SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.16 issue1Creation of emotional expressions videos using multimedia stimuliIntervention in cognitive and metacognitive reading skills in Education Program Tutorial – PET students author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Psicologia: teoria e prática

Print version ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.16 no.1 São Paulo Apr. 2014

 

AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA

Testes do desenho do relógio e de fluência verbal: contribuição diagnóstica para o Alzheimer

 

Clock drawing test and verbal fluence: diagnostic contributions to the Alzheimer

 

Pruebas del dibujo del reloj y fluidez verbal: contribución diagnostica para lo Alzheimer

 

 

José Maria MontielI; Juliana Francisca CecatoII; Daniel BartholomeuIII; José Eduardo MartinelliIV
I Centro Universitário FIEO, Osasco – SP – Brasil
II Faculdade de Medicina de Jundiaí, Jundiaí – SP – Brasil
III Centro Universitário FIEO, Osasco – SP – Brasil
IV Faculdade de Medicina de Jundiaí, Jundiaí – SP – Brasil

Endereço para correspondência

 

 


Resumo

Os testes do desenho do relógio (TDR) e de fluência verbal (FV) são de simples aplicação e amplamente utilizados em avaliações neuropsicológicas que procuram investigar síndromes demenciais em idosos. O diagnóstico da doença de Alzheimer é clínico, mas os testes cognitivos são de grande auxílio durante a anamnese. O objetivo deste trabalho foi avaliar a correlação entre os testes de fluência verbal e do desenho do relógio e outros instrumentos cognitivos usados para o rastreio de doença de Alzheimer. Adotou-se o estudo de corte transversal com 130 idosos, avaliados pelos instrumentos: Cambridge cognitive examination (Camcog), miniexame do estado mental (Meem), FV e TDR. Critérios para doença de Alzheimer foram baseados no National Institute for Communicative Disorders and Stroke – Alzheimer’s Disease and Related Disorders Association (Nincds-ADRDA). Um grupo de controles normais foi formado de acordo com os sujeitos que não preencheram critérios para síndrome demencial. Os resultados apontaram para uma correlação moderada e significativa entre os instrumentos utilizados. Pode-se concluir que os testes podem ser utilizados em associação, com uma boa correlação para essa população.

Palavras-chave: avaliação psicológica; neuropsicologia; psicodiagnóstico; teste do desenho do relógio; doença de Alzheimer


Abstract

The clock drawing (CDT) and verbal fluency tests (VF) is a simple application widely used in neuropsychological evaluations aimed to investigate dementia in elderly. The diagnosis of Alzheimer’s disease is clinical, but the cognitive tests are of great help during the anamnesis. The objective this study was to evaluate the correlation between the tests of verbal fluency and clock drawing test and other cognitive tests used in Alzheimer’s disease screening. Cross-sectional study with 130 elderly, evaluated by the instruments: Cambridge cognitive examination (Camcog), mini mental state exam (MMSE), VF and CDT. Alzheimer’s disease criteria were based on National Institute for Communicative Disorders and Stroke – Alzheimer’s Disease and Related Disorders Association (Nincds-ADRDA). Normal control group was formed considering subjects did not fill the criteria for dementia syndrome. The results showed a significant and moderate correlation between the instruments used. It can be concluded that the tests may be used in combination showing a good correlation for this population.

Keywords: psychological assessment; neuropsychology; psychodiagnostic; clock test drawing; Alzheimer disease


Resumen

Las pruebas del dibujo del reloj (DDR) y fluidez verbal (FV) tienen una sencilla aplicación y ampliamente utilizadas en evaluaciones neuropsicológicas que buscan investigar demencia en los ancianos. El diagnóstico de la enfermedad de Alzheimer es clínico, pero las pruebas cognitivas son de gran ayuda durante la anamnesis. El objetivo de este estudio fue evaluar la correlación entre las pruebas de fluidez verbal y dibujo del reloj y otras pruebas usadas en el despistaje para enfermedad de Alzheimer. Estudio de corte transversal en que se evaluaron 130 ancianos, con los instrumentos: Cambridge cognitive examination (Camcog), mini examen del estado mental (Meem), FV y DDR. Los criterios para la enfermedad de Alzheimer fueron basados en National Institute for Communicative Disorders and Stroke – Alzheimer’s Disease and Related Disorders Association (Nincds-ADRDA). Fue formado un grupo de controles normales con sujetos que no presentaban síndrome demencial. Los resultados indicaron una correlación significativa y moderada entre los instrumentos utilizados. Se puede concluir que las pruebas se pueden utilizar en combinación y tuvieron buena correlación para esta población.

