faz-se necessário apreciarmos questões psicossociais relacionadas à iniciação esportiva e à especialização precoce, visando a uma melhor compreensão desse fenômeno.

    Percalços durante a vida como atleta

    De acordo com a maioria dos entrevistados, as derrotas representaram grandes problemas no início dos treinamentos, até que melhores resultados fossem alcançados:

    Comecei como principiante e perdia muito. Com o tempo, fui ganhando um jogo aqui outro ali, pois, no início, você perde muito e é bem difícil você cria uma expectativa, e você só perde, e perdi bastante. Aí você começa a ganhar, aí eu fui subindo, e sempre que sobe de classe é bem difícil ganhar. Então, acho que, como todos, tive muita dificuldade no início com muitas derrotas, era bem difícil ganhar um jogo, mas aí a gente vai superando as dificuldades para realizar o sonho que é ser um tenista profissional (DSC 3).

    Superar as dificuldades, em períodos de derrotas, tem sido um grande problema para os tenistas juvenis (VASCONCELLOS et al., 2005). O atleta, além de boa técnica e determinação, deve estar bem preparado física e psicologicamente para enfrentar esses períodos e deve ter em mente que o começo será bem difícil, pois está concorrendo pelo mesmo espaço com jogadores mais experientes, o que torna a pressão psicológica ainda maior.

    A transição de carreira esportiva é o resultado de inúmeros fatores e mais frequentemente uma combinação de fatores individuais e influências sociais (BRANDÃO et al., 2000). Além disso, é sabido que existe uma diversidade de fatores que podem influenciar, tanto positiva quanto negativamente, nessa fase.

    O que os atletas esperam dos técnicos

    Quanto à pergunta sobre a expectativa que tinham em relação aos técnicos, os atletas, em sua maioria, responderam que esperam ensinamentos gerais como técnica e tática:

    Eu espero que ele me ensine coisas, como movimentos, o golpe correto, esta parte técnica. A parte tática também é importante, ensinar como deve agir contra cada adversário, os planos de jogo. Então, eu espero que ele me prepare mais tecnicamente e taticamente, que ajude a desenvolver meus golpes, que me ensine todos os golpes e todos os fundamentos para que eu possa fazer na quadra. Porque ele me ensinando os fundamentos, o resto só depende de mim. Enfim, que ele me ajude o máximo possível, que ele consiga passar tudo que ele possa para mim (DSC 4).

    Nessa pergunta, poucos falaram da questão mental. Na verdade, quando citam que esperam que o técnico lhes ajude de maneira geral, que os prepare para os jogos e que lhes ajudem a se tornar profissionais, não relatam a questão psicológica, a qual fica subentendida. Verificou-se que não há nenhuma informação sobre o papel da psicologia nesse processo de transição para o profissional.

    De acordo com Becker Júnior e Samulski (1998), a evolução da preparação psicológica mostra que existe uma série de possibilidades, em termos de estratégias e técnicas, cujo propósito é preparar o ser humano para enfrentar uma enorme pressão e render o máximo do seu potencial psicofísico na hora da competição, como a imaginação dos movimentos, golpes e jogadas, que é uma das formas mais eficientes do treinamento mental, ou a técnica de relaxamento por meio da respiração.

    Sonoo, Hoshino e Vieira (2008) em estudo realizado verificaram que os atletas tendem a preferir os técnicos que fornecem um feedback positivo e que têm um estilo mais democrático do que autocrático.

    Como os atletas se sentem durante a partida

    Na pergunta sobre como se sentem durante a partida, houve uma maior variedade de respostas, a que mais apareceu foi a que eles tentam se manter focados no jogo:

    Durante a partida, eu tento ficar tranquilo, pensar no plano de jogo, o que eu tenho que fazer, eu vou percebendo as fraquezas do adversário e vai pensando como você pode atacar essas fraquezas. Então, procuro me concentrar o máximo e ficar o menos nervoso possível e eu tento pensar que eu estou treinando, que não é um jogo, procuro relaxar e tento jogar o melhor que eu posso, e tento dar o máximo de mim e pôr a cabeça no lugar. Durante a maioria das partidas, me sinto calmo, lógico que tem jogo que você dá uma travada, e, quando acontece de travar, eu procuro pôr a bola na quadra e tentar se vê se solta; se eu ver que eu tô atrofiado, não vou bater mais fraco, vou tentando melhorar para ver se entra e eu volto para o jogo (DSC 5).

