SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.18 issue2Depressive symptoms and family support for the elderly and adults on hemodialysisRisk factors and social communicative development of preterms author indexsubject indexarticles search
Home Pagealphabetic serial listing  

Psicologia: teoria e prática

Print version ISSN 1516-3687

Psicol. teor. prat. vol.18 no.2 São Paulo Aug. 2016

http://dx.doi.org/10.15348/1980-6906/psicologia.v18n2p117-128 

AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA

 

Bender - Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG): estudo para versão de rastreio

 

Bender - Score Graduate System (B-SPG): study for screening version

 

Bender - Sistema de Puntuación Gradual (B-SPG): estudio para la versión de cribado

 

 

Fabián Javier Marín Rueda; Vanessa de Sousa; Acácia Aparecida Angeli dos Santos; Ana Paula Porto Noronha

Universidade São Francisco, São Paulo - SP - Brasil

Endereço para correspondência

 

 


RESUMO

O B-SPG foi proposto como um sistema de correção para o Teste Bender, em 2005. O objetivo deste estudo foi verificar se, com um conjunto menor de figuras, é possível chegar a uma medida da avaliação da habilidade perceptomotora equivalente à proposta original desse sistema. Participaram 787 crianças, com idades entre 6 e 10 anos (M = 8,18; DP = 1,33). Por meio de uma análise fatorial exploratória, foram verificados os itens com maiores cargas fatorais, considerando os conjuntos de figuras formadas por pontos e laçadas, linhas retas e ângulos e linhas curvas. A partir disso, realizou-se uma análise de regressão, verificando que um conjunto de três figuras, 3, 4 e 7, explicaram 80% da variância do escore total do B-SPG. O valor do coeficiente alfa foi calculado, indicando uma confiabilidade de 0,74. Pode-se dizer que esse conjunto de figuras se revelou adequado. No entanto, são necessários estudos que investiguem suas relações com outras variáveis, corroborando, assim, sua adequação psicométrica.

Palavras-chave: organização perceptomotora; avaliação psicológica; Teste Gestáltico de Bender; desenvolvimento infantil; psicologia escolar.


ABSTRACT

The B-SPG was proposed as a correction system for the Bender Test in 2005. The aim of this study was to determine, if, with a set lower figures, is possible to get a measure of evaluation of perceptual motor skills equivalent to the original purpose of this system. Participated in this study 787 children, with ages ranging from 6 to 10 years (M = 8.18, SD = 1.33). Through an exploratory factor analysis, the items were checked with larger loads factorials, considering the sets of figures formed by dots and circles, straight lines and angles and curved lines. From there, was a regression analysis, finding that the set of three figures, 3, 4 and 7, explained 80% of the variance of the total B-SPG score. The value of the alpha coefficient was 0.74. It can be said that this set of figures proved appropriate. However, studies are needed to investigate the relationship with other variables, which confirms the psychometric adequacy of this set of items.

Keywords: perceptual motor organization; psychological assessment; Bender Gestalt Test; childhood development; school psychology.


RESUMEN

El B-SPG fue propuesto en 2005 como sistema de corrección para el Test de Bender. el objetivo de este estudio fue verificar si con menos figuras se puede obtener una medida para evaluar la capacidad perceptomotora, equivalente a la propuesta original del sistema. Participaron 787 niños, con edades entre 6 y 10 años (M = 8,18, DT = 1,33). A partir del análisis factorial exploratorio fueron observados los ítems con mayor carga factorial, considerando los conjuntos de figuras que se refieren a puntos y lazos, líneas rectas y ángulos, y líneas curvas. A partir de eso se realizó un análisis de regresión, encontrando que un conjunto de tres figuras, 3, 4 y 7, explicaron el 80% de la varianza de la puntuación total del B-SPG. el valor del coeficiente alfa fue calculado, indicando una confiabilidad de 0,74. Se concluye que este conjunto de figuras resultó apropiado. Sin embargo, se necesitan estudios para investigar su relación con otras variables para confirmar la adecuación psicométrica de este grupo de ítems.