Palabras clave: evaluación psicológica; neuropsicología; psicodiagnóstico; prueba del dibujo del reloj; la enfermedad de Alzheimer


 

 

A doença de Alzheimer (DA) acomete principalmente pessoas acima dos 60 anos de idade e não tem cura, e o principal sintoma é a perda de memória recente. Sua evolução é progressiva e lenta e pode durar até 20 anos. Há dois estágios da DA: leve, fase em que o paciente ainda apresenta áreas cognitivas preservadas e mantém certa independência, e avançado, quando a doença causa uma incapacidade completa e o paciente necessita de auxílio para alimentar-se, vestir-se ou tomar banho (Damasceno, 2010). A doença é onerosa tanto para a família, dependendo da fase são necessárias duas pessoas para tomar conta do paciente, quanto para os sistemas de saúde, que arcam com custos de medicamentos e exames (Hamdan, 2008). Representando cerca de 50% a 70% dos casos de demências, a DA possui uma incidência maior após os 65 anos de idade. Pode acometer pessoas mais jovens, na faixa etária entre 40 e 50 anos, e quanto mais precoce seu início, pior o prognóstico (Damasceno, 2010).

Além do comprometimento de memória, o paciente pode apresentar no início afasia, apraxia ou incoordenação visuomotoraespacial (Damasceno, 2010). Com a evolução da doença, nos casos mais avançados, o comprometimento da região cortical torna o paciente incapaz de cuidar de si mesmo, por apresentar desorientação, confusão mental, além de provocar incontinência urinária. Dentre os critérios de avaliação, a análise das perdas cognitivas, da motricidade e de outros aspectos assume relevância para auxiliar a indicar o grau de comprometimento, bem como o estado atual da progressão da doença. De acordo com os novos critérios diagnósticos para demência, avaliações mais apuradas devem ser realizadas, e a utilização dos testes neuropsicológicos nesse diagnóstico ganha maior importância durante o processo de investigação da doença (Albert et al., 2011; McKhann et al., 2011). Existem diversos testes na área gerontológica, e, geralmente, os que apresentam maior acurácia são utilizados.

Nessa perspectiva, um dos instrumentos de uso frequente para auxiliar o diagnóstico de pacientes com Alzheimer é o teste do desenho do relógio (TDR), criado por Critchley, em 1953, como uma testagem funcional. Atualmente, o TDR é amplamente utilizado como teste de rastreio, de simples aplicação e de rápida execução, que avalia diversas dimensões cognitivas, como memória, função motora, função executiva e compreensão verbal (Aprahamian, Martinelli, Cecato, Izbicki, & Yassuda, 2011). Por avaliar a memória e outras funções cognitivas, o TDR é aplicado em idosos com suspeita de síndrome demencial, auxiliando na investigação diagnóstica. Para Shulman, Shedletsky e Silver (1986), os sinais de declínio cognitivo no TDR são mais evidentes no momento em que o paciente indica de maneira errada o horário, principalmente quando se exige o horário de “onze horas e dez minutos”, em que é necessário o pensamento abstrato para a execução da tarefa. Muitos pacientes com demência não conseguem executar o horário exigido.

Com relação à pontuação do TDR, muitas escalas foram desenvolvidas ao longo dos anos (Mendez, Ala, & Underwood, 1992; Shulman, Gold, Cohen, & Zucchero, 1993; Sunderland et al., 1989), e existe uma variação considerável entre a sensibilidade (de 42% a 97%) e especificidade (de 48% a 94%) encontradas nesses trabalhos. A escala de Shulman et al. (1993) pontua 5 pontos no total e um ponto de corte igual a 3. Já a escala de Mendez et al. (1992) pontua até 20 pontos para o desenho perfeito do relógio, tendo como ponto de corte igual a 18 pontos. Por tratar-se de um teste de ampla aplicação, alguns estudos analisaram seus resultados com outros testes cognitivos, como o Cambrigde cognitive examination (Camcog).