    Alguns sentem pressão principalmente em momentos decisivos; para outros, é um momento de estresse. O fato de procurarem o técnico durante a partida aparece com destaque:

    Sempre dou uma olhada para fora, para o técnico, isso me traz coragem e tranquilidade, mas eu procuro não ir até ele para receber instrução, prefiro ficar quieto na quadra pensando no próximo ponto, procuro mais quando o jogo está complicado, mas eu gosto muito do técnico incentivando quando faço ponto, aí eu vibro e vejo ele me apoiando (DSC 6).

    Na maioria dos casos, os atletas relatam que tentam se manter focados no jogo e analisar o jogo do adversário. No entanto, o que mais aparece nas respostas é o verbo "tentar". É evidente que o esporte não é uma coisa lógica, em que cada atleta consegue fazer exatamente o que quer. Entretanto, observa-se na fala dos atletas muita insegurança, pois, muitas vezes, não sabem o que fazer para se manterem concentrados, não conhecem nenhuma técnica, nada é falado ou treinado nesse quesito. É claro que, apesar das técnicas, o atleta pode não obter o resultado esperado. Embora aprendam e saibam golpes técnicos, como bater "direitas paralelas" (e às vezes erram) – mas pelo menos sabem como fazer –, é fundamental que os atletas sejam treinados para manter a concentração. Em geral, esse tipo de orientação é muito vaga: "Eu tento me manter focado". O tenista deve ter, sim, durante as partidas, determinadas atitudes que o levem a ter essa concentração, esse foco que o motive para a vitória.

    Segundo Samulski (2006), no tênis o jogador é seu próprio treinador durante o jogo. Ele precisa criar uma atitude positiva para o jogo, motivar-se durante a partida, concentrar- se mentalmente em situações decisivas, controlar-se emocionalmente em situações de pressão e perceber e analisar o jogo taticamente.

    Os rituais

    Sobre os rituais durante as partidas, quase todos mencionam o fato de irem até a toalha com diversos fins: para se acalmar ou para esfriar o jogo.

    Nas trocas de lado, eu coloco a toalha na cabeça e tento me concentrar, e procuro sempre a toalha quando estou um pouco nervoso, e, em momentos decisivos, eu vou até ela, enxugo o rosto para diminuir um pouco a tensão e me concentrar para jogar meu melhor tênis. Quando eu estou perdendo, eu também vou para tentar desconcentrar meu adversário e dar uma esfriada no jogo. (DSC 7)

    Como o tempo real de jogo é aproximadamente um terço do tempo total de jogo, durante esse tempo morto o jogador pode concentrar-se, planejar o que pretende fazere raciocinar de maneira positiva ou negativa. Nesse instante, podem aparecer a ansiedade, as distrações e preocupações que podem produzir erros mentais e consequentemente erros técnicos na execução dos gestos (WEINBERG; GOULD, 2001).

    A preparação psicológica

    Na questão sobre como é feita a preparação psicológica nos treinos e para as partidas, a maioria dos atletas declarou não haver nenhum trabalho nesse sentido:

    Não tenho nenhum trabalho psicológico. Eu mesmo tento ficar tranquilo, mas nunca fui a um psicólogo do esporte nem nada, não sei nenhuma técnica assim para ficar tranquilo e meu técnico não fala nada, ele sempre fala para eu me manter tranquilo. Eu considero importante o trabalho psicológico, mas eu mesmo não tenho feito nada. As academias pelas quais eu passei nunca tiveram nada neste sentido, e hoje não é diferente. Quando eu treino e fico nervoso, eu paro no meio do treino e espero 5 minutos, mas, durante os treinamentos, não tenho nada específico. Meu técnico às vezes conversa, mas não tem nenhuma técnica. Então é isso, não faço nada. Antes eu alongo e depois do jogo também, e durante os treinos eu faço a mesma coisa (DSC 8).

