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Psicologia: teoria e prática

versão impressa ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.13 no.2 São Paulo ago. 2011

 

ARTIGO ORIGINAL

 

A discriminação condicional como método para ensinar crianças a ler em situação coletiva de sala de aula

 

Conditional discrimination as a method for teaching children to read in collective classroom situation

 

La ensenãnza de lectura en colectivo para ninõs en clases según el metodo de discriminación condicional

 

 

José Gonçalves Medeiros

Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis – SC – Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

Os objetivos deste estudo foram: 1. ensinar um repertório de leitura composto de palavras comumente utilizadas nas séries iniciais, mas relacionadas entre si; e 2. desenvolver e sistematizar um esquema de ensino em grupo com base num delineamento de sujeito único. Os participantes foram 24 crianças, de ambos os sexos, de uma escola da rede pública. O procedimento foi a discriminação condicional, usada para expandir gradualmente, ao longo de uma sequência de passos, o conjunto de pareamentos entre modelos e estímulos de comparação. As etapas de ensino foram realizadas coletivamente, contudo os testes foram aplicados individualmente. Dois grupos, um coletivo e um individual, foram formados pela dificuldade de aplicar critérios unificados de desempenho em toda a classe. As crianças de ambos os grupos leram as palavras de ensino, porém apenas as crianças do grupo coletivo leram as palavras de generalização.

Palavras-chave: análise do comportamento aplicada; discriminação condicional; ensino; leitura; equivalência em situação coletiva.


ABSTRACT

The project aimed: 1. to teach a reading repertoire composed of words commonly used in the initial series, but related to each other; and 2. to create and systematize a collective teaching system based on a single-subject system. The subjects were 24 children, of both sexes, from a public school. The procedure was the conditional discrimination, used to gradually increase their ability to pair models and comparison stimuli, through a sequence of teaching steps.The teaching was carried out collectively, but the tests were administered individually. Because of the difficulty in establishing unified performance criteria to the whole class two groups – one collective and the other individual – were formed. Children of both groups read the words that had been taught, but only the children of the collective group were able to read the generalization words.

Keywords: applied behavior analysis; conditional discrimination; teaching; reading; equivalence in collective situation.


RESUMEN

Los objetivos de este estudio han sido: 1.establecer un repertorio de lectura compuesto por palabras de uso común en las clases iniciales, pero relacionadas entre sí; y 2. desarrollar y sistematizar el plan de enseñanza en grupo basada en registro individualizado de ejecución. Los participantes fueron 24 niños, de ambos los sexos, de una escuela pública. El procedimiento fue la discriminación condicional, que sirve para ampliar gradualmente, en una secuencia de pasos, el conjunto de emparejamientos entre modelos con estímulos de comparación. Las actividades didácticas han sido realizadas en grupos, pero las verificaciones fueron administradas individualmente. Dos grupos, uno colectivo y otro individual, se formaron por la dificultad de utilización de normas unificadas de ejecución para toda la clase. Los niños de todos dos grupos fueran capaces de leyer las palabras de enseñanza, pero solamente los niños del grupo de lectura colectiva lograran leyer las palabras de generalización

Palabras clave: análisis del comportamiento aplicado; discriminación condicional; enseñanza; lectura; equivalencia en situación colectiva.


 

 

Introdução

Os alunos brasileiros não passaram do nível 1 de aprendizagem na avaliação do Programme for International Student Assessment (Pisa) de 2006. Na edição de 2009, o Brasil, com 401 pontos, ficou abaixo da média, mas livrou-se do desconforto das últimas posições e subiu para o 55o lugar. Resultados como esses são preocupantes, mesmo com a melhora verificada na avaliação de 2009, principalmente em relação à atividade de leitura em crianças e adolescentes.

Na escola onde o projeto que deu origem a este artigo foi realizado não era diferente. Os professores relatavam a "angústia" de não conseguirem ensinar e as dificuldades das crianças na aprendizagem do conteúdo básico das séries iniciais. Ao solicitar-lhes que indicassem aquelas com maiores dificuldades de aprendizagem, relataram-nos não saber como e nem quantas escolher, pois a grande maioria delas apresentava dificuldades. Foi possível perceber que, de fato, a expectativa deles era que trabalhássemos com todas as crianças da turma, mas não dispúnhamos, em 1996, período da realização do projeto, de estratégias de ensino em situação coletiva.

A proposição de Strommer, Mackay e Stoddard (1992) serviu-nos como ponto de partida. Nesse artigo, os autores examinam algumas características críticas para a delineação de um programa coletivo. Indicam alguns aspectos que devem ser considerados, como tipos de registro, de consequenciação e acompanhamento do desempenho do aprendiz. Os autores sugerem também, quanto às formas de consequenciação, que se alterne ora individualmente, ora coletivamente a participação dos aprendizes.

A maior parte do conhecimento produzido sobre equivalência de estímulos com base na proposição paradigmática de Sidman (1971) era relativa à aquisição de leitura e escrita obtida em ambientes experimentais ou quase experimentais, portanto não diretamente aplicável em sala de aula. Estudos sobre interação entre sujeitos em ambientes coletivos experimentais ou quase experimentais com procedimentos de equivalência são ainda pouco frequentes. Um levantamento realizado por Mauad, Guedes e Azzi (2004) no Journal of Applied Behavior Analysis (Jaba), no período entre 1968 a 2002, sobre a produção de conhecimento em análise do comportamento e habilidades de leitura, mostra que grande parte dos estudos em equivalência de estímulos foi e tem sido realizada com delineamentos de sujeito único. Os resultados descritos pelas autoras mostram que ainda são escassos os estudos sobre o uso da equivalência em delineamento de grupos.