Palabras clave: organización perceptomotora; evaluación psicológica; Prueba de Bender Gestalt; desarrollo infantil; psicología escolar


 

 

A habilidade perceptomotora é um construto que compreende a percepção visual e a expressão motora, estando associado à linguagem, a conceitos temporais e espaciais e à capacidade de organização e representação. Em geral, seu desenvolvimento ocorre paralelamente à maturação neurológica da criança (Bender, 1955; Koppitz, 1963).

Um instrumento destinado à avaliação dessa habilidade, o Teste Gestáltico Visomotor de Bender, foi desenvolvido por Lauretta Bender, em 1938. A autora propôs que, a partir da cópia de determinadas figuras, seria possível analisar o desenvolvimento perceptomotor de crianças sob a luz da teoria da Gestalt. Bender criou o instrumento com enfoque clínico, considerando aspectos qualitativos, e não propôs um método sistemático de correção e pontuação das figuras, o que ocasionou o desenvolvimento de diversos sistemas por outros autores ao longo do tempo (Koppitz, 1963).

Os sistemas criados, desde então, têm particularidades em relação às suas finalidades, às formas de correção e pontuação e, até mesmo, em relação às figuras do instrumento. A exemplo dos propósitos específicos, tem-se o sistema de Pascal e Suttel, criado em 1951, e de Hutt, de 1969. Ambos se prestam à avaliação de aspectos emocionais em adultos. O de Hutt é singular também no que diz respeito às figuras-estímulo, que apresentam distinções em relação à espessura das linhas, às angulações e aos arredondamentos mais acentuados em determinadas figuras. Outro sistema, o de Clawson, de 1959, presta-se à avaliação de dificuldades emocionais de crianças, sob o enfoque projetivo. Essa autora propõe uma correção interpretativa dos desenhos, avaliando aspectos, como a disposição das figuras na folha, modificações na Gestalt e o modo de execução da tarefa (Nunes & Ferreira, 2007).

Para a avaliação grafoperceptiva, pode-se citar o sistema Santucci-Pêcheux (1981). Ele proporciona a avaliação por meio da reprodução de cinco (A, 2, 4, 3 e 7 - aplicadas nesta ordem), das nove figuras utilizadas por Bender. Consideram-se critérios, como angulação, conceito espacial, número de elementos e relação entre as partes.

Outro sistema que tem por finalidade a avaliação da habilidade perceptomotora é o Developmental Bender Scoring System, criado por Koppitz (1963). Ele é o mais conhecido e estudado e tem por base o caráter evolutivo associado à aprendizagem das funções gestálticas. Sua avaliação é dicotômica, considerando a atribuição de um ponto para desvios acentuados. Os critérios avaliados são a distorção da forma (alterações de aspectos estruturais do desenho), a integração (perda na configuração do desenho), a rotação (modificação da orientação espacial) e a perseveração (aumento de elementos).

Também destinado à avaliação perceptomotora, o Teste Gestáltico de Bender Modificado foi desenvolvido por Brannigan e Brunner (2002). Ele é destinado a crianças entre 4 e 8 anos. Os autores utilizaram seis (A, 1, 2, 4, 6 e 8), das nove figuras propostas por Bender. A pontuação varia de cinco a zero. Embora os sistemas de Santucci-Pêcheux e Brannigan e Brunner tenham sido propostos com um número menor de estímulos, os autores não apresentam justificativas psicométricas da escolha de algumas das figuras em detrimento de outras.

Em 2005, um sistema brasileiro foi desenvolvido pelos autores Sisto, Noronha e Santos, o Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG). Ele é atualmente o único aprovado para uso diagnóstico no Sistema de Avaliação de Testes Psicológicos (Satepsi), criado pelo Conselho Federal de Psicologia. Além disso, tem como diferencial o fato de poder ser aplicado coletivamente, o que expande sua utilização no contexto da psicologia escolar. Considera como critério para a correção das figuras a distorção da forma - que acontece quando pontos, retas, curvas e ângulos são desenhados sem precisão. Além disso, a pontuação é gradual, ou seja, o avaliador atribui uma pontuação de 0 a 3, variando de acordo com a qualidade do desenho (Sisto et al., 2005).