De fato, a avaliação neuropsicológica, principalmente de funções executivas, exerce importante papel no diagnóstico de inúmeros problemas que envolvam aspectos como a aprendizagem ou função cognitiva ou motora. O problema da medição das funções executivas é que ela requer um desenho de provas adaptadas ao contexto sociocultural dos sujeitos, visando à sua validade ecológica com fins clínicos e educacionais. Nesse sentido, os estudos de validade são essenciais para quaisquer dessas provas neuropsicológicas (Casullo, 2009).

Outro teste de ampla aplicação e de rápida execução é o teste de fluência verbal (FV), de categoria semântica e fonêmica, em que é solicitado ao paciente que fale o maior número de palavras (dentro de cada categoria exigida). No teste de FV, pontuam- se as respostas, mas não se consideram as repetições (Brucki, Nitrini, Caramelli, Bertolucci, & Okamoto, 2003; Montiel, 2005; Montiel & Seabra, 2007). Trata-se de um teste de grande praticidade e aplicabilidade, com simples pontuação e administração em clínicas e hospitais. É capaz de mensurar declínio cognitivo mesmo em fases iniciais da síndrome demencial. O teste de FV avalia vários domínios, como memória operacional, linguagem, capacidade de organização e sequenciamento. Dada a importância da linguagem para o diagnóstico de demência, um estudo longitudinal recente verificou que os pacientes que evoluíram para DA começaram a apresentar declínio nos testes de FV 12 anos antes de receberem o diagnóstico de demência (Amieva et al., 2008).

O objetivo principal deste estudo foi correlacionar o TDR, escala de Shulman et al. (1993) e Mendez et al. (1992), com o teste de FV (categorias animais, frutas e palavras com a letra “M”) em idosos com diagnóstico de DA e sem comprometimento cognitivo. Além disso, visa correlacionar esses instrumentos com outras medidas de rastreio cognitivo para DA, como o miniexame do estado mental (Meem) e o Camcog, com o propósito de analisar se estão aferindo aspectos cognitivos distintos. Cabe enfatizar que esses instrumentos têm muita tradição no rastreio de DA. Esse tipo de informação fornecerá evidência de validade dentro do contexto clínico para os instrumentos em questão.

 

Método

Participantes

Foram selecionados 130 pacientes no Ambulatório de Geriatria e Gerontologia da Faculdade de Medicina de Jundiaí, em São Paulo, onde passaram por anamnese clínica com um geriatra e foram encaminhados para avaliação psicológica, no período de junho de 2007 a dezembro de 2011. Do total de participantes, 97 (74,6%) receberam diagnóstico de DA com base nos critérios do National Institute for Communicative Disorders and Stroke – Alzheimer’s Disease and Related Disorders Association – Ninds- -ADRDA) (Mckhann et al., 2011) feito por um gerontologista, que se fundamentou em indicadores clínicos e sintomas, e 33 (25,4%) dos participantes formaram o grupo controle (GC), ou seja, idosos que fizeram a avaliação cognitiva, mas não preencheram os critérios para demência. Além disso, os critérios de inclusão no GC incluíram escores abaixo do ponto de corte em testes neuropsicológicos, não ter sintomas de demência, escore na escala de depressão geriátrica menor que sete e não ter comprometimentos em desempenhar atividades diárias.

Do total de 130 participantes, 92 (70,8%) correspondiam ao sexo feminino, e a maioria (43,08%) tinha escolaridade de 1 a 4 anos. Em relação aos pacientes com DA, 70 (72,2%) eram do sexo feminino, sendo a escolaridade de 1 a 4 anos encontrada com maior frequência (44,33%), e a idade variou de 63 a 93 anos (média = 77,45 e desvio padrão [dp] = 6,95). Já o GC, com 66,70% de mulheres, mostrou-se com mais anos de escolaridade quando comparado ao grupo com DA, sendo a escolaridade acima de 8 anos igual a 39,40%, com a idade variando de 61 a 91 anos (média = 73,97 e dp = 8,36).