As condições de ensino em grupo comuns em sala envolvem variáveis geradas pela presença de outros organismos no papel de aprendizes, na situação de ensino. Essas variáveis, obviamente, não podem ser estudadas em procedimentos de ensino em situação individual. Em condições de grupo, o controle gerado pela presença de outro organismo pode criar relações de contingências independentes das estabelecidas pelo experimentador (WEINGARTNER; MECHNER, 1966). Nas situações de ensino em grupo, tais contingências também podem estar presentes. Para isso, é necessário descrever as variáveis presentes e indicar de que maneira elas se relacionam com o desempenho dos aprendizes. No estudo de Ribela, Reis e Gioia (2009), os autores instruíram um professor a aumentar o número de ocorrências de interações sociais entre alunos com desenvolvimento atípico e seus pares. Após a etapa de intervenção, foram retiradas todas as instruções fornecidas ao professor para verificar se os comportamentos direcionados à melhoria das interações sociais entre seus alunos se mantinham. Os resultados mostram que o procedimento foi eficaz para aumentar a quantidade e melhorar a qualidade das interações sociais entre os participantes do estudo. Os resultados obtidos por Ribela, Reis e Gioia (2009) mostram a interdependência entre o comportamento dos organismos (interações sociais entre o comportamento dos alunos e do professor, respectivamente).

Em um estudo realizado com grupos, Piccolo, Goyos e Porto (2004) fizeram interface entre aprendizagem de discriminações condicionais e a interação social que ocorre no ambiente experimental. Segundo os autores, essa área pode trazer implicações importantes nos programas de ensino para crianças baseados em discriminações condicionais, especificamente aqueles que são apresentados por meio de softwares educativos. Leal e Luz (2001) mostraram que um programa de ensino de produção textual em duplas foi mais eficiente do que a produção individual. Para isso, esses autores analisaram o desempenho de 21 crianças entre 8 e 13 anos de idade de uma escola pública do Nordeste do Brasil. Verificaram que os textos produzidos pelas duplas foram melhores que os textos individuais em composições do tipo assimétrico (fraco-médio) e simétrico (médio-médio), e não encontraram efeito marcante em duplas compostas por crianças de níveis iniciais (fraco-fraco). De acordo ainda com esses autores, a estratégia de colocar as crianças em interação leva-as a negociar informações e estratégias de elaboração textual.

A formação de classes de estímulos equivalentes constitui-se em pré-requisito fundamental para avaliar a extensão das classes emergentes de respostas e tem sido observada tanto em estudos individuais (SIDMAN, 1971; MELCHIORI; SOUZA; DE ROSE, 1992; MEDEIROS et al., 2007) quanto em estudos em situação coletiva (AMORIM et al., 1996; LEAL; LUZ, 2001; MACHADO, 2005, 2011; PICCOLO; GOYOS; PORTO, 2004). No trabalho de Amorim et al. (1996), foi investigada a emergência de classes de estímulos equivalentes por meio da utilização de material baseado em instrução programada individualizada, delineado para aplicação em grupo. Os autores verificaram a formação de classes equivalentes no desempenho de participantes que apresentaram testes positivos para as relações emergentes, cujas simetrias correspondentes podem levar grupos de participantes a formar classes de estímulos equivalentes.

Em dois outros estudos (MACDONALD; DIXON; LEBLANC, 1986; GOYOS et al., 2006), por meio de observação do modelo, foram obtidos resultados originais. Em Goyos et al. (2006), num experimento de discriminação condicional, os participantes foram instruídos a observar um demonstrador que selecionava os estímulos de comparação e recebia consequências diferenciais por suas escolhas. Após o ensino das relações BA e CA, foram introduzidos testes para verificar a emergência de simetria, transitividade e equivalência. Todos os participantes mostraram formação de classes equivalentes, e cinco deles, expansão de classes para os estímulos D e E. Os autores discutem se os resultados produzidos foram em função exclusiva do ensino por modelação ou uma combinação desses com efeitos sequenciais do ensino individual e direto da primeira relação condicional. Em MacDonald, Dixon e Leblanc (1986), investigou-se a aprendizagem observacional de tarefas de escolha de acordo com o modelo com quatro indivíduos adultos portadores de deficiência mental. Os participantes aprenderam diretamente a relação entre dois conjuntos de estímulos e, por modelação, a relação entre dois outros conjuntos de estímulos, e obtiveram quatro novas relações emergentes. Para os autores, a aprendizagem das relações por meio de modelo foi um aspecto importante, pois o fenômeno observado – equivalência de estímulos – foi obtido por meio de um procedimento até então original, a aprendizagem observacional.

Formação de classes de estímulos equivalentes foi observada em contexto coletivo de sala de aula. Dois relatos de aplicação do paradigma foram realizados por Machado (2005, 2011). No estudo de 2005, três experimentos foram realizados. No estudo 1, foram ensinadas as relações entre palavra ditada e palavra impressa (relação AC) e entre palavra impressa e composição de palavra com letras (relação CE). Dezesseis dos 17 participantes apresentaram as relações emergentes BC (figura-palavra impressa), CB (palavra impressa-figura) e CD (nomeação de palavras impressas). Dez dos participantes do estudo 1 participaram também do estudo 2, que foi proposto para avaliar se haveria relação entre a leitura de palavras novas e os comportamentos de construção de palavras. Os resultados mostram que, para apenas 1 dos 10 participantes, os comportamentos de construção de palavras e leitura de palavras novas ocorreram. O estudo 3 foi proposto, então, para verificar se reforçando as mesmas sílabas, nas mesmas posições em diferentes palavras, a leitura de palavras novas seria facilitada. O estudo 1 foi aplicado, porém com diferentes palavras para os mesmos participantes do estudo 2. Os resultados mostram que, para 6 dos 10 participantes, a leitura de palavras novas ocorreu, sugerindo que o controle por unidades menores pode ter se estabelecido em função da escolha das palavras de ensino e do reforço diferencial das sílabas que as compunham.