As propriedades psicométricas do B-SPG foram avaliadas por diversos estudos desde a sua proposição como sistema de correção. Ele tem se mostrado como uma ferramenta importante para avaliações no contexto das dificuldades no desempenho em leitura e escrita (Carvalho, Noronha, Pinto, & Luca, 2012; Suehiro & Santos, 2005). Outras pesquisas verificaram que amostras diagnosticadas com dislexia (Santos & Jorge, 2007) e deficiência intelectual (Noronha, Santos, & Rueda, 2013) tiveram um pior desempenho no teste, quando comparadas à amostra normativa. Além disso, foi constatada a adequação do uso do B-SPG em amostras de diversas regiões do Brasil (Noronha, Rueda, & Santos, 2013) e em crianças estrangeiras (Rueda, Santos, Noronha, & Segovia, 2013; Santos, Noronha, Rueda, & Segovia, 2014).

Sisto, Santos e Noronha (2010) também buscaram evidências de validade baseada na estrutura interna, por meio da análise do Funcionamento Diferencial dos Itens (DIF). Os resultados mostraram que duas figuras diferenciaram o sexo, sendo as figuras 5 e 6. Os meninos tenderam a ter mais dificuldade na execução da Figura 5, e as meninas, na 6. Os autores optaram por mantê-las, já que consideraram que o resultado fazia com que esses itens se compensassem.

O B-SPG utiliza os nove cartões originalmente propostos por Bender. Deles são extraídos 10 escores - no sétimo cartão, são avaliadas as duas imagens que compõem a figura (7A e 7B) - além da pontuação total. As figuras são constituídas por pontos ou laçadas (figuras 1, 2, 3 e 5), linhas retas e ângulos (A, 7A, 7B e 8) e linhas curvas (4 e 6). Vale mencionar que a figura A é constituída de duas imagens, sendo elas, um círculo e um quadrado rotado, no entanto, o B-SPG somente considera para a pontuação, o quadrado. O mesmo ocorre com a 4, que é composta por dois traçados diferentes, mas somente é pontuado o traçado em forma de curva, no caso, a campânula. Na Figura 8, também são atribuídos pontos apenas para o hexágono (Sisto et al., 2005).

Para a execução das figuras angulares, a criança deve realizar traçados em formatos de ângulo e lados retilíneos. A primeira dessas figuras, a A, é formada por um quadrado. As figuras 7A, 7B e 8 são constituídas pelos mesmos traçados, entretanto, de acordo com Kacero (2005) poucas vezes são percebidas assim, por causa de suas posições e orientações. Além disso, Clawson (1992) alega que a confecção de formas quadrangulares é mais simples do que os hexágonos, graças à exigência da noção espacial envolvida na realização de uma maior quantidade de ângulos.

A execução de pontos ou laçadas nas figuras 1, 2, 3 e 5 requer, segundo Clawson (1992), uma boa coordenação da musculatura grossa e fina, para que os elementos não sejam substituídos por traços. A Figura 1 é formada por pontos idênticos que, por sua proximidade e direção, dão a indicação de uma linha reta. A Figura 2 consiste em três séries horizontais de laçadas que, ao serem combinadas, devem manter uma inclinação. A Figura 3 é formada por pontos dispostos, compondo um desenho em progressão angular. A complexidade dessa estrutura se dá pelo fato de ter que considerar, simultaneamente, a distância, a posição, a inclinação, a proporção, o paralelismo, a obliquidade e o ajuste dos ângulos. A composição da Figura 5 é feita por pontos que formam um semicírculo. A especificidade dela é em relação à mudança de direção durante a execução dos pontos (Kacero, 2005).

Em relação aos traçados de linhas curvas, observa-se que elas diferem das linhas retas pelo fato de serem produzidas por meio de movimentos ondulantes. Tais características podem ser observadas nas figuras 4 e 6. A campânula, avaliada na Figura 4, é constituída por traçados abertos que formam curvas. A Figura 6 também foi formada por ondas, e a sua avaliação considera o número de ondas horizontais e inclinadas e o tamanho de cada uma delas (Kacero, 2005).

O teste de Bender é um instrumento comumente utilizado em avaliações diagnósticas (Zuccolo, Rzezak, & Góis, 2010). Sua relevância tem sido particularmente verificada em contextos de aprendizagem (Carvalho et al., 2012; Suehiro & Santos, 2005, entre outros), tal como informado anteriormente.