Instrumentos e procedimentos

Os testes cognitivos utilizados foram o Camcog (Roth et al., 1986), o Meem (Folstein, Folstein, & Mchugh, 1975), o teste de FV (versão animais, frutas e palavras com a letra “M”) (Brucki et al., 2003) e o TDR, segundo a clock drawing interpretation scale (Mendez et al., 1992; Shulman et al., 1993). Todos os testes são aplicados como parte da avaliação neuropsicológica do ambulatório e também para auxiliar em diagnósticos diferenciais.

O TDR é um instrumento de rastreio de funções executivas que indica padrões de funcionamento frontais e temporoparietais, sendo frequentemente usado para diagnóstico de demências. Pacientes com escores normais no Meem podem ter alterações funcionais indicadas por esse instrumento. Em sua aplicação, solicita-se ao paciente que desenhe o mostrador de um relógio com os ponteiros indicando 11 e 10. A correção seguiu os pressupostos de Mendez et al. (1992) e Shulman et al. (1993). A primeira é uma lista de 20 critérios para indicar a presença à qual é atribuída um ponto, e soma- se a pontuação total. Já Shulman et al. (1993) apresentam um critério de 0-5 pontos quanto à qualidade geral do relógio.

O Camcog é a bateria cognitiva que compõe a entrevista estruturada do Cambrigde mental desorders of the elderly examination (Camdex), desenvolvida por Roth et al. (1986). Apresenta uma pontuação máxima de 107 pontos, divididos em subitens que avaliam memória, atenção, concentração, linguagem, praxia, pensamento abstrato, cálculo e percepção. O ponto de corte para o Camcog é igual a 80 pontos.

O Meem foi desenvolvido por Folstein et al. (1975) e é um dos testes de rastreio mais utilizados em todo o mundo. Possui uma pontuação máxima de 30 pontos, e seu ponto de corte varia de acordo com a escolaridade do paciente (Brucki et al., 2003). Segundo o estudo realizado por Brucki et al. (2003), os pontos de corte sugeridos por nível de escolaridade são: analfabetos = 20 pontos, de 1 a 4 anos de estudo = 25 pontos, de 5 a 8 anos de estudo = 26 pontos e entre 9 e 11 anos = 28 pontos, para idosos com escolaridade acima de 11 anos, o ponto de corte é igual a 29 pontos.

O teste de FV consiste em avaliar, em um minuto, o maior número de palavras verbalizadas pelo paciente, de acordo com uma determinada categoria. Existe o teste de FV que avalia o componente semântico (quando é solicitado que o paciente fale o maior número de palavras de acordo com uma determinada categoria, como nome de animais em um minuto) e o componente fonológico (quando é solicitado que o paciente fale o maior número de palavras que se inicia com uma determinada letra, como palavras que começam com a letra “M”) (Brucki et al., 2003). Segundo Brucki et al. (2003), o ponto de corte para o teste de FV é feito de acordo com a escolaridade: para analfabetos, é de 9 pontos, entre 1 e 8 anos de estudo igual a 12 pontos, e acima de 9 anos de estudo o ponto de corte é igual a 13 pontos.

As informações coletadas foram analisadas por meio dos programas SPSS 13.1 e SAS System for Windows (Statistical Analysis System) versão 6.12 e Microsoft Excel 2002 (versão 2.0). Para descrever o perfil da amostra segundo as variáveis em estudo, foram feitas frequências das variáveis categóricas sobre o gênero e estatísticas descritivas das variáveis contínuas (idade, Camcog, Meem, FV e TDR), com valores de média e desvio padrão. Compararam-se as médias das variáveis FV (categoria animais, frutas e palavras com a letra “M”) e TDR (escalas de Mendez et al. (1992) e Shulman et al. (1993)) entre os grupos de pacientes e controles. Foram analisados ainda coeficientes de correlação de Pearson (r), para comparar os dados do TDR aos de FV.