No estudo de 2011, selecionar cartões a partir da palavra falada foi escolhido como unidade de ensino. Foram também descritas as variáveis envolvidas em situações de ensino em grupo e suas relações com o desempenho dos participantes. A partir da observação em vídeo, os comportamentos dos participantes foram descritos e categorizados em situações que antecederam o compor com sílabas, suas topografias e respectivas consequências, tais como: selecionar cartões, compor palavras com sílabas, alterar ou conferir sua resposta tendo como modelo a resposta apresentada pelo colega; fazer tarefa pelo outro quando este responde incorretamente ou não responde; auxiliar colega, indicando a resposta correta ou a de completar tarefa iniciada pelo colega; produzir consequências para o responder do colega, dizendo que a resposta está incorreta, responder pelo outro correta ou incorretamente, indicando a resposta correta; solicitar opinião/avaliação (receber realimentação/avaliação oral do colega, não receber resposta, ter sua tarefa refeita por colega).

As referências que dão apoio teórico a este trabalho provêm da extensa bibliografia sobre equivalência de estímulos que têm sua origem nos estudos de Sidman (1971). O autor trabalhou com um garoto com necessidades especiais, incapaz de ler palavras impressas oralmente (CD) ou com compreensão, porém podia escolher palavras ditadas diante de figuras (AB) e também nomear figuras (BD). Após ter sido ensinado a escolher palavras escritas diante de palavras ditadas (AC), ele tornou-se capaz de realizar leitura com compreensão (relacionando palavras impressas com figuras [BC]) e leitura oral (nomeando em voz alta as palavras impressas – CD). Em outras palavras, Sidman (1971) trabalhou com as relações BD (nomeação de figuras) e AB (seleção de figura diante do nome falado da figura) já presentes no repertório do garoto e com o ensino da relação AC (escolha da palavra escrita ante a palavra ditada). Em seguida, Sidman (1971) observou que com a utilização desse procedimento, o jovem participante de seu estudo, sem ser diretamente ensinado, passou a ser capaz de emparelhar outras palavras escritas aos seus modelos ditados (AC), selecionar figuras quando palavras escritas eram apresentadas como modelo (CB), selecionar palavras escritas quando figuras eram modelos (BC) e passou a ser capaz de nomear as palavras escritas (CD) (leitura).

A análise experimental dos processos de equivalência, tem sido referência para projetos de ensino de leitura e escrita, tendo como objeto de estudo palavras simples (MELCHIORI; SOUZA; DE ROSE, 1992; SIDMAN, 1971, 1994; SOUZA; DE ROSE, 1997), números (CARMO, 1997; DRACHENBERG, 1973; MONTEIRO; MEDEIROS, 2002) e frases (ALBUQUERQUE, 2007; HABER, 2008; MEDEIROS et al., 2007; MELO; SEREJO, 2009; SAMPAIO, 2007). Sua contribuição tem sido inequívoca na compreensão de variáveis presentes no processo de aquisição e manutenção dos processos de leitura.

Os estudos realizados na área são, em geral, de duas naturezas: aqueles que lidaram com delineamento de sujeito único e aqueles que lidaram com delineamento de sujeitos em grupo no ensino de classes de respostas. Ambos, em seus próprios domínios, têm contribuído para a sistematização do conhecimento da área. Ambas as contribuições serão uma referência importante, principalmente para os estudos em situação coletiva, por se apresentarem em número menor, como relatam Mauad, Guedes e Azzi (2004). Tanto os estudos com sujeitos únicos quanto aqueles com sujeitos em grupos mostram que ainda temos muito a percorrer na extensão dos conhecimentos produzidos para aplicação em situações coletivas como a de sala de aula. Assim, foram propostos como objetivos deste estudo: 1. ensinar um repertório de leitura, composto de palavras comumente utilizadas nas séries iniciais, mas relacionadas entre si; e 2. desenvolver e sistematizar um delineamento de ensino em grupo com base num delineamento de sujeito único.

 

Método

Participantes1

Participaram 22 alunos, do período vespertino, sendo 9 do sexo masculino e 13 do sexo feminino, com idade entre 7 e 14 anos. A turma era composta por crianças bastante diferenciadas, tanto do ponto de vista de idade (entre 7 a 14 anos), de histórico escolar (14 com repetência), como de condições psico-orgânicas (mudez, epilepsia). A maioria dos pais tinha baixo poder aquisitivo e residia nas proximidades da escola, localizada na periferia de uma cidade do Sul do Brasil.

Local

O procedimento de ensino em situação coletiva foi realizado dentro de uma sala de aula que continha carteiras, cadeiras, lousa e armários. Na parede do fundo, foi pintada, na cor branca, uma tela para projeção. No horário do procedimento, as janelas foram cobertas por papel bege para facilitar a observação dos estímulos projetados na tela pintada na parede.

O procedimento de ensino em situação individual foi realizado numa sala menor, de 1,5 m de largura por 3,0 m de comprimento, que continha um armário que a dividia em dois ambientes, permitindo a aplicação do procedimento em duas crianças, ao mesmo tempo. Em cada ambiente havia uma carteira e duas cadeiras.

Equipamento e material

Os estímulos-modelo de palavras (minúsculas, tipo arial, bold, tamanho 72 do Word) foram gravados em transparência. Os estímulos de comparação, também palavras, foram impressos em papel-cartão, inseridos em crachás de plástico, conforme observado na Figura 1, e impressos também em tiras de papel-cartão, com três estímulos cada, conforme observado na Figura 2.