Koppitz (1963) afirmou que o uso desse instrumento como screening poderia auxiliar a detectar potenciais problemas de aprendizagem, atenuando, assim, o surgimento de comprometimentos mais sérios posteriormente. A autora relatou como obstáculo para essa prática o fato de que, até então, o instrumento não era previsto para aplicações coletivas.

O sistema brasileiro do instrumento, o B-SPG, foi validado e padronizado para aplicações individuais e coletivas, sendo que as comparações entre as duas formas apontaram para a inexistência de diferenças nos escores obtidos por ambas, o que justifica a não diferenciação de tabelas normativas para cada uma das formas de aplicação (Sisto et al., 2005). A aplicação coletiva favorece o uso deste sistema no contexto escolar, pois o desenho de nove cartões demanda um tempo que muitas vezes o ambiente escolar não dispõe.

Ao lado disso, considera-se que, mesmo as avaliações realizadas no contexto clínico em que, além da aplicação de instrumentos, são realizadas anamneses, observações clínicas, dentre outros, a proposta de um instrumento para a avaliação da habilidade perceptomotora com um número menor de itens é relevante, pois possibilita a minimização do impacto do tempo nesses procedimentos. Dessa forma, almeja-se, neste estudo, verificar se, com um conjunto de menos figuras, sendo cada uma representante de um dos tipos de traçados - é possível chegar a uma medida da avaliação da habilidade perceptomotora equivalente à proposta original do B-SPG.

 

Método

Participantes

Participaram desta pesquisa 787 crianças, oriundas de três estados brasileiros, sendo 37,8% de Minas Gerais, 35,1% do Piauí e 27,1% da Paraíba. As informações referentes à idade e ao sexo podem ser observadas na Tabela 1.

Observa-se que, quanto ao sexo, 405 indivíduos eram do sexo feminino (56,5%). As idades variaram de 6 a 10 anos, com média de 8,18 e desvio padrão de 1,33.

Instrumentos

Teste Gestáltico Visomotor de Bender: Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG) (Sisto et al., 2005).

O B-SPG é um instrumento proposto para a avaliação da maturidade perceptomotora de crianças de 6 a 10 anos, por meio da reprodução de desenhos. É composto por nove figuras que, na execução do teste, devem ser copiadas em uma folha em branco, sem auxílio mecânico.

A pontuação máxima que uma criança pode obter nesse instrumento é 21 pontos. As figuras A, 1, 2, 3, 4, 5, 7 e 8 possuem pontuações que variam de zero a dois pontos, e a Figura 6 varia de zero a três. Em todas as figuras, a correção é feita considerando as distorções, assim, quanto maior a pontuação, maior será a imprecisão dos traçados. Não há tempo-limite para aplicação desse instrumento, e o material necessário para execução da tarefa proposta são lápis preto n. 2, folha para desenhar e cartões de estímulos, sejam na forma de transparência ou cartão individual.

Procedimentos

Coleta

O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade São Francisco, depois da aprovação das escolas para a coleta de dados. Com a aprovação do Comitê de Ética, os Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) foram entregues às crianças para que elas levassem aos responsáveis para recolhimento das autorizações. No momento da entrega do TCLE, foi comunicado a elas os objetivos e o procedimento de coleta, além da não obrigatoriedade de suas participações.

O instrumento foi aplicado coletivamente, em salas de aula com aproximadamente 25 lugares e em uma única sessão. As figuras foram projetadas em uma tela em branco, e o projetor foi colocado a uma distância de dois metros da tela, conforme indicação do manual. As crianças receberam um lápis e uma folha de papel sulfite A4 para que pudessem fazer a cópia das figuras do B-SPG. As instruções foram feitas seguindo o manual e a coleta ocorreu em aproximadamente 20 minutos.

Análise de dados

Para averiguar as cargas fatoriais das figuras, os dados foram submetidos à Análise Fatorial Exploratória. A análise foi realizada utilizando o método de extração Principal Axis Factoring, considerado apropriado quando as amostras apresentam distribuição não normal (Costello & Osborne, 2005).

Visou-se observar quais eram as figuras com as maiores cargas fatoriais, considerando os grupos de traçados. De posse desse resultado, essas figuras foram submetidas à análise de regressão, utilizando-se o método enter, tendo como variável dependente a pontuação total do B-SPG e como variáveis independentes as figuras selecionadas. Essa análise foi utilizada, pois por meio dela pôde ser verificado o quanto um determinado conjunto de figuras pode contribuir na predição do escore total.