 

Resultados

Foram feitas análises com o teste de correlação de Pearson (Tabela 1), tanto com a amostra geral quanto separadas por grupos (grupo controle e grupo experimental, com diagnóstico de DA). Verificaram-se coeficientes positivos, significativos e menores no grupo de idosos sem comprometimento cognitivo (GC) em comparação aos demais.

A correlação dos testes TDR e FV identificou um coeficiente moderado, positivo e significativo entre os testes aplicados. Entre o Meem e os testes de FV (animais r = 0,67, p < 0,000; frutas r = 0,74, p < 0,000; “M” r = 0,74, p < 0,000) e TDR (Mendez r = 0,76, p < 0,000; Shulman r = 0,79, p < 0,000), a correlação foi significativa e moderada, o que também foi observado entre o Camcog e esses instrumentos (animais r = 0,74, p < 0,000; frutas r = 0,77, p < 0,000; “M” r = 0,76, p < 0,000; Mendez r = 0,75, p < 0,000; Shulman r = 0,79, p < 0,000). Os resultados do coeficiente de correlação entre o TDR e o teste de FV foram moderados, com valores mais baixos quando comparados ao Meem e Camcog, também significativos (Tabela 1).

 

 

Nesse grupo, observa-se correlação fraca entre o TDR versão de Mendez (r = 0,14; p = 0,098) e Shulman (r = 0,12; p = 0,163), FV animais (r = 0,29; p < 0,000) quando comparados ao Meem. Evidenciaram-se ainda correlações fracas e positivas entre o teste de FV animais e o TDR de Mendez (r = 0,16; p = 0,058) e Shulman (r = 0,11; p = 0,180), entre o teste de FV frutas e o TDR de Mendez (r = 0,28; p = 0,002), entre FV palavras com a letra “M” e o TDR de Mendez (r = 0,26; p = 0,005). Contudo, no grupo com diagnóstico de DA, observaram-se coeficientes de correlação fortes e positivos, entre o Meem e o Camcog (r = 0,81; p < 0,000), entre o TDR de Mendez e Shulman (r = 0,89; p < 0,000).

Foram realizadas ainda análises de regressão logística entre os testes neuropsicométricos, escolaridade e idade (variáveis independentes) e os grupos controle e experimental (variável dependente), visando identificar quais das medidas, incluindo as sociodemográficas, melhor caracterizavam o quadro de DA. As análises demonstram que as variáveis do teste de FV versão animais e o TDR de Shulman apresentam melhores preditores no diagnóstico de DA. Tais informações constam da Tabela 2.

 

 

Discussão

De acordo com pesquisas realizadas na literatura sobre a temática em questão, pode- se apontar que o levantamento de artigos pesquisados para este trabalho demonstra um grande número de trabalhos publicados com o objetivo de encontrar testes com maior valor preditivo para o diagnóstico de demência (Aprahamian et al., 2011).

Mckhann et al. (2011) e Albert et al. (2011) descrevem novas recomendações para o diagnóstico de DA e asseguram a maior importância dos testes neuropsicométricos na investigação diagnóstica nas síndromes demenciais. Nesse contexto, um teste amplamente utilizado é o Meem, porém há uma limitação das avaliações de função executiva e visuoespacial, e, em casos de estágios iniciais, o Meem pode não ser um bom instrumento (Ladeira, Diniz, Nunes, & Forlenza, 2009).

O TDR e o teste de FV foram comparados entre si e entre outros instrumentos de ampla aplicação no Brasil. A correlação entre o TDR e o Meem foi moderada, resultado que corrobora a pesquisa de Shulman (2000) que encontrou coeficiente de correlação entre 0,30 e 0,77. O artigo de Ferrucci et al. (1996) corrobora as ideias apontadas nesta pesquisa, em que o potencial diagnóstico aumenta consideravelmente quando se associam testes cognitivos aplicados concomitantemente. Outro estudo que justifica a boa correlação entre o TDR e o Meem foi realizado por Kirby, Denihan, Bruce, Coakley e Lawlor (2001), que descreveram que a associação entre TDR e Meem ajudou a identificar corretamente 39 dos 41 casos duvidosos de demência, com uma sensibilidade de 95%.