 

 

 

Apresentaram-se palavras dissílabas ou trissílabas compostas por sílabas simples, como nomes de objetos, organismos ou eventos corriqueiros e seus respectivos correspondentes pictóricos, que presumivelmente faziam parte do universo vocabular das crianças, como apresentado na Quadro 1.

 

 

As figuras (medindo aproximadamente 8 cm de altura por 8 cm de largura) correspondentes às palavras foram coladas em pedaços de papel-cartão. Letras de 1 x 1 cm e impressas em papel-cartão amarelo, de 2 cm de largura por 2 cm de comprimento, foram utilizadas na atividade de montagem das palavras que estavam sendo ensinadas durante as etapas de ensino.

Pastas de capa dura com plásticos transparentes foram utilizadas nos pré e pós-testes do procedimento de ensino em situação coletiva. As palavras foram impressas em folhas de papel-ofício e inseridas nos plásticos transparentes das pastas.

Procedimento

Um delineamento de sujeito único em que a criança escolhe a palavra nova por exclusão da palavra conhecida foi utilizado para ensinar leitura tanto no procedimento em situação coletiva quanto individual. Cada passo do programa foi composto pelas etapas de pré-teste, ensino e pós-teste. as tentativas iniciais de cada passo de ensino constituíram um pré-teste que permitia avaliar a leitura de três palavras de ensino (AC) a serem introduzidas no passo, de três palavras ensinadas na sessão imediatamente anterior (Aca – retenção), de três palavras de generalização (A'C'), além da nomeação das três figuras relacionadas às palavras ensinadas (AB). Nas tentativas finais do passo, no pós-teste, testaram- se as mesmas palavras apresentadas no pré-teste (relações AC e A'C'), exceto as da sessão imediatamente anterior (ACa) e as figuras (AB), como pode ser observado no diagrama do Quadro 2.

 

 

As palavras, na função de estímulos-modelo, foram apresentadas por meio de um retroprojetor sobre a tela pintada na parede da sala. A tarefa dos alunos, após observarem os estímulos projetados, era escolher, entre três palavras, como estímulos de comparação, uma delas (a correta) que estava inserida dentro de crachás, dispostos sobre a mesa de cada criança. Após ter escolhido um dos crachás, a criança deveria levantar a mão com o crachá escolhido (estímulo de comparação correto) e permanecer assim com a mão levantada para que o bolsista pudesse fazer o registro.

Função do pesquisador, da professora e dos bolsistas

O pesquisador e a professora da turma alternavam-se na função de apresentadores orais das configurações de estímulos. Os bolsistas aplicavam os pré e pós-testes, o procedimento de consequenciação e registro das respostas (apenas as incorretas; assim, as caselas em branco da folha de registro indicavam que a resposta fora correta).

Ensino das três primeiras palavras em situação coletiva

Na sessão inicial de ensino, todas as crianças da sala participaram do procedimento, pois não houve pré-seleção. Após entrarem na sala, dirigiam-se para suas carteiras; na sequência, quatro crianças por vez eram convidadas pelos bolsistas para dirigirem-se às cadeiras distanciadas das existentes na sala para realizarem o pré-teste. Após sentarem-se, o bolsista explicava à criança que iria pedir que lesse algumas palavras e dissesse o nome de algumas figuras. Informava também que não diria se suas respostas estavam certas ou erradas. Abria então a pasta de capa dura (como consta no item "Equipamento e material") e apontava para uma das três palavras impressa e perguntava: "O que está escrito aqui?". Para cada palavra apresentada, foi também apresentada a figura correspondente acompanhada da pergunta: "O que é isto?". O bolsista aguardava a resposta e, caso a resposta fosse incorreta, anotava na folha de registro; se a resposta fosse correta, o quadriculado ficava em branco sem a apresentação de nenhum tipo de consequenciação.

Terminado o pré-teste das três primeiras palavras e respectivas figuras com todas as crianças, dava-se início à sessão de ensino da primeira palavra. Nas seis primeiras tentativas, apenas uma palavra por vez foi apresentada às crianças. Projetada a palavra, o pesquisador ou a professora apontava para a tela, dizendo: "Esta palavra é..." (e dizia, em voz alta, o nome da palavra); em seguida perguntava: "Que palavra é esta? Agora digam todos juntos, em voz alta, o nome desta palavra". Após a verbalização, dizia: "Agora peguem a palavra (ou seja, o crachá com a palavra inserida dentro dele) sobre a carteira e levantem a palavra". O bolsista passava, então, carteira por carteira e, em frente a cada aluno que levantasse a palavra correta, elogiava com as expressões ótimo, muito bem, correto. As respostas incorretas foram então anotadas e as certas ficaram em branco.

Terminada a apresentação de seis tentativas com a primeira das três palavras, era apresentada, em seguida, a segunda palavra ao lado da primeira palavra já ensinada. Nessa situação, o pesquisador ou a professora dizia: "Qual palavra é..." (dizia, em voz alta, o nome da palavra nova) e perguntava: "Qual palavra é...?" (e dizia o nome da palavra nova sem apontá-la). "Agora digam todos juntos o nome da palavra. Agora peguem a palavra (nesse momento, havia dois crachás sobre a mesa e a criança deveria escolher aquele referente à palavra que estava sendo ensinada) sobre a carteira e levantem a palavra". O bolsista passava então carteira por carteira e, em frente a cada aluno que levantasse a palavra correta, elogiava-o e registrava se a resposta estivesse incorreta. Se o aluno levantasse a palavra incorreta, usava-se o procedimento de correção, dizendo: "Você tem certeza?". Após o bolsista ter passado por todas as carteiras, o pesquisador ou a professora solicitava, então, às crianças que lessem na transparência projetada na tela a outra palavra (a primeira palavra ensinada), e todo o procedimento de anotação e reforço repetia-se com essa palavra. O ensino da terceira palavra deu-se de maneira semelhante ao ensino da segunda palavra.