Além disso, foram verificados os coeficientes alfa. Eles foram calculados tanto para o conjunto completo de figuras do B-SPG, quanto para o conjunto de figuras selecionadas nos procedimentos anteriores descritos. Por fim, de posse das figuras que comporiam a versão reduzida/de rastreio do B-SPG, realizou-se uma análise de variância (Anova) para verificar se o desempenho das crianças em função da sua idade era diferenciado.

 

Resultados

Em relação às estatísticas descritivas, observa-se que a média da pontuação para a amostra geral foi de 9,17 e o desvio padrão 4,62; sendo que a pontuação mínima da amostra foi zero e a máxima, 21 pontos. A pontuação mais frequente foi de seis pontos, totalizando 8,8% da amostra, verificando-se também que 50% das crianças tiveram pontuação até nove.

Antes da realização da Análise Fatorial Exploratória, buscou-se observar se os dados eram passíveis de fatoração. Pelos índices de Kaiser-Meyer-Olkin (KMO = 85) e do Teste de Esfericidade de Bartlett (χ2 (45) = 2152,370, p < 0,001), comprovou-se a fatoriabilidade da matriz de correlação.

Por meio do método de extração Principal Axis Factoring, sem se fixar o método de rotação e o número de fatores a se extrair, foi observada uma estrutura de dois fatores, com dois eigenvalues maiores que 1,0 (3,72 e 1,2) explicando 32,19% da variância total. No entanto, houve itens que carregaram ao mesmo tempo nos dois fatores. Assim, por se esperar unidimensionalidade da escala, decidiu-se realizar uma análise paralela. Tal método é um procedimento estatístico de simulação em que valores de eigenvalues aleatórios são comparados com os dados reais e o número de fatores a ser retido refere-se àqueles que apresentam valores >1 e também maiores do que os eigenvalues simulados. A análise paralela realizada, com 1000 simulações, indicou que a estrutura unidimensional era a mais adequada. Assim, realizou-se uma nova análise, fixando-se um único fator. Dessa análise, surgiu um fator com eigenvalues = 3,72, responsável por 31,5% da variância total. As cargas fatoriais podem ser observadas na Tabela 2. Os resultados estão apresentados em grupos, considerando o tipo de traçado.

Na Tabela 2, as figuras foram agrupadas sob o aspecto qualitativo em três grupos, referentes às suas composições: pontos e laçadas, linhas retas e ângulos e linhas curvas. Pode ser observado que, dentre as figuras constituídas por pontos e laçadas, a Figura 3 apresentou a maior carga fatorial. A maior carga dentre as figuras compostas por ângulos foi da Figura 7B, seguida da 7A; e a Figura 6 apresentou a maior carga fatorial no conjunto de figuras formadas por curvas. No entanto, nota-se que a as cargas das figuras 4 e 6 são bastante próximas.

A Figura 6 é a única, dentre as figuras do instrumento, a ter uma pontuação variando de zero a três pontos; nas demais, os pontos variam de zero a dois. Além disso, no estudo do Funcionamento Diferencial dos Itens (DIF), realizado por Sisto et al., 2010, foi possível observar que a Figura 6 suscitou uma maior dificuldade de execução para as meninas (Sisto et al., 2010). Em razão desses dados, optou-se por considerar, para as análises subsequentes, como figura representante do conjunto "linhas curvas", a Figura 4. Embora se tenha pensado inicialmente na escolha de uma figura para representar cada tipo de traçado, pelo fato de as figuras 7A e 7B comporem o mesmo cartão e serem entrelaçadas, optou-se pela inclusão de ambas.

Com o objetivo de averiguar o valor preditivo desse conjunto de variáveis - as figuras 3, 4 e 7A e 7B - com relação à pontuação total do B-SPG, foi realizada a análise de regressão, pelo método Enter. Foram incluídas essas quatro figuras como variáveis independentes, e a pontuação total do Bender (considerando-se as 10 pontuações) foi inserida como variável dependente.