Quando se analisam os coeficientes com a amostra toda e comparam-se esses dados com os obtidos com os dois grupos separados, evidenciam-se os seguintes resul tados: esses coeficientes, a maior parte deles, são altos na amostra geral, ficam reduzidos com a amostra de controles e variam de moderados a altos na amostra clínica. Chama a atenção os dados obtidos no grupo controle quanto à correlação de a FV ser mais associada a outros testes de rastreio de funções cognitivas, como o Meem e Camcog, em comparação ao TDR que não se configurou significativo nesse grupo. Já no grupo de pacientes com Alzheimer, o teste de FV versão animais teve a maior correlação com o Camcog e Meem, seguidos do TDR de Mendez e Shulman, mas com coeficientes muito próximos. De fato, aparentemente, esses instrumentos podem fornecer uma boa estimativa do desempenho cognitivo geral de pacientes com esse problema, mas não seriam boas estimativas de desempenho intelectual normal.

Essa informação é relevante, pois, em níveis diferentes da doença, caso o paciente tenha maior comprometimento da linguagem, a estimativa do desempenho intelectual pode ser tomada via prova gráfica e vice-versa, obtendo resultados semelhantes. Do ponto de vista dos constructos teóricos avaliados, sabe-se que tanto o Meem como o Camcog avaliam várias funções cognitivas, apesar de este último apresentar um foco maior sobre a linguagem, o que justifica sua maior associação, principalmente no grupo de pacientes, com o teste de FV animais. No caso das correlações entre o TDR e FV evidenciadas, pode-se dizer que foram de baixas a moderadas, o que indica que compartilham algo em comum, possivelmente associado ao nível cognitivo geral, mas que a maior parte do que avaliam é distinta, sendo ambas boas estimativas do desempenho intelectual de pacientes com DA.

A magnitude dos coeficientes de correlação no grupo experimental foram, de modo geral, superiores às do GC. É interessante notar as correlações do teste de FV na categoria animais com as medidas do TDR que não foram significativas e com coeficientes baixos no grupo controle, enquanto seus coeficientes foram moderados e significativos no grupo experimental. Isso pode decorrer do fato de que, por se tratar de instrumentos de rastreio de funções executivas, em sujeitos sem diagnóstico de Alzheimer, a variabilidade dessas medidas tende a ser menor, já que maiores diferenças seriam observadas em avaliações de funções cognitivas mais complexas, como inteligência ou provas de atenção e memória mais adequadas para indivíduos normais, ou seja, sem comprometimento cognitivo (Brucki et al., 2003). Nesses sujeitos, instrumentos de rastreio tendem a não diferenciar adequadamente os desempenhos de participantes por se tratar de tarefas mais simples e breves, com poucas amostras de desempenho cognitivo mais específico.

Já em quadros demenciais, o decréscimo das funções cognitivas é mais intenso e ocorre em diferentes níveis, produzindo maior variabilidade nessas medidas de rastreio e justificando as associações evidenciadas nesse grupo, bem como sua maior magnitude. Os coeficientes moderados a altos também revelam que tais perdas tendem a ser identificadas em quaisquer dos testes de rastreio empregados. Todavia, novas investigações poderiam analisar, por meio de modelagem com equações estruturais, quais funções cognitivas assumem maior relevância nesse processo para analisar as progressões dos quadros clínicos. Ainda, indicadores clínicos também poderiam ser incluídos nesse modelo para avaliar sua acurácia nessa mesma finalidade, em comparação aos instrumentos cognitivos, mas tal fato convida a novas investigações.

A combinação do TDR com o Camcog mostrou boa correlação com o diagnóstico. Um estudo realizado por Aprahamian et al. (2011), em que se utilizou o Camcog, evidenciou alta acurácia em diagnosticar casos de DA. Esse fato justifica a boa correlação entre o TDR e o teste de FV apresentados nesta pesquisa. O teste de FV é de simples aplicação e utilizado na investigação diagnóstica, evidenciando um maior declínio em pacientes com suspeita de DA (Nutter-Upham et al., 2008). O teste de FV mostrou boa correlação com TDR, Camcog e Meem quando avaliados DA e controles normais. Contudo, um estudo realizado por Ladeira et al. (2009) não encontrou diferenças significativas quando associou o Meem, o teste de FV e o TDR entre pacientes com diagnóstico de comprometimento cognitivo leve (CCL) e controles normais. Uma justificativa encontrada pelos autores foi que, para o diagnóstico do CCL, seriam necessárias avaliações neuropsicológicas mais estruturadas e não somente testes de rastreio, como no caso do Meem, TDR e FV.