A cada duas tentativas consecutivas de ensino de uma palavra, uma tentativa de escrita ou montagem da palavra era realizada. O bolsista entregava para cada criança um envelope que continha as letras, separadas uma a uma, de uma das palavras que estava sendo ensinada e solicitava às crianças que escrevessem a palavra letra por letra, semelhante àquela que estava sendo ensinada, dizendo: "Agora vocês vão escrever com as letrinhas que estão no envelope a palavra..." (e dizia o nome da palavra). Após a criança ter escrito a palavra corretamente, aplicava-se o procedimento regular de reforço e solicitava-se à criança que lesse a palavra que acabara de escrever, dizendo: "Que palavra você escreveu?". O mesmo procedimento ocorria com as outras duas palavras. Se a criança não realizasse corretamente a escrita, o bolsista pedia para tentar outra vez: "Vamos tentar mais uma vez?". Caso não conseguisse montar a palavra na segunda tentativa, o bolsista sugeria: "Preste atenção na palavra" (o bolsista apontava a palavra impressa). "Agora tente montar a palavra". Após o ensino das três primeiras palavras, cada criança era convidada pelo bolsista para dirigir-se a uma das cadeiras distanciada das existentes na sala, de forma semelhante ao que está descrito no primeiro parágrafo do item "Ensino das três primeiras palavras em situação coletiva". Na etapa de pós-teste, eram avaliadas as três primeiras palavras ensinadas e três palavras de generalização.

 

Ensino de três novas palavras em situação coletiva

Na primeira sessão de ensino, todas as crianças participaram do procedimento. Na segunda sessão, para participar a criança deveria ter lido corretamente, no pré-teste, as três palavras ensinadas na primeira sessão. Aquelas que não conseguiam eram encaminhadas para o procedimento de ensino em situação individual fora de sala de aula. Se atingissem o critério (leitura correta, no pré-teste das palavras da sessão anterior e obtivessem 90% de leitura correta na etapa de ensino das palavras ensinadas na sessão), retornavam para o procedimento de ensino em situação coletiva. Com o desenrolar do estudo, a maioria das crianças não conseguiu retornar para a situação coletiva e realizou todo o procedimento na situação individual.

O ensino de três novas palavras ocorreu somente na sessão seguinte. A diferença no procedimento em relação ao ensino das três primeiras palavras refere-se a dois acréscimos: 1. no pré-teste, testaram-se também as três palavras ensinadas na sessão anterior; e 2. na etapa de ensino, após duas tentativas com uma das palavras que estava sendo ensinada, eram apresentadas à criança tiras em papel-cartão (ver Figura 2) com as palavras da exclusão anterior. Depois que uma das tiras era apresentada a cada criança, perguntava-se: "Qual palavra é..." (e dizia-se o nome da palavra conhecida sem apontá-la) e, em seguida, perguntava-se: "E esta, qual é?" (mostrava-se a segunda palavra) e "E esta?" (mostrava-se a terceira palavra); todo esse processo era acompanhado das consequências de reforço descritas anteriormente.

A cada dois passos de ensino, foram testadas as relações de equivalência. Nessa situação, a criança era convidada a sentar-se numa cadeira distanciada das demais. Na primeira parte do teste (relação BC), a figura funcionava como estímulo-modelo e os nomes de figuras como estímulos de comparação, sendo um deles o correto ou aquele que correspondia ao estímulo-modelo. A princípio, uma tala cobria os estímulos de comparação. O bolsista solicitava à criança que apontasse a figura colada no alto da página; depois de ela ter feito isso, o bolsista retirava a tala e pedia-lhe que apontasse a palavra que correspondesse ao estímulo-modelo: "Aponte o nome dessa figura". Assim que a criança apontava, o bolsista perguntava-lhe: "Que palavra é essa?". Então, anotava sua resposta (apenas se estivesse errada) na coluna apropriada e nenhuma consequência era fornecida ao desempenho da criança, não importando se a resposta estivesse correta ou incorreta.

Na segunda parte do teste (relação CB), o nome de uma das figuras (palavra impressa) funcionava como modelo e as figuras como estímulos de comparação, sendo um deles o correto. Com os estímulos de comparação cobertos por uma tala, o bolsista dizia: "Aponte a palavra. Que palavra é essa?". Assim que a criança apontava e verbalizava, o bolsista dizia: "Agora aponte o desenho correto", e nenhuma consequência era fornecida ao desempenho da criança, não importando se a resposta estivesse correta ou incorreta.

Também foram realizados dois testes extensivos (aplicados individualmente) que verificaram a leitura de todas as palavras de ensino e de generalização introduzidas até então. Realizou-se o teste 1 aproximadamente na metade do programa, e o teste 2 foi conduzido ao final do programa. O procedimento era semelhante ao procedimento dos pré e pós-testes descritos anteriormente.

Procedimento de ensino em situação individual

As crianças que não conseguiram retornar para o procedimento de ensino em situação coletiva passaram a fazer parte do procedimento de ensino em situação individual. As palavras foram apresentadas em pastas plásticas de capa dura, com as palavras impressas em folhas brancas inseridas em plásticos transparentes. Cada folha da pasta representava uma tentativa. Quando o estímulo-modelo era impresso, ele era colocado na parte superior, e os estímulos de comparação eram colocados na parte inferior da folha. Quando o estímulo-modelo era auditivo, apenas os estímulos de comparação eram impressos na parte inferior da folha.