Os resultados da regressão mostraram que as variáveis independentes conseguiram predizer 80% (R2 ajustado = 0,80) da variância do escore total do B-SPG. A Tabela 3 apresenta os coeficientes advindos desta análise.

Observa-se que os resultados encontrados para as figuras analisadas se revelaram estatisticamente significativos na predição do escore total do instrumento. Em relação ao coeficiente alfa, observou-se que nesta amostra o conjunto de figuras completas alcançou o alfa de 0,80. Para o conjunto das quatro figuras, o alfa foi de 0,74.

Por fim, e para verificar se a somatória das figuras 3, 4, 7A e 7B diferenciava o desempenho em função da idade das crianças, foi realizada uma Anova, com o posterior teste de Tukey. Foi observada diferença estatisticamente significativa [F (4,782) = 72,16, p < 0,001], e os grupos formados podem ser observados na Tabela 4.

Pelo teste de Tukey, observa-se que, conforme aumentou a idade das crianças, aumentou a média de pontos nos quatro itens do B-SPG. No entanto, os cinco grupos de idade não se diferenciaram, uma vez que 6 e 7 anos ficaram juntos.

 

Discussão

O objetivo deste estudo foi verificar se, com um conjunto reduzido de figuras que compõem o teste Bender, é possível obter uma estimativa da habilidade perceptomotora de crianças equivalente à proposta pelo B-SPG. Para tanto, foram considerados aspectos qualitativos de cada figura, bem como suas características psicométricas. As figuras foram agrupadas de acordo com os aspectos de seus traçados e submetidas à análise fatorial exploratória. De posse dessas informações, foram realizadas análise de regressão e averiguação do coeficiente alfa.

No que se refere às características qualitativas de cada item do teste, é relevante mencionar as especificidades das figuras representantes de seus grupos. A Figura 3 foi considerada por Clawson (1992) como a mais difícil de executar. De acordo com Kacero (2005), a configuração desse item é mais elaborada por resultar em uma figura semelhante a uma flecha. Sendo assim, observa-se que o item com maior carga fatorial desse conjunto foi também o item que revela maior complexidade em sua execução.

O conjunto de figuras formadas por linhas curvas foi composto apenas pelas Figuras 4 e 6, sendo que elas tiveram cargas fatoriais bastante próximas (0,47 e 0,49 respectivamente). Bender (1955) já relatava que essas figuras apresentavam semelhança na sua execução, não evidenciando grandes peculiaridades entre si quando analisados qualitativamente.

Além da proximidade das cargas fatoriais, levou-se em consideração a pesquisa de Sisto et al. (2010), que averiguou se os itens do teste forneciam medidas idênticas para meninos e meninas e verificou que as meninas demonstraram maior dificuldade na execução da Figura 6 e os meninos na Figura 5. Como os autores consideraram que essas diferenças se compensariam, optaram por manter ambas as figuras. Considerando que no caso da presente pesquisa essa compensação é desnecessária, que a Figura 6 é o item que apresenta maior dificuldade na sua correção (pontuação varia de 0 a 3), além das cargas fatoriais próximas já relatadas, optou-se por selecionar a Figura 4.

No que se refere às figuras compostas por linhas retas e ângulos, é curioso notar que três, dos quatro itens, são constituídos pelos mesmos traçados. No entanto, as especificidades das figuras 7A e 7B dizem respeito ao fato de elas serem apresentadas de forma ligeiramente inclinadas. Segundo Kacero (2005), essa pequena inclinação pode influenciar o modo como essa figura é percebida.

As figuras 3, 4, 7A e 7B são estruturas complexas, constituídas de linhas perpendiculares e oblíquas. Segundo Clawson (1992), estruturas com tais características requerem mais dispêndio tanto da percepção visual quanto da expressão motora.

A redução no número de figuras do teste Bender também foi utilizada por Santucci-Pêcheux (1981) e Brannigan e Brunner (2002). No caso do primeiro, foram utilizadas as figuras A, 2, 4, 3 e 7, excluindo-se as figuras 1, 5, 6 e 8. No entanto, as autoras não trazem uma justificativa psicométrica para essa escolha, alegando apenas que os critérios, a avaliação da angulação, o conceito espacial, o número de elementos e a relação entre as partes são mais adequados para serem avaliados nessas figuras.