    No entanto, aparece, em duas repostas, uma referência à ajuda do técnico no preparo psicológico. Em uma resposta, o participante mencionou a preparação realizada por psicólogo.

    Verificou-se que, em suma, os atletas treinam apenas a parte técnica e tática, muitas vezes com os drills; alguns ainda citam a parte física e nada específico sobre a psicologia. Quase todos nunca passaram por um psicólogo, apesar de, nas falas dos atletas, a maioria considerar o fator psicológico fundamental e decisivo em uma partida de tênis. Quando incitados sobre o papel da psicologia no treinamento, os atletas mencionaram ser importante, no entanto não esperam dos técnicos um trabalho psicológico. É um contrassenso, explicado muitas vezes pela falta de conhecimento, na área da psicologia, por parte das pessoas ligadas ao tênis.

    De acordo com Carta e Marcher (2004), no final dos anos 1990 e início dos anos 2000, os excelentes resultados obtidos por Gustavo Kuerten, com seu talento, e Fernando Meligeni, com sua simpatia, alavancaram o surgimento de muitos tenistas no Brasil, no entanto muitos vêm esbarrando em enormes dificuldades. Apesar de se empenharem bastante na parte técnica e tática, esses novos atletas deixam a desejar em outros fatores, principalmente no que se refere à parte psicológica, considerada o aspecto mais crítico no desenvolvimento dos tenistas. As respostas obtidas por esta pesquisa confirmam que os atletas do tênis não recebem o acompanhamento psicológico necessário.

    A importância do técnico no preparo psicológico

    Na pergunta sobre a importância do técnico no preparo psicológico, dois aspectos foram os mais ressaltados nas respostas. Um é que os técnicos são muito importantes:

    Ele é muito importante na parte tática, na parte técnica, e ele tem muita visão tática como eu devo enfrentar cada jogador, e também porque a gente não percebe o que está fazendo de errado e no treino ele corrige a gente, fazendo a gente melhorar. Ele me explica tudo, ele tem mais experiência, me dá apoio. E ele faz o máximo que pode no treino, e eu também faço o máximo que posso. E se eu me dou bem e consigo virar um profissional, ele que seria meu técnico, então, eu tento contribuir com muita vontade tudo que ele me passa nos jogos, e ele tem toda importância na minha carreira. Então, ele, para mim, é praticamente tudo, ele que treina você sempre, sabe o que você esta errando, te dá dica para você melhorar, e ele é muito importante (DSC 9).

    A outra resposta é sobre como o técnico é importante na questão mental:

    Na parte mental, ele é muito importante, porque o técnico está sempre te dando um apoio, e nos jogos te dando força, dizendo o que você tem que fazer. Quando você tem alguém para te dar algumas dicas, falando o que você tem que fazer, é mais fácil. Ele sempre manda pensar positivo, sempre pensar em ganhar o ponto e jogar sempre concentrado, não olhar para fora. Ele me ajuda bastante, ele é fundamental para mim, ele me passa muita confiança, sempre me diz para acreditar sempre, que posso virar um jogo e que posso ganhar de caras melhores que eu se eu tiver com a cabeça boa. Também percebe quando eu tenho mais jogo para ganhar e acabo perdendo para minha cabeça. Aí ele me ajuda muito com bastante conversa, sempre me pede muita calma, mesmo porque ele já jogou federação e já lidou com esse pessoal que faz joguinho psicológico. Por exemplo, jogadores que pedem para ver a marca toda hora, e isso acaba tirando você de jogo, porque toda hora indo ver a marca da bola acaba enchendo. Mesmo quem tem um preparo psicológico muito bom acaba saindo do jogo. E quando vê que você está para baixo no jogo, ele tenta te motivar, então ele é fundamental. Nos treinos, quando joga a raquete no chão, tem que sair e ficar dez minutos fora, beber uma água e depois volta, ele faz algumas jogadas de pressão, faz treino que quando você tá sacando e faz 40 você tem que fechar, coisa de jogo, para na hora do jogo, a gente não sentir a pressão. Então, ele dá bastante ênfase à parte psicológica (DSC 11).