A situação de uma sessão típica era o bolsista, sentado ao lado da criança, apresentar-lhe um estímulo-modelo (uma palavra ou uma figura), pedindo-lhe que tocasse o estímulo, com exceção do estímulo-modelo oral (que era apresentado verbalmente pelo bolsista). Depois do modelo, apresentava, abaixo deste, três estímulos de comparação (variando, a cada tentativa, suas posições e distribuição) e requisitava à criança que escolhesse qual estímulo estava relacionado ao modelo. Quando a criança escolhia corretamente o estímulo, o bolsista elogiava a resposta por meio de expressões verbais, tais como "muito bem", "é isso aí", "parabéns". Quando as escolhas eram incorretas, nenhuma consequência experimentalmente programada era apresentada à criança, ou seja, passava-se para a próxima tentativa sem nenhuma atenção aos erros cometidos. Nas tarefas auditivo-visuais, o modelo era ditado pelo bolsista e pedia-se à criança que escolhesse o estímulo de comparação (impresso) que correspondia ao modelo ditado. As respostas eram manualmente registradas numa folha de registro. A sessão tinha a duração de aproximadamente 30 minutos. Utilizou-se o critério de 90% de acertos das palavras da etapa de ensino para passar de uma fase a outra, mantendo-se os demais critérios inalterados, como acertar 100% no pré-teste em relação às palavras da linha de base anterior e ler corretamente, no pós-teste, todas as palavras de ensino apresentadas.

 

Resultados

O Gráfico 1 apresenta os índices percentuais de leitura correta no pré-teste da linha de base 1 (gráfico superior), nos testes de retenção 1 e 2 referentes às palavras treino (gráfico intermediário) e às palavras de generalização (gráfico inferior). A porcentagem de acertos na LB1 para as crianças dos dois grupos é proporcionalmente semelhante, variando entre 0

 

 

e 67%, exceto a criança 15 que obteve 100% de acerto. Na comparação entre a linha de base e os testes de retenção, pode-se verificar que as crianças que participaram do coletivo apresentaram um desempenho superior em relação às crianças que participaram do procedimento individual. Nos testes 1 e 2 de retenção das palavras-treino (colunas cinza e losangos brancos), todas as crianças do coletivo, exceto uma (criança 1), leram as palavras, com índice maior no teste 2. Das crianças do ensino em situação individual, apenas três no teste 1 (colunas vermelhas) e apenas duas no teste 2 (losangos brancos) leram as palavras-treino, com valores bem inferiores às crianças do coletivo. Nos testes 1 e 2 das palavras de generalização, a diferença entre os dois grupos é ainda maior. A média percentual das palavras-treino lidas corretamente pelas crianças do coletivo é da ordem de 89% e 91%, respectivamente nos testes 1 e 2, e a média para as crianças do ensino em situação individual é da ordem de 59% e 66% nos mesmos testes. Em relação às palavras de generalização, a diferença é ainda mais acentuada. A média percentual de leitura correta apresentada pelas crianças do coletivo é da ordem de 57% e 67%, respectivamente nos testes 1 e 2, e, para as crianças que participaram do ensino em situação individual, a média é da ordem de 6,1% e 1,6% nos mesmos testes.

O Gráfico 2 apresenta os dados relativos aos testes de equivalência (relações BC e CB) montados com as palavras de ensino utilizadas durante o procedimento em sessões realizadas individualmente com cada criança. Os histogramas mostrados à esquerda da figura representam os dados individuais das crianças que participaram do procedimento de ensino em situação coletiva, e os histogramas à direita representam os dados das crianças que participaram do procedimento de ensino em situação individual. Não há praticamente diferença percentual entre o desempenho dos dois grupos. Apenas duas crianças do procedimento de ensino em situação coletiva apresentam índices abaixo de 100%, porém eles situam-se em torno de 95%. Das 14 crianças do procedimento de ensino em situação individual, quatro apresentam índices de 100%; três, índices abaixo de 90%; e sete, índices na faixa de 90% a 97% aproximadamente.

 

 

 

Discussão

Os dados obtidos são claros quanto à eficiência do procedimento de ensino em situação coletiva na produção de leitura correta das palavras de ensino e na facilitação da leitura de palavras novas. Pode-se também afirmar, quando se comparam os percentuais de acertos das palavras de ensino entre ambas as situações, que o desempenho das crianças que aprenderam na situação coletiva é mais estável com variações percentuais menos acentuadas (porcentagem entre 70% e 100%) do que o desempenho das crianças que aprenderam na situação individual (porcentagem entre 33% e 88%). Na situação coletiva, na retenção 1, apenas uma das crianças obteve um percentual abaixo de 80% de acerto. Na situação individual, são 12 crianças cujos percentuais estão abaixo desse valor. Na retenção 2, a situação é bastante semelhante.

Os índices de acerto nos testes de retenção mostram que as crianças do procedimento de ensino em situação coletiva apresentaram melhor desempenho na leitura das palavras ensinadas e das palavras de generalização do que as crianças do procedimento de ensino em situação individual, embora a diferença entre as porcentagens de acertos das palavras ensinadas dos dois grupos não seja tão acentuada quanto à diferença entre as palavras de generalização. Uma explicação para essa diferença poderia ser a oportunidade que as crianças do coletivo tiveram no momento de escrever as palavras, já que eram incentivadas quando apresentavam a formação de outras palavras além daquelas que estavam sendo ensinadas. Havia também, na situação de ensino em situação coletiva, a disputa pela escrita correta e pelo término antecipado da atividade. De alguma forma, mesmo não planejado, esse desempenho era também incentivado. Aqui aparece claramente a concepção de Weingartner e Mechner (1966), segundo a qual o controle gerado pela presença de outro organismo pode criar novas relações de contingências independentes daquelas estabelecidas pelo experimentador. Na situação individual, as crianças eram também incentivadas, mas apenas na escrita das palavras de ensino. Faltava nessa situação a presença de outras crianças para criar as condições para o aparecimento das contingências dependentes.