No caso de Brannigan e Brunner (2002), foram excluídas as figuras 3, 5 e 7. Como tal instrumento é proposto para crianças entre 4 e 8 anos, os autores excluíram essas figuras com a justificativa de que elas seriam mais difíceis. Entretanto, eles não trazem dados que justifiquem essas escolhas.

Ainda, pode-se observar que considerando todas as figuras, as maiores cargas fatoriais foram encontradas em 7A, 7B e 8. Embora as cargas verificadas sejam adequadas e até desejadas estatisticamente (Hair et al., 2009), considera-se que o fato de as figuras serem constituídas pelos mesmos traçados pode limitar o acesso à amplitude da avaliação da habilidade proposta pelo instrumento. Assim, julga-se mais adequado considerar, além dos aspectos psicométricos, a análise qualitativa dos traçados.

Em relação à verificação da confiabilidade, observou-se que o coeficiente alfa para todas as figuras do B-SPG foi de 0,80. Esse valor é considerado satisfatório. Já o conjunto de três figuras (quatro itens) obteve um coeficiente alfa de 0,74. No entanto, é importante salientar que o valor de alfa é afetado pelo número de itens que compõem uma escala (Field, 2009). Sendo assim, essa informação pode justificar a diminuição do coeficiente de um conjunto para o outro, dado que foram excluídos seis itens do instrumento. Mesmo assim, se considerado que são apenas quatro itens, 0,74 pode ser considerado um valor bastante satisfatório.

É sabido da importância de se proporcionar a avaliação de crianças em idade escolar, já que elas podem detectar aquelas com potenciais problemas para a aprendizagem. Koppitz (1963) relata que a percepção, a análise e a integração de estímulos são habilidades essenciais no contexto escolar. Nesse sentido, este estudo pode ser uma contribuição, pois visa propor uma avaliação breve da habilidade perceptomotora. É evidente que a aplicação do instrumento completo não deve ser substituída pela aplicação das três figuras contendo quatro indicadores, quando há indícios de comprometimentos dessa habilidade, situação em que investigações mais profundas devem ser conduzidas. No entanto, se um bom desempenho for observado na execução dos quatro itens propostos, o restante da prova poderá ser suprimido.

Em complemento, tais figuras podem ser utilizadas na clínica, pois sabe-se que as avaliações neuropsicológicas e psicológicas são realizadas em contextos em que uma grande quantidade de atendimentos é efetivada. Além disso, as avaliações requerem dispêndio de tempo, pois os procedimentos se constituem de várias etapas.

Considera-se como limitações deste estudo o fato de esse conjunto de figuras não ter sido testado, isoladamente, das demais figuras. Também, seus escores não foram correlacionados a outras variáveis associadas ao desempenho escolar. As questões de pesquisa, decorrentes dela constituem desafios que serão enfrentados em uma agenda de pesquisa a ser empreendida proximamente. A realização destes novos estudos poderá corroborar os bons indicativos psicométricos desse conjunto de itens.

 

Referências

Bender, L. (1955). Test Gestáltico Visomotor - Usos y Aplicaciones Clinicas (6a ed.). Buenos Aires: Paidós.         [ Links ]

Brannigan, G. G., & Brunner, N. A. (2002). Guide to the Qualitative Scoring Systems for the Modified Version of the Bender-Gestalt Test. Springfield: Charles C. Thomas, Publisher.         [ Links ]

Carvalho, L., Noronha, A. P. P., Pinto, L. P., & Luca, L. (2012). Maturidade perceptomotora e reconhecimento de palavras: estudo correlacional entre o Bender - Sistema de Pontuação Gradual e o Teste de Reconhecimento de Palavras. Estudos de Psicologia, 29(3),371-377. Recuperado em janeiro, 2015, de http://www.scielo.br/pdf/estpsi/v29n3/07.pdf.         [ Links ]

Clawson, A. (1992). Bender infantil: manual de diagnóstico clínico. Porto Alegre: Artes Médicas.         [ Links ]

Costello, A. B., & Osborne, J. W. (2005). Best practices in exploratory factor analysis: Four recommendations for getting the most from your analysis. Practical Assessment, Research & Evaluation, 10(7),1-9. Recuperado em abril, 2015, de http://pareonline.net/pdf/v10n7.pdf.         [ Links ]