Vale destacar que a idade e o nível de escolaridade não se configuraram significativos em nenhum modelo da análise de regressão. Nesse sentido, pode-se dizer que, ao serem consideradas em conjunto com testes de FV ou gráficos como o TDR, a idade e a escolaridade não apresentam grande peso na explicação do DA. Tal fato é curioso e convida a novas pesquisas, principalmente quando se considera o fato de que o nível educacional é frequentemente tido como um critério importante para o diagnóstico de DA (Albert et al., 2011; Cecato, Fiorese, Montiel, Bartholomeu, & Martinelli, 2012). Há que se considerar também que o nível educacional não teve grande variabilidade nesta pesquisa, sendo essa uma de suas limitações, com os pacientes exibindo, em sua maioria, níveis educacionais medianos.

Os resultados obtidos entre as correlações do TDR e do teste de FV e entre os outros instrumentos analisados sugerem que a aplicação de mais de um teste cognitivo atrelada à anamnese clínica e neuropsicológica em idosos pode ajudar a obter diagnósticos mais precisos e confiáveis de DA. Apesar disso, estudos longitudinais são necessários para verificar a influência de outras variáveis (como escolaridade e sintomas depressivos) na cognição de pessoas idosas e também correlacionar escalas de atividades funcionais com testes de rastreio, a fim de verificar sua influência na acurácia diagnóstica na demência.

 

Referências

Albert, M. S., DeKosky, S. T., Dickson, D., Dubois, B., Feldman, H. H., Fox, N. C., Gamst, A., Holtzman, D. M., Jagust, W. J., Petersen, R. C., Snyder, P. J., Carrillo, M. C., Thies, B., & Phelps, C. H. (2011). The diagnosis of mild cognitive impairment due to Alzheimer’s disease: recommendations from the National Institute on Aging-Alzheimer’s Association workgroups on diagnostic guidelines for Alzheimer’s disease. Alzheimers Dementia, 7(3), 270-279.         [ Links ]

Amieva, H., Le Goff, M., Millet, X., Orgogozo, J. M., Pérès, K., Barberger-Gateau, P., Jacqmin-Gadda, H., & Dartigues, J. F. (2008). Prodromal Alzheimer’s disease: successive emergence of the clinical symptoms. Annal Neurology, 64(5), 492-498.         [ Links ]

Aprahamian, I., Martinelli, J. E., Cecato, J. F., Izbicki, R., & Yassuda, M. S. (2011). Can the Camcog be a good cognitive test for patients with Alzheimer’s disease with low levels of education? International Psychogeriatrics, 23(1) 96-101.         [ Links ]

Brucki, S. M. D., Nitrini, R., Caramelli, P., Bertolucci, P. H. F., & Okamoto, I. H. (2003). Sugestões para o uso do mini-exame do estado mental no Brasil. Arquivos de Neuropsiquiatria, 61(3-B) 777-781.         [ Links ]

Casullo, M. M. (2009). La evaluación psicológica: modelos, técnicas y contextos. Revista Iberoamericana de Diagnóstico y Evaluación Psicológica, 27(1), 9-28.         [ Links ]

Cecato, J. F., Fiorese, B., Montiel, J. M., Bartholomeu, D., & Martinelli, J. E. (2012). Clock drawing test in elderly individuals with different education levels correlation with Clinical Dementia Rating. American Journal of Alzheimer’s Disease and Other Dementias, 27(8), 620-624.         [ Links ]

Damasceno, B. P. (2010). Demências. In M. H. Guariento & A. L. Neri. Assistência ambulatorial ao idoso (pp. 243-254). Campinas: Alínea.         [ Links ]