    No DSC 10, os atletas relatam como o técnico é importante de maneira geral, e, quando perguntados sobre o psicológico no DSC11, a maioria diz ser de extrema importância, mesmo eles não tendo nenhum trabalho específico, como constatado na questão anterior. Os atletas consideram as conversas durante os treinamentos e antes das partidas muito importantes para que eles se sintam mais confiantes.

    Na pergunta sobre a importância do técnico, obtivemos respostas muitas vezes emocionadas, muitos atletas disseram o quanto seus técnicos são importantes para a vida e não só para a carreira como tenista. Algumas falas do tipo "Ele é tudo para mim" mostram como o técnico tem um significado enorme, o que aumenta a sua responsabilidade. O tênis, por ser um esporte individual, cria um vínculo maior entre os técnicos e os atletas. Em geral, o atleta viaja acompanhado apenas de seu técnico. Nesse caso, o técnico amplia seu papel e torna-se pai, amigo, psicólogo e tudo o mais de que o atleta precisar.

    O treinador é aquele que dirige o atleta, oferecendo orientações técnicas, táticas e motivacionais. Muitos atletas olímpicos atribuem a conquista de medalhas de ouro e outros prêmios à influência recebida por seus treinadores, indicando como os responsáveis pelo alcance do sucesso nos mais altos níveis de exigência (LOBO; MORAES; NASCIMENTO, 2005).

    Derrotas e vitórias

    Na questão referente a como os atletas e os técnicos se relacionam depois de vitórias e derrotas, todos afirmaram que sempre existe uma conversa depois das partidas:

    Depende de como é que foi, mas ele geralmente é bem compreensível, a gente conversa sobre o que eu fiz de errado, e o que eu tinha que ter feito e como eu agi durante a partida, os porquês de eu não conseguir fazer o que foi treinado, se eu estava muito nervoso, se eu tive chances de ganhar o jogo e tudo que eu errei durante o jogo a gente vai treinar depois. Ele fala meus erros e é sempre quase a mesma coisa, ele fala para eu aprimorar mais as coisas que eu estou errando e para sempre eu dar o melhor de mim. Ele tenta me pôr pra cima, treinando mais, corrigindo mais, para da próxima vez não errar mais. Então, é isso não é muita cobrança, ele fala onde eu errei, onde eu acertei as coisas boas e ruins, e conversamos muito sobre o jogo em quais lances eu poderia ter feito algo diferente do que eu fiz, em alguns lances que eu me precipitei. Ele geralmente traz os números do jogo e comenta sobre os pontos decisivos que eu fiz de errado e de certo. Mas é assim, sempre depois dos jogos e dos treinos eu alongo, é importante, fico uns dez minutos pensando e depois tem muita conversa com o técnico, e ele está sempre me incentivando tanto na vitória quanto na derrota (DSC 12).

    Nas respostas, houve relatos sobre o que ambos aprendem com a derrota:

    Cada derrota é um sofrimento, é difícil saber perder. Mas, se eu perco e jogo bem, eu saio bem da quadra feliz com meu jogo. Agora, quando eu perco e jogo mal, eu fico muito irritado, só vou me acalmar no dia seguinte. Chego segunda-feira no treino muito bravo porque eu sabia o que eu poderia ter feito e deixei meu adversário jogar. E com a derrota o técnico tem muito que falar, e com derrota você sempre aprende muito mais, principalmente quando o adversário joga melhor. Quando eu perco, a gente conversa bastante, porque eu acho que com a derrota você aprende mais que com a vitória (DSC 13).

    Segundo os depoimentos, os erros comentados e todo o conteúdo da conversa vão ser trabalhados durante a semana nos treinamentos. Um ponto positivo foi a consciência da maioria dos atletas com relação à questão de aprender com a derrota, e mesmo na vitória há algo que pode melhorar. Muitos preferem jogar bem a ganhar e não se importam tanto, quando perdem jogando bem, dizendo que se aprende mais na derrota que na vitória.