Field, A. (2009). Descobrindo a estatística usando o SPSS. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Hair, J. F., Black, W. C., Babin, B. J., Anderson, R. E., & Tatham, R. L. (2009). Análise multivariada de dados. Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

Kacero, E. (2005). Test gestáltico visomotor de Bender: una puesta en espacio de figuras. Buenos Aires: Lugar editorial.         [ Links ]

Koppitz, E. M. (1963). O teste gestáltico Bender para crianças. Porto Alegre: Artes Médicas.         [ Links ]

Noronha, A. P. P., Rueda, F. J. M., & Santos, A. A. A. (2013). Teste Gestáltico Visomotor de Bender - Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG): A study with different samples. Paidéia, 23(55),179-185. DOI: 10.1590/1982-43272355201305.         [ Links ]

Noronha, A. P. P., Santos, A. A. A., & Rueda, F. J. M. (2013). Habilidad viso-motriz y deficiencia intelectual: Estudio de validez para el Bender-SPG. Acta Colombiana de Psicología, 16(2),115-123. DOI: 10.14718/ACP.2013.16.2.11.         [ Links ]

Nunes, M. L. T., & Ferreira, R. B. (2007). Diferentes sistemas de aplicação e interpretação do Teste Gestáltico Visomotor de Bender. Psic - Revista de Psicologia da Vetor Editora, 8(1),41-49.         [ Links ]

Rueda, F. J. M., Santos, A. A. A., Noronha, A. P. P., & Segovia, J. L. (2013). Estudio trans-cultural con la prueba de Bender - Sistema de Pontuação Gradual. Liberabit, 19(2),173-180. Recuperado em janeiro, 2015, de http://www.scielo.org.pe/pdf/liber/v19n2/a03v19n2.pdf.         [ Links ]

Santos, A. A. A., & Jorge, L. M. (2007). Teste de Bender com disléxicos: comparação de dois sistemas de pontuação. Psico-USF, 12(1),13-21. DOI: 10.1590/S141382712007000100003.         [ Links ]

Santos, A. A. A., Noronha, A. P. P., Rueda, F. J. M., & Segovia, J. L. (2014). Bender - Gradual Scoring System: Performance of Brazilian and Peruvian children. Perceptual and Motor Skills, 118(3),897-908. DOI: 10.2466/03.10.PMS.118k25w7.         [ Links ]

Santucci, H., & Pêcheux, M. G. (1981). Prova Gráfica de Organização Perceptiva para crianças de 6 a 14 anos. In R. Zazzo (Org.). Manual para o exame psicológico da criança (pp. 291-338). São Paulo: Editora Mestre Jou.         [ Links ]

Sisto, F. F., Noronha, A. P., & Santos, A. A. A. (2005). Manual Bender - Sistema de Pontuação Gradual (B-SPG). São Paulo: Vetor.         [ Links ]

Sisto, F. F., Santos, A. A. A., & Noronha, A. P. P. (2010). Differential functioning of Bender Visual-Motor Gestalt Test items. Perceptual and Motor Skills, 110(1),313-322. DOI: 10.2466/PMS.110.1.313-322.         [ Links ]

Suehiro, A. C. B., & Santos, A. A. A. (2005). O Bender e as dificuldades de aprendizagem: estudo de validade. Avaliação Psicológica, 4(1),23-31. Recuperado em fevereiro, 2015, de http://pepsic.bvsalud.org/pdf/avp/v4n1/v4n1a04.pdf.         [ Links ]

Zuccolo, P. F., Rzezak, P., & Góis, J. O. (2010). Praxia e visoconstrução. In L. F. Malloy Diniz, D. Fuentes, P. Mattos & N. Abreu (Orgs.). Avaliação Neuropsicológica (pp.114-122). Porto Alegre: Artmed.         [ Links ]

 

 

Endereço para correspondência:
Fabián Javier Marín Rueda
Universidade São Francisco
Rua Alexandre Rodrigues Barbosa, 45, Centro
Itatiba - São Paulo - Brasil. CEP: 13251-900
E-mail: marinfabian@yahoo.com.br

Submissão: 11.6.2015
Aceitação: 15.03.2016

Creative Commons License