Ferrucci, L., Cecchi, F., Guralnik, J. M., Giampaoli, S., Lo Noce, C., Salani, B., Bandinelli, S., & Baroni, A. (1996). Does the clock drawing predict cognitive decline in older persons independent of the mini-mental state examination. Journal American Geriatric Society, 44, 1326-1331.         [ Links ]

Folstein, M. F., Folstein, S. E., & Mchugh, P. R. (1975). “Mini mental state”. A practical method for rading the cognitive state of patients for the clinician. Journal of Psychiatric Research, 12, 189-198.         [ Links ]

Hamdan, A. C. (2008). Avaliação neuropsicológica na doença de Alzheimer e no comprometimento cognitivo leve. Psicologia Argumento, 26(54), 183-192.         [ Links ]

Kirby, M., Denihan, A., Bruce, I., Coakley, D., & Lawlor, B. A. (2001). The clock drawing test in primary care: sensitivity in dementia detection and specificity against normal and depressed elderly. International Journal Geriatric Psychiatry, 16, 935-940.         [ Links ]

Ladeira, R. B., Diniz, B. S., Nunes, P. V., & Forlenza, O. F. (2009). Combining cognitive screening tests for the evaluation of mild cognitive impairment in the elderly. Clinics, 64(10) 967-973.         [ Links ]

McKhann, G. M., Knopman, D. S., Chertkow, H., Hyman, B. T., Jack, C. R., Jr., Kawas, C. H. (2011). The diagnosis of dementia due to Alzheimer’s disease: recommendations from the National Institute on Aging-Alzheimer’s Association workgroups on diagnostic guidelines for Alzheimer’s disease. Alzheimers Dementia, 7(3), 270-279.

Mendez, M. F., Ala, T., & Underwood, K. (1992). Development of scoring criteria for the clock drawing task in Alzheimer’s disease. Journal American Geriatric Society, 40, 1095-1099.         [ Links ]

Montiel, J. M. (2005). Avaliação neuropsicológica de pacientes com transtorno de pânico. Dissertação de mestrado, Universidade São Francisco, São Paulo, SP, Brasil.         [ Links ]

Montiel, J. M., & Seabra, A. G. (2007). Teste de fluência verbal. In A. G. S. Capovilla & F. C. Capovilla. Teoria e pesquisa em avaliação neuropsicológica. São Paulo: Memnon.         [ Links ]

Nutter-Upham, K. E., Saykin, A. J., Rabin, L. A., Roth, R. M., Wishart, H. A., Pare, N., & Flashman, L. A. (2008). Verbal fluency performance in amnestic MCI and older adults with cognitive complaints. Archives Clinical Neuropsychol, 23, 229-241.         [ Links ]

Roth, M., Tym, E., Mountjoy, C. Q., Huppert, F. A., Hendrie, H., Verma, S., & Goddard, R. (1986). Camdex. A standardized instrument for the diagnosis of mental disorder in the elderly with special reference to the early detection of dementia. Bristh Journal Psychiatry, 149, 698-709.         [ Links ]

Shulman, K. I. (2000). Clock-drawing: is it the ideal cognitive screening test? International Journal Geriatric Psychiatry, 15, 548-546.         [ Links ]

Shulman, K. I., Shedletsky, R., & Silver, I. L. (1986). The challenge of time: clickdrawing and cognitive function in the elderly. International Journal Geriatric Psychiatry, 1, 135-140.         [ Links ]

Shulman, K. I., Gold, D. P., Cohen, C. A., & Zucchero, C. A. (1993). Clock-drawing and dementia in the community: a longitudinal study. International Journal Geriatric Psychiatry, 8, 487-496.         [ Links ]

Sunderland, T., Hill, J. L., Mellow, A. M., Lawlor, B. A., Gundersheimer, J., Newhouse, P. A., & Grafman, J. H. (1989). Clock drawing in Alzheimer’s disease: a novel measure of dementia severity. Journal American Geriatric Society, 37, 725-729.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
José Maria Montiel
Centro Universitário Fieo
Avenida Franz Voegelli, 300, Vila Yara
São Paulo – SP – Brasil. CEP: 06020-190
E-mail: montieljm@hotmail.com

Submissão: 25.10.2012
Aceitação: 4.11.2013