Outro aspecto modificado foi o critério de desempenho nas etapas de ensino, cujo valor foi de 90% de acerto ou mais para passar de uma fase a outra. Os demais critérios permaneceram inalterados, como acertar, no pré-teste, as palavras da sessão anterior e acertar, no pós-teste, todas as palavras de ensino apresentadas com índices de 100%. A pergunta que pode surgir é: "Por que o critério de 90% e não o de 100% é frequentemente utilizado nos estudos de equivalência?". Na situação coletiva, o desempenho de uma criança não permanecia necessariamente sob o controle do estímulo-modelo apresentado. Frequentemente, o estímulo-modelo era a resposta (correta ou incorreta) de outra criança que ficava logo à frente ou ao lado, ou seja, a imitação apareceu com frequência nessas situações. Dados dessa natureza foram encontrados no estudo de Machado (2011). Como os desempenhos das "crianças-modelo" poderiam estar incorretos e, portanto, induzir o imitador a erro, decidiu-se diminuir o rigor do critério. De qualquer modo, foi preservado o rigor da avaliação, pois os pré e os pós-testes, mesmo na situação coletiva, foram realizados individualmente.

O ensinar em situação coletiva como facilitador de novos comportamentos

A presença de outras crianças teria influenciado a emergência de leitura de palavras novas? Estariam essas crianças aprendendo sob o controle não apenas das configurações de estímulos apresentadas, mas também sob o controle do desempenho de outras crianças? Para Rivière (1996), a eficácia da aprendizagem por observação depende de fatores de memória que implicam a recodificação simbólica das atividades de modelos. Rivière (1996) cita estudos realizados com crianças (BANDURA; GRUSEC; MENLOVE, 1966; COATES; HARTUP, 1969), nos quais foi demonstrado que as crianças que transformam a atividade observada em códigos verbais ou imagens aprendem e retêm muito melhor a informação do que aquelas que simplesmente se limitam a observar. Em termos comportamentais, dir-se-ia que, para o primeiro grupo de crianças, o controle de estímulos é mais amplo do que para aquelas que se limitaram a observar. Assim como a classe de respostas é também mais ampla, o que provavelmente gera consequências diferenciadas para ambos os grupos.

O conceito de contingências dependentes foi discutido por Medeiros (1981) em sua tese de doutorado, num procedimento de esquema múltiplo VI-EXT, no qual ratos treinados (quando estavam no esquema de extinção-EXT) podiam observar o desempenho de outro rato numa caixa experimental dupla (quando estava no esquema de intervalo variável-VI). Segundo o conceito de contingências dependentes (WEINGARTNER; MECHNER, 1966), o controle gerado pela presença de outro organismo pode criar novas relações de contingências, uma espécie adicional de contingência, independentes daquelas estabelecidas pelo experimentador. Cada comportamento do participante cria contingências para o comportamento do outro. Essas contingências não estão sob o controle direto do experimentador, mas são inteiramente uma função das interações dos participantes. Como essas contingências são dependentes da interação comportamental dos participantes, elas devem ser distinguidas daquelas que são estabelecidas pelo experimentador e foram denominadas por Weingartner e Mechner (1966) contingências dependentes. Na análise dos fenômenos de interação social, essas relações deveriam ser tratadas como assunto de investigação científica por seu próprio direito. Picollo, Goyos e Porto (2004) e Machado (2011) avaliaram os efeitos dessas variáveis. Os primeiros autores fizeram-no numa situação de laboratório, de maior controle; e o segundo autor, numa sala de aula em atividades de observação direta.

A mera presença de um organismo seria suficiente para facilitar o desempenho de outro, segundo Zajonc (1965), porém Cottrell (1968) discorda. Argui que mais que a mera presença de outra pessoa seria a expectativa explícita ou implícita de avaliação pela audiência que produziria os efeitos de facilitação social. Assim, neste estudo, a audiência seria constituída pela presença dos outros colegas e da equipe técnica. Como o procedimento utilizado gera alta probabilidade de acertos, com informação imediata para as crianças, é provável que, nessa situação de grupo, em vez de explicar o fenômeno pela criação de expectativas positiva, é mais prudente e parcimonioso afirmar que, dada a alta probabilidade de acertos, a probabilidade de respostas corretas seria também mais provável, como afirma Zajonc (1965) sobre fenômenos com alta probabilidade de ocorrência na presença de outros organismos ou audiências.

Nos testes de equivalência (ver Gráfico 2), praticamente todas as crianças responderam às relações CB (palavra-figuras) e BC (figura-palavras), indicando que as palavras ensinadas passaram a ter significado para elas. Pode ser observado que as crianças do procedimento de ensino em situação individual apresentaram desempenho pouco inferior, representado por índices percentuais pouco menores (índice entre 86,5% e 100%) em relação ao desempenho das crianças que participaram do procedimento de ensino em situação coletiva (índice entre 95,5% e 100%). Os dados aqui obtidos assemelham-se parcialmente aos de Amorim et al. (1996) que obtiveram testes positivos para as relações emergentes e suas correspondentes simetrias, os quais levaram grupos de participantes a formar classes de estímulos equivalentes.