    Segundo Silva (2006), os comentários, após as partidas, dos jovens jogadores são invariavelmente "ganhei" ou "perdi", no entanto, quando questionados mais a fundo, começam a descobrir muitas coisas a mais do que o placar puro e simples. Informações mais específicas mostram o quanto melhoraram e o que ainda devem aprender. Esse será um diferencial dentro do tênis, quem conseguir assimilar essas informações tanto na vitória quanto na derrota terá um futuro mais promissor do que quem se entrega a uma autoanálise primária do jogo.

    Samulski (2002) apresenta uma classificação de objetivos: de resultados (relacionados a vitórias), de rendimento (relacionado ao rendimento real durante uma partida) e de processo (relacionado à maneira como o tenista executa uma habilidade). Esse autor enfatiza que os técnicos e jogadores devem se centrar mais nos objetivos de rendimento e de processo, pois podem ser controlados pelos atletas.

     

    Conclusões

    A psicologia é fundamental no esporte, essa frase foi bastante usada ao longo deste trabalho. No entanto, infelizmente essa ideia ainda não permeia o cotidiano dos atletas de tênis aqui entrevistados. A grande maioria dos atletas ressalta ser de extrema importância a psicologia no tênis e atribui derrotas e vitórias às questões mentais. Apesar disso, o tempo destinado ao preparo psicológico, como constatado na pesquisa, é mínimo e na maioria dos casos inexistente.

    O tênis é um esporte que requer muito mais do que boa técnica, exige uma grande força mental. Trata-se de um esporte em que grande parte do tempo de jogo é gasto com "outras coisas" que não disputando o ponto. Estima-se que, em uma partida de tênis, a duração do jogo gire em torno de 20%-25% do tempo total, ou seja, os tenistas passam a maior parte no chamado "tempo morto", que consiste em trocas de lado, na cadeira à espera do próximo game, antes dos saques, e ainda na própria tática em atrasar o jogo para tentar desconcentrar o adversário. Observou-se que no treinamento há uma preocupação maior com o jogo propriamente dito, deixando, muitas vezes, a parte mental de lado.

    Verificou-se que os próprios atletas percebem que, para serem completos, devem dar atenção especial à parte psicológica em seu treinamento e durante os jogos. O técnico poderia preencher essa lacuna, apesar de ainda não fazê-lo. Esse preparo requer um grande esforço por parte de todos os envolvidos na preparação do atleta, e principalmente dele mesmo. Nesse contexto, ganha importância o trabalho multidisciplinar que é a junção das ciências do esporte (psicologia, nutrição, fisioterapia, medicina etc.) com a supervisão do técnico. Isso utopicamente falando, pois, na situação real do tênis juvenil, são poucos atletas que têm essa condição, cabendo ao técnico o acúmulo de funções. Dessa forma, o técnico deve ser detentor de diversos conhecimentos gerais em cada área. Isso ressalta a sua importância, pois, além de ensinar golpes e táticas, ele será muitas vezes o pai, o amigo, o psicólogo, enfim será a pessoa em que o atleta deposita muita confiança.

    Notou-se também a influência da família na vida do atleta de tênis. A expectativa gerada pelos pais sobre uma possível carreira de sucesso do filho. No decorrer da pesquisa, observaram-se pais que superestimavam o talento dos filhos, confrontando um planejamento estipulado, ou seja, mais um fator a ser gerenciado pelo técnico.

    As técnicas de preparo psicológico são inúmeras que contribuem para o desenvolvimento dos tenistas. De acordo com este estudo, tal preparação deve ter início o quanto antes, para que o atleta incorpore esse hábito, tendendo a evoluir no futuro. Notou-se que, na prática, o preparo ocorre de maneira superficial, sem embasamento teórico.

    Enfim, preparo mental mais fundamentado, aplicação prática, interesse de atletas e principalmente dos técnicos na questão psicológica, trabalho multidisciplinar e mais estudos nessa área são fatores que contribuirão substancialmente para a evolução do tênis no Brasil.

     

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    Endereço para correspondência

    Daniel Souza Corrêa de Moraes
    Rua Simão Velho, 368, ap. 72
    Freguesia do Ó – São Paulo – SP
    CEP 02731-090
    e-mail: dscmoraes@yahoo.com.br

    Tramitação
    Recebido em novembro de 2008
    Aceito em setembro de 2009

     

     

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