Os aspectos positivos da experiência: o aspecto lúdico e a atividade de significação das palavras

O método utilizado neste estudo poderia servir como um currículo suplementar de leitura e escrita junto a alunos com histórico de fracasso escolar, segundo Souza et al. (2004). Na situação coletiva, merce destaque a atividade das crianças de "brincar" com as letras na hora de escreverem as palavras. Algumas delas, por incentivo dos membros da equipe, formavam outras palavras, além daquelas de ensino que estavam sendo apresentadas. Quando se formava alguma palavra, perguntava-se à criança o seu significado e dizia-se em voz alta que "fulano de tal" formou "tais e tais palavras". É provável que esse modo de proceder (que não estava previsto) tenha contribuído para facilitar o aparecimento de leitura generalizada, prática que não ocorria no procedimento de ensino em situação individual.

Outro aspecto positivo foi a presença da professora em sala durante a realização do estudo, ajudando na aplicação do procedimento e na manutenção da disciplina. Terminado o procedimento, a professora continuava com as crianças ensinando outros conteúdos como matemática, estudos sociais etc., utilizando as práticas tradicionais de sala de aula, contudo ela foi orientada a não ensinar qualquer outra palavra nos dias em que a equipe não estava presente na escola. Ela que poderia trabalhar com as palavras já ensinadas, como fazer ditado, cópia etc.

Os aspectos negativos encontrados, as soluções propostas e os desdobramentos do procedimento

O procedimento foi complexo. Do ponto de vista prático, dificilmente poderia ser realizado com menos de três pessoas (cada bolsista ficou responsável por seis crianças). Na folha de registro, anotavam-se apenas os erros, pois estes ocorriam com baixa probabilidade, o que favoreceu as crianças a discriminá-los, embora não se tenha planejado dar feedback para os erros. Os crachás (ver Figura 1), nos quais eram encaixadas as palavras de ensino, funcionaram também como estímulos que favoreceram a distração (brincar com eles, tirar as palavras de dentro, colocar as palavras de cabeça para baixo etc.). Por essa razão, os bolsistas tinham que arrumar os crachás na posição correta, o que nem sempre era possível por causa da dinâmica do procedimento.

Uma outra dificuldade surgiu no momento de aplicar o critério de desempenho. Dada a heterogeneidade do grupo, como descrito no item "Participantes", as crianças atingiam o critério em momentos diferentes, o que conduziu à realização de dois procedimentos distintos: um em situação coletiva e outro em situação individual, embora esse não fosse o objetivo. Essa situação tornou-se, inclusive, mais onerosa, pois teve que envolver mais bolsistas para atender as crianças (as do procedimento de ensino em situação coletiva e as do procedimento de ensino em situação individual). Aqui aparece uma questão importante para ser resolvida em futuros procedimentos dessa natureza: "Como compatibilizar, em um grupo de crianças, um único critério de desempenho, tendo em vista a heterogeneidade?". Uma solução desejável seria a organização de subgrupos para as crianças que não atingissem o critério. Desse modo, os participantes de um determinado subgrupo não seriam sempre os mesmos, permitindo, dessa forma, o contato acadêmico entre todos eles. Teríamos, então, grupos mais adiantados e grupos mais atrasados em termos de tempo, mas o ensino em situação coletiva seria mantido para todos os participantes.

 

Considerações finais

Mesmo com resultados satisfatórios do ponto de vista social e científico, os estudos de equivalência precisariam avançar mais na produção de conhecimento que beneficiasse um número maior de sujeitos, ou seja, realizar mais estudos em contextos coletivos. Resultados derivados desse tipo de estratégia poderiam facilitar o trabalho de professores em sala de aula. A maior parte do conhecimento de que dispomos sobre os procedimentos de equivalência nos habilita a lidar mais especificamente com o comportamento em situação individual apresentado em contextos laboratoriais específicos. Levantamento realizado por Mauad, Guedes e Azzi (2004) mostra que ainda são escassos os estudos sobre o uso da equivalência em delineamento de grupos. E essa situação nos leva a perguntar: 1. "Como agir perante crianças que se orientam pelas escolhas de outras crianças como modelos para suas respostas?", 2. "Que papel o professor desempenharia neste novo contexto?", 3. "Como lidar com as dicas verbais oferecidas pelos colegas?", e 4. "Que tipos de reforços e quais seus efeitos nessas situações?". O conhecimento disponível sobre critérios de desempenho oriundo de estudos individuais não daria conta, evidentemente, da complexidade da nova situação. Novos critérios de estabilidade e controle metodológico seriam necessários!

Em suma, pode-se afirmar que os dados obtidos em situação coletiva assemelham-se àqueles obtidos em estudos com delineamentos de sujeito único, o que nos permite afirmar que é possível estender para a situação de grupo os procedimentos com sujeito único construídos ao longo dos anos com as adaptações por nós sugeridas e discutidas. Em termos dos objetivos, pode-se dizer que foram parcialmente alcançados, uma vez que aproximadamente um terço das crianças leu não apenas as palavras de ensino, mas também as palavras de generalização.

 

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Endereço para correspondência
Contato
José Gonçalves Medeiros
e-mail: jose.medeiros@pesquisador.cnpq.br

Tramitação
Recebido em março de 2009
Aceito em janeiro de 2011

 

 

Notas

1 As providências para a autorização do consentimento livre e esclarecido não ocorreram porque, na época de realização do estudo (1996), as normas institucionais do Comitê de Ética em Pesquisa com Seres Humanos ainda não estavam em vigor, sendo constituídas em 16 de junho de 1997. Contudo, todos os cuidados éticos foram tomados como preservação da identidade dos participantes, autorização da coordenação pedagógica para trabalhar com as crianças, convite e aceite da professora da turma para auxiliar no procedimento, entre outros.

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